Existem tantas ideias fantásticas
a meu respeito, que tenho que começar pedindo-vos, se realmente tendes a
intenção de dar-me ouvidos, que deixeis de lado toda a superstição. Aquilo de
que vos vou falar pertence tanto a vós quanto a mim; conquanto que para mim
seja a Verdade única, não significa isto que ela me pertença exclusivamente. É
ela uma verdade que pode ser atingida por todo o ser humano e não está apenas
reservada para os eleitos, para os eruditos. Onde quer que seres humanos
pensem, sentam e se esforcem, é esta a verdade a culminância e a flor; e para
todo o ser humano significa ela o atingimento da pura razão e do puro amor,
a união vital que é a combinação da sabedoria e da beatitude — da visão
duradoura e felicidade perdurável. Esta é, para mim, a realidade mais alta de
todas e é uma realidade a qual todo o ser humano, pelo fato de o ser, pode
atingir.
No que a mim concerne, eu vos
falo acerca da verdade de meu próprio conhecimento; pois sei que libertei essa
vida que todos, cedo ou tarde têm de libertar, e que por meio dessa liberdade,
alcancei a iluminação, a qual é apenas uma outra palavra para a verificação do
verdadeiro mérito das coisas. Assim, não deveis tomar o que eu digo como mero
amontoado de palavras e frases ou como sendo qualquer espécie de complicada
filosofia Oriental. Não é isto, porque o que tendes que libertar é a própria
vida; é com a vida que tendes que contender, de lutar incessantemente se
quiserdes deitar as mãos à plenitude da verdade.
Nem tão pouco falo de gente
escolhida, a um núcleo apartado do resto do mundo. Para mim, tal grupo não
existe. Não conheço gente selecionada; conheço somente o mundo e vós é que sois
o mundo— vós e o restante da humanidade. Não se cogita aqui de um núcleo especialmente
qualificado para compreender o que eu digo. Minhas palavras são de modo igual
para todos.
Quisera que considerásseis o que
eu digo, não sob o ponto de vista de uma filosofia qualquer ou de qualquer
sistema porém com espírito prático. Quisera que verificásseis como isto opera;
pois a prova de qualquer verdade está na ação. Pelo julgar, portanto, que
espécie de ação naturalmente resultará de uma linha qualquer de pensamento,
podeis ajuizar do próprio pensamento em si. Pois o pensamento verídico conduz à
ordem, à paz e à harmonia, ao passo que o pensamento inverídico somente pode finalizar
o caos, pela perturbação e pela exploração dos outros.
Um outro ponto é este — não
penseis que o que eu digo se aplica somente aos jovens com exclusão dos velhos,
ou vice-versa. A partir do momento que dividais a vida e penseis em seu
objetivo como tendo de vir a ser atingido oportunamente, em algum futuro
distante, perde-se o propósito desta doce realização, pois que a eventualidade
da vida acha-se no próprio momento da ação. A vida não conhece divisões de
jovens e de velhos. No Agora Eterno não existe tempo nem estágios do tempo.
Falo daquela vida que se acha
manifestada em cada um de vós e que transcende todas as divisões de
nacionalidades, de classe e religião; essa vida que, pelo fato de ser
essencialmente livre, está continuamente se esforçando para realizar essa
liberdade; a vida em que não há separação, que é em si mesma a realidade última,
uma, integra e eterna. É com essa vida que me preocupo, de como ela pode ser
liberta afim de que possa funcionar espontaneamente e ser estabelecida na beatitude
perdurável. Digo beatitude, porque a felicidade é a verdadeira consumação da
vida, a mais alta realidade atingível pelo homem. Falando de uma tal
felicidade, não estou dependendo de teoria alguma. Falo do que sei e
informo-vos segundo o meu próprio conhecimento de que, quando houverdes
extirpado toda ilusão, então sereis todas as coisas; tornar-vos-eis unos com
todo o esforço humano, seja bom, seja mau, e com toda a humana consecução seja
do futuro, seja do passado. Quando houverdes libertado essa vida dentro de vós
mesmos, tereis estabelecido a verdade que é felicidade.
Jiddu Krishnamurti, 1930