Se você se sente grato por este conteúdo e quiser materializar essa gratidão, em vista de manter a continuidade do mesmo, apoie-nos: https://apoia.se/outsider - informações: outsider44@outlook.com - Visite> Blog: https://observacaopassiva.blogspot.com

terça-feira, 30 de abril de 2013

As manobras do pensamento condicionado

A Consciência Total e a consciência do eu

segunda-feira, 29 de abril de 2013

O pensamento é a origem do medo

Desejo falar sobre o medo, porque o medo perverte todos os nossos sentimentos, pensamentos e relações. É o temor que impele a maioria de nós a tornar-nos isso que se chama "espiritual"; e ele que nos impulsiona para as soluções intelectuais que tantos oferecem; é ainda o temor que nos leva a praticar ações estranhas e peculiares. E não sei se já experimentamos em sua realidade, não o sentimento que ocorre antes ou após um certo fato! O medo existe por si só? Ou só há medo em consequência do pensamento no amanhã ou no ontem, no que aconteceu ou poderá acontecer? Existe medo no pre­sente vivo, ativo? Quando vos vedes em presença da coisa que dizeis temer, nesse instante mesmo existe medo?

Para mim, é importantíssima esta questão do medo. Porque, se a mente não estiver total, completa e absolutamente livre do medo em qualquer forma — medo da morte, da opinião pública, da separação, de não ser amado — sabeis quantas variedades existem de medo — se a consciência total não estiver livre do medo, é impossível ir-se muito longe. Uma pessoa pode agitar-se ansiosamente, em todos os sentidos, dentro das clausuras de seu próprio intelecto; mas para se penetrar muito profundamente em si mesmo e ver o que existe lá e além, não deve haver temor de espécie alguma, nem temor da morte, nem da pobreza, nem de não alcançar alguma coisa.

O medo, em virtude de sua própria natureza, inevitavelmente impede a investigação. E, a menos que a mente, que todo o nosso ser esteja livre do medo, não só dos temores conscientes mas também dos profundos, secretos, ocultos temores, de que mal temos consciên­cia — não haverá possibilidade de se descobrir o que existe realmente, o que é verdadeiro, positivo, e se de fato existe aquele senso do subli­me, do imenso, de que o homem vem falando há séculos e séculos.

Creio ser possível estar totalmente livre do medo, não durante um certo período, não ocasionalmente, porém verdadeiramente livre dele, de maneira completa. A experiência desse estado total isento de medo, eis o que desejo examinar junto convosco.

Desejo tornar claro que não estou falando de memória. Não pen­sei de antemão na questão do medo e, portanto, não vim aqui repetir coisa ensaiada; isso seria horrivelmente enfadonho para mim e para vós. Eu também estou investigando. Deve tratar-se sempre de coisa nova, todas as vezes. E espero estejais empreendendo junto comigo a jornada da investigação e não apenas preocupados com vosso medo especial — medo do escuro, do médico, do inferno, da doença, de Deus, do que digam vossos pais, do que diga vossa esposa ou marido, ou uma qualquer das numerosas formas de medo. Estamos investi­gando a natureza do medo e não uma determinada manifestação do medo.

Ora, se examinardes, vereis que só há medo quando o pensa­mento se fixa no dia de ontem ou de hoje, no passado ou no futuro. No verbo ativo não há temor, mas no passado e no futuro do verbo ele sempre existe. Não há medo no presente real; e esta é uma coisa extraordinária para a própria pessoa descobrir. Não existe medo de espécie alguma em face do momento real e vivo, do presente ativo. O pensamento, portanto, é a origem do medo, o pensamento no ama­nhã ou no ontem. A atenção está no presente ativo. O pensamento no que ontem aconteceu, ou poderá acontecer amanhã, é desatenção, e a desatenção gera temor. Não é verdade isso? Quando posso aplicar toda a minha atenção a um dado problema, sem nenhuma reserva, sem rejeitar, sem julgar, avaliar — nesse estado de atenção não há medo. Mas, se há desatenção, isto é, se digo: "Que acontecerá amanhã?", ou se estou todo ocupado com o que ontem aconteceu, aí, sem dúvida, gera-se medo. A atenção é o presente ativo. O medo é o pensamento enredado no tempo. Na presença de algo real, concreto, em presença do perigo, neste momento não existe pensamento, porém ação. E essa ação pode ser positiva ou negativa.

Assim, o pensamento é tempo — não o tempo marcado pelo relógio, mas o tempo psicológico do pensamento. O tempo, por conseguinte, produz medo: tempo como distância daqui até , como processo de "vir a ser algo"; tempo representado pelas coisas que eu disse e fiz ontem, as coisas ocultas que não desejo que ninguém saiba; tempo representado pelo que acontecerá amanhã, pelo que será de mim quando eu morrer.

O pensamento, pois, é tempo. E existe, no presente ativo, tempo e pensamento? Pode-se ver que o medo só existe quando o pensa­mento se "projeta" para diante ou para trás, e que o pensamento resulta do tempo — tempo representado pelo "vir a ser" ou "não vir a ser" algo, tempo como preenchimento ou frustração. Não estamos falando do tempo cronológico; seria evidente desatino dispensá-lo. Estamos falando do tempo como pensamento. Se está claro isto, pas­semos a investigar o que é pensamento e o que é pensar. E espero não estejais apenas ouvindo minhas palavras, mas também prestando atenção ao desafio que elas vos apresentam e reagindo individual­mente. Estou perguntando: "Que é pensar?" Se não conheceis o mecanismo do pensar e não o investigastes muito profundamente, não podeis responder, vossa reação será inadequada. E se é inadequada a reação, haverá conflito, e tentar livrar-se do conflito é fuga ao fato — o fato que desconheceis. No momento em que reconheceis que não podeis responder, que não sabeis, apresenta-se o medo. Não sei se me estais seguindo.

Assim, que é pensar? Evidentemente, pensar é a reação que ocorre entre o "desafio" e a "resposta", não é verdade? Pergunto-vos uma coisa e há um intervalo de tempo antes de responderdes; neste intervalo o pensamento está em ação, procurando a resposta. É bas­tante simples ouvir esta explicação; mas o real experimentar, pela própria pessoa, do processo do pensar, o investigar como o intelecto reage a um "desafio" e qual é o processo de fabricação da resposta, isso requer atenção ativa, pois não? Observai qual é vossa reação à pergunta: "Que é pensar?" Que está ocorrendo? Não sabeis respon­der; nunca investigastes isso; estais aguardando uma resposta de vossa memória. E nessa "demora", no intervalo entre a pergunta e a res­posta, está em ação o processo do pensamento; não é assim? Se vos faço uma pergunta com que estais familiarizado, por exemplo: "Como é vosso nome?", respondeis instantaneamente porque, pela repetição constante, tendes a resposta na ponta da língua. Se a pergunta é um pouco mais séria, ocorre um intervalo de tempo de vários segundos — não é verdade? — durante o qual o intelecto é posto em movimento para procurar na memória a resposta. Se vos fazem uma pergunta mais complexa, maior é o intervalo de tempo, mas o processo é o mesmo — consultar a memória, procurar as palavras apropriadas, achá-las e em seguida responder. Segui isso com vagar, pois é real­mente muito divertido e interessante observar o funcionamento desse processo. Tudo isso faz parte do autoconhecimento.

Pode-se também perguntar, por exemplo, "Quantas milhas há daqui a Nova Iorque?" — pergunta à qual, após consultar a memória, sois obrigado a responder: "Não sei, mas posso verificar". Isso leva mais tempo. E pode-se também fazer uma pergunta que vos obrigue a dizer: "Não sei a resposta"; porém, ao mesmo tempo ficais espe­rando uma resposta, esperando que vo-la digam. Assim, temos a per­gunta familiar e a resposta imediata; a pergunta menos familiar, que exige algum tempo; a coisa de que não tendes certeza, mas que podeis verificar e para isso precisais de tempo; e, por fim, a coisa que não sabeis mas achais que, se esperardes, tereis a resposta.

Agora, se alguém pergunta: "Existe ou não existe Deus?" — que acontece? Nenhuma resposta pode ser encontrada na memória, pode? Embora vos agrade crer, embora vos tenham ensinado a crer, deveis varrer esses disparates. Investigar na memória não dá resul­tado; esperar que vos deem a resposta é inútil, porque ninguém pode dá-la; e o intervalo de tempo para nada serve. Há só o fato no presente ativo, a certeza absoluta de que não sabeis. Esse estado de "não saber" é atenção completa, não? E qualquer outra forma de saber ou de não saber procede do tempo e do pensamento, e é desatenção.

Estais seguindo tudo isso e aprendendo? Aprender, por certo, supõe "não saber". Aprender não é adicionar, acumular. No pro­cesso de acumular, o que se faz é apenas aumentar o conhecimento, que é estático. O aprender é constante variação, mudança, viver.

Sendo assim, que acontece quando estais aprendendo a respeito do medo? Estais investigando o medo, não é verdade? Estais "ata­cando" o medo, não é o medo que vos está atacando. E descobris então que não existe esta coisa: "vós e o medo". Esta divisão não existe. A atenção, pois, é o presente ativo, no qual a mente, o inte­lecto, diz: "Não sei, absolutamente". E nesse estado não existe medo. Mas existe medo quando dizeis: "Não sei, mas espero saber". Eis um ponto essencial que importa compreender. Consideremo-lo de diferente maneira.

Sem dúvida, o medo surge quando buscamos a segurança, exte­rior ou interiormente; quando se aspira a um estado permanente, dura­douro, nas relações, nas coisas mundanas, na confiança, que o saber proporciona, na experiência emocional. E, finalmente, dizemos que existe Deus, absoluta e eternamente permanente, em cujo seio encon­traremos imperturbável paz e segurança para todo o sempre. Cada um está a buscar segurança nesta ou naquela forma, e sabemos como cada um atua — buscando a segurança no amor, na propriedade, na virtude, jurando a si mesmo ser bom, casto. Todos conhecemos os horrores inerentes à busca, secreta ou aberta, da segurança. E isso é medo, porquanto nunca averiguastes se existe segurança. Não o sabeis. Emprego estas palavras para denotar que se trata de um fato que desconheceis absoluta e completamente. Vós não sabeis se Deus existe ou não existe. Não sabeis se haverá ou não outra guerra. Não sabeis o que irá acontecer amanhã. Não sabeis se existe, interior­mente, alguma coisa permanente. Ignorais o que irá suceder em vos­sas relações, com vossa esposa, vosso marido, vossos filhos. Não sa­beis; mas deveis verificar isso, não achais? Deveis descobrir por vós mesmo que ignorais. E esse estado de não saber, esse estado de completa incerteza, não é medo; é a atenção plena, na qual podeis descobrir.

Vê-se, pois, que a totalidade da consciência — a qual inclui o superficial, o consciente, o oculto, e as extremas profundezas dos resí­duos raciais, os "motivos", tudo o que constitui pensamento — vê-se que a totalidade da consciência é, essencialmente, medo. A consciên­cia é tempo, resultado de muitos dias, meses, anos e séculos. Vossa consciência de serdes francês se formou, historicamente, através de muitas gerações de propaganda. O fato de serdes cristão, católico, o que quer que seja, representa dois mil anos de propaganda durante os quais fostes obrigado a crer, a pensar, a funcionar e atuar segundo um certo padrão chamado "cristão". E não ter crença alguma, ser o mesmo que nada parece coisa temível. Assim, a totalidade da consciên­cia é medo. Isto é um fato, e não há concordar ou discordar sobre um fato.

Agora, que acontece quando vos vedes em presença de um fato? Ou tendes opiniões a respeito do fato, ou simplesmente o observais. Se tendes opiniões, juízos, avaliações do fato, então não o estais vendo. E não o vedes porque entra em cena o tempo, pois vossa opinião é produto do tempo, do ontem, de vossos conhecimentos anteriores. O ver realmente está no presente ativo, e nesse ver não existe medo. Isso é um fato real. O experimentar de um fato real é que liberta do medo a consciência total. Espero que não estejais muito cansados e possais experimentar isto, pois não podeis levá-lo para casa para lá refletir a seu respeito. Porque então não tem valor. O que tem valor é enfrentar o fato diretamente, e penetrá-lo. Vereis então que o todo de nosso mecanismo pensante, com seus conhecimentos, suas sutilezas, suas defesas e renúncias — que esse todo constitui o pensamento e é a causa real do temor. E vemos também que, quando há atenção total, não há pensamento; há, só, percepção, o ato de ver.

Havendo atenção, há completa tranquilidade; porque nessa aten­ção não há exclusão. Quando o intelecto pode estar completamente sereno — não adormecido, porém ativo, sensível, vivo, — nesse estado de atenta serenidade não existe medo. Há então uma qualidade de movimento que não é pensamento, absolutamente, que não é senti­mento, emoção ou sentimento. Não é uma visão, nem uma ilusão; é um movimento de qualidade toda diferente, que conduz ao Indenominável, ao Imensurável, à Verdade.

Mas, infelizmente, não estais escutando, experimentando deveras, pois não examinastes isto realmente, não investigastes até este ponto. Por conseguinte, o medo não tardará a precipitar-se novamente sobre vós, qual uma vaga, submergindo-vos. Tendes, portanto, de examinar isto; e no examiná-lo está a solução. Esta é a base; e uma vez lançada a base, nunca mais buscareis, porque toda busca da Realidade se baseia no medo. Libertada do medo a mente, o intelecto, então podereis descobrir.

Krishnamurti — O Passo Decisivo — Cultrix — Pág. 234 à 239

domingo, 28 de abril de 2013

A mente religiosa e a mente científica

A mente científica é objetiva. Sua missão é descobrir, perceber. Vê as coisas através de um microscópio, de um telescópio; tudo tem de ser visto exatamente como é; dessa percepção, a ciência tira conclusões, constrói teorias. Essa mente move-se de um fato para outro fato. O espírito científico nada tem que ver com condições individuais: nacionalismo, raça, preconceito. Os cientistas existem para explorar a matéria, investigar a estrutura da terra, das estrelas e planetas, descobrir meios para curar os males do homem, propagar-lhe a vida, explicar o tempo, tanto o passado como o futuro. Porém, a mente cientifica e suas descobertas são usadas e exploradas pela mente nacionalista, quer seja da Índia, quer seja da Rússia, da América, etc. De seu turno, os estados e continentes soberanos utilizam e exploram as descobertas dos cientistas.

Há, também, a verdadeira mente religiosa, que não pertence a nenhum culto, nenhum grupo, nenhum religião, a nenhuma igreja instituída. A mentalidade religiosa não é a mentalidade hindu, a mentalidade cristã, a mentalidade budista, a muçulmana. A pessoa religiosa não pertence a nenhum grupo que se intitule religioso. Ela não frequenta igrejas, templos, mesquitas, nem se apega a determinadas crenças e dogmas. A mente religiosa é completamente só. Ela já compreendeu a falsidade das igrejas, dogmas, crenças, tradições. Não sendo nacionalista nem condicionada pelo ambiente, não tem horizonte nem limites. É explosiva, nova, fresca, são. A mente são, jovem, é extraordinariamente maleável, sutil, não tem âncora. Somente ela pode descobrir o que se chama "deus", o que é imensurável.

Só é verdadeiro o ser humano quando alia o espírito científico ao autêntico espírito religioso. Então, os homens criarão um mundo justo — não o mundo dos comunistas ou dos capitalistas, dos brâmanes ou dos católicos romanos. De fato, o verdadeiro brâmane é aquele que não pertence a nenhum credo religioso, nem tampouco a nenhuma classe, não é detentor de autoridade, e não mantém posição social. O genuíno brâmane é o novo ente humano, que tem simultaneamente a mentalidade científica e a mentalidade religiosa, sendo, portanto, harmônico, sem qualquer contradição interior. Para mim, o objetivo da educação é criar esta nova mentalidade, que é explosiva e não se adapta a nenhum padrão estabelecido pela sociedade.

A mente religiosa é criativa. Não lhe basta acabar com o passado, tem também de explodir no presente. Ela, diferentemente da que só interpreta os livros sagrados e a Bíblia, é capaz de investigar, bem como criar uma realidade explosiva. Ai não há interpretação nem dogma.

É sobremodo difícil alguém ser religioso e ter uma mente lúcida, objetiva, científica, intrépida, alheia à própria segurança, aos próprios temores. Não podemos ter uma mente religiosa sem a compreensão total de nós mesmos  nosso corpo, nosso espírito, nossas emoções; ignorando como trabalha, e também como o pensamento funciona. Para descobrir e superar tudo isso, torna-se indispensável encarar o problema com uma mente cientifica, que é objetiva, clara, sem preconceitos, que não condena, que observa, que vê. Com essa mentalidade, somos efetivamente um ser humano culto, um ser humano que conhece a compaixão. Tal ente humano sabe o que é estar vivo.

Como conseguir tudo isto? Pois urge ajudar o estudante a ter um espírito científico, a pensar com clareza, precisão, argúcia, assim como auxiliá-lo a descobrir as profundezas de sua mente, a ir além das palavras, dos diferentes rótulos de hindu, muçulmano, cristão. Será possível ensinar o estudante a ultrapassar os rótulos, a descobrir por si, a examinar aquela coisa imensurável, que nenhum livro contém, à qual nenhum guru tem acesso? Se um colégio como este propiciar essa educação, constituirá isso um feito grandioso. Vocês todos devem sentir como será importante criar-se tal escola. É sobre isto que os professores e eu vimos há dias debatendo. Temos conversado acerca de várias coisas — autoridade, disciplina, métodos de ensino, o que ensinar, o que é ouvir, o que significa educação, cultura, etc. Apenas prestar atenção à dança, ao canto, à aritmética, às aulas, não constitui o todo da vida. Também faz parte da vida a pessoa sentar-se tranquilamente e olhar para seu interior, ter clara percepção, ver. Cumpre também saber pensar, o que pensar e porque estamos pensando. Faz parte igualmente da vida olhar os pássaros, observar os aldeões, sua miséria — qual a contribuição de cada um de nós para essa situação, criada pela sociedade. Tudo isso concerne à educação.

Krishnamurti — Ensinar e aprender — ICK

Sobre o conteúdo deste blog

Criticar antes de investigar é um erro, e crer antes de investigar é outro erro. É preciso ler silenciosamente, nem voluntariosamente resistindo nem cegamente aceitando. Há um poder inerente nas palavras verdadeiras.

Não é nossa intenção fundamentar cada declaração aqui feita. Preferimos apresentar nossas observações para um público atento e já simpatizante, para que sejam comunicadas com maior economia de meios, evitando divagações e circunlocuções de uma argumentação desnecessária. Em suma, desejamos que estes textos sejam um real serviço para aqueles que estão mental e psicologicamente preparados para recebê-los. Não desejamos forçar ninguém, mesmo de maneira sutil, a aceitar uma posição à qual as circunstâncias de seu natural crescimento interno ainda não os conduziram, ou desperdiçar o tempo de todos com uma dialética que não leva a parte alguma.

Portanto, se o leitor deseja se beneficiar da leitura deste material, é preciso adotar uma atitude de simpatia intelectual para com estas observações, ao invés de uma postura de criticismo suspeitoso. Estas observações são apresentadas como vivência comprovada, não como opiniões teóricas; no entanto, nada há neles que não seja razoável, desde que o leitor aplique aquela razão impessoal que se recusa a confundir pensamentos e observações familiares com as verdadeiras. Ao pedirmos isto, sabemos bem que estamos pedindo o que para muitos é demasiado, mas esses não precisam seguir-nos adiante. Estamos seguros de que ninguém se volta para um caminho desta espécie enquanto não houver esgotado as possibilidades dos métodos convencionais de comprovar a verdade. Com efeito, as pessoas procuram em negro desespero, como uma espécie de último recurso. É somente as pessoas deste tipo que sentem uma imensa angústia por sua inabilidade de penetrar nas regiões "espirituais", que não acham nenhum auxílio nos sistemas ortodoxos, e que talvez tenham tido uma pesada partilha de sofrimentos, que estas páginas provavelmente interessarão.

Ler estas páginas com um espírito de acre antagonismo ou de determinada oposição, procurando descobrir falhas e arvorar-se em juiz do que imagina ser erros, será talvez um bom exercício para o intelecto, mas não vos aproximará da verdade. Infelizmente, na educação moderna se tem desenvolvido a tendência para este estilo de leitura. Daí esta advertência para suspender, temporariamente pelo menos, a faculdade crítica que tem sido altamente útil na preparação da fábrica da moderna civilização comercial e científica, porém que se torna um empecilho quando empregada às exposições emanadas daqueles que já penetraram realmente na esfera espiritual.

Não solicitamos ao leitor para que seja desonesto para com seu próprio raciocínio, ou que destrua sua faculdade de juízo independente. Com efeito, quem quer que não se incline ao exercício de sua faculdade de raciocínio, não está apto para este paradigma. Desejamos, sim, tornar claro ao leitor que é tão só quando se sinta insatisfeito com o atual ponto de vista, que se pode esperar que tome, no momento pelo menos, o ponto de vista logicamente apresentado pelos que passaram por uma extensa ordem de experiências superiores.

Nesse caso solicitamos ao leitor que reflita sem superstições frequentes contra afirmações que encontre em sua busca até que possa apreender o ponto de vista dos que as fizeram. Solicitamos que seja imparcial e a assimilar, experimentalmente por assim dizer, uma concepção que até então não tenha nutrido e que possui um poder próprio para despertar no leitor a faculdade intuitiva e dar-lhe maior energia.

Não é possível condensar este método numa fraseologia mais tersa ou melhor  do que outrora adornou o gracioso pórtico do belo templo grego em Delfos: HOMEM, CONHECE-TE A TI MESMO!

O método mais exato para chegar à verdadeira natureza daquilo que somos, é seguir, por meio da observação, um processo de eliminação, isto é, distinguir entre o eu e o não-eu.

Ao leitor é preciso mergulhar repetidamente na corrente de pensamentos que lhe trouxeram a este ponto, pois necessita reconhecer sua verdade, não como algo que lhe é imposto de fora, porém, como algo que traz inerente em si a sua própria integridade, e portanto, nasce dentro de si com o mais pleno poder de convicção. Não utilizando outros meios senão os fatos da vida humana e das experiências do pensamento humano em suas várias fases, chegamos à visão da verdade de que o eu real que buscamos mora numa dimensão superior à corporal, emocional, à dimensão do pensamento e do tempo; oculta-se alhures por trás do eu de emoção-pensamento; e que em verdade deve existir além de todas as nossas categorias comuns.

Finalizando, desejamos ao leitor, uma boa viagem!

Texto parafraseado de Paul Brunton em "A Realidade Interna"

O que há lá dentro?

Um dos maiores mistérios da vida é o fato de nascermos com a perfeita bem-aventurança em nosso ser e, no entanto, continuarmos como mendigos, porque nunca olhamos para nosso interior.

Nós o subestimamos, como se já soubéssemos de tudo que há lá dentro. Essa é uma ideia muito idiota, mas prevalece em todo o mundo.

Estamos dispostos a ir à lua em busca da bem-aventurança, mas não a nos voltar para dentro de nós mesmos, pelo simples motivo de que pensamos do lado de fora, sem jamais entrar: “O que há lá dentro?”

De certa forma, carregamos conosco a noção de que nos conhecemos. Não nos conhecemos nem um pouco.

Sócrates tem razão quando diz: “Conhece-te a ti mesmo”.

Toda a sabedoria de todos os sábios está condensada nessas palavras, pois, quando você conhece a si mesmo, tudo o mais se torna conhecido, e tudo é realizado e alcançado.

Osho, em "Meditações Para a Noite"

sábado, 27 de abril de 2013

Ordem pós-moderna

Abrindo mão das chupetas psicológicas

Não troco o pior de hoje pelo melhor de ontem

Despressurizando a mente através da observação

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Morada


Morada
Forfun

Faço de mim
Casa de sentimentos bons
Onde a má fé não faz morada
E a maldade não se cria

Me cerco de boas intenções
E amigos de nobres corações
Que sopram e abrem portões
Com chave que não se copia

Observo a mim mesmo em silêncio
Porque é nele onde mais e melhor se diz
Me ensino a ser mais tolerante, não julgar ninguém
E com isso ser mais feliz

Sendo aquele que sempre traz amor
Sendo aquele que sempre traz sorrisos
E permanecendo tranquilo aonde for
Paciente, confiante, intuitivo

Faço de mim
Parte do segredo do universo
Junto à todas as outras coisas as quais
Admiro e converso

Preencho meu peito com luz
Alimento o corpo e a alma
Percebo que no não-possuir
Se encontram a paz e a calma

E sigo por aí viajante
Habitante de um lar sem muros
O passado eu deixei nesse instante
E com ele meus planos futuros
Pra seguir

Sendo aquele que sempre traz amor
Sendo aquele que sempre traz sorrisos
E permanecendo tranquilo aonde for
Paciente, confiante, intuitivo

O Despertar da Inteligência – Parte 1–Capítulo 1

O DESPERTAR DA INTELIGÊNCIA PARTE 1 CAPÍTULO 1

1a CONVERSA COM JACOB NEEDLEMAN MALIBÚ, CALIFÓRNIA - 26 DE MARÇO DE 1971

'O PAPEL DO PROFESSOR'

Needleman: Existe muita discussão acerca de uma revolução espiritual entre os jovens, particularmente aqui na Califórnia. Você enxerga nesse confuso fenômeno alguma esperança de um novo desabrochar para a civilização moderna, uma nova possibilidade de crescimento?

Krishnamurti: Para uma nova possibilidade de crescimento, não acha, senhor, que deve-se antes ser sério, e não meramente pular de uma atração espetacular para outra? Se uma pessoa investigou em todas as religiões do mundo e viu suas futilidades organizadas, e através desta percepção enxergou algo real e claro, talvez então poderia haver algo novo na Califórnia, ou no mundo. Mas até onde vi, temo que não haja uma condição de seriedade em tudo isso. Posso estar enganado, porque apenas vejo os chamados jovens de longe, no meio da platéia, e por vezes aqui; e por suas perguntas, por seus risos, por seus aplausos, eles não me parecem muito sérios, maduros, com grandes propósitos. Posso estar enganado, naturalmente.

Needleman: Entendo o que quer dizer. Minha única dúvida é: porventura não possamos então esperar que jovens sejam sérios.

Krishnamurti: É por isso que eu não ache que seja aplicável aos jovens. Não sei por quê faz-se tanto caso dos jovens, por que isso se tornou algo tão extraordinário. Em alguns anos eles serão os velhos à sua vez.

Needleman: Como um fenômeno, à parte do que está por baixo de tudo, esse interesse numa experiência transcendental - ou o que quer que se queira chamá- lo - parece ser um tipo de semeadura da qual certos indivíduos incomuns à parte de toda a enganação e todos os trapaceiros, alguns Mestres porventura, devam surgir.

Krishnamurti: Mas não estou tão certo, senhor, de que todos os trapaceiros e exploradores não estejam encobrindo isso. "Consciência de Krishna" e Meditação Transcendental e toda essa baboseira que segue - eles são pegos em tudo isso. É uma forma de exibicionismo, uma forma de divertimento e entretenimento. Para que algo novo tome forma deve haver um núcleo de pessoas realmente devotas e sérias, que prossigam até o fim. Após terem passado por todas essas coisas, eles dizem, "Aqui está algo que eu buscarei até o fim".

Needleman: Uma pessoa séria seria alguém que se tornasse desiludida com todo o resto.

Krishnamurti: Eu não chamaria isso de desilusão mas uma forma de seriedade.

Needleman: Mas uma pré-condição para tal?

Krishnamurti: Não, não chamaria de desilusão de forma alguma, já que ela leva ao desespero e ao cinismo. Refiro-me ao estudo de tudo aquilo dito religioso, espiritual: examinar, descobrir qual a verdade em tudo isso, se de fato há alguma verdade. Ou descartar a coisa toda e começar do zero, sem continuar em todas as armadilhas, em toda essa bagunça.

Needleman: Creio que seja o que tentei dizer, mas isso o expressa melhor. Pessoas que tenham tentado algo e que isso tenha falhado para elas.

Krishnamurti: Não "outras pessoas". Quero dizer que deve-se descartar todas as promessas, todas as experiências, todos os relatos místicos. Penso eu que deve-se começar como se não se soubesse absolutamente nada.

Needleman: Isso é muito difícil.

Krishnamurti: Não, senhor. Não creio que seja difícil. Acho que é difícil apenas para aqueles que se encheram com os conhecimentos de outras pessoas.

Needleman: E não é essa a maioria de nós? Eu estava falando à minha sala de aula ontem na Universidade Estadual de São Francisco, e disse que iria entrevistar Krishnamurti e quais perguntas gostariam que eu lhe fizesse. Eles tinham muitas perguntas, mas o que mais me chamou a atenção foi o que um jovem disse: "Eu li os livros dele uma vez atrás da outra e eu não consigo fazer o que ele diz". Havia algo tão transparente naquilo, que me deu um estalo. Parece que num certo e sutil sentido começa desse jeito. Ser um iniciante, puro!

Krishnamurti: Não creio que perguntamos o suficiente. Você sabe o que quero dizer?

Needleman: Sim.

Krishnamurti: Nós aceitamos, somos crédulos, ávidos por novas experiências. As pessoas engolem o que é dito por qualquer um com uma barba, com promessas, dizendo que você terá maravilhosas experiências se fizer certas coisas! Acho que deve-se dizer: "Eu não sei nada." Obviamente não posso contar com os outros. Se não houvesse livros, ou gurus, o que você faria?

Needleman: Mas o indivíduo é facilmente enganado.

Krishnamurti: Você é enganado quando quer algo.

Needleman: Sim, compreendo.

Krishnamurti: Então você diz "Vou buscar, vou questionar passo a passo. Não quero enganar a mim mesmo". A decepção surge quando eu quero, quando sou ganancioso, quando digo "Toda experiência é vazia, eu quero algo misterioso" - então sou pego.

Needleman: Pra mim você está falando sobre um estado, uma atitude, uma abordagem, a qual por si própria se encontra muito ao longe no entendimento para um indivíduo. Eu mesmo sinto que estou muito longe, e sei que meus alunos também. Então eles sentem, por bem ou por mal, uma ânsia por ajuda. Provavelmente eles interpretam mal o que é ajuda, mas existe algo assim como ajuda?

Krishnamurti: Você diria: "Por quê você pede ajuda?".

Needleman: Deixe-me colocar dessa maneira. Você meio que sente o cheiro ao enganar a si próprio, você não sabe exatamente...

Krishnamurti: É relativamente simples. Eu não quero enganar a mim mesmo - certo? Então eu encontro qual é o movimento, qual é a coisa que traz decepção. Obviamente isso é quando eu sou ganancioso, quando quero algo, quando estou insatisfeito. Então ao invés de atacar a ganância, o desejo, a insatisfação, eu quero algo mais.

Needleman: Sim.

Krishnamurti: Então tenho que entender minha ganância. Pelo que sou ganancioso? Será porque estou farto desse mundo, tive mulheres, tive carros, tive dinheiro e quero algo mais?

Needleman: Creio que um indivíduo seja ganancioso porque deseja estímulo, ser arrancado de si mesmo, de forma que não enxergue a pobreza de si próprio. Mas o que estou tentando perguntar - Sei que já respondeu essa pergunta muitas vezes em suas palestras, mas ela continua recorrente, quase inevitavelmente - as grandes tradições do mundo, à parte do que elas tenham se tornado (elas se tornaram distorcidas e mal interpretadas e enganosas) sempre falam direta ou indiretamente de ajuda. Elas dizem "O guru é você também", mas ao mesmo tempo há ajuda.

Krishnamurti: Senhor, você sabe o que essa palavra "guru" significa? Needleman: Não, não exatamente.

Krishnamurti: Aquele que mostra. Esse é um significado. Outro significado é aquele que traz a iluminação, alivia o fardo. Mas ao invés de aliviar seu fardo eles impoem os deles em você.

Needleman: Receio que sim.

Krishnamurti: Guru também significa aquele que te ajuda a atravessar - e assim por diante, há diversos significados. No momento em que o guru diz que sabe, então você já pode estar seguro de que ele não sabe. Porque o que ele sabe é algo do passado, obviamente. O conhecimento é do passado. E quando ele diz que sabe, está pensando em alguma experiência que teve, a qual ele foi capaz de reconhecer como algo grandioso, e esse reconhecimento nasce de seu conhecimento anterior, de outra forma ele não poderia tê-lo reconhecido, portanto sua experiência tem suas raízes no passado. Dessa forma ela não é real.

Needleman: Bem, eu acho que o conhecimento em geral é assim.

Krishnamurti: Então por que queremos alguma forma de tradição antiga ou moderna em tudo isso? Veja, senhor, eu não leio nenhum livro religioso, filosófico ou psicológico: pode-se adentrar em si mesmo a tremendas profundidades e encontrar tudo. Adentrar em si é o problema, como fazê-lo. Sendo incapaz de tal coisa pergunta-se, "Poderia me ajudar, por favor?"

Needleman: Sim.

Krishnamurti: E o outro cara diz, "Eu te ajudarei" e te empurra pra outro lugar qualquer.

Needleman: Bom, isso meio que responde a pergunta. Eu estava lendo um livro outro dia que falava de uma coisa chamada "Sat-san".

Krishnamurti: Você sabe o que isso significa?

Needleman: Associação com sábios.

Krishnamurti: Não, com benevolentes.

Needleman: Com benevolentes, ah!

Krishnamurti: Sendo benevolente você é sábio. Não, sendo sábio você é benevolente.

Needleman: Sim, compreendo.

Krishnamurti: Porque você é benevolente, você é sábio.

Needleman: Não estou tentando destrinchar isso em algo, mas eu vejo meus alunos e eu mesmo, falo por mim, quando lemos, quando te ouvimos, dizemos, "Ah! Não preciso de ninguém, não preciso estar com ninguém" - e há uma tremenda decepção nisso também.

Krishnamurti: Naturalmente, porque você está sendo influenciado pelo orador.

Needleman: Sim. Isso é verdade. (Risos).

Krishnamurti: Senhor, veja, sejamos bem simples. Suponha, se não houvesse nenhum livro, nenhum guru, nenhum professor, o que você faria? Você encontra-se em agitação, confusão, agonia, o que você faria? Sem ninguém pra te ajudar, sem drogas, sem tranquilizantes, sem religiões organizadas, o que você faria?

Needleman: Não consigo imaginar o que faria.

Krishnamurti: Aí está.

Needleman: Porventura haveria um momento de urgência aí.

Krishnamurti: É isso. Não possuímos a urgência porque dizemos, "Bem, alguém vai me ajudar".

Needleman: Mas a maioria ficaria louca por conta dessa situação. Krishnamurti: Não tenho certeza, senhor. Needleman: Eu tampouco.

Krishnamurti: Não, não tenho nenhuma certeza. Porque o que é que fizemos até agora? As pessoas nas quais nos apoiamos, as religiões, as igrejas, educação, elas nos levaram a essa terrível bagunça. Não estamos livres do sofrimento, não estamos livres de nossa bestialidade, nossa feiúra, nossas vaidades.

Needleman: Pode alguém dizer tal coisa a respeito de tudo isso? Existem diferenças. Para cada mil enganadores existe um Buda.

Krishnamurti: Mas isso não é meu problema, senhor, se dissermos que isso leva a tal decepção. Não, não.

Needleman: Então deixe-me lhe perguntar isso. Sabemos que sem trabalho árduo o corpo pode adoecer, e esse trabalho árduo é o que chamamos de esforço. Existe outro esforço pelo qual podemos chamar o espírito? Você se diz contra o esforço, mas o crescimento e bem-estar de todos os aspectos do homem não exigem algo como trabalho árduo de um tipo ou outro?

Krishnamurti: Fico imaginando o que você quer dizer por trabalho árduo! Esforço físico?

Needleman: É o que geralmente queremos dizer por trabalho árduo. Ou indo contra desejos.

Krishnamurti: Vê, aí estamos! Nosso condicionamento, nossa cultura, são construídos em torno desse "ir contra". Levantar um muro de resistência. Então ao dizermos "trabalho árduo", o que significa? Preguiça? Por que devo fazer algum esforço pra alguma coisa? Por quê?

Needleman: Porque desejo algo.

Krishnamurti: Não. Por que existe esse culto ao esforço? Por que devo eu fazer algum esforço para alcançar Deus, iluminação, verdade?

Needleman: Há muitas respostas possíveis, mas só posso responder por mim.

Krishnamurti: Ela pode simplesmente estar aí, e só não sei como procurar.

Needleman: Mas então tem de haver um obstáculo.

Krishnamurti: A maneira de procurar! Pode estar na próxima esquina, embaixo de uma flor, em qualquer lugar. Então primeiro devo aprender a procurar, não fazer o esforço de procurar. Preciso descobrir o que de fato é procurar.

Needleman: Sim, mas você não admite que pode haver uma resistência a essa busca?

Krishnamurti: Então não se incomode em procurar! Se alguém chega e diz, "Não quero procurar", como vai forçá-lo a olhar?

Needleman: Não. Falo por mim mesmo agora. Eu quero procurar.

Krishnamurti: Se quer procurar, o que quer dizer com procurar? Você precisa descobrir o que procurar significa antes de fazer o esforço para procurar. Certo, senhor?

Needleman: Isso seria, pra mim, um esforço. Krishnamurti: Não.

Needleman: Fazê-lo de uma maneira delicada, sutil. Quero procurar, mas não quero descobrir o que isso significa. Concordo que isso é mais pra mim o básico. Mas esse desejo de fazê-lo depressa, acabar logo com isso, não é isso resistência?

Krishnamurti: Remédio imediato pra dar fim logo.

Needleman: Há algo em mim que eu precise analisar, que resiste a essa coisa delicada e sutil de que você fala? Isso não é trabalho, o que está dizendo? Não é trabalho fazer essa pergunta tão silenciosa e sutilmente? Parece a mim que é trabalho não escutar àquela parte que quer procurar...

Krishnamurti: Rapidamente.

Needleman: Particularmente para nós no Ocidente, ou talvez para todos os homens.

Krishnamurti: Receio que seja o mesmo ao redor de todo o mundo. "Diga-me como chegar rapidamente até lá".

Needleman: E no entanto você diz que é em um instante. Krishnamurti: É, obviamente. Needleman: Sim, compreendo.

Krishnamurti: Senhor, o que é esforço? Sair da cama de manhã, quando você não quer levantar, é um esforço. O que faz surgir aquela preguiça? Falta de sono, excesso de comida, excesso de autopiedade e todo o resto; e na manhã seguinte você diz, "Ah, que saco, tenho que levantar!" Agora espera um minuto, senhor, acompanhe. O que é preguiça? É preguiça física, ou o pensamento em si é preguiçoso?

Needleman: Isso eu não entendo. Preciso de outra palavra. "O pensamento é preguiçoso?" Considero que o pensamento seja sempre o mesmo.

Krishnamurti: Não, senhor. Eu sou preguiçoso, eu não quero levantar então me forço a levantar. Nisso está o chamado esforço.

Needleman: Sim.

Krishnamurti: Eu quero isso, mas não deveria tê-lo, resisto. A resistência é esforço. Fico nervoso e não posso estar nervoso: resistência, esforço. O que me fez ficar preguiçoso?

Needleman: A ideia de que eu devo levantar. Krishnamurti: Aí está. Needleman: Tá certo.

Krishnamurti: Então eu realmente tenho que ir adiante em toda essa questão do pensamento. Não inventar que o corpo é preguiçoso e forçar o corpo fora da cama, porque o corpo tem sua própria inteligência, ele sabe quando está cansado e precisa repousar. Essa manhã eu estava cansado; eu havia preparado o colchão e tudo o mais para praticar exercícios de ioga e o corpo disse "Não, sinto muito". E eu disse, "Tudo bem". Isso não é preguiça. O corpo disse, "Me deixa em paz porque você discursou ontem, viu muitas pessoas, está cansado". O pensamento então diz, "Você deve se levantar e fazer os exercícios porque é bom pra você, você os tem feito todos os dias, se tornou um hábito, não relaxe, você se tornará preguiçoso, continue com isso". O que significa: o pensamento está me deixando preguiçoso, e não o corpo.

Needleman: Entendo isso. Então há um esforço com relação ao pensamento.

Krishnamurti: Então sem esforço! Por que o pensamento é tão mecânico? E todo pensamento é mecânico?

Needleman: Sim, tudo bem, pode-se colocar essa pergunta. Krishnamurti: E não é?

Needleman: Não posso dizer que tenha comprovado isso.

Krishnamurti: Mas podemos, senhor. Isso é relativamente simples de se ver. O pensamento não é sempre mecânico? O estado não-mecânico é a ausência de pensamento; não a negação de pensamento mas sua ausência.

Needleman: Como posso descobrir isso?

Krishnamurti: Faça-o agora, é bem simples. Você consegue fazer agora se o desejar. O pensamento é mecânico.

Needleman: Vamos assumir que sim.

Krishnamurti: Não assuma. Não assuma nada.

Needleman: Tá certo.

Krishnamurti: O pensamento é mecânico, não é? - porque é repetitivo, condicionante, comparativo.

Needleman: Essa parte eu enxergo, a comparação. Mas minha experiência é a de que nem todo pensamento é da mesma natureza. Existem naturezas do pensamento.

Krishnamurti: Existem?

Needleman: Em minha experiência existem.

Krishnamurti: Vamos descobrir. O que é o pensamento, pensar?

Needleman: Parece haver o pensamento que é muito superficial, muito repetitivo, muito mecânico, possui um certo gosto para tal. Parece haver um outro tipo de pensamento que é mais conectado com meu corpo, com todo o meu ser, ele reverbera de um outro jeito.

Krishnamurti: Que é isso, senhor? O pensamento é a resposta da memória. Needleman: Tudo bem, essa é uma definição.

Krishnamurti: Não, não, posso vê-lo em mim. Tenho que ir àquela casa essa noite - a lembrança, a distância, o visual - tudo isso é memória, não é?

Needleman: Sim, isso é memória.

Krishnamurti: Eu já estive lá antes e por isso a memória está bem estabelecida e à partir disso existe ou pensamento instantâneo, ou pensamento que leva um pouco de tempo. Então me pergunto: todo pensamento é similar, mecânico, ou existe o pensamento que é não-mecânico, que é não-verbal?

Needleman: Sim, correto.

Krishnamurti: Existe pensamento se não houver nenhuma palavra? Needleman: Existe entendimento.

Krishnamurti: Espere, senhor. Como é que esse entendimento toma forma? Ele acontece quando o pensamento está funcionando rapidamente, ou quando o pensamento está silencioso?

Needleman: Quando o pensamento está silencioso, sim.

Krishnamurti: Entendimento não tem a ver com pensamento. Você pode raciocinar, que é o processo do pensar, da lógica, até você dizer, "Eu não entendo isso; então você se aquieta, e diz, "Ah! Eu vejo, eu compreendo". Esse entendimento não é resultado do pensamento.

Needleman: Você fala de uma energia que parece não ter causa. Nós experimentamos a energia de causa e efeito, que molda nossas vidas, mas qual é a relação dessa energia com aquela energia que nos é familiar? O que é energia?

Krishnamurti: Primeiramente: a energia é divisível?

Needleman: Não sei. Prossiga.

Krishnamurti: Ela pode ser dividida. Energia física, a energia da raiva, e assim por diante, energia cósmica, energia humana, todas elas podem ser divididas. Mas é tudo uma só energia, não é?

Needleman: Logicamente, eu digo sim. Eu não entendo energia. Por vezes experimento a coisa que chamo de energia.

Krishnamurti: Por que dividimos a energia em primeiro lugar, é nisso que quero chegar; então podemos abordá-la de um jeito diferente. Energia sexual, energia física, energia mental, energia psicológica, energia cósmica, a energia do homem de negócios que vai ao escritório e por aí vai - por que a dividimos? Qual a razão para essa divisão?

Needleman: Parece haver muitos aspectos do indivíduo que são separados; e nós dividimos a vida, me parece, por conta disso.

Krishnamurti: Por quê? Nós dividimos o mundo em comunista, socialista, imperialista, e católico, protestante, hindu, budista, e nacionalidades, divisões linguísticas, a coisa toda é fragmentação. Por que a mente fragmentou a totalidade da vida?

Needleman: Não sei a resposta. Eu vejo o oceano e vejo uma árvore: há uma divisão.

Krishnamurti: Não. Há uma diferença entre o mar e a árvore - Assim espero! Mas isso não é uma divisão.

Needleman: Não. É uma diferença, não uma divisão.

Krishnamurti: Mas estamos perguntando por que a divisão existe, não só externamente mas dentro de nós.

Needleman: Está dentro de nós, essa é a questão mais interessante.

Krishnamurti: Por estar em nós que projetamos externamente. Agora por que existe essa divisão em mim? O "eu" e o "não eu". Você entende? O superior e o inferior, o Atman e o eu inferior. Por que essa divisão?

Needleman: Talvez ela tenha sido criada, pelo menos no começo, para auxiliar os homens a se questionarem. Para fazê-los questionar se de fato eles realmente sabem o que pensam que sabem.

Krishnamurti: Através da divisão eles poderão descobrir?

Needleman: Talvez através da ideia de que existe algo que eu não entenda.

Krishnamurti: Em um ser humano há uma divisão - por quê? Qual é a "razão de ser", qual é a estrutura dessa divisão? Vejo que há um pensador e o pensamento - certo?

Needleman: Eu não vejo isso.

Krishnamurti: Há um pensador que diz, "Devo controlar aquele pensamento, não devo pensar nisso, devo pensar naquilo". Então há um pensador que diz, "Devo", ou "Não devo".

Needleman: Certo.

Krishnamurti: Existe a divisão. "Eu deveria ser isso", e "Não deveria ser aquilo". Se puder entender por que essa divisão em mim existe - Oh, veja, veja! Veja aquelas colinas! Maravilhosas, não?

Needleman: Lindas!

Krishnamurti: Agora, senhor, você as olha com uma divisão?

Needleman: Não.

Krishnamurti: Por que não?

Needleman: O "eu" não tinha nada a ver com isso.

Krishnamurti: Isso é tudo. Não pode fazer nada a respeito. Aqui, com o pensamento, eu penso que posso fazer alguma coisa.

Needleman: Sim.

Krishnamurti: Então quero mudar "o que é". Não posso mudar "o que é" lá, mas acredito que posso mudar "o que é" em mim. Sem saber como fazer essa mudança fiquei desesperado, perdido, em aflição. Digo, "Não posso mudar", e portanto não tenho energia para mudar.

Needleman: É o que se diz.

Krishnamurti: Então em primeiro lugar, antes que eu mude "o que é", tenho que saber quem é que realiza a mudança, quem é aquele que muda.

Needleman: Há momentos que se sabe isso, por um instante. Esses instantes são perdidos. Há momentos que se sabe quem é o que vê "o que é" em si próprio.

Krishnamurti: Não, senhor. Desculpe. Somente enxergar "o que é" basta, não mudá-lo.

Needleman: Concordo. Concordo com isso.

Krishnamurti: Sou capaz de enxergar "o que é" somente quando o observador não está presente. Quando você olhou para aquelas colinas o observador não estava presente.

Needleman: Concordo, sim.

Krishnamurti: O observador só veio à tona no momento em que você quis mudar "o que é". Você diz: Eu não me satisfaço com "o que é", ele deve ser mudado, então instantaneamente há a dualidade. Pode a mente observar "o que é" sem o observador? Issose concretizou quando você olhava as colinas com aquela luz maravilhosa incidindo nelas.

Needleman: Essa verdade é absoluta verdade. No momento que se tem uma experiência se diz, "Sim!" Mas a experiência é também o fato de se esquecer disso.

Krishnamurti: Esqueça!

Needleman: Com isso quero dizer que continuamente se tenta mudar. Krishnamurti: Esqueça, e retome novamente.

Needleman: Mas nessa discussão - seja lá o que pretende - há ajuda vindo dessa discussão. Sei, tanto quanto sei das coisas em geral, que não poderia acontecer sem a ajuda que existe entre nós. Eu poderia observar aquelas colinas e talvez ter essa atitude não-julgadora, mas isso não teria importância pra mim. Não saberia que assim é que é a maneira que devo buscar salvação. E essa, creio eu, é uma questão que sempre se quer levantar. Talvez isso seja a mente de novo a querer se agarrar e se segurar em algo, mas no entanto parece que a condição humana...

Krishnamurti: Senhor, nós observamos aquelas colinas, você não poderia mudar isso, você só olhou; e você olhou internamente e a batalha começou. Por um instante você olhou sem essa batalha, sem essa briga, e todo o resto envolvido. Então se lembrou da beleza daquele momento, daquele segundo, e você quis capturar aquela beleza de novo. Espere, senhor! Prossiga. E então o que acontece? Estabelece outro conflito: a coisa que você tinha e que gostaria de ter de novo, e não sabe como conseguir. Sabe, se pensar sobre isso, não é o mesmo, não é aquilo. Então você briga, luta. "Tenho que controlar, não posso desejar" - certo? Ao passo que se disser, "Tudo bem, acabou, fim", esse momento está acabado.

Needleman: Tenho que aprender isso.

Krishnamurti: Não, não.

Needleman: Tenho que aprender, não?

Krishnamurti: O que há para aprender?

Needleman: Tenho que aprender a futilidade desse conflito.

Krishnamurti: Não. O que há para aprender? Você próprio percebe que aquele momento de beleza se torna uma memória, e então a memória diz, "Isso foi tão bonito que preciso ter de novo". Você não está preocupado com a beleza, está preocupado com a busca do prazer. Prazer e beleza não andam juntos. Então se enxergar isso, está acabado. Como uma serpente perigosa, você não vai chegar perto de novo.

Needleman: (Risos) Porventura não deva ter enxergado, então não posso dizer.

Krishnamurti: Essa é a questão.

Needleman: Sim, creio que deva ser, pois continua-se a voltar uma vez atrás da outra.

Krishnamurti: Não. Essa é a coisa real. Se vejo a beleza daquela luz, e ela é de fato extraordinariamente bonita, eu só a vejo. Agora com a mesma condição de atenção eu quero ver a mim mesmo. Há um momento de percepção que é tão bonito quanto aquele. E então o que acontece?

Needleman: Então eu o desejo.

Krishnamurti: Então eu o quero capturar, cultivá-lo, quero buscá-lo. Needleman: E como ver isso?

Krishnamurti: Somente perceber que está tomando forma já basta. Needleman: É isso que eu esqueço! Krishnamurti: Não é uma questão de esquecer.

Needleman: Bem, isso é o que não entendo a fundo o suficiente. Que só o percebimento é o bastante.

Krishnamurti: Veja, senhor. Quando vê uma cobra o que acontece?

Needleman: Eu fico com medo.

Krishnamurti: Não. O que acontece? Você foge, mata-a, faz alguma coisa. Por quê? Porque você sabe que é perigosa. Você está ciente de seu perigo. Um penhasco, melhor pegar um penhasco, um abismo. Você conhece o perigo. Ninguém precisa te dizer. Você vê diretamente o que aconteceria.

Needleman: Certo.

Krishnamurti: Agora, se você enxergar diretamente que a beleza daquele momento de percepção não pode ser repetida, está acabado. Mas o pensamento diz, "Não, não acabou, a memória daquilo permanece". Então o que você está a fazer agora? Está buscando a memória morta daquilo, e não sua vívida beleza - certo? Então se enxergar isso, a verdade disso - não a afirmação verbal, a verdade disso - está acabado.

Needleman: Então esse percebimento é muito mais raro do que pensamos.

Krishnamurti: Se eu vir a beleza daquele minuto, está acabado. Não quero buscá-la. Se buscá-la, se torna um prazer. Então se não consigo alcançá-la, traz aflição, sofrimento e todo o resto. Então digo, "Tudo bem, acabou". Então o que acontece?

Needleman: De minha experiência, temo que o acontece é que o monstro nasce de novo. Ele tem mil vidas. (Risos).

Krishnamurti: Não, senhor. Quando foi que a beleza tomou forma?

Needleman: Quando eu vi sem tentar mudar.

Krishnamurti: Quando a mente estava completamente quieta.

Needleman: Sim.

Krishnamurti: Não foi? Certo?

Needleman: Sim.

Krishnamurti: Quando você olhou aquilo, sua mente estava quieta, ela não estava a dizer, "Queria poder mudar isso, copiar e fotografar, isso, aquilo e aquele outro" - você só olhou. A mente não estava em operação. Ou melhor, o pensamento não estava em operação. Mas o pensamento imediatamente vem a operar. Então se perguntou, "Como o pensamento pode silenciar? Como se pode exercitar o pensamento quando necessário, e não exercitá-lo quando não for necessário?"

Needleman: Sim, essa pergunta é altamente interessante pra mim.

Krishnamurti: Ou seja, por que idolatramos o pensamento? Por que o pensamento se tornou tão extraordinariamente importante?

Needleman: Ele parecer ser capaz de satisfazer nossos desejos; através do pensamento acreditamos sermos capazes de satisfazer.

Krishnamurti: Não, não vem da satisfação. Por que o pensamento em todas as culturas com maior parte da população se tornou de tão vital preocupação?

Needleman: O indivíduo geralmente se identifica como sendo o pensamento, como sendo seus próprios pensamentos. Se penso sobre mim mesmo penso sobre o que penso, que tipo de ideias tenho, em que acredito. É isso que quer dizer?

Krishnamurti: Não exatamente. À parte da identificação com o "eu", ou com "não eu", por que o pensamento é tão ativo?

Needleman: Ah, entendo.

Krishnamurti: O pensamento está sempre operando no conhecimento, não é? Se não houvesse conhecimento, não haveria pensamento. O pensamento está sempre operando no campo do conhecido. Seja mecânico, não-verbal e assim por diante, está sempre trabalhando no passado. Então minha vida é o passado, porque é baseada em conhecimento anterior, experiências anteriores, memórias anteriores, prazer, dor, medo e assim por diante - tudo isso é passado. E o futuro que projeto à partir do passado, o pensamento projeta do passado. Dessa forma o pensamento está flutuando entre o passado e o futuro. Toda vez que ele diz, "Deveria fazer isso, deveria fazer aquilo, deveria ter me comportado". Por que ele faz tudo isso?

Needleman: Eu não sei. Hábito?

Krishnamurti: Hábito. Ótimo. Prossiga. Vamos descobrir. Hábito? Needleman: O hábito traz o que chamo de prazer. Krishnamurti: Hábito, prazer, dor. Needleman: Para me proteger. Dor, sim, dor.

Krishnamurti: Ele está sempre operando dentro desse campo. Por quê? Needleman: Porque não conhece nada melhor.

Krishnamurti: Não. Não. O pensamento é capaz de trabalhar em qualquer outro campo?

Needleman: Esse tipo de pensamento, não.

Krishnamurti: Não, pensamento nenhum. O pensamento pode trabalhar em qualquer outro campo exceto o campo do conhecido?

Needleman: Não.

Krishnamurti: Obviamente não. Ele não pode trabalhar em algo que eu não conheça; só pode trabalhar nesse campo. Agora por que é que ele trabalha assim? Aí está, senhor - Por quê? É a única coisa que sei. Nisso existe segurança, existe proteção, existe garantia. É tudo que sei. Dessa forma o pensamento só pode funcionar no campo do conhecido. E quando ele se cansa disso, como acontece, então ele busca algo de fora. Então o que ele procura ainda é o conhecido. Seus deuses, suas visões, seus estados espirituais - tudo projetado à partir do passado conhecido para o futuro conhecido. Assim o pensamento só trabalha nesse campo.

Needleman: Sim, entendo.

Krishnamurti: Portanto o pensamento está sempre a trabalhar em uma prisão. Ele pode chamar de liberdade, pode chamar de beleza, pode chamar do que quiser! Mas está sempre dentro das limitações da cerca de arame farpado. Agora quero descobrir se o pensamento tem espaço em algum outro lugar que não seja lá. O pensamento não tem espaço nenhum quando digo, "Eu não sei". "Eu realmente não sei". Certo?

Needleman: Naquele momento.

Krishnamurti: Eu realmente não sei. Eu só sei disso, e realmente não sei se o pensamento pode funcionar em qualquer campo, exceto este. Eu realmente não sei. Quando digo, "Eu não sei", que não quer dizer que esteja esperando vir a saber, quando digo que realmente não sei - o que acontece? Eu desço a escada. Eu me torno, a mente se torna, completamente humilde. Agora esse estado do "não-saber" é inteligência. Então ele pode operar no campo do conhecido e estar livre para trabalhar em qualquer outro lugar se assim quiser.


Do livro: O Despertar da Inteligência

Tradução gentilmente feita pelo Confrade:
Ricardo Lagarto

Independência


Independência
Capital Inicial

Toda essa curiosidade
Que você tem pelo que eu faço
Eu não gosto de me explicar
Eu não gosto de me explicar...

Toda essa intensidade
Buscamos identidade
Mas não sabemos explicar
Mas não sabemos explicar...

Se paro e me pergunto
Será que existe alguma razão
Prá viver assim
Se não estamos
De verdade juntos...

Procuramos independência
Acreditamos na distância entre nós
Procuramos independência
Acreditamos na distância entre nós...

Toda essa meia verdade
A qual temos nos conformado
Só conseguimos nos afastar
Nós aprendemos a aceitar...

Tantas coisas pela metade
Como essa imensa vontade
Que não sabemos explicar
Que não sabemos saciar...

Se paro e me pergunto
Será que existe alguma razão
Prá viver assim
Se não estamos
De verdade juntos...

Procuramos independência
Acreditamos na distância entre nós
Procuramos independência
Acreditamos na distância entre nós...(2x)

Toda essa curiosidade
Toda essa intensidade
Toda essa meia verdade
Tantas coisas pela metade
Toda essa curiosidade
Toda essa intensidade...

Sem Deus, sem lei


Sem Deus, sem lei
Plebe Rude

Sem Deus, sem lei
Só eu e você
Sem Deus, sem lei
Só eu e você...

Me diz
podemos conseguir
Sem Deus, sem lei

Vivo sem religião
Sem o dogma e a perseguição
Eu não preciso acreditar

Levanta o rosto vai
No que não creio eu já deixei pra trás
Essa é a minha lei, eu e você

(instrumental)

Você... me diz
podemos conseguir
Sem Deus, sem lei

Vivo sem religião
Sem o dogma e a perseguição
Eu não preciso acreditar

Levanta o rosto vai
No que não creio eu já deixei pra trás
Essa é a minha lei, eu e você

Autonomia



Autonomia
Titãs

O que eu queria, o que eu
sempre queria
Era conquistar a minha
autonomia
O que eu queria, o que eu
sempre quis
Era ser dono do meu nariz
Os pais são todos iguais
Prendem seus filhos na jaula
Os professores com seus l pis
cores
Te prendem na sala de aula
O que eu queria, o que eu
sempre queria
Era conquistar a minha
autonomia
O que eu queria, o que eu
sempre quis
Era ser dono do meu nariz

Ia pra rua, mamãe atrás s
Ela não me deixava em paz
Não aguentava o grupo escolar
Nem a prisão domiciliar
O que eu queria, o que eu
sempre queria
Era conquistar a minha
autonomia
O que eu queria, o que eu
sempre quis
Era ser dono do meu nariz
Mas o tempo foi passando
então eu ca¡ numa outra
armadilha
Me tornei prisioneiro da minha
própria família
Arranjei um emprego de
professor

Vejo os meus filhos, Não sei
mais onde estou
O que eu queria, o que eu
sempre queria
Era conquistar a minha
autonomia
O que eu queria, o que eu
sempre quis
Era ser dono do meu nariz

Os pais São todos iguais
Prendem seus filhos na jaula
Os professores com seus l pis
cores
Te prendem na sala de aula
O que eu queria, o que eu
sempre queria
Era conquistar a minha
autonomia
O que eu queria, o que eu
sempre quis
Era ser dono do meu nariz
Ia pra rua, Mamãe atrás s
Ela não me deixava em paz
não aguentava o grupo escolar
Nem a prisão domiciliar
O que eu queria, o que eu
sempre queria
Era conquistar a minha
autonomia
O que eu queria, o que eu
sempre quis
Era ser dono do meu nariz
Mas o tempo foi passando
então eu ca¡ numa outra
armadilha
Me tornei prisioneiro da minha
própria família
Arranjei um emprego de
professor
Vejo os meus filhos, não sei

Pode-se persuadir os que não querem ouvir?

Quando, numa noite pré-histórica não escrita, o ser pensante ergueu a cabeça pela primeira vez e contemplou no alto a imensidade ilimitada do céu coalhado de estrelas, seu primeiro pensamento não havia de ter sido outro senão o primeiro pensamento que penetra na mente do homem de nosso século vinte, ao contemplar a abóbada sob a qual ele vive e se move, amofina-se e galanteia.

“Qual é o significado disso?”

A dificuldade em achar-se a resposta a esta pergunta é tanta e tão profunda que ainda hoje o nossos maiores cientistas devem inclinar suas cabeças, em humilde ignorância, pois todas as suas vitórias em conhecimentos pouco mais fizeram até agora do que roçar a superfície deste problema.

As profundeza de tal problema seriam inescrutáveis, se dependêssemos apenas do intelecto humano. Jamais podem ser sondadas sem a ajuda de revelação superior.

Em consequência, fiz uma ampla pesquisa. Meus estudos abrangeram livros empilhados nas prateleiras de pequenas bibliotecas; incluíram conversações íntimas e prolongadas discussões com os mestres do conhecimento do Oriente, e finalmente estudei com os melhores de todo os tutores: as experiências pessoais de primeira mão. Finalmente, os fados me colocaram os pés em estranhas viagens a terras cujas esbeltas palmeiras me chamaram com suas esticadas folhas e me convidaram, como a todos os homens convidam, para atar de novo os vínculos que submetem a Deus a relutante alma humana. Poucos ocidentais tiveram o tempo e o treinamento, a vontade e o dinheiro, que requerem estas pesquisas; e assim eu procurei fazer para eles o que eles não puderam fazer para si mesmos; procurei recuperar da obscuridade de épocas desvanecidas alguns segredos que o mundo hoje necessita. Repetidamente eu permaneci sob os céus orientais completamente marchetado de estrelas  ou quando caminhava sozinho solitário em meio silêncio misterioso das florestas ameaçadoras, e era assaltado por um ultrapotente sentimento do estranho paradoxo da vida humana. Eu seguia uma única trilha no estudo dos hábitos e sabedoria do Oriente, e ainda mais ao procurar equacionar em bases científicas as misteriosas façanhas e doutrinas dos iogues e faquires.

Meus assentamentos de aventuras espirituais sob aqueles ardentes sóis orientais foram transladados em forma literária. Procurei revelar ao homem comum quão profundas fontes espirituais e quão deslumbrantes poderes psicológicos podem encontrar-se em seu interior, ainda que tivesse sido compelido a reservar para mais tarde a inscrição de minhas divinas experiências e os meus melhores pensamentos. Minha reticência neste ponto é devida às limitações da sociedade que me circunda, da civilização em que nasci. Queria dirigir-me ao homem de experiências rotineiras, ainda que as minhas houvessem sido extraordinárias. Quando o vi, em minhas andanças pelo mundo, notei que ele elaborava penosamente, por si, uma compreensão do significado da vida, que poderia ser adquirida por menor preço. Eu queria dizer-lhe isso, e persuadi-lo a dar um propósito vivo à sua vida, remover as apavorantes incertezas que são a característica predominante em nossa época. Mas, ah! Cada uma dessas veze me lembrava a pergunta do grego Sócrates a Glauco: “Pretendes dizer que podes persuadir os que não querem ouvir?”

O homem de experiências comuns encara estas filosofias abstratas, estas verdades complexas, e práticas austeras, como matérias de pouco interesse e nenhum benefício. A experiência me tem explicado, melhor do que a fala alertadora de meus Guias, por que a maioria dos videntes reserva para os poucos os seus mais recônditos segredos. Quem quer que escreva de assuntos tão extraordinários como os que escolhi para a minha pena, escreve sob grande desvantagem. Não ousa ignorar as misteriosas experiências que lhe formam a medula e o cerne; provavelmente não lhe darão crédito se as apresentar tal qual elas ocorreram; encontra a maior dificuldade em descrever ocorrências psicológicas que não tem significação para os intelectos meramente materialistas. E com referência ao supremo atingimento, parece às vezes um empreendimento desesperador tentar alguém desvelar um estado inefável e inatingível do ser por meio de palavras e frases frias, pois metade desta experiência altamente iridescente* desaparece entre o cérebro e o papel durante a descrição.

Por fim, se ele for prudente, terminará por escrever para uns poucos. Depois, se os demais começarem a compreender e a acolher, ele poderá contentar-se; se ocorrer o contrário, que nuca se desaponte. Mas os números não importam. Não interessam pessoas inertes. São apenas a humanidade a granel. Sempre em toda a parte, tudo o que é valioso é feito e descoberto pelos poucos. “Ela acreditou em mim quando ninguém mais queria acreditar”, disse Maomé de sua esposa Kadijah. Durante três anos ele encontrou apenas treze seguidores. Todavia, sua doutrina se espalhou depois entre milhões. Estas ideias são novas apenas para o Ocidente moderno, pois no antigo Oriente eram ensinadas e compreendidas há milhares de anos.

O destino decidiu que a resposta aos meus livros fosse marcadamente encorajadora. Bem compreendido, isto não é uma mensagem destinada só aos poucos; seus benefícios não se destinam apenas aos iogues e santos; destinam-se a todos nós, a quem quer que queira ser o que Deus pretendeu que ele fosse.

Muito se engana quem quer que imagine que estas páginas lhe ofereçam meras abstrações e ideias faltas de valor prático. Em resposta, só posso dizer que elas tratam realmente de coisas que são vitais para os seres humanos, porque são fundamentais para a vida. Convenientemente compreendidas, estas “abstrações” ajudarão os homens a viver com mais sucesso. Descobri que elas imprimem mais força em minha própria vontade, orientação em minha mente, paz em meu coração, e veracidade em minha alma. E se algumas coisas parecem ser realmente sutis, deve defender-me respondendo que em minha tentativa de dar explicações de estados d ser comumente inarticulados, fiz o melhor possível. E quem quer que se esforce para traduzir em ações as ideias desta técnica psicológica, encontrará o prêmio numa existência equilibrada, paz interna e energia espiritual.

Assim, fui sendo forçado, pouco a pouco, a percorrer um caminho que antes nunca intentara trilhar: o caminho de escrever contos para minhas próprias obras e de explicar minhas próprias explicações. Em suma, inconscientemente me tornei cada vez mais tutor e cada vez menos um buscador. E conquanto ainda me atenha estritamente à minha fixada atitude de completa independência, reclamando absoluta liberdade de todos os que cruzaram meu caminho e prazerosamente lhes concedendo a mesma liberdade que lhes solicito, recusando-me a aceitar qualquer pedestal ou posição de seguidor, de organização ou culto, não obstante jamais pude resistir a numerosas solicitações que me chegaram pedindo mais esclarecimentos. E assim acudi ao chamado que me induziu a juntar estas páginas a uma vida bastante ocupada. Devo tornar claro que não me arvoro em instrutor, que não faço nenhuma exigência pessoal quanto ao meu próprio estado espiritual, e que apenas escrevo para proporcionar amistosamente a informação e auxílio que eu puder, como qualquer caminhante poderia tê-lo feito.

Não desejo convencer outros, mas simplesmente irradiar o que de verdadeiro encontrei; aos outros cabe apanhá-lo ou não, segundo o desejarem. Devem vir a mim por sua livre vontade, e não porque eu deseje proceder como um missionário para com eles. Não procuro converter, muito menos compelir, mas mostrar aos outros o que eles, também, podem encontrar dentro de si mesmos. Francamente, não me tornei consciente de possuir qualquer missão para este mundo, mas a única que eu cuidaria de empreender, houvessem os deuses me outorgado tal habilidade, seria a de tornar os homens perceptivos do valor de sua própria alma. Ademais, esta liberdade pessoal não deixa de ter um peculiar valor intrínseco. Por ser independente de todas as sujeições e por não obedecer a nenhuma autoridade que não seja o meu próprio monitor interno, eu posso livremente dar-me ao luxo de expor verdades que no passado foram egoisticamente veladas ou insensatamente distorcidas. Quero que minhas verdades doam. Quero que elas sejam ousadas, não por minha causa somente, mas também pela de meus leitores. Quero alimentar minha pena com destemidos pensamentos, que roçarão a pele dos apáticos de pensamento. Não me interessa agradar uma classe particular, uma seita especial, ou qualquer grupo auto-admirador. Nada significa para mim a aprovação destas pessoas.

Paul Brunton — A Realidade Interna — Ed. Pensamento       
* Que reflete as cores do arco-íris    

Solve et Coagula



Não é um trabalho de um artista dar ao público o que o público quer. Se o público soubesse o que quer, eles não seriam o público, e sim seriam o artista. É o trabalho de um artista dar ao público o que ele necessita. – Alan Moore

Primeiro Ato

Chega!

Mil vezes um varredor de rua feliz, do que um normótico de sucesso... Mil vezes um rebelde insatisfeito do que um morno satisfeito; um Sócrates insatisfeito do que um tolo satisfeito.

Recuso-me de vez à padronização cultural que me força a este estado de constante mediocridade.

Sim! Estou ciente de que não é fácil ser do grupo diferente e arriscado demais resistir ao ambiente...

Mesmo assim... Serei persistente!

Não quero com o avançar da idade, ter num corpo decadente, coração e mente dormentes, na poltrona retraído, distraindo-me com o débil movimento frenético de um controle remoto.

Chega!

Não dá mais para disfarçar este constante medo da vida, este medo da luta e das experiências novas, que aos poucos me rouba o espírito de aventura e o frescor da novidade.

Quero de vez me sentir livre do medo de ser e pensar diferente, ainda que em total desacordo com o padrão socialmente vigente.

Na verdade, farto estou desse falso respeito à arcaica e disfuncional tradição e autoridade...

Quero bradar por todos os cantos deste imenso palco da vida, a beleza deste espírito de descontentamento e de revolta, que agora, me toma por completo...

E não me venha com tuas frases prontas ou com teus arcaicos sistemas de crença organizada, pois os mesmos... Não conseguem mais me iludir... Tudo isso pode ser muito eficaz para distrair um infeliz iludido, mas não a um feliz insatisfeito consciente.

E tem mais: recuso terminantemente essa ilusória felicidade de segunda mão; quero descobrir algo original, pois até aqui, no que diz respeito à verdadeira felicidade, nada do que me foi dito teve valor.

Cansei de acreditar em políticos, governos e em sistemas de crença organizada, a qual erroneamente, muitos chamam de religião. Nenhuma destas instituições me quer psicologicamente autônomo e auto-suficiente: sei que isso me tornaria um problema para eles.

Mesmo assim: quero deixar de ser ajustado, mecânico e desprovido de surtos criadores.

Já não há mais como aceitar, como a grande maioria, sem a mínima reflexão, aos poucos me consumir consumindo as idiotices criadas por um idiota qualquer.

Pois bem: não sei onde, não sei quando e muito menos quem, disse que ousar é o preço do sucesso... Então, aqui expresso: ouso pelo Supremo, ouso pela Excelência de Ser, pois farto estou desse público e estagnante vicio pelo óbvio!

E não me olhe com teus olhos travados de ideologias, pois quero ser livre de toda influência... Já não tens como me reformar.

E o que será de mim? Não demoro a te responder: serei um desajustado, um nada, um anônimo, um ser livre da doentia expressão da vontade coletiva, secularmente imposta por uma minoria desconhecida...

O que será de mim?... Digo já: serei um imoral diante de teus olhos condicionados. Tudo bem! Não faz mal! Não me importa!

E pode ficar com teus usos, costumes, templos e livros sagrados, pois nada disso me serviu para viver a vida em toda a sua plenitude; muito ao contrário, me mantiveram por anos e anos apenas existindo feito um humanóide...

Sim um humanóide... Um escravo livre, preso na falsa segurança de uma carteira de trabalho assinada e na possibilidade de consumir em suaves prestações, numa importada loja de departamento qualquer...

Chega!

Nunca mais negarei minha liberdade de expressão, minha originalidade em nome das migalhas da aceitação parental e social...

A partir de agora, de todas as minhas células expurgo os tóxicos e familiares "você tem que" - os quais durante anos me mantiveram preso num ciclo vicioso de medo, culpa e vergonha e que por pouco não fragmentaram por completo meu canal com a Suprema Criatividade.

Chega, pois a partir de agora, Eu decido: serei um artista, um ator, um cantor, um poeta, um dançarino!

O que?... Achas que estou ficando louco?... Ora, ora! Que beleza!... Levam-se anos para chegar nesta santa loucura que a tudo cura.

Portanto, chegue mais perto e olhe... Olhe bem fundo em meus olhos – se é que consegues não desviar os teus dos meus - e veja o que agora ocorre: o velho homem está em seu leito de morte... E não ouse tentar ressuscitá-lo! Deixe que morra!...

Deixe que morra, feito que a morte do antigo é o nascimento do novo!...

Como sei que a estúpida maioria abomina a tristeza e vive a fugir da dor, ainda que doloroso, digo: deixe-me aqui insatisfeito, descontente... Porque debaixo da superfície prospera de minha vida passada, só rotina, frustração, ansiedade, desespero e ilusão eu experimentava.

Portanto, é com seriedade que imploro: deixe que o velho morra!...

Deixe-me ser por livre e espontânea vontade um ser humano dolorosamente sensível...

Chega!

Cansei de fazer parte da enorme massa de manobra sobre a qual, os poucos espertos inconscientemente prosperam materialmente num compasso espiritual decadente. Deixe-me só...

(fim do primeiro ato)
..................................
Segundo Ato

Sim!...

Programado...

Não passo de um computador ambulante. Um ser biológica, física, mental e intelectualmente programado...

É triste constatar, mas, desde criança, programado para ser funcional... FUNCIONAL!...

Para ser um especialista, para ter uma vida em compartimentos, dos quais boa parte deve ficar sempre hermeticamente fechada numa vida de fachada... Um especialista, um mísero ser limitado numa limitada área...

Não passo de uma diabólica e formidável propaganda religiosa, política e cultural, um ser humano de segunda-mão que a tudo aceitou sem a mínima indagação.

Pudera, tanto em casa como na escola sempre proibido me era qualquer tipo de indagação...

É assim e pronto!... Cala a boca e vai pro quarto!... E se falar mais, apanha!... Quer ir para a Diretoria?...

Veja só: um descartável processador de informações de terceiros movido por mouses sem fios... Como não vês: isso é ótico!

Diga-me logo: que fizeram da minha originalidade? Onde está a minha autenticidade? Por que me conformei a repetir crenças feito cativo papagaio sobre o olhar de seu senhor?

Agora vejo que essa programação que "funcionou" por muitos anos, por pouco não me desintegrou. E agora? Como formatar de vez esta HD cerebral? Como liberar a pesada carga que mais que temporariamente mantenho em minha memória? Como ser novamente um indivíduo?...

Sinto medo...

Só de pensar em me abster de tudo que venho tendo como certo há tantos anos...

Meu corpo já começa a dar sinais...

Devo estar ficando louco...

Isso não pode ser real!...

Mas como negar de forma consciente, isso que nas entranhas sinto visceralmente?...

Não!... Nada disso tem a ver com o ser que nasci para ser.

O pior é essa mente que não silencia, com esse acumulo de palavras, esse monólogo de incessante agressividade...

Palavras, palavras e mais palavras... Sou um enorme arquivo de palavras de terceiros que nunca silencia...

Não vês que elas são parte de processos egocêntricos a serviço de interesses egoístas que precisam urgentemente ser colocadas de lado? Consciente que uma mente repleta de palavras não passa de uma mente vulgar e estúpida, digo já: preciso de silêncio... No entanto, onde encontrá-lo?... Como consegui-lo?...

Como posso aspirar pela Suprema Criatividade, pela Excelência de ser, se feito um ser programado, caminho com uma mente amontoada de símbolos?...

Chega! Não há mais como viver de símbolos, pois os mesmos nunca me fizeram alcançar o simbolizado! O símbolo é algo morto, como um enorme e pesado elefante morto no meio da sala, um enorme empecilho.

Preciso da Verdade, pois tudo isto fede... No entanto, como encontrá-la?...

Chega!

Digo adeus às palavras, símbolos e frases de impacto, pois de nada me servem! Quero sentir-me livre! Livre!...

Palavras, palavras e mais palavras!... No tempo em que eu acreditava em palavras era como outros tantos que falam demais por não ter nada a dizer...

Mas agora, nego-as de vez, pois isso que sinto necessitar pressinto não poder ser descrito em palavras...

Só o que não mais necessito pode ser descrito em palavras. Não percebes a inutilidade de tentar expressar esta coisa verbalmente? Não vês que o fato de que as palavras por mais acuradas e precisas, não tem o poder de transmitir a Realidade?

E não te ofendas, mas, de agora em diante, nego todas as receitas que chamam espiritualidade e que na verdade para mim não passam de uma forma doentia de negar a experiência da completude do Ser. Preciso daquilo que está além das receitas e palavras...

Portanto, chega das palavras de terceiros! Não mais!...

Afinal, não deve um homem sujeito a tamanho sofrimento saltar para fora do seu mundo, em vez de procurar valer-se das histórias de quem "talvez" um dia se achou livre de tamanha angústia?

Decido de vez romper com esse emaranhado de palavras e viver de acordo com a fala mansa e suave que quando em silêncio ouço brotar de meu coração.

Pode te parecer loucura, mas sinto que essa é a única esperança de futuro que me resta... Os demais caminhos, já sei onde vão dar, já estive lá mil vezes antes!

Assim sendo, Deixe-me só...

Não há mais como me contentar com a transitoriedade das paixões, a insuficiência das atividades mercantilistas e triviais e a incerteza da afeição humana...

Preciso de silencio... O silêncio profundo do espírito, onde toda palavra se cala e o Supremo se conhece....

Claro está para mim, que somente uma silenciosa mente inocente, é capaz de absorver o Inimaginável.

(fim do segundo ato)

................................

Terceiro Ato

Espelho, espelho meu:... Será que algum dia já vivi?

Será que faz sentido a vida humana e as atividades sociais terem como único objetivo a conquista da expansão material?

Será que devo me conformar a isso e permitir que tal expansão seja promovida em detrimento da minha integridade espiritual?

Não sei!...

Para onde quer que eu olhe só vejo o culto ao sucesso. Não é a toa que o medo do fracasso seja o maior fantasma que trago há anos em meus sonhos. E poderia ser diferente?

Claro que não!...

Toda minha educação me instruiu à adoração do êxito aquisitivo. Sempre me induziu ao consumismo irrefletido, desde os tempos de menino com Carrinhos de Ferro e o Forte Apache, depois os tênis de borracha com algumas poucas listrinhas e as calças com etiquetas coloridas que custavam os olhos da cara... Acho que começou tudo ali! E ainda vejo o quanto que tantos se consomem por um carrinho de ferro, erroneamente chamado de popular...

Mas se o sucesso é a verdade, por que tantos, apesar da riqueza, da educação e do sucesso profissional que alcançaram, estão tão insatisfeitos com suas vidas?...

Por que essa profunda fome interior que não sabem como saciar pelos corredores dos novos templos chamados de Shopping Centers?...

Ah!... Se ao menos um desses grandes "mortos de sucesso", pudesse voltar para falar através das letras de suas músicas, sobre a crônica incompletude do ser que existindo, sem vida, experimentava...

E, em solidão, são tantos os questionamentos que surgem, quando pelas ruas caminho observando o mundo que se apresenta lá fora...

São nesses momentos, que sempre me surgem os bons questionamentos...

Onde está a simplicidade?

Por que é sempre tão difícil manter-se vivo de forma simples e clara?...

Será que as pessoas de sucesso estão preocupadas com a construção de um mundo melhor?...

Será que isso que chamam de amor é realmente Amor?

Não sei!...

Será que o objetivo da vida é o momentâneo sucesso exterior ou seria o permanente desabrochar do espírito que nos torna realmente humanos?...

O que realmente vale a pena perseguir?... Ter uma mente de valor que ultrapassa as barreiras do espaço/tempo, para além de sete gerações, ou ser uma fragmentada pessoa de sucesso momentâneo?...

Quais as conseqüências de ambas as opções?

Não!...

Decido já: o sucesso não me interessa!

Ele pode ser útil para os macacos do circo, mas não a mim...

O que quero mesmo é saber se é possível ou não viver aqui e agora sem essa doentia, separatista e destruidora ambição, apenas sendo o que nasci para ser.

Quero saber se é possível ser intensamente feliz... Sim! Intensamente feliz, vivendo anonimamente neste mundo, como um completo desconhecido, sem ser famoso, ambicioso e cruel.

E para saber.... Sigo pela estrada menos percorrida, uma vez que o mundo inteiro adora o êxito!...

Deixo de lado a mundanidade e, separado da massa, desse turbilhão inconsciente, sigo ao encontro de mim mesmo.

E resoluto, diante de teus olhos, declaro aqui e agora: serei um artista de verdade...

O que? Não sabes o que é um artista de verdade?

Digo-lhe já, citando-lhe feito um poeta da vida:

O artista é aquele que escolheu como profissão e estilo de vida, o estar em contato constante com sua bem-aventurança. Por isso, aconteça o que acontecer, siga a sua bem-aventurança, e não deixe que ninguém o desvie dela. Há uma voz dentro de nós que diz sempre se estamos na direção certa ou fora dela. E se abandonarmos essa direção para ganhar dinheiro... Perdestes
tua vida... Se estiveres no centro e não conseguires dinheiro.... Ainda terás a tua bem-aventurança...

O que?... Não murmures! Fale mais alto... Queres saber o que sinto ser sucesso?...

Pois bem, sem retrocesso , digo-lhe já e ainda em tom poético:

Sucesso é a compreensão e a dissolução dessa incompletude e sofrimento que não me deixam um só momento...

..............................................

Senhores:
apesar de ainda poder ouvir ecos do constante monólogo de muitas mentes, chegamos ao final do monólogo presente!...

Por favor, por favor... Suplico: nada de palmas!

Acenando digo: tudo bem!... Se assim persistem...

Façam-no com uma só mão!
.................................................

Outsider
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...
"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill