Pergunta: Pode a ideia da perfeição constituir um incentivo em qualquer
estágio da evolução?
Krishnamurti: Naturalmente
quando o selvagem vê contas brilhantes, não se sente excitado e desejando-as? Esta
é uma das maneiras de aproximar-se da perfeição. Em primeiro lugar vem o desejo
de possuir, tal como no selvagem; mais tarde o desejo de colocar de lado todas
essas coisas, como se dá com o homem culto. Entre estes dois extremos existem
todos os graus de evolução, com seus desejos variantes, todos eles
encaminhando-se para a perfeição.
Pergunta: Por que é que vós, que
haveis sido especialmente preparados para vossa grande missão, durante anos, no
passado, esperais que nós, que não fomos preparados pela mesma forma, possamos
atingir a libertação convosco, agora?
Krishnamurti: Como sabeis
ter eu sido especialmente preparado? Não vos estais vós preparando pelo fato de
viverdes, todos os dias? Não estais lutando em meio da tristeza e do prazer? Não
é isto uma preparação? Não são o descontentamento, a inveja, o ódio, o afeto,
todos eles uma preparação?
É verdade que atingi e que por
causa desse atingimento posso mostrar-vos o caminho como agora o faço. Não espero, porém, que atinjais
imediatamente, pois que para vós existe ainda a renuncia e o auto-sacrifício; e
assim, não podeis por enquanto atingir. Se, porém, fixardes a vossa meta — a verdadeira felicidade que nasce da libertação
— então isso tornar-se-á mais fácil e direto e uma luz continua virá a ser
projetada sobre os vossos pensamentos e atos. Que mais necessitais do que fixar
vossa meta e encaminhar todo pensamento, emoção, e ação, para essa meta?
Pergunta: Será possível separar a pessoa da verdade? Como pode um homem
ordinário aprender a fazer isso? A autoridade externa pode ser uma mal, porém é
uma mal inevitável no presente.
Krishnamurti: Tem importância
por ventura o poço de onde extrais água desde que seja água extingua vossa
sede? Digo que descobri, que estabeleci por mim mesmo uma certa verdade; e
sinto desejo e ardor no mostrar essa verdade, a todo aquele que quiser
aprender. Se voz, porém, cultuardes ao individuo portador dessa verdade, ela não
mais será a verdade. Que importa quem traz a verdade, desde que haja em vosso coração
e mente a resposta que vos proporcione força para lutar e jamais ceder? Se imaginais
que a autoridade é indispensável, tendes que vos sujeitar a ela. Se um homem não
pode ver claramente, tem que usar óculos. A grande maioria das pessoas, porém, não
necessita de óculos. Um ou outro dia, haveis de chegar a verificar que a
autoridade não vos proporciona felicidade. Eu tomo como exemplo o meu próprio caso.
Quando meu irmão morreu, já há alguns anos, disseram-me ser ele perfeitamente
feliz no plano astral, e tudo lhe era róseo e belo. Porém disse eu: “no fim de
contas, perdi um grande amigo e sinto-me muito só; preciso de sua companhia”. Pensais
que minha tristeza se extinguiu porque me disseram que ele era perfeitamente
feliz no além? Verifiquei que, enquanto houver separação entre os indivíduos,
enquanto Krishnamurti fosse mais importante para mim, como indivíduo, do que
quaisquer outras pessoas, tinha que haver tristeza, e sempre sentiria a perda
de meu irmão. A partir do momento em que me tornei capaz de me identificar com
todos e sentir, não intelectualmente, mas por intermédio de meu coração, que não
existe separação real, então encontrei minha felicidade.
Pergunta: O ideal é estar só, porém será isto para todos no presente
momento?
Krishnamurti: Cada qual
tem que decidir por si mesmo. Quereis, ainda uma vez, que a verdade vos seja Rebaixada.
A Verdade, que é felicidade, que é a compreensão da vida, e, portanto, a
conquista da vida, não pode ser rebaixada. Vós tendes que vos encaminhar para a
Verdade e não esperar que a Verdade seja trazida para baixo. Assim como, no
outono, todas as folha murcham e fenecem e novos rebentos lhes vem tomar o
lugar, assim também deveis deitar fora todas as vossas velhas ideias, afim de
ganhardes a frescura e a glória da primavera; não confiar em passageiros
confortos ou deixar-se apanhar pelo presente.
Krishnamurti, 1930