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domingo, 30 de setembro de 2012

Áudio: No estado de mente aberta não há espaço para escolha

Vale a pena investir energia no aprimoramento da minha personalidade?


Você precisa abrir mão da sua personalidade para que possa encontrar a sua individualidade. O que chamamos de personalidade não é você; é uma máscara que as pessoas puseram em você. Ela não é uma realidade autêntica, não é sua face original. Você está me perguntando, “Vale mesmo a pena investir energia no aprimoramento da minha personalidade?” Invista energia na destruição da sua personalidade! Invista energia na descoberta de sua individualidade, e deixe essa distinção muito clara: a individualidade que você trouxe com você ao nascer. A individualidade é o seu ser essencial, e a personalidade é o que a sociedade fez com você, o que ela quis fazer com você.
Nenhuma sociedade até hoje foi capaz de dar liberdade às crianças para que sejam elas próprias. Parece arriscado dar essa liberdade. Elas podem ficar rebeldes. Podem não seguir a religião dos antepassados; podem não confiar nos valores morais. Elas descobrirão a sua própria moralidade e o seu próprio estilo de vida. Não serão réplicas, não repetirão o passado; serão seres do futuro.
Isso faz surgir o medo de que elas se desviem. Antes que se desviem, toda a sociedade tenta ensinar a elas uma maneira certa de viver, uma certa ideologia sobre o que é bom e o que é ruim, uma certa religião, uma certa escritura sagrada. Essas são maneiras de se criar a personalidade, e a personalidade funciona como uma prisão.
Mas milhões de pessoas neste mundo só conhecem a própria personalidade; não sabem que existe algo mais. Elas se esqueceram completamente de si mesmas, esqueceram-se até do caminho para chegar a elas mesmas. Tornaram-se, todas elas, atores, hipócritas. Estão fazendo coisas que nunca tiveram vontade de fazer e não estão fazendo coisas que adorariam fazer. A vida delas é tão fragmentada que elas nunca conseguem ficar em paz. A natureza delas está sempre se impondo e não as deixa em paz. E a chamada personalidade não para de reprimi-las, forçando-as a mergulhar cada vez mais fundo na inconsciência. Esse conflito divide você e a sua energia — e uma casa dividida não consegue resistir por muito tempo. Essa é a desgraça dos seres humanos — é a razão porque não existe tanta dança, tanta música, tanta felicidade.
As pessoas estão muito preocupadas em guerrear consigo mesmas. Elas não têm energia e não têm tempo para mais nada a não ser brigar com elas próprias. Elas têm de lutar contra a sensualidade, tem de lutar contra a individualidade, tem de lutar contra a originalidade. E tem de lutar por algo que elas não querem ser, que não faz parte da natureza delas, que não é o seu destino. Portanto, elas podem mostrar falsidade por um tempo, mas o verdadeiro sempre acaba aparecendo.
A vida passa, com seus altos e baixos, e elas não conseguem descobrir quem são: o repressor ou o reprimido? O opressor ou o oprimido? E, façam o que fizerem, as pessoas não vão conseguir destruir a natureza delas. Elas com certeza podem envenená-la; podem destruir a sua alegria, podem destruir a sua dança, podem destruir o seu amor. Podem tornar a vida delas uma mixórdia, mas não podem destruir completamente a sua própria natureza. E também não podem jogar fora a sua personalidade, porque a personalidade carrega os antepassados, os pais, os professores, os padres, todo o passado. É uma herança, à qual eles se apegam.
Tudo o que eu ensino é: não se apegue à sua personalidade. Ela não é você, nunca vai ser você. Dê à sua natureza total liberdade. E respeite-se, tenha orgulho de si mesmo, seja lá o que você for. Tenha dignidade! Não se deixe destruir pelos mortos.
Pessoas mortas há milhares de anos estão empoleiradas sobre a sua cabeça. Elas são a sua personalidade — e você quer aprimorá-las? Então, convoque mais alguns mortos! Escave mais alguns túmulos, desenterre mais esqueletos, cerque-se de todo tipo de fantasma. Você será respeitado pela sociedade. Será homenageado, recompensado; terá prestígio, será considerado um santo. Mas cercado pelos mortos você não conseguirá rir — não será de bom-tom —, você não conseguirá dançar, não conseguirá cantar, nem conseguirá amar.
A personalidade é uma coisa morta. Acabe com ela! Num sopro só, não aos poucos, não lentamente, hoje um pouquinho e amanhã um pouco mais, porque a vida é curta e o amanhã não é uma certeza. O falso é falso. Descarte-o totalmente!
Todo ser humano de verdade tem de ser um rebelde... E rebelde contra quem? Contra a própria personalidade.  
O japonês era cliente, fazia muito tempo, de um restaurante grego, porque tinha descoberto que eles faziam um arroz frito muito saboroso. Toda noite ele ia até o restaurante e pedia “aroz flito”. Isso sempre causava um ataque de riso no dono do restaurante. Às vezes, ele chegava a chamar dois ou três amigos só para ouvir o japonês pedir “aroz flito”.
O japonês acabou ficando tão ofendido que resolveu tomar aulas de dicção só para dizer “arroz frito” corretamente. Na vez seguinte que foi ao restaurante, ele disse claramente: “Arroz frito, por favor”.
Sem acreditar no que ouvia, o dono do restaurante pediu. “Pode repetir, por favor?”
O Japonês replicou, “Você ouviu o que eu disse, seu gleco cletino”.
Por quanto tempo você consegue fingir? A realidade vai aparecer uma hora dessas, e quanto antes melhor. Você não precisa melhorar a sua dicção — só precisa se livrar de toda essa coisa de personalidade. Seja simplesmente você mesmo. Não importa o quanto ela pareça tosca ou rústica no início, logo vai começar a adquirir a sua própria graça, a sua própria beleza.
E a personalidade... Você pode burila-la, mas vai estar burilando uma coisa morta, que não vai desperdiçar apenas com o seu tempo, com a sua energia e com a sua vida, mas também com as pessoas à sua volta. Nós todos afetamos uns aos outros. Quando todo mundo está fazendo alguma coisa, você também começa a fazer. A vida é extremamente contagiosa e todo mundo está aprimorando a sua personalidade — é por isso que essa ideia lhe ocorreu.
Mas isso não é necessário. Você não faz parte de um rebanho, não faz pare dessa gentalha. Tenha respeito por si mesmo e pelas outras pessoas. Orgulhe-se da sua liberdade. Quando você tem orgulho da sua liberdade, quer que todo mundo seja livre, pois a sua liberdade dá à você um amor e uma graça imensos. Você gostaria que todo mundo na vida fosse livre, amoroso e cheio de graça.
Isso só é possível se você for original — não algo construído, falso, mas algo que cresça dentro de você, que tenha raízes no seu ser, que floresça no tempo certo. E ter as suas próprias flores é o seu único destino, é o único caminho que faz sentido na vida.
Mas a personalidade não tem raízes; ela é feita de plástico, é artificial. Não é difícil descarta-la; só é preciso um pouquinho de coragem. E a sensação que eu tenho diante de milhares de pessoas é que todo mundo tem essa coragem, as pessoas apenas não a estão usando. Depois que você passa a usar a sua coragem, as suas fontes interiores adormecidas começam a ser ativadas e você fica ainda mais corajoso, mais rebelde. Você próprio se torna uma revolução.
Se você é uma revolução em si mesmo, isso é uma grande alegria, porque é sinal de que você cumpriu o seu destino. Você transcendeu a gentalha comum, a massa adormecida. 

OSHO — O Livro da sua vida - Crie seu próprio caminho para a liberdade - Cultrix

Áudio: Diálogo sobre a poesia de Osho e a Maestria de Krishnamurti

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sábado, 29 de setembro de 2012

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Não se deixe levar pelas aparências.

Áudio: Sobre a Influência Social - Parte 1 e 2




Reunião meditativa feita pelo Paltalk em 28/09/2012
Link para a sala do Paltalk: 
(2ª, 4ª e 6ª Feira das 22:00 às 24:00 horas)

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

O amor


A mente que busca não é uma mente apaixonada, e não buscar o amor é a única maneira de encontrá-lo; encontrá-lo inesperadamente e não como resultado de qualquer esforço ou experiência. Esse amor, como vereis, não é do tempo; ele é tanto pessoal como impessoal, tanto um só como multidão. Como uma flor perfumosa, podeis aspirar-lhe o perfume, ou passar por ele sem o notardes. Aquela flor é para todos e para aquele que se curva para aspirá-la profundamente e olhá-la com deleite. Quer estejamos muito perto, no jardim, quer muito longe, isso é indiferente à flor, porque ela está cheia de seu perfume e pronta a reparti-lo com todos.

O amor é uma coisa nova, fresca, viva. Não tem ontem nem amanhã. Está além da confusão do pensamento. Só a mente inocente sabe o que é o amor, e a mente inocente pode viver no mundo não inocente. Só é possível encontrá-la, essa coisa maravilhosa que o homem sempre buscou sequiosamente por meio de sacrifícios, de adoração, das relações, do sexo, de toda espécie de prazer e de dor, só é possível encontrá-la quando o pensamento, alcançando a compreensão de si próprio, termina naturalmente. O amor não conhece oposto, não conhece conflito.

Podeis perguntar: "Se encontro esse amor, que será de minha mulher, de minha família? Eles precisam de segurança". Fazendo essa pergunta, mostrais que nunca estivestes fora do campo do pensamento, fora do campo da consciência. Quando tiverdes alguma vez estado fora desse campo, nunca fareis uma tal pergunta, porque sabereis o que é o amor em que não há pensamento e, por conseguinte, não há o tempo. Podeis ler tudo isto hipnotizado e encantado, mas ultrapassar realmente o pensamento e o tempo — o que significa transcender o sofrimento — é estar cônscio de uma dimensão diferente, chamada "amor".

Mas, não sabeis como chegar-vos a essa fonte maravilhosa — e, assim, que fazeis? Quando não sabeis o que fazer, nada fazeis, não é verdade? Nada, absolutamente. Então, interiormente, estais completamente em silêncio. Compreendeis o que isso significa? Significa que não estais buscando, nem desejando, nem perseguindo; não existe centro nenhum. Há, então, o amor.

Krishnamurti - Liberte-se do Passado

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quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Vídeo: Educação Proibida


A Educação Proibida

A Educação Proibida " é um projeto documental, sem fins lucrativos, realizado por um grupo de jovens estudantes de cinema e preocupados com o futuro da educação. Os objetivos do projeto são: colocar na agenda pública os problemas educacionais como um assunto que exige uma dedicação profunda; o desenvolvimento de uma educação integral da humanidade incluindo aspectos intelectuais, emocionais, experimentais e físicos; dar a conhecer os projetos educacionais holísticos encontrados em desenvolvimento atualmente na América do Sul e Espanha; educar os pais e professores sobre as consequências da educação que dão a seus filhos e oferecer uma alternativa de mudança; e finalmente lançar o filme na Internet para que dele se possa fazer download da rede e exibição em casas/escolas/Institutos sem impedimentos jurídicos.

Algumas das propostas e princípios pedagógicos que sustentam “A Educação Proibida”: Método Montessori; pedagogia Waldorf (Rudolf Steiner); pedagogia Crítica; pedagogia Liberadora (Paulo Freire); método Pestalozzi; método Freinet; A Escola Livre; A Escola Ativa; pedagogia Sistêmica; educação Personalizada; pedagogia Logosófica.

Estes são alguns dos fundamentos gerais pedagógicos do projeto:

- Conteúdo/conhecimento não é a coisa mais importante, a informação não é correta para sempre, ela pode variar. O ideal é aprender a aprender, aprender a distinguir, interpretar por si só, tudo é relativo, de acordo com o contexto.

- O desempenho não é o mais importante, deve haver um objetivo a atingir. O importante são os objetivos pessoais e apreciar o processo em harmonia, o crescimento e a aventura de progredir. Em sala de aula não deve haver nenhuma hierarquia, senão se transforma em uma jaula. O professor não é superior ou tem o direito de dar ordens, é um companheiro, um guia que promove a democracia, a autonomia, a diversidade.

- O professor deve adaptar-se às capacidades e habilidades do aluno e não vice-versa. Programas educativos devem ser flexíveis e adaptáveis para o crescimento e o interesse da criança.

- O progresso não deve ter passos fixos, a segregação das crianças deve ser substituída por um agrupamento consciente de acordo com interesses, habilidades, experiências, simpatias. Não há nenhum nível maior ou menor do que outros.

- Conhecimento não deve ser somente teórico. Deve basear-se em experiências e experimentação dentro e fora da sala de aula. A teoria deveria ser mínima, a criança pode alcançá-la por suas próprias conclusões.

- Nem sempre é bom o que é conveniente, eficaz e produtivo. É importante criar um ambiente de autonomia, interação e alegria.

- A escola deve estar aberta para a Comunidade, permitir eventos de bairro, com a família, vizinhos e organizações parceiras. A criança pode trazer temáticas da comunidade para a escola. A escola funciona como um centro comunitário.

- O objetivo da escola já não é domesticar as crianças, nem transmitir valores e costumes sociais, mas criar o ambiente em que as crianças podem construir seus próprios valores e costumes. Educação não é um processo temporário, é um processo de vida que procura desenvolver capacidades e habilidades, sem um determinado curso marcado.

- O professor não tem todo o conhecimento, também vem para aprender com os alunos. É um guia que está em um processo de aprendizagem.

- O comportamento é um elemento visível que não indica demasiado. O ideal é que o professor possa conhecer internamente a cada criança, seus sonhos, sentimentos, imaginação, desejos. Esta é a melhor maneira de encontrar a melhor educação para ela.

- Seguir um padrão regular, estruturado de pensamento não é benéfico. O melhor é promover o pensamento divergente ou lateral. Há tantas soluções como alunos. Incentivar a criatividade e conjectura.

- Aprender a utilizar ambos os hemisférios cerebrais. Como na vida, as estratégias devem recorrer também à intuição e não ser tão seqüenciais e analíticas. Tudo é relativo.

- O sistema de qualificações não funciona. O esquema é de auto-profecias cumpridas. A pedagogia é uma ciência social que não pode ser medida numericamente. Avaliação é um processo.

- As lutas de poder e a competitividade causam danos para a criança. Há que democratizar a sala de aula. Torná-la um lugar participativo, cheio de paz.

- O interesse do professor deve satisfazer seu aluno para promover o crescimento do mesmo, não para controlá-lo. O mestre deve confiar que a criança vai crescer e concorda em não ter de adaptá-lo ao seu conceito de normal.

- O professor também colabora no crescimento espiritual e emocional da criança. Sem gerar crenças, deve dar-lhe técnicas para administrar seus estados de ânimo, seus pensamentos, ações, idéias e projetos. Incentivá-los à introspecção.

- Os valores não são para ser ensinados, mas para ser vividos. A cognição de valores e conhecimento é baseada em emoções, a melhor maneira de educar é pelo exemplo.

Sobre a influência social

            Falamos outro dia sobre o significado do conhecimento, e como o conhecimento impede a clareza da percepção. Creio que temos investigado profundamente esta questão, e nesta manhã quisera se possível for, discutir a virtude. Para indagar nesta questão, temos que considerar a influência da sociedade, o significado social da virtude e da autoridade, e do estado de solidão. Todos esses fatores estão aplicados nesta palavra “virtude”.
            Temos, primeiramente, toda esta questão da influência social, como somos moldados tanto pela estrutura sociológica como pela psicológica da sociedade. A forma com que pensamos, a maneira como atuamos, nosso sentido de responsabilidade, se posso usar esta palavra, da qual falamos outro dia: tudo isso é resultado da influência social. Psicologicamente não estamos separados da sociedade. Nossas reações, nossos pensamentos, são o resultado de nosso condicionamento, que é determinado pela estrutura psicológica da sociedade. Ainda que nos eduquemos em colégios e escolas e adquirirmos certa quantidade de conhecimento técnico em diversas áreas, a maioria de nós caímos a mercê da sociedade. Esta molda o nosso caráter. Nossas idéias religiosas estão condicionadas pela sociedade, pela cultura em que nascemos. A influência da sociedade molda todo o nosso ser. Somos católicos, protestantes, judeus, hindus, isto ou aquilo, com sua correspondente serie de dogmas, crenças e superstições. Dentro desse molde, cultivamos o que chamamos nossos próprios valores, porém nisto também somos influenciados consciente ou inconscientemente por muitas coisas, pelo alimento que comemos, pelo clima em que vivemos, pelas roupas que usamos, os jornais, revistas e livros que lemos, pelo rádio e a televisão. Sem compreender todas estas influencias, que são imediatas, penetrantes e constantes, sem dar-se conta por completo da influência de instante em instante, a virtude perde o seu significado. Quando não há compreensão da influência, seguimos simplesmente uma norma que tem chegado a ser respeitável, e a respeitabilidade não é virtude. Ao contrário, a respeitabilidade é um horror, não tem em absoluto nada haver com isso que se pode chamar de virtude, e no qual vou entrar agora.
            Assim, pois, se alguém quer realmente compreender a extraordinária virilidade da virtude e a força da virtude, tem primeiro que se dar conta da influência; não somente da influência que recebemos constantemente, senão também, da inconsciente, para qual, maioria de nós somos tão receptivos, e que é muito difícil de perceber.
            Porém, é possível por acaso, estar livres da influência: a influência de nossa esposa ou marido, de nossos filhos, da sociedade, de tudo o que nos rodeia? É possível estar livre dessa influência extraordinariamente insistente que continua a todo tempo na forma de propagandas através dos jornais e dos livros? Se dizemos que não é possível estar livre da influência, então,  evidentemente, a questão termina aí. Então, não há a necessidade de mais indagação, e toda virtude chega a ser mera imitação, ajuste a uma norma. A sociedade, com seu código de ética, suas responsabilidades, seus valores tradicionais, insiste em sua exigência de que o individuo se ajuste ao padrão estabelecido, e a esta conformidade a chama de moralidade; e é imoral a pessoa que se desvia do padrão estabelecido. Porém, por certo, alguém tem que estar completamente livre do padrão, tem que romper por completo com a estrutura psicológica da sociedade, o que significa que tem que se dar conta de toda a estrutura em si mesmo, tanto na mente inconsciente como na mente consciente. E é muito difícil dar-se conta do próprio condicionamento inconsciente. Conscientemente pode alguém recusar a estrutura moral da sociedade, e muitas pessoas o fazem; dão de ombros e a deixam de lado. Porém, a influência da sociedade não se limita ao século atual, inclui também o imenso passado com toda a sua propaganda, sua tradição, e este padrão está profundamente incrustado no inconsciente; e ao dar-se conta da norma inconsciente requer certa qualidade de negação.
            Vejam, espero que nos vos limiteis a escutar palavras e aprovar ou desaprovar, senão que de fato estejais experimentando para ver quão profundamente podeis penetrar em vós mesmos, no inconsciente. Estas reuniões serão completamente inúteis, carecerão de todo significado se escutais casualmente umas poucas conferências e partis. E não digais: “não posso fazê-lo”, porque nenhuma outra pessoa pode fazê-lo por vós. Cada um de nós tem que fazê-lo por si mesmo.
            O inconsciente é o oculto depósito do passado, tanto individual como coletivo. É o repositório de séculos de propaganda, de toda a experiência e conhecimento, as tradições e complexidades da raça. Agora bem, por muito sagaz que sejais ou que seja o analista, a mente consciente não pode penetrar no inconsciente pelo caminho da analise. Pela analise somente podeis arranhar a superfície do inconsciente, não podeis aprofundar muito nele, como creio reconheceram agora a maioria dos analistas e psicólogos. A mente consciente tem sido educada, adestrada numa direção particular; tem adquirido conhecimento técnico em certas direções, para que se possa ganhar a vida, coisa que se chama de atitude positiva diante da vida; porém, tal atitude com respeito ao inconsciente não é possível.
            Espero que estejais acompanhando claramente. Se não, rogo para que me façais perguntas depois, e discutiremos mais a questão.
            O inconsciente, que é o desconhecido, deve ser abordado negativamente. Compreendeis o que quero dizer com a atitude negativa e positiva? Quando temos um problema, a maioria de nós o abordamos positivamente, o que significa que tratamos de modificar o que é com regras de certa maneira. Como somos pessoas chamadas positivas, nossa atitude para o inconsciente é igualmente positiva. Na realidade não somos pessoas positivas em absoluto, porque nossa atitude positiva é uma reação ao negativo. Espero que compreendais isto.
            Dar-se conta de algo negativamente, da agitação dessa cortina, do ruído desse riacho, é observar e escutar sem resistência, sem condenação, sem negação. Porém, este estado de negação não é o oposto do positivo; não tem nada haver com o positivo, porque não é uma reação.
            Se queres compreender algo, vossa mente deve encontrar-se num estado de negação; e não está nesse estado quando reacusais ou condenais o que vês. O estado de negociação não é uma mente me branco. Ao contrário, vos daí conta de tudo, vês e olhais com toda a totalidade de vosso ser, o que significa que não há resistência, que não há recusa, que não há comparação, nem julgamento. E creio que é possível escutar da mesma maneira todas as respostas do inconsciente, que é dar-se conta dele negativamente. Se podeis fazer isto – e esta é realmente a única maneira de abordar o inconsciente -, então, o inconsciente se revela totalmente, de imediato. Certamente, podeis ir passo a passo, analisando cada forma de condicionamento, toda tradição, cada valor a medida que surge, coisa que é muito longa e tediosa; e desse modo vosso enfoque nunca pode ser total.
            Pois bem, mediante esta percepção alerta negativa ou sem escolha, podeis romper por completo o condicionamento do inconsciente. Vosso condicionamento de nacionalidade, de valores tradicionais, de herança racial, o condicionamento imposto a vós pela atual sociedade. Podeis destruir tudo isso imediatamente, e então, começareis a compreender o significado, a verdade ou a falsidade da influência.
            A maioria de nós temos dividido a influência em boa ou má. Consideramos que existe uma coisa tal como a boa influência, e que é salutar ter boas influências. Mas, para mim, toda influência dá no mesmo: perverte, desvia. Uma mente que está influenciada em qualquer direção não pode ver com clareza, é incapaz de uma percepção direta. Se compreendemos isso, não só intelectual ou verbalmente, senão em forma total, com todo o nosso ser, então, já não seremos escravos de nenhuma forma de influência.
            Por favor não considereis o que estamos dizendo como algo teórico, ou como algo não aplicável a vós porque sois demasiado velhos, ou demasiado jovens, ou demasiado condicionados, ou porque possuem muitas responsabilidades. Tudo isso é puro disparate, é uma mera fuga do fato de que não quereis realmente compreender todo esse processo da influência. E é muito importante compreender o processo da influência, porque é a influência que faz com que nos ajustemos à moralidade respeitável, que possui atrás de si a autoridade da tradição, da sociedade, a autoridade de um cargo; e assim a autoridade se torna muito dominante em nossa vida. A sociedade exige obediência , a obediência que uma mãe espera de seu filho e por ser escravos da influência aceitamos instintivamente a autoridade da sociedade, a autoridade do sacerdote, a autoridade do símbolo, a autoridade da tradição. Em questões tais como manter a direita no caminho, pagar os impostos, etc., devemos naturalmente aceitar a autoridade da lei, porém, não estamos falando disso. Falamos da tendência psicológica a obedecer, que implica escravidão da influência.
            Vejam, não estou fazendo um discurso para que somente o escuteis. Estamos fazendo algo juntos -, que é isto: estamos indagando por inteiro a questão da virtude. Se compreendemos bem a virtude, ela liberará uma enorme vitalidade, e é esta vitalidade, esta energia, o que se necessita para produzir a completa transformação de que falamos em nossa primeira reunião. Ao escutar, pois, ao que estamos dizendo, deveis ser vós mesmos que estejais trabalhando, e não eu trabalhando por vós. A maioria de nós nos contentamos em ir a uma partida de tênis para assistir aos jogadores; nunca participamos de uma partida, só assistimos, escutamos e desfrutamos com o jogo dos outros. Temo que aqui não tenha em absoluto que ser assim. Aqui tendes que trabalhar tão intensamente como o que fala, pois pelo contrário, isto carece de todo valor. Por trabalho que dizer escutar o que se diz e descobrir se é aplicável a vós mesmos, o que significa ver por vós mesmos o fato, a verdade ou a falsidade do que se está dizendo. Ver o fato não é nem aceitar e nem rejeitar o que se disse, senão dar-se conta tão vitalmente que, se for verdade, capteis e apliqueis cada matiz de toda palavra aprofundando em vós mesmos. Isso é o que entendo por trabalho. Se fazeis isso, quando deixardes esta tenda sereis virtuosos; e realmente quero dizer isso: sereis virtuosos.
            Temos, pois, que compreender a aceitação da autoridade, que na verdade é a tendência psicológica de se estar seguindo ao bom caminho. A maioria de nós detesta estar inseguro sobre algo, especialmente sobre nós mesmos. Mas, como veis, temos que estar inseguros para descobrir o que é verdade. Temos que libertar-nos de toda a autoridade, de todo seguimento, de toda obediência, e essa é uma coisa muito difícil de se fazer, porque a liberdade não é uma reação frente ao fato de que sois prisioneiros. Tão somente quando compreendeis por vós mesmos vossa própria escravidão à palavras, à influência, à autoridade – quando a compreendeis, não quando reagis contra ela -, é quando há liberdade.
            Há que se compreender pois a autoridade, seja do sacerdote, do político, do livro, do especialista, de vosso vizinho do lado, ou a autoridade de vossa própria experiência. E, como temos visto, para compreender algo, a mente tem que se encontrar num estado de negação. Para compreender a vosso filho deveis observá-lo enquanto está jogando, chorando, comendo, dormindo; e quando o comparais com outro menino, não o estais observando. Do mesmo modo, tendes que observar o instintivo desejo de obedecer, de seguir, de adaptar-se, de imitar; tendes que indagá-lo muito profundamente em si mesmo. A adaptação é evidentemente necessária em certas coisas. A linguagem que usamos ao falar se baseia na adaptação de um padrão lingüístico estabelecido, e recusar esse padrão seria absurdo, porque então, não haveria um modo de comunicarmos com os outros. Não estou falando de conformismo no sentido de não aceitar certos fatos que são óbvios e necessários e com os que todos estamos de acordo; falo da conformidade psicológica, a aceitação ou imitação, que é essencialmente o desejo de estar seguro.
            A maioria temos medo de equivocar-nos, sempre estamos buscando êxito no mundo, o queremos, psicologicamente, chegar a alguma parte; portanto, a obediência, que significa aceitar a estrutura psicológica da sociedade, se mostra extraordinariamente importante. Se compreendeis todo o significado disto, então, vereis que a essência mesma da virtude é a solidão. Se não estais completamente só, não sois virtuosos.  A mente está só, somente quando tenha compreendido a influência e não é afetada, capturada por ela. Uma mente assim já não está buscando por posição ou poder, e, por conseguinte está livre da autoridade, da obediência, do seguir. O estado de solidão não é uma reação, não é uma fuga da multidão; não significa retirar-se, fazer-se heremita, viver em isolamento, tudo o qual é reação. E com a palavra “solidão” quero significar algo que é inteiramente diferente do sentimento de solidão.
            É muito difícil comunicar ao outro o significado ou a qualidade de estar só. A maioria de nós nunca estamos sós. Podeis retirar-vos para as montanhas e viver como um recluso, porém, quando estais sós fisicamente, ainda tendes convosco, vossas idéias, vossas experiências, vossas tradições, vossos conhecimentos do que o tenhais sido. O monge cristão numa cela de monastério não está só; está com seu Jesus conceitual, com sua teologia, com as crenças e dogmas de seu particular condicionamento. Do mesmo modo, o sannyasi na Índia, que se retira do mundo e vive em isolamento, não está só, porque também vive ele com suas recordações.
            Eu falo de uma solidão na qual a mente está completamente livre do passado; e só uma mente assim é virtuosa, porque unicamente nesta solidão há inocência. Talvez digais: “isso é pedir demais. Não pode alguém viver neste mundo caótico, em que se tem que ir ao trabalho todo dia, ganhar-se a vida, criar filhos, agüentar as broncas da esposa ou do marido e tudo mais”. Mas eu creio que o que estamos dizendo está diretamente relacionado com a vida e a ação cotidiana; do contrário, careceria de valor. Como vês, desta solidão surge uma virtude que é viril e que trás um extraordinário sentido de pureza e doçura. Não importa que se cometa erros, isto é de muito pouca importância. O que importa é ter o sentimento de estar completamente só, incontaminado, porque só uma mente assim pode conhecer ou dar-se conta daquilo que está mais além das palavras, mais além do nome, mais além de todas as projeções da imaginação.

Krishnamurti - 26 de Julho de 1962
Do livro: TRAGEDIA DEL HOMBRE Y DEL MUNDO: A MENTE MECANICA
Editorial “SER” – 1967 - Impresso na Argentina
Título da obra em inglês: TALKS BY KRISHNAMURTI IN EUROPE – 1962 E 1965 

O que sois, o governo é

            PERGUNTA: Que devemos fazer para termos um governo deveras bom, e não simplesmente o governo “do povo pelo povo”?

            KRISHNAMURTI: Senhores, para terdes um bom governo, deveis em primeiro lugar compreender o que significa “governo”. Não façamos uso de palavras sem “referente”, palavras sem significação, sem algo em que se apóiem. A palavra relógio tem “referente”, mas a expressão “bom governo” não o tem. Para acharmos o seu “referente”, precisamos examinar o que significa “governo” e o que significa “bom”. Mas dizer, simplesmente, o que é um “bom governo” não tem sentido algum.
            Vejamos, pois, em primeiro lugar o que se entende por “bom”. Não estou esmiuçando, não estou procedendo como um estudante discutindo numa união; porque é muito importante descobrirmos o que estamos falando, em vez de fazermos, simplesmente, emprego de palavras que pouca significação têm. Bem sei que nos nutrimos de palavras. Produz impressão dizermos que temos um governo “do povo pelo povo”, e agitarmos a nossa bandeira — bem sabeis como é isso, como ficamos fascinados por palavras, quando os nossos corações e nossas mentes estão vazios. Verifiquemos, pois, o que significa “bom governo”.
            Que significa “bom”? “Bom” tem naturalmente um “referente”, baseado no prazer ou na dor. “Bom” é o que dá prazer, “mau” o que causa dor, quer exterior, quer interiormente (física ou psicologicamente). Isso é um fato. Estamos apreciando o fato, e não o que gostaríeis que ele fosse. Visto que buscais o prazer sob várias formas: segurança, conforto, poder, dinheiro — o fato é que o prazer é o que chamamos “bom”; e qualquer coisa que perturbe o estado de prazer, dizemos que “não é boa”. Não estou discutindo filosoficamente, mas com base na realidade. O prazer é o que desejais. Assim, evidentemente, chamais bom àquilo que vos dá segurança, conforto, posição, poder, garantia. Estais compreendendo? Isto é, um bom governo é aquele órgão que pode dar-vos o que desejais; e se o governo não vos dá o que quereis, tratais de derrubá-lo — se não for um governo totalitário. Mas até mesmo um governo totalitário pode ser destruído, se o povo disser: “Não o queremos”. Entretanto, nos dias de hoje é quase impossível a revolução física, porque os aviões e outras máquinas de guerra sem as quais não é possível, modernamente, uma revolução, estão nas mãos do governo. Assim, “bom” é aquilo que desejais, não é verdade? Senhores, não nos iludamos com palavras sobre o “bem” abstrato e o “mal” abstrato. O fato é que, em vossa vida diária, chamais “bons”, “nobres”, “eficientes”, etc., aqueles que vos dão o que desejais. O que desejais é satisfação, sob diferentes formas, e àquilo que vô-la pode dar, chamais benéfico.
            O governo, portanto, é o órgão que criais com o vosso desejo, não é verdade? Isto é, o governo sois vós mesmos. O que sois, o governo é, — o que é um fato bem evidente no mundo. Detestais um de terminado país e elegeis um governo que apóie o vosso ódio. Tendes inclinações comunalistas, e criais um governo com o vosso ponto de vista comunalista, — o que, mais uma vez, representa um fato bem óbvio, sobre o qual não há necessidade de nos estendermos. Visto que o que sois o governo é, como podeis ter um “bom governo”? Só podeis ter um bom governo quando houverdes transformado a vós mesmos. Do contrário, o governo não passa de mera máquina administrativa, um grupo de pessoas que elegestes para vos darem aquilo que desejais. Dizeis que não desejais a guerra, mas nutris todas as causas geradoras da guerra, como o nacionalismo, o comunalismo, etc. Sendo esta a vossa condição, criais um governo, uma sociedade à vossa imagem e semelhança. E tendo criado esse governo, o governo, por sua vez vos explora. Temos, pois, um círculo vicioso. Só pode haver um governo “bom” — não quero chamá-lo “bom” — só pode haver um governo são, quando fordes sãos. Senhores, não estejais a sorrir. Isso é um fato; não somos sãos, não somos criaturas humanas racionais, puras. Estamos desequilibrados, e por isso os nossos governos são desequilibrados. Será que julgais, senhores, que, vendo o mundo inteiro avassalado pela aterradora catástrofe da guerra e a produção de máquinas de guerra, será que julgais que um homem são não deseja pôr termo a isso? Um homem são procura averiguar quais são as causas a guerra, em vez de dizer: “esta é minha pátria, e eu tenho de defendê-la” — o que é infantil e estúpido.
            Pois bem: uma das causas da guerra é a avidez — a avidez por serdes algo maior do que vós — a qual vos leva a identificar-vos com a nação. Dizeis “sou hinduísta”, sou “budista”, sou “cristão”, sou “russo”, isto ou aquilo. Esta é uma das causas da guerra. E um homem equilibrado diz: “Quero livrar-me dessa insana limitação, que leva sempre à destruição final”. Precisamos primeiro criar sanidade, e não um plano de um governo novo, ou disso que chamais “governo bom”, e para serdes sãos precisais saber o que sois, precisais tomar conhecimento de vós mesmos. Mas isso não vos interessa. O que vos interessa é agitar bandeiras, ouvir discursos ocos, ser estimulados. Tudo isso são sintomas de insanidade, e como podeis esperar um governo são, quando os cidadãos não estão inteiramente despertos, quando só estão semi-vigilantes e desequilibrados?
            Senhores, se estais confusos, vós criareis o chefe confuso e ouvireis a voz desse homem confuso. Se não estais confusos, se estais lúcidos, não esperais que o governo vos diga o que deveis fazer. Porque desejais um governo? Porque, não sabendo amar racionalmente, humanamente, precisais de alguém que vos diga o que deveis fazer; por essa razão multiplicam-se as leis — temos leis e mais leis, determinando o que devemos e o que não devemos fazer. A culpa, portanto, é vossa. Vós sois responsáveis pelo governo que tendes ou ides ter. Porque, a menos que vos transformeis radicalmente, o que sois o vosso governo é. Se tendes uma mentalidade comunalista, criareis um governo igual a vós. E que significa isso? Mais desordem, mais destruição.
            Nessas condições, só haverá uma sociedade sadia, um mundo sadio, quando vós, como parte da sociedade, do mundo, vos libertardes, isto é, vos tornardes sadios. E só haverá sanidade, se abandonardes a autoridade, se vos livrardes do espírito nacionalista, do espírito patriótico, se tratardes os entes humanos como entes humanos, e não como brâmanes ou como indivíduos pertencentes a qualquer outra casta ou nação. E é impossível tratar os entes humanos como entes humanos se lhes dais rótulos, se os designais por um termo, se lhes dais um nome, como “hindú”, “russo”, isso ou aquilo? É muito mais fácil pôr etiquetas nos outros, porque então podemos passar por eles e dar-lhes pontapés, ou lançar bombas sobre a Índia ou o Japão. Mas se não tendes rótulos, e ides ao encontro das pessoas simplesmente como seres humanos, que acontece então? Deveis estar muito despertos, ser muito sensatos, nas vossas relações com outro. Mas como não desejamos fazer isso, criamos um governo acomodado às nossas conveniências.

Krishnamurti – 15 de agosto de 1948 – Novo Avesso à Vida

Os governos são a expressão da violência


PERGUNTA: Porque meio podeis influenciar os chefes de um partido ou os membros de um governo e trabalhar através deles?

KRISHNAMURTI: Pela razão muito simples de que os chefes são fatores de degeneração na sociedade, e os governos são a expressão da violência. E como se pode, como pode qualquer homem que realmente deseja compreender a verdade, trabalhar por meio de instrumentos que são opostos à realidade? Ora, porque desejamos guias políticos ou religiosos? Pela razão muito clara que desejamos ser dirigidos, desejamos que nos digam o que devemos fazer ou o que devemos pensar. Nossa educação, nossas organizações sociais e religiosas estão baseadas nisso: elas não nos dizem como devemos pensar, mas o que devemos pensar. Em tais condições, naturalmente, tendes necessidade de guias, de chefes. Porque estais confusos, porque estais a desintegrar-vos, porque sofreis e não sabeis o que fazer, apelais para alguém, para guias políticos, religiosos, ou econômicos, para que vos ajudem a sair desta caótica condição de existência. Ora, pode qualquer guia, político ou religioso tirar-vos, desta miséria, desta confusão? Prestai atenção, por favor: temos aqui uma questão muito importante. Porque o posto de guia implica poder, posição, prestigio; o posto de guia implica exploração — tanto pelo que é guiado como pelo guia. Surge o guia porque os que são guiados querem ser guiados. Quer isso dizer que o seguidor explora o guia, e o guia explora o seguidor. Sem o seguidor, que é do guia? Vê-se frustrado, sente-se perdido. E sem guia, que é feito do seguidor? Temos, portanto, um processo de mútua exploração; e onde existe o desejo de poder, de posição, de domínio, de guia, não existe compreensão. Quando o guia se torna a autoridade, a pessoa que decide sobre todos os assuntos, políticos ou religiosos, então o seguidor se torna mero fonógrafo, mero autômato; e visto como a maioria das pessoas prefere repetir, prefere ficar vendo os guias agirem, o resultado é que nos tornamos improdutivos, incapazes de pensar. Foi isso, exatamente, o que aconteceu no mundo.
            Nosso problema, portanto, é: Porque necessitamos de guias ou chefes? Pode alguém conduzir-vos para fora da confusão, que vós mesmo estais criando? Outros poderão apontar-vos as causas de vossa confusão, mas ficai certos de que esses não se tornam guias. Eu, por exemplo, vos estou mostrando a causa da confusão, mas não estou com isso me tornando vosso guia nem vosso guru. Compete-vos percebê-la e proceder de acordo, ou deixá-la de lado. Se, porém, eu vos induzisse a entrar para uma organização, se me tornasse a vossa autoridade, nesse caso eu me tornaria importante; por conseguinte, a vossa confusão continuaria a existir, e estaríeis meramente a fugir da vossa confusão e a ligar muita importância à minha pessoa; mas é à vossa confusão que deveis ligar importância, e não a mim. Portanto, eu estou fora do jogo.
            O que tem importância é que compreendais o vosso próprio sofrimento, vossa própria confusão, vossa própria dor, e vossa própria existência desastrada. E, para compreender necessitais de alguém, seja quem for? O que precisais é observar com precisão, com clareza, com olhos não embaciados pelo preconceito. E isso deveis fazer por vós mesmo, deveis olhar para dentro de vós mesmo, para descobrir se tendes preconceitos. Quer isso dizer que deveis estar cônscio de vosso próprio processo, de vossas próprias idiossincrasias. Como em geral não nos mostramos dispostos a descobrir a nós mesmos e a examinar o processo do autoconhecimento, procuramos um guia — ou, antes, criamos um guia. O guia se torna, assim, importante, porque nos ajuda a fugir de nós mesmos. O guia pode ser adorado, guardado numa gaiola, e dele se pode murmurar. O guia, portanto, é na verdade um fator degenerativo. Positivamente, quando o indivíduo, quando uma sociedade, quando uma civilização apela para um guia, isso indica um estado de desintegração. Uma sociedade criadora não tem guia, porque, nela, cada indivíduo é uma luz para si mesmo. Uma sociedade assim é o resultado das relações entre pessoas que estão em busca de autoconhecimento e compreensão, profundos, fundamentais; e tais pessoas não têm necessidade de uma sociedade estática, com os seus guias ou chefes, com suas autoritárias organizações sociais.

Krishnamurti – Da Insatisfação à Felicidade – 29 de fevereiro de 1948

O governo é o que nós somos


PERGUNTA: Um homem que abomina a violência pode tomar parte no governo de um país?

            KRISHNAMURTI: Ora, que é governo? Afinal de contas, um governo é, um governo representa o que nós somos. Na chamada democracia, seja qual for a sua significação, nós elegemos, para nos representar, aqueles que são iguais a nós, aqueles de quem gostamos, que têm a voz mais forte, a mente mais inteligente, ou o que quer que seja. Assim, evidentemente, o governo é o que nós somos, não achais? E que somos nós? Somos uma massa de reações condicionadas — violência, avidez, aquisicionismo, inveja, volúpia de poder, etc. Naturalmente o governo é o que nós somos, isto é, a violência sob diferentes formas; e como pode um homem em cujo ser realmente não existe a violência, pertencer, quer em nome, quer de fato, a uma estrutura que é violenta? Pode a realidade coexistir com a violência, que é o que chamamos governo? Pode um homem que busca ou que experimenta a realidade ter qualquer coisa em comum com os governos soberanos, com o nacionalismo, com uma ideologia, com a política de partidos, com um sistema de poder? O homem pacífico pensa que, aderindo a um governo, estará habilitado a prestar algum serviço útil. Que acontece, quando ingressa no governo? A estrutura é tão poderosa que o absorve, e ele muito pouco pode fazer. Senhor, isso é um fato, a que assistimos hoje no mundo. Quando uma pessoa ingressa num partido, ou se candidata a uma eleição para o parlamento, ou que quer que seja, tem de aceitar o programa do partido. Por conseguinte, deixa de pensar. E como pode um homem que se entregou a um outro — a um partido, a um governo, ou a um guru — achar a realidade? E como pode aquele que busca a verdade ter qualquer relação com a política das potências?
            Vede, Senhores, fazemos tais perguntas, porque nos agrada depender da autoridade exterior, do ambiente, para a transformação de nós mesmos. Esperamos que os chefes, os governos, os partidos, os sistemas, os padrões de ação, de alguma maneira nos transformarão, de alguma maneira implantarão a ordem e a paz em nossas vidas. Esta é por certo a base de todas as perguntas deste gênero, não é verdade? Pode um outro, seja um governo, um guru, ou um demônio, dar-vos a paz e a ordem? Pode alguém trazer-vos felicidade e amor? De certo que não. A paz só pode nascer depois de perfeitamente compreendida a confusão que nós mesmos criamos, compreendida não no nível verbal, mas interiormente; depois de afastadas as causas da confusão e da luta, teremos sem dúvida a paz e a liberdade. Entretanto, sem cuidarmos de eliminar as causas, preferimos recorrer à autoridade externa, para que nos dê paz; e o exterior é sempre submergido pelo interior. Enquanto existir o conflito psicológico, a ânsia de poder, de posição, etc., qualquer que seja a estrutura exterior, por melhor que tenha sido edificada, por mais benéfica e ordeira que seja, sempre será dominada pela confusão interior. Por conseguinte, é óbvio que devemos dar toda a importância ao interior e não ficar na mera dependência do exterior.

Krishnamurti – 7 de março de 1948 – Da Insatisfação à Felicidade

Tendes o governo que desejais - então, porque reclamais?

Que se entende por "governo"? Pessoas investidas de autoridade, um pouco burocratas, membros de gabinete, o primeiro-ministro, etc. Isso é o governo? Quem o elege? Sois vós, não é verdade? Sois os responsáveis por ele, não é exato? Tendes o governo que desejais - então, porque reclamais?... Sois vós os responsáveis e não o governo, porque o governo é a projeção, o prolongamento de vós mesmos - os seus valores são os vossos valores... garanto que também quereis ser exploradores, na ocasião oportuna, e por isso sustentais este jogo... Senhores, deveria existir uma classe de pessoas independentes do governo, não pertencentes à sociedade, à margem da sociedade, — para atuarem como guias. Essas são os “açoitadores”, os profetas, que vos apontam vossos grandes erros. Mas não existe nenhum grupo desses, porque o governo, no mundo moderno, não pode apoiar um tal grupo, um grupo sem autoridade, que não pertence ao governo, que não pertence a nenhuma religião, casta ou nação. É só um grupo desses que pode atuar como um freio aos governos. Porque os governos se estão tornando cada vez mais prepotentes, pondo ao seu serviço uma maioria de seres humanos, e em conseqüência os cidadãos, em números cada vez maiores, se vão tornando incapazes de pensar por si mesmos. O governo os controla e lhes diz o que devem fazer. Assim, só quando existe um grupo daqueles, um grupo enérgico, inteligente, ativo, só então há esperança de salvação. De outro modo, todos nós vamos acabar como empregados do governo, e o governo mais e mais nos dirá o que devemos fazer, e nos ensinará o que pensar, e não a pensar.

Krishnamurti - A Arte da Libertação - página 94

Todos temos um político de tocaia em algum lugar da nossa mente

Qualquer um que seja capaz de fingir com convicção, que consiga ser hipócrita, se tornará seu líder político, se tornará seu sacerdote religiosamente. Tudo que ele precisa é de hipocrisia, tudo o que ele precisa é de dissimulação, tudo que ele precisa é de uma "fachada" para se esconder por trás. Os seus políticos vivem vidas duplas, os seus sacerdotes levam vida dupla — uma pela porta da frente, a outra pela porta dos fundos. E aquela vivida pela porta dos fundos é a vida real deles. Aqueles sorrisos pela porta da frente são pura falsidade, aquelas caras tão inocentes são puramente cultivadas.

Se você quiser ver a realidade do político, precisará olhá-lo pela porta dos fundos. Deste ângulo ele aparece na sua nudez, do jeito como ele é; e para o sacerdote a coisa é assim também. Esses dois tipos de pessoas dissimuladas têm dominado a humanidade. Muito cedo eles descobriram que, se você quer dominar a humanidade, deve torná-la fraca, fazê-la sentir-se culpada, não-merecedora. Destrua a sua dignidade, tire-lhe toda a glória, humilhe-a. E encontraram maneiras tão sutis de humilhar, que eles nem aparecem "na foto"; você mesmo fica encarregado de se humilhar, de se destruir. Eles lhe ensinaram uma forma de suicídio lento. Você reconhece este homem? Com exceção dos mais inocentes e sinceros de nós, todos temos um político de tocaia em algum lugar da nossa mente. De fato, a mente é política. É da sua própria natureza planejar, montar esquemas, e tentar manipular situações e pessoas de maneira a conseguir o que quer. Nesta carta, a mente é representada pela serpente recoberta de nuvens, que "fala com uma língua bífida". O que é importante perceber, porém, a propósito desta figura, é que ambas as caras são falsas. A face cândida, inocente, do tipo "confie em mim", é uma máscara, e a face diabólica, venenosa, do tipo "vou tirar vantagem de você", também não passa de uma máscara. Políticos não têm faces verdadeiras. Seu jogo é na totalidade uma mentira. Dê uma boa examinada em si mesmo para verificar se você tem estado fazendo esse jogo. O que você vai encontrar poderá ser doloroso de ver, mas não tão doloroso quanto continuar agindo igual. No final, esse jogo não serve ao interesse de ninguém, e muito menos ao seu. O que quer que você consiga por esse caminho, irá transformar-se em pó nas suas mãos.

Osho, The White Lotus Chapter 10

A política é apenas instrumento da exploração

Pergunta: De que maneira poderia um homem de estado que compreendesse o que o senhor está a dizer, dar-lhe expressão nos assuntos públicos? Ou não é mais provável que se retirasse da política quando compreendesse as suas falsas bases e objetivos?

Krishnamurti: Se ele compreendesse o que estou a dizer, não separaria a política da vida na sua totalidade; e não vejo porque deveria retirar-se. Afinal, a política atualmente é apenas o instrumento da exploração; mas se ele considerasse a vida como um todo, não só política – e por política ele quer dizer apenas o seu país, o seu povo, e a exploração de outros – e considerasse os problemas humanos não como nacionais mas como problemas do mundo, não como problemas americanos, hindus ou alemães, então, se ele compreendesse aquilo de que falo, seria um verdadeiro ser humano, não um político. E para mim, essa é a coisa mais importante, ser um ser humano, não um explorador, ou meramente um especialista num curso de ação específico. Tentei explicar isso ontem na minha palestra. Penso que é onde reside o mal. O político só lida com a política; o moralista com a moral, o chamado instrutor espiritual com o espírito, cada um pensando que ele é o especialista, e excluindo todos os outros. Toda a nossa estrutura de sociedade se baseia nisso, e portanto estes líderes dos vários departamentos geram maiores estragos e maior miséria. Ao passo que se nós como seres humanos víssemos a ligação íntima entre todos eles, entre políticos, religião, a vida econômica e social, se víssemos a ligação, então não pensaríamos e agiríamos separadamente, de maneira individualista.

Na Índia, por exemplo, há milhões de pessoas a morrer à fome. O Hindu que é nacionalista diz; “Vamos em primeiro lugar tornar-nos intensamente nacionais; então seremos capazes de resolver este problema da fome.” Ao passo que para mim, a maneira de resolver o problema da fome é não tornar-se nacionalista, mas antes pelo contrário; a fome é um problema mundial, e este processo de isolamento apenas incrementa mais a fome. Portanto se o político lidar com os problemas da vida humana apenas como um político, então esse homem cria maior devastação, maior mal, maior miséria. Mas se ele considerar o todo da vida sem diferenciação entre raças, nacionalidades e classes, então ele é verdadeiramente um ser humano, embora possa ser um político.

Krishnamurti - Ojai, California, 11ª Palestra - 30 de Junho de 1934.

Sobre o envolvimento político

            Já notastes como a política e a reforma social se tornaram extraordinariamente predominantes em nossas vidas, nos tempos atuais? Todos os jornais e a maioria das revistas, salvo as de gênero puramente “escapista”, estão cheios de política, de estudos econômicos, e outros problemas. Já perguntastes a vós mesmos qual o motivo dessa orientação, por que razão os entes humanos estão atribuindo tamanha importância à política, à economia e à reforma social? As reformas são necessárias, em vista da confusão econômica, social e política, e da geral deterioração das condições de vida do homem, depois das duas guerras. Agrupam-se, por isso, multidões em torno dos guias políticos; as ruas ficam apinhadas de gente que os quer ver, como se fossem animais exóticos... Os homens que querem resolver o problema no nível econômico, social ou político, sem levar em conta o processo total do homem. Podem esses problemas ser atendidos separadamente, independentemente do psicológico total do homem? Podeis possuir um sistema perfeito, que julgais capaz de resolver os problemas econômicos do mundo, mas um outro terá também o seu sistema perfeito; e os dois sistemas, representando duas ideologias diferentes, se combaterão. Enquanto estiverdes a lutar por causa de idéias, de sistemas, não haverá uma revolução verdadeira e radical, nunca será possível a transformação fundamental da sociedade. As idéias não transformam os homens. É a libertação das idéias que causa a transformação. Revolução baseada em idéia não é revolução, mas apenas uma continuação do passado num estado modificado. Isso, evidentemente, não é revolução.
            O interrogante deseja saber porque não tomo parte na política ou na reforma social. Ora, se compreendemos o processo total do homem, atendemos então aos fatos fundamentais em vez de ficarmos meramente a podar determinados ramos da árvore. Mas a maioria de nós não tem interesse pelo problema na sua totalidade. Só nos interessa a reconciliação, o ajustamento superficial, e não a compreensão fundamental do homem, como um processo total. É muito mais fácil ser especialista num determinado nível. Os especialistas do nível econômico ou do nível político deixam a outros especialistas o nível psicológico, e assim nos tornamos escravos dos especialistas: somos sacrificados pelos especialistas a uma idéia. Nessas condições, só haverá possibilidade de uma revolução fundamental quando compreenderdes o processo total de vós mesmo, não como indivíduo oposto à massa, à sociedade, mas como um indivíduo em relação com a sociedade; porque sem vós a sociedade não existe, sem vós não pode haver relações com outras pessoas. Não haverá revolução nem transformação fundamental enquanto não compreendermos a nós mesmos. Os reformadores e os chamados revolucionários são, na realidade, fatores de retrocesso na sociedade. O reformador tenta remendar a atual sociedade com base numa ideologia, e sua idéia é condicionada a um padrão; e uma revolução dessa espécie, baseada em ideologia, nunca será capaz de produzir uma transformação fundamental nas relações sociais. O que nos interessa não é a reforma ou continuidade modificada, a que chamais revolução, mas, sim a transformação fundamental do homem, em suas relações com o homem, e enquanto não se verificar essa modificação básica no individuo, não poderemos produzir uma nova ordem social. A transformação fundamental não depende de crenças, de organizações religiosas, nem de sistema algum, político ou econômico: depende unicamente da vossa compreensão de vós mesmos, em relação uns com os outros. Essa é a revolução real que cumpre efetuar-se e tereis, então, como individuo, extraordinária influência na sociedade. Mas, sem essa transformação, o mero falar de revolução, ou o sacrifício de vós mesmo em prol de uma suposta idéia prática — o que realmente não é sacrifício nenhum — não passa evidentemente de mera repetição, e, portanto, retrocesso.

Krishnamurti - 15 de janeiro de 1950 – Do livro: Nosso Único Problema -  ICK

Sobre o estado de beleza criadora

            Senhor, que é a beleza como nasce o estado de beleza criadora? Obviamente, é necessário a existência do amor. E o amor significa abandono completo, não é verdade? Não o estado de abandono criado pelo desejo, mas aquele abandono sem restrições, sem esperança de resultados, em que, por conseguinte, não há medo. Só pode haver esse abandono completo quando não existe o “eu”, o “ego”; e quando já não existe “eu”, não há, no estado de abandono, austeridade, simplicidade?
            Para a maioria das pessoas, austeridade significa a destruição de tudo o que é belo ao redor delas. Exteriormente, essas pessoas rejeitam todas as coisas mundanas e só possuem umas poucas coisas, mas interiormente não são elas simples, absolutamente; pelo contrário, são extraordinariamente complexas, consumidas de desejos, ansiando por um certo resultado. Isto, por certo, não é austeridade. Ora, senhor, ser austero não significa negar o desejo. Tende a bondade de escutar. Só há estado de abandono quando não existe “eu”, mas o “eu” não pode ser destruído pelo simples expediente de reprimir o desejo. Afinal de contas, o desejo é energia, e se fosse destruído o desejo, nada mais seria possível. Necessitamos de uma energia extraordinária para que a mente tenha a possibilidade de estar quieta e de descobrir o que é Deus, o que é a verdade, e se aquela energia está sendo controlada, moldada, pelo medo, por influência de um condicionamento qualquer, ela não pode fluir “com abandono”, não pode ser livre; e, no entanto, essa energia, quando livre, criará sua peculiar austeridade.
            É esse estado de abandono, com austeridade, que leva à beleza, e esse estado é amor. Se não temos amor, como podemos apreciar a beleza ou criar o que é belo? Mas, não pode haver amor enquanto não houver aquele abandono, que só se tornará existente quando não mais existir o “eu”, o “ego”. Está visto, pois, que esse estado criador só pode surgir ao existir amor, “abandono” e austeridade; mas a mera austeridade sem abandono, sem amor, nada significa.
            O problema, por conseguinte, não é de como ser austero, de como abandonar ou expulsar o “eu”, mas, sim, de investigar o que é que se entende por amor. Como sabeis, dividimos o amor em coisa divina e coisa terrena, e criamos assim uma batalha entre as solicitações da carne e a ânsia do divino, entre o amor virtuoso e o amor físico. Mas é possível amar, não sentimental ou fisicamente, mas amar com aquela bondade e aquele perfume do amor no nosso coração, esvaziado de todas as coisas da mente? Ora, por certo, isto só é possível quando entregamos completamente o nosso coração a uma coisa; não há então conflito: há abandono, e esse estado de abandono cria sua peculiar austeridade, assim como um rio cria os barrancos que o contêm.
            Mas a respeitabilidade que a sociedade confere nada tem que ver com esse austero estado de abandono. O que a sociedade exige é respeitabilidade, controle, mediocridade; a mente medíocre, porém, não pode “abandonar-se”; ela não é nem ardente nem fria; é cheia de temores, apreensões e, por conseguinte, não pode de modo nenhum conhecer o que é o amor. Os mais de nós nos deixamos meramente controlar pelas sanções da sociedade, pela moralidade social que diz “Isto é bom e aquilo é mau”; estamos apanhados no meio do conflito entre o que é e o que deveria ser, e tal é a razão por que já não sabemos amar. Somos simples máquinas imitativas e, assim sendo, não podemos conhecer aquele estado de abandono em que existe austeridade e que é o único estado criador. Não podeis achar Deus, a verdade, sem aquele total abandono, sem estardes livres de todas as crenças, todos os dogmas e temores — e isso significa abrir o coração de par em par e não o deixar encher-se com as coisas da mente. Só pode haver bondade, generosidade, quando a mente está quieta; a beleza, essa coisa que realmente é Deus, é amor, é a bondade, só pode tornar-se existente pelo completo abandono do “eu”. Mas o “eu” não pode ser abandonado mediante a observância de determinados preceitos, determinadas práticas, nem pela meditação. O “eu” deixará de existir pelo percebimento de sua própria limitação, da falsidade da sua própria existência. Por mais profundo que se torne, por mais que se amplifique, o “eu” é sempre limitado, e enquanto não for abandonado, a mente nunca será livre, O simples percebimento desse fato é o fim do “eu”, e só quando ele finda é possível vir à existência o real.

Krishnamurti – Visão da Realidade - ICK

Sobre o estado de eterna criação

            Que é que impede essa constante renovação em nossa vida, que impede o novo de realizar-se? Não será porque não sabemos morrer a cada dia? Porque vivemos em estado de continuidade, num constante processo de transportar de dia para dia as nossas memórias, nossos conhecimentos, nossas experiências, nossas tribulações, nossas penas e sofrimentos, nunca encontramos num dia novo, sem a lembrança do anterior.  Para nós, a continuidade é a vida. Saber que eu continuo como memória, identificado com um determinado grupo, com um determinado conhecimento, com uma determinada experiência - para nós, isso é a vida; e o que tem continuidade, o que subsiste pela memória, como pode isso renovar-se?  Positivamente, só é possível a renovação quando compreendermos, na sua inteireza, o processo do desejo de continuar; e só quando cessa tal continuidade como entidade, como eu, no pensamento, só então se produz uma renovação.
            Afinal de contas, nós somos um feixe de lembranças: as lembranças da experiência, as lembranças que acumulamos pela vida, pela educação; e o eu é o resultado da identificação com tudo isso. Somos o resultado de nossa identificação com um determinado grupo francês, holandês, alemão, ou hindu.  Sem essa identificação com um grupo, com uma casa, um piano, uma idéia, ou uma pessoa, sentimo-nos perdidos; apegamo-nos por isso, à memória, à identificação, e essa identificação dá-nos continuidade, e a continuidade impede a renovação. Positivamente, só há possibilidade de renovar-nos quando sabemos morrer e renascer em cada dia, isto é, quando sabemos morrer e renascer em cada dia, isto é, quando estamos livres de toda identificação, que dá continuidade.
            A criação não é uni estado de memória, é? Não é um estado em que a mente está ativa. A criação é um estado mental, do qual o pensamento está ausente; enquanto o pensamento funciona, não pode haver criação. O pensamento é contínuo, é o resultado da continuidade, e para o que tem continuidade não pode haver criação, renovação; o que é contínuo só pode mover-se do conhecido para o conhecido, e, por conseguinte, nunca pode ser o desconhecido. Por essa razão, a compreensão do pensamento, e a maneira de por fim ao pensamento, são de grande importância. Pôr fim ao pensamento não é um processo de viver numa torre de marfim de abstração; pelo contrário, o findar do pensamento constitui a forma mais elevada da compreensão. O findar do pensamento gera a criação, e nesta há renovação; mas enquanto existir pensamento, não haverá renovação. Por esta razão é muito mais importante compreender como pensamos, do que considerar a maneira de renovar-nos. É só quando compreendo as tendências do meu próprio pensar, só quando percebo todas as suas reações, não apenas nos níveis superficiais, mas também nos profundos níveis inconscientes – é só então que, compreendendo a mim mesmo, o pensamento se extingue.
            O findar do pensamento é o começo da criação, o findar do pensamento é o começo do silêncio; mas o findar do pensamento não pode dar-se pela compulsão, nem por forma de disciplina, de constrangimento. Já devemos ter tido momentos em que nossa mente se achou muito tranqüila – espontaneamente tranqüila, sem nenhuma intenção de compulsão, sem nenhum impulso, nenhum desejo de fazê-la silenciosa. Já devemos ter experimentado momentos em que a mente esteve de toda quieta. Ora, essa tranqüilidade não é o resultado de continuidade, essa tranqüilidade nunca pode ser o produto de uma certa forma de identificação. A mente, num tal estado, deixa de existir; isto é, o pensar, como reação de um determinado condicionamento, deixa de existir. Este extinguir-se do pensamento é renovação, é o estado de novo, no qual a mente pode começar de maneira nova.
            Assim, a compreensão da mente, não como pensante, mas só como pensamento, a direta percepção da mente como pensamento, sem nenhum senso de condenação ou justificação, sem escolha, causa a extinção do pensamento. Vereis então, se o experimentardes, que depois da extinção do pensamento não existe mais pensante; e, quando não existe pensante, a mente está tranqüila. O pensante é a entidade que tem continuidade. O pensamento, vendo-se transitório, cria o pensante como entidade permanente, e dá continuidade ao pensante; e o pensante se torna então o agitador, mantendo a mente em estado de constante agitação, de constante busca, indagação, ansiedade. Só quando a mente compreende o processo total de si mesma, sem nenhuma forma de compulsão, há tranqüilidade e, por conseguinte, uma possibilidade de renovação.
            Assim, em todas essas questões o mais importante é compreender o processo da mente; e compreender o processo da mente não significa ação introspectiva, ação de auto-isolamento; não significa negação da vida, retraimento para um eremitério ou mosteiro, nem enclausuramento numa determinada crença religiosa.  Pelo contrário, toda crença condiciona a mente. A crença gera antagonismo; e a mente que crê nunca pode estar tranqüila, a mente presa a um dogma nunca saberá o que é ser criador. Logo, nossos problemas só podem ser resolvidos quando compreendemos o processo da mente, que é a criadora dos problemas; e o criador só pode deixar de existir ao compreendermos a vida de relação. A vida de relação é a sociedade, e para promover uma revolução na sociedade, cumpre compreender as nossas reações na vida de relação. A renovação, esse estado criador, só pode realizar-se quando a mente está de todo tranqüila, quando não está encerrada em atividade ou crença alguma. Quando a mente está quieta, totalmente tranqüila, porque o pensar se findou, só então há criação.

Krishnamurti - 9 de  abril de 1950.

Sobre o Morrer Todos os Dias

Krishnamurti: O pensamento é o resultado do passado a atuar no presente; as vagas do passado estão de contínuo submergindo o presente. O presente, o novo, está sempre sendo absorvido pelo passado, o conhecido. Para se viver no presente eterno, é necessário morrer para o passado, para a memória; nesta morte há renovação, sem a limitação do tempo.
Estende-se o presente para o passado e para o futuro; sem compreender-se o presente, fica- nos fechada a porta para a compreensão do passado. É tão fugaz a percepção do que é novo; nem bem o sentimos e já o submerge a rápida corrente do passado, e o novo deixa de existir.
Morrer para todos os dias passados, viver cada dia renovadamente — tal só é possível se formos capazes de estar passivamente vigilantes. Nessa vigilância passiva nada se nos acrescenta; nela há uma tranqüilidade intensa, na qual se assiste ao desenrolar perene do novo, na qual o silêncio se estende infinitamente.
Procuramos servir-nos do novo como meio de destruir ou consolidar o velho, e com isso corrompemos o presente, em que palpita a vida. O presente renova, e dá-nos a compreensão do passado. É sempre o novo que dá compreensão, e na sua luz assume o passado um significado novo e vivificante. Quando ouvimos uma coisa nova, ou a sentimos em nós, nossa reação instintiva é compará-la com o velho, com algo já conhecido e sentido, com uma lembrança já quase a apagar-se. Essa comparação dá força ao passado, desfigura o presente, e por essa razão se transforma o novo sempre em coisa passada e morta. Se fosse o pensamento-sentimento capaz de viver no presente, sem o desfigurar, veríamos, então, o passado transformar-se no presente eterno.
Para alguns de vós terão, porventura, estas palestras e exposições despertado uma compreensão nova e estimulante; o que agora importa é que se não ajuste o novo a velhos padrões de pensamento ou velhas fraseologias. Deixai o novo como está, livre de contaminação. Se for ele verdadeiro, a sua luz abundante e criadora dissipará o passado. O desejo de dar permanência ao presente criador, de torná-lo prático ou útil, despoja-o de seu valor. Deixai que o novo viva, sem estar ancorado no passado, sem a influência deformadora de temores e esperanças.
Morrei para vossa experiência, para vossas lembranças. Morrei para vossos preconceitos agradáveis ou desagradáveis. Morrer assim é tornar-se incorruptível; tal estado não é de aniquilamento porém de criação. É essa renovação que, se o permitirmos dissolverá os nossos problemas, por mais complicados, e os nossos sofrimentos, por mais intensos que sejam. Só na morte do “ego” haverá a vida.

Krishnamurti
Conferências com perguntas e respostas realizadas nos anos de 1945 e 1946, em Ojai, Califórnia, Estados Unidos da América. Do livro: O Egoísmo e o Problema da Paz – Ed. ICK - 1946

A importância dos retiros


Pergunta: Tendes estado em retiro nestes últimos dezesseis meses, e isto pela primeira vez em vossa vida. Podemos saber se há nisto alguma significação?

Krishnamurti: Não desejais, também, às vezes, recolher-vos à quietude, para fazer um balanço das coisas, a fim de não vos tornardes simples máquina de repetição, um discursador, um explicador, um expositor? Não desejais fazer isso, alguma vez, não desejais estar em tranqüilidade, não desejais conhecer-vos melhor? Alguns de vós o desejam, mas não o podem fazer por motivos econômicos. Há de haver dentre vós alguns que desejam fazê-lo, mas as obrigações de família, etc., os impedem. De qualquer maneira, é benéfico recolher-nos à tranqüilidade, para proceder a um balanço de todas as coisas que praticamos. Ao fazer isso, uma pessoa adquire experiências que não são reconhecidas, que não são traduzidas, O meu recolhimento, portanto, não tem significação nenhuma para vós. Sinto muito. Mas o vosso recolhimento, se o observardes corretamente, há de ter significação para vós. Julgo essencial que entreis, de vez em quando, em recolhimento, deixando tudo o que estais fazendo, detendo por completo as vossas crenças e experiências, e olhando-as de maneira nova, em vez de ficardes a repetir, como máquinas, o que credes ou o que não credes. Deixaríeis, assim, entrar ar fresco em vossas mentes, não é verdade? Isso significa que tendes de estar inseguros, não é verdade? Se fordes capazes de tanto, estareis abertos aos mistérios da natureza e para as coisas que sussurra ao redor de nós, e que de outra maneira não poderíeis alcançar; encontrareis o Deus que aguarda o momento de vir, a verdade que não pode ser chamada, mas vem por si mesma. Não estamos abertos ao amor e a outros processos mais delicados que se verificam dentro em nós, porque vivemos fechados em nossas ambições, em nossas realizações, em nossos desejos. Não há dúvida de que é muito salutar nos retrairmos de todas essas coisas. Deixai de ser membro de alguma sociedade deixai de ser brâmane, hindú, cristão ou muçulmano. Abandonai o vosso culto, os vossos ritos, retirai-vos completamente de tudo isso, e vereis o que acontecerá. Nesse retiro, não mergulheis noutra coisa qualquer, não abrais livro algum, absorvendo-vos em novos conhecimentos e novas aquisições. Rompei completamente com o passado, e vereis o que acontece. Fazei-o, senhores, e conhecereis o deleite. Descortinareis as imensidões do amor, da compreensão, da liberdade. Quando vosso coração está aberto, então é possível a vinda da realidade. E não mais ouvireis os sussurros dos vossos próprios preconceitos, os ruídos que vós mesmos produzis. Eis porque é salutar entrarmos em retiro, recolher-nos e fazer parar a rotina — não só a rotina da existência exterior, mas também a rotina que a mente estabelece para sua própria segurança e conveniência.

Experimentai-o, senhores, se tendes oportunidade para tal. Então, talvez conheçais a verdade que não pode ser medida. Vereis, que Deus não é uma coisa que se experimente e se reconheça, mas, sim, que Deus é algo que vem a nós sem que o invoquemos. Isso só se dá quando a vossa mente e o vosso coração estão completamente tranqüilos, não estão buscando, esquadrinhando, e quando não tendes nenhum desejo de aquisição. Deus só pode ser encontrado quando a mente não mais busca vantagem para si. Se nos retrairmos de todas essas coisas, talvez não ouçamos mais os sussurros do desejo, e, então, aquilo que está à espera, virá diretamente, infalivelmente.

Krishnamurti - 5 de janeiro de 1952 Do livro: Quando o Pensamento Cessa 

Áudio: Ego, o falso centro


Reunião Meditativa feita pelo Paltalk em 26/09/2012
Para participar destas reuniões acesse:

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Áudio: O sistema educacional como fator condicionante



Morrer para o ontem


Pensamos que o viver está sempre no presente e que o morrer é algo que nos aguarda num tempo distante. Mas nunca indagamos se essa batalha da vida diária é de fato viver. Queremos saber a verdade a respeito da reencarnação, desejamos provas da sobrevivência da alma, prestamos ouvidos às asserções dos clarividentes e às conclusões das pesquisas psíquicas, porém nunca perguntamos, nunca perguntamos como viver — viver com deleite, com encantamento, com a beleza, todos os dias. Aceitamos a vida tal qual é, com toda a sua agonia e desespero, com ela nos acostumamos, e pensamos na morte como uma coisa que devemos diligentemente evitar. Mas, a morte se assemelha extraordinariamente à vida, quando sabemos viver. Não podeis viver sem morrer. Isso não é um paradoxo intelectual. Para se viver completamente, totalmente, de modo que cada dia seja uma nova beleza, tem-se de morrer para todas as coisas de ontem, pois, de contrário, viveremos mecanicamente, e uma mente mecânica jamais saberá o que é o amor ou o que é a liberdade.

Em geral tememos a morte, porque não sabemos o que significa viver. Não sabemos viver, e por isso não sabemos morrer. Enquanto tivermos medo da vida, teremos medo da morte. O homem que não teme a vida não teme a insegurança, porque compreende que, interiormente, psicologicamente, não existe segurança nenhuma. Quando não há segurança, há um movimento infinito, e então a vida e a morte são uma só coisa. O homem que vive sem conflito, que vive com a beleza e o amor, não teme a morte, porque amar é morrer.

Se morreis para tudo o que conheceis, inclusive vossa família, vossa memória, tudo o que sentistes, a morte é então uma purificação, um processo de rejuvenescimento; traz então a morte a inocência, e só os inocentes são apaixonados, e não aqueles que crêem e que desejam descobrir o que acontece após a morte.

Para descobrirdes o que realmente acontece quando se morre, tendes de morrer. Isso não é pilhéria. Tendes de morrer, não fisicamente, mas psicologicamente, interiormente, morrer para as coisas que vos são caras e para as coisas que vos amarguram. Se morrestes para cada um dos vossos prazeres, tanto os insignificantes como os mais importantes, sem nenhuma compulsão ou discussão, então sabereis o que significa morrer. Morrer é ter uma mente completamente vazia de si mesma, vazia de seus diários anseios, prazeres e agonias. A morte é uma renovação, uma mutação, em que o pensamento não funciona, porque o pensamento é coisa velha. Quando há a morte, há uma coisa totalmente nova. Estar livre do conhecimento é morrer; e, então, estais vivendo!

Krishnamurti

O tempo e o sofrimento

O homem vive do tempo. A invenção do futuro se tornou seu favorito jogo de fuga. Pensamos que as mudanças em nós mesmos só podem ser efetuadas no tempo, que a ordem só pode ser estabelecida em nós mesmos pouco a pouco, aumentada dia por dia. Mas, o tempo não traz a ordem nem a paz e, portanto, temos de deixar de pensar em termos de gradualidade. Isso significa que não há um amanhã em que viveremos em paz. Temos de alcançar a ordem imediatamente. 

Quando se apresenta um perigo real, o tempo desaparece, não é verdade? A ação é imediata. Mas, nós não percebemos o perigo existente em muitos dos nossos problemas e, por conseguinte, inventamos o tempo como um meio de superá-los. O tempo é um embusteiro, porquanto nada faz para ajudar-nos a promover uma mudança em nós mesmos. O tempo é um movimento que o homem dividiu em passado, presente e futuro. E, enquanto fizer essa divisão, o homem viverá sempre em conflito.

O aprender depende do tempo? Após tantos milhares de anos, ainda não aprendemos que existe uma maneira de vida melhor do que odiarmos e matarmos uns aos outros. Muito importa compreender o problema do tempo, se desejamos uma solução para esta vida que cada um de nós contribuiu para tornar tão monstruosa e sem significação como é.

A primeira coisa, pois, que se deve compreender é que só podemos olhar o tempo com aquele vigor e aquela inocência da mente, que já estivemos considerando. Vemo-nos confusos a respeito de nossos numerosos problemas, e perdidos no meio desta confusão. Ora, quando uma pessoa se perde numa floresta, qual a primeira coisa que faz? Pára e olha em torno de si. Mas nós, quanto mais nos vemos confusos e perdidos na vida, tanto mais corremos em todos os sentidos, buscando, indagando, rogando. A primeira coisa que deveis fazer, se me permitis sugeri-lo, é fazer alto, interiormente. E, quando parais, interiormente, psicologicamente, vossa mente se torna muito tranqüila e clara. Podeis então considerar verdadeiramente a questão do tempo. 

Os problemas só existem no tempo, isto é, quando nos encontramos com um fato de maneira incompleta. Esse encontro incompleto com o fato cria o problema. Quando enfrentamos um desafio parcial, fragmentariamente, ou dele tentamos fugir — isto é, quando o enfrentamos com atenção incompleta — criamos um problema. E o problema continua existente enquanto continuarmos a dar-lhe incompleta atenção, enquanto esperarmos resolvê-lo um dia destes.

Sabeis o que é o tempo? — Não o tempo medido pelo relógio, o tempo cronológico, porém o tempo psicológico? É o intervalo entre a idéia e a ação. Uma idéia visa, naturalmente, à autoproteção: a idéia de estar em segurança. A ação é sempre imediata; não é do passado nem do futuro; o agir deve estar sempre no presente; mas a ação é tão perigosa, tão incerta, que preferimos ajustar-nos a uma idéia que nos promete uma certa segurança.

Olhai isso em vós mesmo. Tendes uma idéia do que é certo ou errado, ou um conceito ideológico relativo a vós mesmo e à sociedade, e de acordo com essa idéia ides agir. A ação, por conseguinte, ajusta-se àquela idéia, aproxima-se da idéia, e por essa razão existe sempre conflito. Há a idéia, o intervalo, e a ação. Nesse intervalo encontra-se todo o campo do tempo. Esse intervalo é, essencialmente, pensamento. Quando pensais que amanhã sereis feliz, tendes então uma imagem de vós mesmo a alcançar um certo resultado no tempo. O pensamento, pela observação, pelo desejo, e pela continuidade desse desejo, sustentada por mais pensamento, diz: "Amanhã serei feliz; amanhã terei sucesso; amanhã o mundo será um belo lugar." Dessa maneira, o pensamento cria esse intervalo que é o tempo.

Agora, perguntamos: Pode-se deter o tempo? Podemos viver tão completamente que não haja um amanhã para o pensamento pensar nele? Pois o tempo é sofrimento. Isto é, ontem ou há um milhar de "ontens", amastes ou tínheis um companheiro que se foi, e essa memória perdura e ficais pensando naquele prazer ou naquela dor; estais a olhar para trás e a desejar, a esperar, a lamentar, e, assim, o pensamento, ruminando continuamente aquilo, gera essa coisa que se chama sofrimento e dá continuidade ao tempo. 

Enquanto existir esse intervalo de tempo, gerado pelo pensamento, tem de haver sofrimento, tem de haver a continuidade do medo. Assim, perguntamos a nós mesmos: Pode esse intervalo terminar? Se disserdes: "Terminará ele algum dia?", isso então já é uma idéia, uma coisa que desejais conseguir e, por conseguinte, tendes um intervalo e de novo vos vede na armadilha.

Krishnamurti - Liberte-se do Passado
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill