A religião não é tradicional, não pode ser, por sua própria natureza. A tradição é o que está morto. A tradição já passou, já morreu, é apenas a poeira do passado, apenas a memória. A religião está sempre viva, respirando. A religião nunca pode ser tradicional. Sempre que uma religião se torna tradicional, serve mais ao Diabo do que a Deus; serve mais à morte do que à vida. Assim, ela serve aos políticos, aos padres, às organizações, às igrejas, mas não serve ao espírito do homem, e deixa de ser uma abertura para o futuro. A tradição está voltada para trás e nós temos que ir para a frente. Olhar para trás não serve para nada, e não só não serve para nada, como é prejudicial e perigoso. Não podemos ir para trás, temos que ir para a frente, e se ficarmos olhando para trás, certamente haverá problemas.
Outra coisa: a religião não está nas escrituras, não pode estar. As escrituras são palavras mortas. Sim, houve religião um dia, vibrando naquelas palavras, ao serem pronunciadas por um Mestre vivo. Quando Krishna falou o Srimat Bhagavad Gita para arjuna, isso era vivo. Era vivo por causa de Krishna, era radiante por causa de Krishna. Quando ele desapareceu, o Bhagavad Gita tornou-se um cadáver. Palavras mortas: você pode continuar analisando aquelas palavras, interpretando de uma maneira ou de outra... Existem milhares de comentários sobre o Gita, alguns até bem famosos. Na verdade, quando alguém lê o Gita, dá sua própria interpretação. O significado dado por Krishna foi perdido; desapareceu junto com ele. A cobra já passou... Só restou o seu rastro na areia. É esse rastro que você continua cultuando como uma escritura.
Quando Jesus andou sobre a terra e falou a seus discípulos, suas palavras eram uma verdade vibrante, palpitante de vida. A palavra não estava morta; a palavra era Deus, a palavra era a própria verdade. A palavra tinha em si um coração; era plena de amor, experiência, existência, ser. Quando Jesus se foi, a vida se foi. Depois, você pode colecionar palavras e fazer quantos evangelhos quiser, mas eles não serão de nenhuma ajuda.
A religião real nunca está nas escrituras, e a pessoa religiosa que busca, sinceramente, não vai atrás de escrituras, e sim de um Mestre — um Mestre vivo... Se você puder entrar em contato com um Mestre vivo, então as escrituras mortas tornar-se-ão vivas novamente; elas tornam-se vivas somente através de um Mestre vivo — não há outra maneira, porque o Mestre vivo é a única escritura. Quando um Mestre vivo toca o Bhagavad Gita, este torna-se vivo; quando ele toca os Evangelhos, eles tornam-se vivos. Quando um Mestre recita o Alcorão, ele torna-se vivo novamente. O Mestre dará sua própria vida a essas palavras e elas começarão a pulsar. Mas, diretamente, você não pode encontrar religião nas escrituras.
Assim, a religião não está na tradição, não está nas escrituras e não está nos rituais. O rituais são formalidades. A menos que você esteja em comunhão com um Mestre vivo, os rituais são apenas um peso morto. Eles oprimirão, esgotarão, matarão você, e você ficará perdido em infinitas formalidades. Com um Mestre vivo, nasce um novo ritual; que vem com o contato; existe um contexto, uma referência viva para esse ritual, que não é aprendido através de tradições mortas, transferidas de geração a geração. Você o vive — e, vivendo-o, aprende-o.
(...) A religião não está nos rituais. Sempre que existe uma religião, existe ritual, mas isso é bem diferente. Como você pode evitar de tocar os pés de Buda, quando ele está perto de você? Impossível. Você só pode fazer duas coisas, e ambas são rituais: ou você toca seus pés, ou você lhe atira pedras. Mas ambas são rituais — uma é o do amigo e outra é o do inimigo. O ponto principal é que não se pode omitir Buda, não se pode ser indiferente. O fenômeno é tal, que não se pode ignorá-lo. Ou você se torna um amigo ou se torna um inimigo; você tem de escolher. Você tem que tomar uma atitude, e essa atitude é ritual. Mas, nesse caso, nasceu em seu coração, não foi aprendido com outra pessoa. Ela simplesmente surge em seu ser.
(...) A religião não está na tradição, nem nos rituais e nem nas chamadas religiões: hindu, cristã, muçulmana. A religião não tem adjetivos. Religião é simplesmente religião, como amor é amor.(...) A religião não está nas religiões;está isenta de qualquer adjetivo, de qualquer definição, e cada um tem que buscá-la. Ninguém pode nascer numa religião; a religião tem que nascer em você. Você tem que abrir sua alma e receber a religião. Ela está se derramando em toda a parte... mas você está carregando brinquedos substitutos, moedas falsas, em suas mãos, pensando que tem religião. Ela não está na igreja, não está na mesquita, não está no templo. Vá onde está um mestre vivo: ela está lá. Isso também existe apenas por alguns momentos — o Mestre se vai, e a religião desaparece...
Religião é algo individual, cada um tem que buscar por si mesmo. Não é um fenômeno social, não tem nada a ver com a multidão, com o coletivo. É algo privado, tão íntimo quanto o amor. Você vem a ela sozinho, em profunda intimidade e privança... você abre seu coração. A religião é espontânea no sentido de que você não pode aprendê-la. Você pode estar nela, mas não pode aprendê-la. É tão espontânea quanto o amor. Você alguma vez aprendeu o que é o amor? No dia em que o homem tiver que aprender a amar, será o dia do Juízo Final. Esse dia parece estar cada vez mais próximo, principalmente no Ocidente, e particularmente na América. Livros estão sendo escritos: Como amar, Como fazer amigos — livros tolos, porque se o homem esqueceu como amar, nenhum livro pode ensiná-lo. Ensinar a humanidade a amar é o mesmo que querer ensinar um peixe a nadar — tolice completa. O mesmo acontece com a religião. Ela não pode ser aprendida, pode somente ser apreendida; é algo contagioso. Se você vai a algum lugar onde existe uma pessoa santa, você pode apreender, absorver a religião.
Religião é rebelião. É rebelião contra a morte, contra tudo o que está morto; é rebelião contra o exterior: contra a política, a ganância, a sociedade, a cultura, a civilização. Religião é uma rebelião: ela diz que temos de escutar a parte mais profunda de nosso ser, e segui-la aonde quer que ela nos leve. Aonde for... sem medo das consequências, escutaremos aquela pequena voz dentro de nós e a seguiremos. Religião é um risco. As pessoas que sempre procuram a segurança nunca poderão torna-se religiosas; é muito perigoso. Se você passar através do perigo, passará através da crucificação... e somente depois da crucificação vem a ressurreição.
OSHO em, A DIVINA MELODIA