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quarta-feira, 1 de maio de 2013

O pensamento e as suas duas faces: medo e prazer

Ao vos observardes interiormente, não descobris dois prin­cípios ativos: o medo e o prazer? Não vedes que o prazer assume formas diferentes — ora é busca de Deus, ora desejo de ser pessoa importante, politicamente ou a outros respeitos? E não vedes também em ação, dentro de vós mesmo, o princípio do medo? Temos, pois, estas duas coisas. De uma, o prazer, que­remos mais, da outra, o medo, queremos menos. Ora, neste momento, sentado neste salão e ouvindo esta palestra, não estais sentindo nenhum medo; podereis senti-lo mais tarde, após vos retirardes. Embora, no fundo, ele sempre exista latentemente, não podeis provocá-lo, a fim de observá-lo. Não podeis dizer: "Vou ficar com medo, para olhar esse estado"; mas podeis, pela compreensão do apego, compreender o que significa "ter medo". Como dissemos, o medo e o prazer constituem nossos principais movimentos — movimentos contraditórios, em nossa vida; e porque, inconscientemente, tendes medo, vos tornais ape­gado, dependente de alguma pessoa — vossa mulher, vosso ma­rido, ou vosso guru. E quando dependeis de outra pessoa psico­logicamente, interiormente, e nela buscais consolação, amparo, por causa dessa dependência precisais possuir a pessoa, dominá-la ou submeter-vos ao seu domínio. E, ao observardes que sois de­pendente, podeis perceber que a fonte dessa dependência é o medo — medo de estar só, medo de errar, de não seguir o caminho certo, medo de ficar sem a consolação, sem a companhia de alguém, de não poder amparar-se em ninguém. Assim, por meio da dependência, podeis, neste momento, aqui neste salão, descobrir que realmente estais com medo. Sem precisardes pro­vocar o medo, descobris que, basicamente, tendes medo. Estamos em comunhão? Estar em comunhão, como já dissemos, é com­partilhar um problema de interesse comum. Nosso problema comum é este. Outrossim, quando dependeis de uma pessoa, não há só medo, mas também, inevitavelmente, ciúme, ansie­dade.

Eis, pois, o que a dependência implica. Ora, temos possi­bilidade de libertar-nos dessa dependência? Porque, em geral, nós gostamos de ser possuídos. Já não notastes isso? Gostamos de pertencer a alguém, de pertencer a um grupo, de compro­meter-nos a seguir um certo padrão de ação, para termos o sen­timento de estar vivendo virtuosamente. Deste modo, obser­vando bem a dependência, podeis ver, por vós mesmo, que na base dela está o medo. Somos, assim, levados a perguntar: Temos possibilidade de libertar-nos desse medo, não apenas do medo e da dependência superficiais, existentes nas relações, mas do medo profundamente radicado em nós? Estais fazendo junto comigo esta pergunta? Isto é, podeis vós, como ente humano, libertar-vos completamente do medo? Porque, se um homem teme, faz as coisas mais irracionais que se podem imaginar. Com medo, um homem está como que desequilibrado, num estado de neurose e, portanto, incapacitado de pensar com clareza, de observar com exatidão. Já não notastes que o medo torna a vida sombria, opressiva, uma carga insuportável, uma tortura? E, não sabendo dissolvê-lo, fugis mediante os maiores absurdos.

Há o medo à dor física. Há anos, ou dias, sofrestes dor física, dores lancinantes ou superficiais. A dor que sofrestes há dois anos ou há dois dias deixou, em vosso cérebro, a marca, isto é, a "memória" dela, e não desejais que ela retorne. Que sucede? Tendo sentido a dor física, não desejais que ela se repita. Tendes a ideia de que ela pode voltar, e essa ideia gera medo. Pensais na dor de ontem ou de há dois dias e não desejais tornar a sofrê-la. O pensamento, que é a reação da memória, diz: "Não quero tornar a sentir essa dor." Assim, psicologicamente, a dor continua existente; não podeis esquecê-la. O pensar na dor passada mantém viva essa dor, e quanto mais pensais nela, mais forte se torna a "memória" dela e o medo de tornardes a senti-la.

O pensamento, pois, gera medo. Posso perder meu emprego; esse "posso" está no futuro: penso isso, portanto, sinto medo. Penso na morte, e esse pensamento me faz medo. Assim, como dissemos, o pensamento gera medo, não só medo do passado, mas também medo do futuro. Se não compreenderdes bem este ponto, nunca ficareis livre do medo. Vamos, pois, verificar juntos se podeis libertar-vos totalmente do medo. Sereis, então, um homem livre e largareis todos os vossos gurus; sereis capaz de pensar, de ver, de viver, em plena claridade, num estado extático. Desse modo, cabe-vos compreender a fundo esta questão.

Como vimos, o pensamento tanto dá continuidade à dor psi­cológica como à dor física. Experimentastes ontem um grande prazer sensorial — um prazer sexual ou o prazer de ver uma bela árvore, sua forma, beleza, dignidade, sua pujança, ou um belo pôr do Sol. Esse prazer se registrou em vosso cérebro. Ao admirardes o ocaso — se alguma vez vos dais ao trabalho de olhá-lo —, no momento dessa experiência, não pensais: "Preciso repeti-la." Só há a experiência; mas, um segundo após, exclamais "Que bela coisa! Quero repeti-la".

Esse desejo de repetição é o começo do prazer. Compreendeis? O desejo da repetição de um incidente que proporcionou deleite, o buscá-la, o exigi-la, é prazer, e este, por sua vez, é pensamento. Isto é, ver o pôr do Sol, depois, pensar nele e desejar a repetição dessa experiência — isso é prazer, não? O mesmo acontece em relação ao prazer sexual: o desejo de repe­tição, a imagem, o pensar nesse prazer, o ruminá-lo e desejá-lo de novo. Por conseguinte, o pensamento, o pensar, tanto gera o medo como o prazer. Mas se, depois de sentirdes a dor física, a derdes por terminada, dela não fizerdes nenhum registro, ela não terá continuidade — a continuidade produzida pelo pensar a seu respeito.

Vou agora examinar este ponto. Tende a bondade de es­cutar. Visto que somos entes humanos, e não meros animais, cumpre-nos viver inteligentemente — viver uma vida maravilhosa e de beleza, e não cheios de ansiedades, de sentimentos de "culpa", frustração, medo — medo que se expressa de dife­rentes maneiras: medo do escuro, medo da morte, medo de perder dinheiro, medo de não podermos tornar-nos pessoas im­portantes ...

Como dissemos, o pensamento nutre, sustenta e dá conti­nuidade ao medo e ao prazer. Ora, perguntamos: Porque é que o pensamento, que tantas maravilhas criou neste mundo — uma admirável tecnologia, miraculosos medicamentos, ciências várias — porque é que esse mesmo pensamento gera e mantém vivos o medo e o prazer? Assim, que é o pensamento, quando deve ele funcionar total e racionalmente, e quando deve estar comple­tamente quieto? O pensamento é a reação da memória, do conhecimento, da experiência, armazenados no cérebro; essa me­mória, essa reação, é pensamento. A memória, a inteligência, o conhecimento, criaram o foguete que foi à Lua, criaram verda­deiras maravilhas tecnológicas, o avião, tantas coisas extraordi­nárias e, no entanto, esse mesmo pensamento dá continuidade ao medo, esse mesmo pensamento busca o prazer, e esse mesmo prazer se torna medo. Percebeis a dificuldade? Necessitais do pensamento para "funcionardes" racional, objetiva, logicamente e, ao mesmo tempo, vedes que o pensamento está sempre a causar medo.

Cabe-nos, pois, descobrir por que razão o pensamento inter­fere (se posso usar o verbo "interferir") sempre que há uma experiência de prazer ou de dor; por que razão, quando expe­rimentamos qualquer coisa, quando temos dor física ou moral, o pensamento "interfere" e dela se apodera. Porque isso? Estais também fazendo esta pergunta? Vós compreendeis o problema, não? Para ser capaz de falar inglês, preciso de abundantes conhecimentos dessa língua, preciso da memória, etc.; e o pensa­mento se serve dessa memória das palavras inglesas para comu­nicar qualquer coisa. O pensamento, pois, está fazendo uso desses conhecimentos, mas faz também uso do conhecimento que gera medo, do conhecimento da dor sentida ontem, do conhe­cimento do prazer ontem experimentado.

E, assim, perguntamos: Porque é que o pensamento está sempre evitando o medo e apegando-se ao prazer? Essa é uma das questões. E a outra é esta: Porque é que o pensamento interfere sempre que há uma experiência? Compreendeis? Tenho a experiência do pôr do Sol e, nesse momento, nenhum pensamento existe; estou simplesmente a olhar aquela luminosa beleza. Vem, depois, o pensamento: "Quero repetir esta expe­riência amanhã" — isto é, o conhecimento da experiência de prazer faz-me desejar a sua repetição. Senti dor; a lembrança dessa dor é conhecimento e, de acordo com esse conhecimento, ou nele firmado, digo: "Não a desejo." Entendeis? Isso o pensamento está fazendo a todas as horas, sempre funcionando entre o prazer e a dor. E o pensamento é responsável pela existência de ambos.

Assim, por um lado, o conhecimento é essencial, sem ele não poderíeis voltar para casa, não poderíeis falar vossa língua, nem inventar coisas, nem erguer construções, se sois arquiteto, etc. O conhecimento é essencial, mas também é certo que o conhecimento da dor ontem sofrida gera medo. Cabe-vos, pois, descobrir por vós mesmos o que é que está em ação quando ausente o pensamento.

Se me vindes acompanhando desde o começo, observando tudo o que estamos mostrando, então, vossa mente se tornou sensível, desperta, cônscia do problema inteiro, de modo que podeis vê-lo diretamente e compreendê-lo instantaneamente — instantaneamente, e não por meio de análise. Vossa mente, por­tanto, se tornou inteligente, porque se tornou sensível ao pro­blema que antes evitava. Sois agora sensíveis ao problema do medo e do prazer e, por conseguinte, o estais observando. A mente que está observando o medo e o prazer nada aprendeu antes sobre eles: está aprendendo agora.

Vede, senhores, eu desejo de todo o coração transmitir-vos esta coisa, a fim de que, ao sairdes daqui, sejais entes humanos novos, entes humanos vivos e não eternamente dominados pelo medo.

Vede, senhor, se estais aprendendo uma coisa, digamos a língua russa ou italiana, vós não a sabeis, estais aprendendo-a por conseguinte, dela vos aproximais como de uma coisa nova. Vós não sabeis o italiano ou o russo; só o sabereis depois de acumulardes conhecimentos dessa língua, mas, no começo, nada sabeis. Ora, vós pensais conhecer o medo, pensais conhecer o prazer, mas na realidade nada sabeis a seu respeito. Portanto, estais aprendendo agora; percebeis a diferença? Por conseguinte, a mente que está aprendendo é uma mente inteligente, e não aquela que diz: "Aprendi" ou "Sei o que é o medo". Isto é, a mente que está aprendendo é inteligente; e não é inteligente a mente que diz: "Ensinai-me, vós sois meu guru. Eu vos obe­decerei, estou disposto a pôr-me de pernas para o ar, a dançar, a fazer o que mandardes, a fim de ir para o céu." Essa é uma mente entorpecida, incapaz de aprender; é uma mente morta, neurótica. Mas a mente que está aprendendo diz: "Eu não sei, vou observar o medo pela primeira vez, vou observar o apego pela primeira vez, vou observar pela primeira vez o que o prazer é realmente." Ora, como vedes, quando estais aprendendo, a mente está desperta. A mente desperta é uma mente inteligente, e essa inteligência é que vos dirá quando se deve e quando não se deve fazer uso do conhecimento.

Vede, senhor, eu quisera que estivésseis aqui, no meu lugar, e eu estivesse aí, no vosso lugar; porque este que vos fala, senhor, não leu livro nenhum sobre esta matéria, nem Gita, nem Upanishads, nenhum dos livros filosóficos ou psicológicos que tratam da psique humana. Cada um tem de descobrir a Verdade por si próprio. A Verdade não é uma coisa "em segunda mão". Não podeis adquiri-la por intermédio de um guru, de um livro. Para conhecê-la, tendes de aprender; compreendeis, senhor: aprender? E a beleza do aprender é o "não saber". Vós não sabeis o que é a Verdade. Não tenhais a pretensão de sabê-lo, não citeis o que outro disse. Na realidade, vós não o sabeis e, por si próprio. A Verdade não é uma coisa "de segunda mão", descobrirdes, precisais de paixão, de "intensidade". Inteligente, pois, é a mente que está aprendendo, e não aquela que repete o que aprendeu, ou a mente escravizada a um hábito, ou a que diz:

"Tenho medo e não sei o que fazer a esse respeito", e tampouco a mente que diz: "Quero prazer, cada vez mais prazer."

O aprender, pois, traz inteligência e, se agora estais real­mente aprendendo, não de mim, tendes então essa extraordinária inteligência que não se adquire de livro nenhum.

Krtishnamurti — O Novo Ente Humano — ICK — páginas 156 à 161

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill