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quarta-feira, 4 de abril de 2018

Por que a mente é de esquerda ou de direita?


Por que a mente é de esquerda ou de direita?

PERGUNTA: A luta básica, através da história e como a presenciamos no mundo moderno, parece ser o choque entre as forças da tradição e o conservantismo, de um lado, e as forças progressistas, de outro lado. Que lado devemos apoiar, na grande batalha pela promoção do bem-estar humano?

KRISHNAMURTI: Não é possível considerarmos este problema sem tomarmos partidos? Porque no momento em que tomamos partido, já não temos uma perspectiva “integrada”, já não somos livres. Se sois progressista e eu conservador, chocamo-nos um com o outro, somos antagonistas. Em vez de considerarmos o problema do vosso ponto de vista ou do meu ponto de vista, não seria preferível descobrirmos o que é que faz a mente ser conservadora ou progressista? Compreendeis o problema? Se eu sou conservador e vós sois progressista, estaremos inevitavelmente em conflito. Eu desejo conservar, reter, manter as coisas o mais possível como estão; e vós desejais reformar, revolucionar. Ficamos numa batalha constante um contra o outro e, consequentemente, jamais resolvemos o problema. Mas se vós e eu estamos muito interessados em resolver o problema humano, então não seremos nem progressistas nem conservadores; estaremos interessados no problema em si, e não em como vós o considerais e como eu o considero. Espero que a questão esteja agora clara; mas a questão nunca estará clara, se já tomamos partidos. Examinemos, pois, a mentalidade conservadora e a mentalidade progressista.

Tanto o conservador como o progressista desejam mudança. Isso é óbvio. Só o homem mais estúpido e mais totalmente cego pode não desejar mudança nenhuma. Os que possuem todas as coisas mundanas — um grande depósito no banco, conforto, luxo — que estão satisfeitos e querem tudo bem protegido, esses não desejam mudanças. Já os que observam, os que estão cônscios do problema mundial (não apenas do problema americano ou do problema hindu) os que veem toda essa luta humana — todos esses desejam mudanças. Há miséria na Ásia, de que não fazeis ideia. Milhões e milhões de pessoas a alimentarem-se uma vez por dia, e às vezes nem isso sequer. Há fome, doença, superstição, a degradação da pobreza, excesso de nascimentos, aumento de população, solo pobre. Essas coisas bradam por mudança. E também, obviamente, há necessidade de transformação, com respeito à guerra. Urge fazer-se algo para acabar-se com todas as guerras, a fim de que os homens sejam livres para educar a si mesmos, viver pacificamente, em boa harmonia, criadoramente. Assim sendo, todos nós — conservadores e progressistas — se refletimos um pouco, temos de desejar mudança.

O problema, portanto, não é de se devemos apoiar o conservador ou o progressista, mas de como promover a mudança. Não é isso? Tende paciência; pode-se responder superficialmente; mas eu desejo considerar este problema fundamentalmente, profundamente. Qual é o fator da transformação? As revoluções geram transformações? Houve revoluções no passado, a Revolução Francesa, e outras mais recentes; e elas produziram alguma transformação? Poderão ter produzido superficiais modificações políticas, não uma transformação básica da mente e do coração, uma transformação fundamental, “integrada”, na qual o indivíduo deixasse de ser nacionalista, deixasse de ser francês, russo, alemão, hindu, e se tornasse um ente humano integrado. Nessas condições, quando investigamos a questão da transformação, da revolução, não devemos perguntar se a mente — sem se levar em conta se ela é conservadora ou progressista — é capaz de efetuá-la? A mudança, a revolução resulta de um “mecanismo” da mente, ou acontece de uma maneira de todo diferente? Já observastes como vos modificais, como indivíduo humano? Quando vos modificais? Não é certamente quando estais tentando modificar-vos pela ação do pensamento; modificais-vos, quer queirais quer não, quando a mente não está planejando fazê-lo.

É importantíssimo compreender-se isso, e peço-vos tenhais paciência para investigá-lo. Se sou ganancioso, invejoso, como posso modificar-me? Posso modificar-me por volição? Quando procuro libertar-me da avidez, esse próprio esforço não resulta da avidez, sob outra forma? Quando digo “não devo ser ávido”, porque o digo? Porque o ser ávido já não compensa, causa-me sofrimento e, portanto tenho agora um móvel diferente, um impulso diferente, há uma sensação nova que desejo alcançar; por conseguinte, rejeitando a avidez, sou ainda ávido. Enquanto a mudança resultar do pensamento, não é mudança — não importando se esse pensamento é conservador ou progressista. A transformação, a revolução só é realizável quando o pensamento calculista deixou de existir. Refleti bem sobre isso e vede a verdade que encerra. A modificação produzida pelo pensamento, pelo cálculo, é uma continuidade modificada. Todas as revoluções políticas são meramente continuidade modificada, reação ao passado, e, por conseguinte, não constituem mudança nenhuma.

Nessas condições, se lhes interessa a mudança, devem, tanto o progressista como o conservador, indagar se o pensamento é capaz de promovê-la. Realiza-se a transformação quando há percepção do que é verdadeiro; e a percepção do que é verdadeiro não procede da mente. A mente pode traduzir a história de acordo com seus próprios preconceitos, de acordo com seus instintos burgueses ou proletários; mas a revolta dos que nada têm, bem como o conservantismo dos que têm tudo, é sempre uma reação; e reação não é transformação. Vem a transformação quando a mente percebe o que é verdadeiro; e ela não poderá percebê-lo enquanto continuar a pensar com a mentalidade do progressista ou do conservador. Vós e eu devemos estar interessados diretamente no problema da transformação. A transformação não se pode operar por nenhum ato de vontade, por nenhuma aplicação do saber; só se realiza quando a Realidade é percebida por vós e por mim. E a Realidade pode ser percebida apenas, quando a mente já não é um instrumento de reação, quando já não sonha com Utopias nem deseja conservar tudo como está. Só há transformação quando vós e eu somos verdadeiramente religiosos. Esta é a única revolução, a única transformação permanente.

Krishnamurti em, Percepção Criadora,
5 de julho de 1953
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terça-feira, 1 de setembro de 2015

Um diferenciado olhar sobre as manifestações políticas

A luta pela liberdade representa preenchimento do "eu", a pátria com que você se identifica representa um meio de fuga de si mesmo. A luta, a dor, o sofrimento, para criar um mundo novo, uma nova pátria, é um meio artificial de auto-preenchimento. É tudo preenchimento, de diferentes maneiras, do "eu". Essas coisas nos dão uma energia extraordinária e transitória, provocam uma explosão de entusiasmo. Atrás de tudo isso, porém, está sempre o "eu", na sua perpétua busca de plenitude; e o preenchimento, o desejo de se preencher, sempre produz conflito.

Jiddu Krishnamurti em, Autoconhecimento — Base da Sabedoria

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Toda a humanidade foi castrada de maneiras diferentes

Toda a programação de nossa mente está errada. Nós fomos programados para sermos ambiciosos. E é aí que entra a política. Ela tem poluído a sua vida normal e não apenas o mundo habitual dos políticos.

Mesmo uma pequena criança já sabe sorrir para a mãe e para o pai com um sorriso falso, sem qualquer autenticidade. Ela sabe que sempre que sorri, ela é recompensada. Ela aprendeu a primeira regra para ser um político. Ela ainda está no berço e você já lhe ensinou política.

Nos relacionamentos humanos existe política em todo lugar.

O homem incapacitou a mulher. Isso é política.

Metade da humanidade é constituída por mulheres. O homem não tem direito algum de incapacitá-la, mas por séculos ele a tem incapacitado completamente. Ele não permitiu que ela tivesse acesso à educação. Ele não lhe permitiu sequer que ouvisse as escrituras sagradas. Em muitas religiões eles não permitiram que elas entrassem nos templos. Ou, se permitiram, elas tinham uma seção separada, elas não podiam ficar ao lado dos homens como iguais, mesmo perante Deus. (...)

O homem tem tentado de todas as maneiras cortar a liberdade da mulher.

Isto é política; isto não é amor.

Você ama uma mulher, mas não lhe dá liberdade. Que tipo de amor é este, que tem medo de dar liberdade?

Você a coloca numa gaiola como um papagaio. Você pode dizer que ama o papagaio, mas você não entende que o está matando.Você tirou todo o céu do papagaio e deu-lhe apenas uma gaiola. A gaiola pode ser feita de ouro, mas ela nada significa ao ser comparada com a liberdade dos papagaios no céu, movendo-se de uma árvore a outra, cantando suas canções – não aquela que você forçou-o aprender a cantar, mas aquela que lhe é natural, que lhe é autêntica.

A mulher continua fazendo as coisas que o homem quer. Pouco a pouco, ela vai esquecendo que ela também é um ser humano.

Na China, por milhares de anos, o marido podia matar a esposa. Somente em 1951 uma nova lei surgiu proibindo isto. Até 1951 o marido estava autorizado, caso ele quisesse, matar sua esposa, era uma questão que dizia respeito a ele. Ela era a sua mulher, uma posse. O sistema de leis não tinha interesse algum em interferir nas suas posses. E, além disto, na China pensava-se que a mulher não tinha alma; somente o homem tinha.

É por isto que na história da China você não encontra uma única mulher com a importância de um Lao Tzu, Chuang Tzu, Lieh Tzu, Confúcio, Mencius. Se você não tem alma, você é apenas uma coisa, não consegue competir com o homem.

Metade da humanidade, em todos os países, em toda civilização, foi destruída pela política de família. Você pode não chamar isto de política, mas é política. Sempre que existe um desejo de ter poder sobre outras pessoas, isto é política. O poder é sempre político, mesmo quando se trata de pequenas crianças. Os pais pensam que as amam, mas apenas em suas mentes, porque o que eles querem são crianças obedientes. E o que significa obediência? Significa que todo o poder fica nas mãos dos pais.
Se a obediência é uma grande qualidade, por que os pais não devem ser obedientes para com os filhos? Se essa é uma questão religiosa, por que os pais não devem obedecer aos filhos? Mas isto nada tem a ver com religião. Tudo isto é política escondida atrás de belas palavras.

O homem precisa ser exposto em todos os pontos em que a política entra, e ela entra em todo lugar, em todos os relacionamentos. Ela contaminou toda a vida do homem e continua contaminando.
Em suas escolas vocês ensinam as crianças a serem os primeiros da sala. Por que? Você já pensou na psicologia disto? A pessoa que chega primeiro começa a se tornar um egoísta: ela é a primeira. E a pessoa que chega por último começa a se sentir inferior. Qual a necessidade de se fazer isto? Os exames deveriam simplesmente ser abolidos.

Não há necessidade alguma de exames. Os professores podem simplesmente dar notas todos os dias da mesma maneira como eles controlam a freqüência. Eles podem dar notas todos os dias a todas as crianças e no final aquele que demonstrar maior aproveitamento passa mais cedo para uma classe mais elevada.

Aquele que for um pouco mais preguiçoso, passará um pouco depois. Mas sem qualquer exame e sem a classificação de ‘primeira classe, segunda classe, terceira classe’. Isto se torna um estigma.

Se uma pessoa em todo o seu currículo escolar, no nível básico, médio e universidade, tiver sido sempre classificada como terceira classe, terá um reduzido senso de auto-respeito. O seu auto-respeito terá sido morto. Ela sabe que não tem valor. Todo mundo poderá exercer poder sobre ela.
Essa expressão ‘terceira classe’ tornou-se tão feia na Índia que se você perguntar a alguém, ‘com que classificação você passou?’ e se ele tiver passado como terceira classe, ele responderá, ‘classe Mahatma Gandhi’ porque Gandhi nunca obteve outra classificação. Ele sempre passou classificado como terceira classe e daí, por toda a sua vida ele viajava de trem de terceira classe. Assim, na Índia, ninguém fala que passou em terceira classe, mas na ‘classe Mahatma Ghandi’. É uma maneira de ocultar aquela classificação, de tapear a si mesmo.

É criada em você a ambição de que tem que ser alguém no mundo. Você tem que provar que não é uma pessoa comum, você é extraordinário. Mas, para que? A que propósito isto serve? Isto serve a um único propósito: se você se torna poderoso, os outros se tornam subservientes a você. Você é uma pessoa extraordinária. Eles são os pobres companheiros, eles são da classe Mahatma Ghandi. Eles, no máximo, conseguem ser balconistas e nada mais. Eles não têm coragem. Toda a humanidade foi castrada de maneiras diferentes, e esta castração é política."

O S H O 

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Da necessidade de estar quieto, observando, passivamente vigilante

Qual a causa desta confusão, desta miséria? Como apareceu esta miséria, este sofrimento que nos aflige, tanto interiormente como exteriormente, este medo a esta expectativa de guerra, que ameaça explodir? Qual a sua causa? Sem dúvida, ela pode ser encontrada na derrocada de todos os valores morais e espirituais e na glorificação dos valores sensuais, do valor das coisas feitas pelas mãos ou pela mente. Que acontece, quando não possuímos nenhum outro valor, senão o das coisas dos sentidos, o dos produtos da mente, da mão ou da máquina? Quanto maior importância atribuímos ao valor sensorial das coisas, tanto maior a confusão, não é verdade? Mais uma vez, não é uma teoria minha. Não é preciso citar livros, para descobrir que vossos valores, vossas riquezas, vossa existência econômica e social, repousam nas coisas feitas pela mão ou pela mente. Vivemos e funcionamos com o nosso ser entranhado de valores sensoriais, o que significa que as coisas, as coisas da mente, as coisas da mão e da máquina, se tornaram importantes; e quando tal acontece, a crença se torna predominantemente significativa, como está ocorrendo atualmente, não é verdade? 

Assim, pois, atribuir significação cada vez maior aos valores dos sentidos, gera confusão; vendo-nos na confusão, procuramos fugir dela por vários meios — religiosos, econômicos, sociais — pela ambição, pelo poder, pela busca da realidade. Mas o real está perto, não precisamos procurá-lo; o homem que procura a verdade, nunca a encontrará. A verdade se acha no que é  e nisso consiste a sua beleza. Mas no momento em que a concebeis e começais a procurá-la, começais a lutar; e o homem que luta não pode compreender. Eis porque é necessário que estejamos quietos, observando, passivamente vigilantes. Vemos que nosso viver, nossa ação, se desenvolve dentro do campo da destruição, dentro do campo do sofrimento; qual uma onda, a confusão e o caos nos submergem constantemente; não há trégua na confusão da existência. 

Tudo o que fazemos atualmente parece levar-nos ao caos, ao sofrimento e à infelicidade. Observai vossa própria vida, e vereis que vosso viver está sempre na orla do sofrimento. Nosso trabalho, nossa atividade social, nossa política, os vários agrupamentos de nações destinados a colocar fim à guerra, tudo só produz mais guerra. A destruição vem sempre na esteira do viver; tudo o que fazemos leva à morte. É o que está acontecendo, inegavelmente. 

Pode-se colocar fim a esta miséria, imediatamente, e não mais continuarmos a ser colhidos pela onda de confusão e sofrimento? Grandes instrutores, como o Buda, como o Cristo, têm vindo ao mundo. Aceitaram a fé, libertando-se, talvez, de toda confusão e angústia. Mas não impediram que continuasse a existir a angústia, não colocaram fim à confusão. A confusão contínua, a angústia contínua. Se, reconhecendo tanta confusão social e econômica, tanto caos e sofrimento, vos retirais para o que se chama a vida religiosa e abandonais o mundo, podeis ter um sentimento de união com aqueles grandes Mestres; o mundo, porém, continuará com seu caos, com suas misérias, suas devastações, e o perene sofrimento dos seus ricos e pobres. Por conseguinte, nosso problema — vosso e meu — é de saber se podemos sair instantaneamente desta miséria. Se, vivendo no mundo, nos recusarmos a dele fazer parte, ajudaremos outros a sair deste caos, não no futuro, não no amanhã, mas agora. É este, sem dúvida, o nosso problema... Vós e eu podemos perceber imediatamente a confusão e o sofrimento, não podemos? Devemos percebê-lo, para nos tornarmos aptos a despertar em outrem igual compreensão da verdade. Em outras palavras: pode-se ser livre instantaneamente? — pois é a única maneira de sair desta tribulação. Só há percebimento no presente; mas mas se dizeis: "O farei amanhã", a onda de confusão vos colherá, e vivereis sempre envoltos em confusão. 

Ora, é possível alcançar aquele estado em que se pode perceber a verdade, instantaneamente, e colocar fim à confusão? Digo que é possível e que este é o único caminho. Digo que isso pode e deve ser feito, sem basear-se em suposição ou crença alguma. Produzir esta revolução extraordinária — que não é a revolução destinada a libertar-nos dos capitalistas e a instalar outro grupo no poder — produzir esta maravilhosa transformação, que constitui a única revolução verdadeira, eis o problema. O que geral se chama revolução, é apenas uma mudança ou continuação direta, de acordo com as ideias da esquerda. A esquerda, afinal de contas, é a continuação da direita, sob forma modificada. Se a direita tem seus fundamentos nos valores sensoriais, a esquerda não é mais do que uma continuação dos mesmos valores com diferença apenas de grau ou expressão. Por conseguinte, a verdadeira revolução só poderá realizar-se quando vós, o indivíduo, vos tornardes bem consciente das coisas, em vossas relações com outrem. Por certo, o que sois em vossas relações com outra pessoa, com vossa esposa, vosso filho, vosso patrão, vosso vizinho, é que forma a sociedade. A sociedade, por si só, não existe. A sociedade é aquilo que vós e eu criamos, em nossas relações, e é a projeção exterior de todos os nossos estados psicológicos interiores. Portanto, se vós e eu não nos compreendermos, a simples mudança do exterior, que é a projeção do interior, não tem significação, absolutamente; isto é, não pode haver alteração ou modificação significativa da sociedade, enquanto eu não compreender a mim mesmo, nas relações convosco. Se estou confuso, nas minhas relações, crio uma sociedade que é a réplica, a expressão exterior daquilo que sou. É um fato óbvio, susceptível de investigação. Podemos investigar se a sociedade, a expressão exterior, me produziram ou se eu produzi a sociedade.

Não é, pois, um fato evidente que aquilo que eu sou, nas relações com meus semelhantes, cria a sociedade e que, se eu não me transformar radicalmente, não pode haver transformação alguma da função essencial da sociedade? Quando dependemos de um sistema, para a transformação da sociedade, estamos simplesmente evitando o problema, porquanto sistema algum pode transformar o homem; o homem sempre transforma o sistema, como prova a História. Enquanto eu não compreender a mim mesmo, em minhas relações convosco, sou eu a causa do caos, da miséria, da destruição, do medo, da brutalidade. A compreensão de mim mesmo não depende do tempo; posso compreender-me neste exato momento. Se digo "compreender-me-ei amanhã", estou atraindo o caos e o sofrimento, minha ação é destrutiva... A transformação só se realiza imediatamente; a revolução só pode ser agora, e não amanhã. Quando ela acontece, vós vos libertais completamente dos problemas, porque então o "eu" já não está preocupado consigo mesmo e estais a salvo da onda de destruição.

Krishnamurti

sábado, 4 de outubro de 2014

Por que vocês buscam eleger um chefe político?

"Por que se sujeitam comunidades e nações ao mando de um chefe?" Que são comunidades e nações? Um grupo de indivíduos que vivem juntos. Por outras palavras, a sociedade, a comunidade, a nação, são vocês, o indivíduo, em nossas relações com outro indivíduo; isso é um fato patente. Por que procuram eleger um chefe? Vocês o fazem, evidentemente, porque estão confusos, não é verdade? Um homem lúcido, íntegro, não precisa de um chefe. Para ele, um chefe é uma coisa molesta, um fator de desintegração na sociedade. 

Vocês procuram um chefe porque estão confusos; não sabem o que fazer, e desejam que lhes digam o que devem fazer, e por isso procuram métodos de conduta, social, política e religiosa. Confusos, como estão, procuram um chefe — vejam bem o que isso subentende. Se, quando estão confusos, buscam um chefe para lhes tirar da confusão, significa isso que  não estão em busca da claridade, não estão interessados na causa da confusão, mas só querem que os levem para fora dela.

Mas, visto que estão confusos, escolherão também um chefe confuso. Não irão procurar um chefe que vê claro, porque ele lhes dirá que devem olhar para a confusão de vocês, em vez de fugir da mesma; lhes dirá que a causa da confusão está em si mesmos. Mas não é isso o que querem; querem um chefe que lhes tire da confusão; e porque a mente de vocês está confusa, procuram um que também esteja confuso. 

Como pode a mente confusa guiar outra mente para fora da confusão? A mente que está confusa há de ter também um guia confuso; por conseguinte, todos os guias são inevitavelmente confusos, visto que nós os criamos por causa de nossa confusão — é importantíssimo que se compreenda isso. Ao compreenderem esse fato, não irão procurar um chefe, mas se tornarão responsáveis pela eliminação de sua confusão. É só o homem confuso que, não sabendo como agir, procura um chefe para ajudá-lo a agir; mas o chefe está também confuso, e é por isso que os chefes são um fator de desintegração na vida de vocês. 

O chefe é "projetado" pela própria confusão de vocês, e por conseguinte ele não é senão vocês mesmos, sob forma diferente, como também o são os seus governos. É a "autoprojeção" que cria o chefe; um herói nacional é uma exteriorização, uma duplicata de vocês mesmos. O que são, ou o que desejam ser, assim é o chefe de vocês; esse chefe, portanto, não pode lhes tirar do caos. A solução do caos está em suas próprias mãos, e não nas mãos alheias. A regeneração é produto da compreensão de si mesmos, e não do seguimento de alguém, porque esse alguém é vocês mesmos, mais eloquente, mas igualmente confuso, igualmente tirânico, igualmente tradicionalista. 

O problema, portanto, não é o chefe, mas, sim, como desarraigar a confusão. Pode alguém lhes ajudar a afastar a confusão? Se procuram alguém para afastar a sua confusão, ele só poderá os ajudar a aumentá-la, porque a mente que está confusa é incapaz de escolher o que é claro; visto que está confusa, só pode escolher o que é confuso. 

Se vocês desejam se libertar radicalmente da confusão, precisam colocar em ordem suas mentes e corações e de considerar as causas responsáveis pela confusão. Só surge a confusão quando não há autoconhecimento. Quando não me conheço a mim mesmo e não sei o que fazer ou o que pensar, naturalmente estou envolvido no torvelinho da confusão. Mas quando me conheço a mim mesmo, o processo integral de mim mesmo — o qual é extraordinariamente simples quando temos a intenção de nos conhecer a nós mesmos — então, dessa compreensão nasce a claridade, dessa compreensão resulta a conduta correta. 

É pois de suma importância deixar de seguir o guia, e compreender a si mesmo. A compreensão de si mesmo traz amor e traz ordem. O caos só existe em relação com alguma coisa, e enquanto não compreendermos essa relação há de haver confusão. Compreender as relações é compreender a mim mesmo, e compreender a mim mesmo é fazer nascer aquela qualidade de amor, na qual existe bem-estar. Se sei amar minha esposa, meus filhos, meu próximo, sei amar todo mundo. Visto que não amo a ninguém, estou permanecendo apenas no nível intelectual ou verbal com relação a humanidade.

O idealista causa enfado: ama a humanidade com o cérebro, não ama com o coração. Quando vocês amam, não há nenhuma necessidade de chefe. São os vazios de coração que procuram o chefe, para encher esse vazio com palavras, com uma ideologia, com uma utopia do futuro. O amor só está no presente, não no tempo, não no futuro. Para quem ama, a eternidade é agora; porque o amor é sua própria eternidade.

Krishnamurti em, A ARTE DA LIBERTAÇÃO.

Sobre o sistema de confusão gerado pelos maníacos do poder

Porque não somos inteligentes, investimos de poder outras pessoas que se dizem inteligentes para nos governar. Um homem inteligente não precisa ser governado; não precisa de organização alguma, além das que são necessárias, para maior eficiência da vida. 

As coisas necessárias da vida não podem ser verdadeiramente organizadas enquanto se acharem nas mãos de uns poucos, de uma classe ou grupo; e quando os poucos atuam como representantes dos muitos, existe, por certo, o mesmo problema do poder. Vem a exploração quando as organizações são utilizadas como instrumentos de poder, quer pelo indivíduo, quer pelo grupo, pelo partido ou pelo Estado. É essa auto-expansão, mercê da organização, que é perniciosa, como, por exemplo, a de um estado que se identifica como governo soberano — que anda sempre de mãos dadas com o nacionalismo, e no qual o indivíduo está também envolvido. É o poder expansionista, agressivo, de defesa do "eu", que é condenável. 

Quando organizações são utilizadas pelos espertos, pelos astutos, como meio de explorar os outros, devem ser erradicadas; e só o serão quando vocês, individualmente, em seu pequeno círculo, não estiver em busca de poder, de domínio. Enquanto existe a busca de poder, haverá um "processo" hierárquico, do ministro do governo ao funcionário, do bispo ao vigário, do general ao soldado raso. 

Sem dúvida, só teremos uma sociedade decente, quando os indivíduos não mais estiverem em busca do poder, em nenhum sentido — pela riqueza, por meio das relações ou de uma ideia. É a busca de poder que é a causa deste desastre, desta desintegração da sociedade. Nossa existência, atualmente, é toda feita de política de força, domínio da família pelo marido ou pela mulher, de domínio por meio de uma ideia. A ação baseada numa ideia é sempre fator de separação e nunca de compreensão; e a busca de poder, seja pelo indivíduo, seja pelo Estado, denota expansão, cultivo do intelecto, em que não existe amor. 

Quando você ama alguém, é muito cuidadoso, organiza, espontaneamente, não é verdade? Você é vigilante, é eficiente no ajudar a este ou àquele. É quando não existe amor, que nasce a organização como instrumento de poder. Quando você ama o próximo, quando é cheio de afeto e generosidade, então as organizações têm significação inteiramente diferente, conservando-se em seu nível próprio. Mas quando a posição do indivíduo assume a máxima importância, quando há ânsia de poder, as organizações são utilizadas como meio de se alcançar esse poder — e a força e o amor não pode co-existir.

O amor é sua própria força, sua própria beleza, e é porque nossos corações estão vazios que os enchemos com as coisas da mente, interessamo-nos pelas organizações como meios de promover a ordem, de promover a paz mundial. Não são as organizações, mas só o amor que pode implantar a ordem e a paz no mundo; não são os planos de alguma utopia, mas só a boa vontade que pode efetuar a conciliação entre indivíduos. Porque não temos a chama do amor, dependemos de organizações; e no momento em que temos organizações sem amor, os espertos e os astutos galgam o posto mais alto e tiram proveito delas. 

Fundamos uma organização para o bem-estar da humanidade, e antes de darmos fé já alguém tomou conta dela para seus próprios fins. Desencadeamos revoluções, revoluções sangrentas e desastrosas, para promover a paz mundial, e antes de o sabermos, o mundo já se acha nas mãos de uns poucos maníacos do poder, que se tornam uma nova e poderosa classe, , um novo grupo dominante de comissários, com sua polícia secreta — e o amor é enxotado para fora. 

Como pode o homem viver sem amor? Só pode existir; e a existência sem amor significa controle, confusão e sofrimento — e é isso o que a maioria de nós está criando. organizamo-nos para a existência e aceitamos o conflito como inevitável, porque nossa existência é uma busca de constante poder. 

Sem dúvida, quando amamos, a organização tem o lugar que lhe compete, seu lugar próprio; mas, sem amor, a organização se torna pesadelo, coisa puramente mecânica e eficiente, tal como um exército. Quando houver amor, não haverá mais exércitos; mas como a sociedade moderna está baseada na eficiência, temos de ter exércitos, e a finalidade de um exército é gerar guerras. mesmo durante a chamada paz, quanto mais intelectualmente eficientes somos, tanto mais cruéis, mais brutais, mais sensíveis nos tornamos. Eis porque há confusão no mundo, eis porque a burocracia se torna cada vez mais poderosa, por que mais e mais governos se vão tornando totalitários. 

Sujeitamo-nos a tudo isso como inevitável, porque vivemos pelo cérebro e não pelo coração, e é por isso que não existe amor. O amor é o mais perigoso e mais incerto elemento de nossa vida; e porque não desejamos estar na incerteza, porque não desejamos estar em perigo, vivemos pela mente. O homem que ama é perigoso, e não desejamos viver perigosamente, queremos viver apenas dentro do molde da organização, pensando que as organizações trarão ordem e paz ao mundo. As organizações nunca trouxeram a ordem e a paz. Só o amor, só a boa vontade, só a caridade pode trazer a ordem e a paz, no final de tudo, e, portanto, agora.

Krishnamurti em, A ARTE DA LIBERTAÇÃO


sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Por que temos tanto medo de estar sem nada a fazer?

É bastante óbvio que a maioria de nós está intelectualmente confusa.  Vemos que os chamados guias ou chefes, em todos os setores da vida, não têm uma solução completa para as nossas várias questões e problemas. Os numerosos e antagônicos partidos políticos da direita ou da esquerda não parecem ter encontrado a solução correta para as nossas dissenções nacionais e internacionais, e vemos também, socialmente, processar-se uma destruição completa dos valores morais. 

Tudo em torno de nós parece desintegrar-se: os valores morais e éticos tornaram-se simples questão de tradição sem sentido. A guerra, o conflito entre a direita e a esquerda, parece um fator constante e frequente nas nossas vidas; por toda a parte vê-se destruição, confusão. Dentro de nós estamos completamente confusos, embora não gostemos de admiti-lo; vemos confusão em todas as coisas, e não sabemos ao certo o que devemos fazer. 

A maioria de nós, reconhecendo esta confusão, esta incerteza, deseja fazer alguma coisa, e quanto mais confusos nos achamos, tanto mais ansiosamente desejamos agir. Assim, para aqueles que já reconheceram que existe confusão neles próprios e em redor de si, a ação se torna extremamente importante. Mas se um homem está confuso, como pode agir? Tudo o que ele faça, qualquer que seja o seu método de ação, há de ser confuso, e essa ação criará, naturalmente, infalivelmente, maior confusão. 

Seja qual for o partido, a instituição ou organização a que pertença, enquanto não afastar de si a confusão, tudo o que ele fizer  há de, necessariamente, produzir caos maior. Que deve fazer então? Que deve fazer um homem que sente sincero empenho, um desejo sincero de dissipar a confusão que há em si e ao redor de si? Qual o seu primeiro dever: agir, ou dissipar a confusão dentro de si, e, portanto, fora de si? 

Ora, nós tememos estar inativos; e recolher-se por um período de tempo para estudar todo o problema requer extraordinária inteligência. Se vocês se recolhessem por algum tempo para considerar, reapreciar o problema, seus amigos, seus camaradas, lhes considerariam um "escapista". Vocês se tornariam inexistentes, socialmente não estariam em parte alguma. Se quando todos agitam bandeiras e você não o faz, se quando todos colocam um determinado boné e você não usa esse boné, você se sente esquecido; e como a maioria de nós não gosta de ficar no segundo plano, nos atiramos à ação. 

Assim, é muito importante compreender o problema da ação e da inação. Não é necessário ficar inativo, para considerar o problema no seu todo? É claro que precisamos continuar a atender à nossa diária responsabilidade de ganhar a subsistência: todas as coisas necessárias têm de continuar. 

Mas as organizações políticas, religiosas, sociais, os grupos, as comissões, etc. etc. — há necessidade de pertencermos a elas? Se temos muito empenho, não é necessário que reconsideremos, que tornemos a analisar todo o problema da existência? E para tal, não é necessário, por ora, que nos afastemos, a fim de estudar, ponderar, meditar? Esse afastamento não é, verdadeiramente, ação? Nessa chamada inação há a extraordinária ação de reconsiderar toda a matéria, de reapreciar, de meditar sobre a confusão em que vivemos. Por que temos tanto medo de estarmos inativos? É inação considerar novamente um problema? Claro que não. 

Sem dúvida, quem está evitando a ação é o homem que está ativo, sem ter reconsiderado o problema. Esse é  que é o verdadeiro "escapista". Está confuso, e para escapar à sua confusão, à sua insuficiência, atira-se à ação, ingressa numa sociedade, num partido, numa organização. Está, na realidade, fugindo ao problema fundamental, que é a confusão. Estamos, pois, empregando mal as palavras. 

O homem que se atira à ação sem reconsiderar o problema, pensando que vai reformar o mundo com o simples ingressar numa sociedade ou partido — esse homem é que está criando maior confusão e maiores desditas; enquanto o homem a que chamam inativo porque se retira e estuda seriamente o problema — não há dúvida de que esse homem está muito mais ativo.

Nos nossos tempos, principalmente, em que todo o mundo se acha à beira do precipício e acontecimentos catastróficos estão se verificando, não se torna necessário que uns poucos, pelo menos, fiquem inativos, e, deliberadamente, não se deixem colher por esta máquina, esta máquina atômica da ação, que nada produz a não ser maior confusão, maior caos? Certo, os que têm empenho hão de retirar-se, não da vida, não das atividades diárias, mas retirar-se a fim de descobrir, estudar, explorar, investigar a causa da confusão; e para perceber , descobrir, explorar, não há necessidade de aderirmos aos numerosos planos e esquemas do que uma nova sociedade deveria ou não deveria ter.

Tais planos, evidentemente, são inúteis de todo; porque o homem que está confuso e só cuida de colocar em prática certos planos, ocasionará maior confusão. Por conseguinte, como tenho dito e redito, o que mais importa, se desejamos compreender a causa da confusão, é o autoconhecimento. Sem compreendermos a nós mesmos, não pode haver ordem no mundo; sem explorarmos a fundo o processo do pensamento,  do sentimento e da ação, em nós mesmos, nunca haverá possibilidade de paz mundial, de ordem e segurança.

Krishnamurti em, A ARTE DA LIBERTAÇÃO












quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Uma mente não mais perturbada pela ignorância

É sobremodo difícil compreender os meandros e as complexidades das relações humanas. Mesmo quando temos muita intimidade com uma pessoa, é muitas vezes dificílimo e quase impossível conhecer-lhes os verdadeiros sentimentos e pensamentos. Isso se torna menos difícil quando há afeição, quando há amor entre duas pessoas, porque há então comunhão imediata, simultânea e no mesmo nível; mas essa comunhão é negada, quando ficamos apenas discutindo ou apenas ouvindo no nível verbal. É dificílimo estabelecer essa comunhão entre eu e você, porque não há comunhão, não há verdadeiro entendimento entre nós. 

A comunhão deixa de existir quando há temor ou preconceito, porque nesse caso entra em funcionamento o mecanismo de defesa. Talvez eu veja as coisas de maneira diferente daquela a que você está habituado, e desejo estar em comunhão com você, desejo comunicar-lhe o que vejo. Posso não ver com exatidão ou de maneira completa; mas, se deseja examinar o que estou lhe comunicando, deve, de sua parte, estar aberto, receptivo. 

Não estou me ocupando com ideias. As ideias, para mim, não têm significação alguma. Ideias não produzem revolução, ideias não produzem regeneração; e é a regeneração que é essencial. A comunicação de ideias é relativamente fácil, mas o comungarmos uns com os outros, além do nível verbal, é sobremaneira difícil. 

O que devemos estabelecer entre nós não é uma comunhão imaginária, uma comunhão mística, mas uma comunhão que só é possível quando nós dois estamos seriamente interessados em descobrir a verdade que resolverá nossos problemas. Quanto a mim, creio em uma realidade que existe de momento em momento e que, absolutamente, não se encontra na esfera do tempo. Essa realidade representa a única solução aos múltiplos problemas da nossa vida. Quando uma pessoa percebe essa realidade, ou quando ela surge, ele é um fator de libertação; mas nenhuma soma de argumentação intelectual, de disputa, de conflito econômico, social ou religioso, resolverá os problemas gerados pela mente. 

Para haver comunicação temos que comungar uns com os outros, e para tal precisamos estar abertos e receptivos, não aceitando nem negando, mas investigando.  Você e eu estamos em relação, não estamos vivendo isoladamente. A verdade não é algo separado do estado de relação. As relações constituem a sociedade, e na compreensão das relações entre você e a sua esposa, entre você e a sociedade, você encontrará a verdade, ou melhor, a verdade virá até você, trazendo-lhe a libertação de todos os problemas. Você não pode achar a verdade; deve deixá-la vir até você; e para que isso aconteça requer-se uma mente não mais perturbada pela ignorância.

Ignorância não significa a falta de conhecimentos técnicos, a falta de leitura de muitos livros filosóficos: ignorância é a falta de conhecimento próprio. Ainda que uma pessoa tenha lido muitos livros filosóficos e sagrados e seja capaz de citá-los, essas citações, que representam uma acumulação de palavras e experiências alheias, não libertam a mente da ignorância. Surge o autoconhecimento ao investigarmos e experimentarmos as tendências dos nossos próprios pensamentos, sentimentos e atos, o que significa estarmos cônscios de nosso "processo" total, nas relações, instante por instante. 

O autoconhecimento, do qual trataremos mais adiante, dá-nos a exata perspectiva de qualquer de nossos problemas, e a exata perspectiva é a compreensão da verdade contida no problema; e essa compreensão, inevitavelmente, produzirá ação, nas relações. Por conseguinte, o autoconhecimento não se opõe à ação, não a nega. O autoconhecimento revela a perspectiva correta, ou seja a verdade contida no problema, da qual resulta a ação — essas três coisas estão sempre relacionadas entre si; não são separadas. Não há ação verdadeira sem autoconhecimento. Se não me conheço a mim mesmo, é óbvio que não tenha base para a ação; o que faço é uma mera atividade, reação de uma mente condicionada, e portanto sem significação. Uma reação condicionada não pode nos libertar nem colocar ordem no caos. 

Ora, o mundo e o indivíduo são um "processo" único, não são opostos uma ao outro; e o homem que está tentando resolver seus próprios problemas, que são os problemas do mundo, necessita evidentemente de uma base para o seu pensar. Acho bastante claro isso. Se não me conheço a mim mesmo, falta-me a base para pensar; se, desconhecendo-me a mim mesmo, ponho-me em atividade, essa atividade só poderá gerar sofrimentos e confusão — exatamente o que está sucedendo no mundo, nos tempos atuais. 

Nessas condições, a investigação que nos leva ao autoconhecimento não é um processo de isolamento, não é uma fantasia nem luxo de asceta. Pelo contrário, é uma necessidade evidente para o homem do mundo, para o pobre e o rico, e para aquele que deseja resolver os problemas do mundo. Julgo importantíssimo compreender que este mundo é produto de nossa existência diária, e que o ambiente criado por nós não é independente de nós. O ambiente existe, e não podemos transformá-lo sem nos transformarmos a nós mesmos; e para isso, devemos compreender os nossos pensamentos, sentimentos e atos, na vida de relação. 

Os economistas e os revolucionários querem alterar o ambiente sem alterar o indivíduo; mas a simples alteração do ambiente, sem a compreensão de nós mesmos, não tem significação alguma. O ambiente é produto dos esforços do indivíduo, estando um e outro relacionados entre si; não se pode alterar um deles, sem alterar também o outro. Você e eu não estamos isolados; somos o resultado do "processo" total, o produto de toda a humanidade, quer vivamos na Índia, no Japão ou na América. A soma de toda a humanidade sou eu e você. Podemos estar conscientes ou inconscientes desse fato. Para se realizar uma transformação revolucionária na estrutura da sociedade, deve cada indivíduo compreender-se a si mesmo como um "processo" total, e não como uma entidade separada, isolada. 

(...) Mas deve ficar bem claro, para o homem que sente real interesse, que não pode haver uma revolução completa no mundo num nível único, econômico ou espiritual. Uma revolução total, uma revolução fecunda, só será possível se você e eu nos compreendermos como um "processo" total. Você e eu não somos indivíduos isolados, mas, sim, o resultado de toda a luta da humanidade, com suas ilusões, suas fantasias, desejos, ignorância, diferenças, conflitos e misérias. Não podemos começar a alterar as condições do mundo antes de termos compreendido a nós mesmos. Se você perceber isso, dar-se-á, dentro de você, imediatamente, uma completa revolução. Então, é desnecessário o guru, porque o autoconhecimento se processa minuto por minuto: não é uma acumulação de coisas ouvidas de outrem, nem se encerra nos preceitos dos religiosos.

Quando o indivíduo está descobrindo-se a si mesmo, instante por instante, em suas relações com outras pessoas, essas relações assumem significado inteiramente diverso. As relações transformam-se em revelação, em constante "processo" de autodescobrimento; e desse autodescobrimento resulta a ação.

(...) O mero citar de autoridades não representa autoconhecimento, descobrimento do "processo" do "eu", e por conseguinte, de nada vale. Você tem de começar como se nada soubesse, pois só assim realizará um descobrimento fecundo e libertador; só assim encontrará, com seu descobrimento, a felicidade e a alegria. Mas nós, a maioria de nós, vivemos de palavras; e as palavras, tal como a memória, são produto do passado. Um homem que vive no passado não pode compreender o presente.

(...) Enquanto não nos compreendermos a nós mesmos, caminharemos sempre de um conflito para outro. Nada se pode criar quando há conflito; a criação só é possível quando cessa o conflito. Para um homem que vive numa batalha constante consigo mesmo e com seu próximo, nunca haverá a possibilidade de regeneração — ele só pode ir de reação em reação. Só pode vir a regeneração quando estamos livres toda reação, e essa liberdade só pode nascer do autoconhecimento.

Krishnamurti em, A ARTE DA LIBERTAÇÃO

domingo, 28 de setembro de 2014

Todos temos um político de tocaia em nossa mente

Você reconhece este homem? Com exceção dos mais inocentes e sinceros de nós, todos temos um político de tocaia em algum lugar da nossa mente. De fato, a mente é política. É da sua própria natureza planejar, montar esquemas, e tentar manipular situações e pessoas de maneira a conseguir o que quer. Nesta figura, a mente é representada pela serpente recoberta de nuvens, que “fala com uma língua bífida”. O que é importante perceber, porém, a propósito desta figura, é que ambas as caras são falsas. A face cândida, inocente, do tipo “confie em mim”, é uma máscara, e a face diabólica, venenosa, do tipo “vou tirar vantagem de você”, também não passa de uma máscara. Políticos não têm faces verdadeiras. Seu jogo é na totalidade uma mentira. Dê uma boa examinada em si mesmo para verificar se você tem estado fazendo esse jogo. O que você vai encontrar poderá ser doloroso de ver, mas não tão doloroso quanto continuar agindo igual. No final, esse jogo não serve ao interesse de ninguém, e muito menos ao seu. O que quer que você consiga por esse caminho, irá transformar-se em pó nas suas mãos.

Qualquer um que seja capaz de fingir com convicção, que consiga ser hipócrita, se tornará seu líder político, se tornará seu sacerdote religiosamente. Tudo que ele precisa é de hipocrisia, tudo o que ele precisa é de dissimulação, tudo que ele precisa é de uma “fachada” para se esconder por trás. Os seus políticos vivem vidas duplas, os seus sacerdotes levam vida dupla, uma pela porta da frente, a outra pela porta dos fundos. E aquela vivida pela porta dos fundos é a vida real deles. Aqueles sorrisos pela porta da frente são pura falsidade, aquelas caras tão inocentes são puramente cultivadas. Se você quiser ver a realidade do político, precisará olhá-lo pela porta dos fundos. Deste ângulo ele aparece na sua nudez, do jeito como ele é; e para o sacerdote a coisa é assim também. Esses dois tipos de pessoas dissimuladas têm dominado a humanidade. Muito cedo eles descobriram que, se você quer dominar a humanidade, deve torná-la fraca, fazê-la sentir-se culpada, não-merecedora. Destrua a sua dignidade, tire-lhe toda a glória, humilhe-a. E encontraram maneiras tão sutis de humilhar, que eles nem aparecem “na foto”; você mesmo fica encarregado de se humilhar, de se destruir. Eles lhe ensinaram uma forma de suicídio lento.

Osho em, Osho Zen Tarot

sábado, 27 de setembro de 2014

Sobre a urgência de uma transformação profunda

Nós, geralmente falando, não queremos a revolução central e, sim, apenas, mudanças exteriores — queremos uma situação econômica melhor, mais riqueza, mais conforto, mais prosperidade, mais luxo, e uma maior variedade de entretenimento e distrações. 

É isso o que interessa para a maioria de nós. Ou, trocamos uma especialidade por outra, uma religião por outra, um dogma por outro; o que significa, simplesmente, passar de uma gaiola velha para uma gaiola nova. 

E se temos disposição séria, falamos sobre a necessidade de abolir a guerra — o que, mais uma vez, significa cogitar sobre a maneira de produzir modificações no exterior. 

As pesquisas científicas, as reformas sociais, os ajustamentos políticos, tudo isso — assim como as várias religiões e sociedades sectárias — só diz respeito a modificações exteriores. 

Ora como produzir uma transformação no centro? Este é o problema da maioria de nós, não acham? Se estamos seriamente intencionados e reconhecemos quanto é superficial andarmos só em busca de um emprego melhor ou de uma solução imediata para os nossos problemas econômicos, políticos, ou religiosos, desejaremos naturalmente saber se é possível efetuar-se uma transformação no centro, a qual por sua vez, produza uma transformação em nossas relações com a família, com os companheiros, enfim, com a sociedade. 

(...) Temos tentado durante anos reformar-nos exteriormente, procuramos transformar as nossas maneiras, pensamentos, conduta, nossa sociedade, e daí não resultou nenhuma mudança radical, nenhuma libertação de forças criadoras; e assim me parece que, sem essa profunda revolução interior, central, será vão todo esforço que empregarmos para modificar as coisas exteriores. 

Nossos esforços poderão produzir modificações momentaneamente satisfatórias; entretanto, se a revolução não for efetuada no centro, a mera alteração da circunferência, da parte externa, é muito pouco significativa e poderá, eventualmente, conduzir a malefícios maiores ainda. 

Compreendendo isso, averiguemos como se pode efetuar essa transformação, essa revolução no centro. 

O que é esse centro? Ora, é a mente; e nós vamos averiguar se a mente pode modificar-se, se pode produzir em si mesma uma revolução interior. 

A mente, como ó óbvio, é constituída de níveis conscientes e níveis inconscientes; e todo esforço da mente consciente para se modificar está sempre compreendido na esfera exterior. 

(...) A maioria de nós conhece o esforço consciente de modificar, de disciplinar a mente, e,  por esse motivo, o que chamamos modificação representa uma operação parcial, e não uma revolução total. E eu estou me referindo à revolução total, integral, e não à ação parcial, de superfície; e essa revolução total não pode verificar-se por meio de nenhum esforço consciente de nossa parte. 

Sabemos o que é a consciência, estamos bem familiarizados com a mente consciente que pensa e deseja, movida pelo impulso, pela intenção, e determina o ajustamento. A mente consciente está sempre forcejando em determinado sentido, ou para ajustar-se pelo temor, ou ainda pelo temor, transforma-se, a fim de adaptar-se a outro padrão de ação. 

Por conseguinte, todo esforço visante a uma modificação é um ajustamento sob a influência do temor, do desejo de termos bom êxito ou do desejo de nos tornarmos melhores, para alcançarmos um certo resultado, seja neste mundo, seja no mundo da santidade. 

É urgentemente necessária uma revolução profunda, mas, é óbvio, essa revolução deve ser inconsciente; pois, se produzo deliberadamente uma revolução em mim mesmo, essa revolução será resultado de desejo. Desejo tornar-me melhor, conseguir um resultado, descobrir o que é Deus, o que é a Verdade, ser mais feliz; por isso digo que há necessidade de transformação. 

O esforço positivo ou negativo, o esforço para ser ou para não ser, se baseia no temor, na ânsia de ganho, de conforto, de paz, segurança; assim, pois, toda modificação operada por esforço consciente não é verdadeira transformação, e, sim, puro ajustamento a um padrão diferente. A esse respeito, temos de perceber a verdade completamente

Como todas as revoluções econômicas, quer da direita, quer da esquerda, o esforço consciente não produz nenhuma transformação no centro. Ambas as coisas só produzem tiranias. O sábio, portanto, não se preocupa essencialmente com modificações periféricas: interessa-lhe só a revolução interior, a revolução que opera no centro. E como iremos, vocês e eu, produzir essa transformação?(...) Como então efetuar essa revolução no centro?  vemos que o esforço deliberado e consciente do nosso pensamento ordinário não pode realizá-la. E pode o inconsciente fazê-la?(...) O inconsciente é o resíduo do passado, não é exato? É o resultado dos instintos raciais, das impressões culturais, de tudo o que fomos no passado, de toda a luta do homem contra seus ocultos intentos, compulsões e ímpetos. 

Pode esse inconsciente ajudar-nos a operar uma modificação, uma revolução no centro? E existe alguma diferença, algum intervalo ou hiato entre o inconsciente e o consciente?

Krishnamurti em, PERCEPÇÃO CRIADORA

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

O homem só pode ser bom quando é livre

Nosso problema é... saber se o homem vive para o bem da sociedade ou se a sociedade existe para o bem-estar do homem. A religião e o governo existem para educar o homem, tornando-o livre para descobrir por si mesmo o que é verdadeiro, ensinando-o a ser bom, a ter visão do grandioso? Ou existem para tiranizar o homem, brutalizá-lo, liquidá-lo, só porque uns poucos têm o poder de destruir?... O que tem importância... é averiguar porque razão a sociedade compele o homem ao conformismo, e porque o indivíduo se submete a isso. Sem dúvida, só a mente livre é capaz de investigar, e não aquela que está amarrada a um livro, uma religião organizada, uma ideologia. Uma sociedade que condiciona a mente para adorar ao Estado, e uma sociedade que condiciona a mente para adorar a ideia chamada "Deus", são igualmente tirânicas. 

Mas, pode existir uma sociedade que ajude efetivamente o homem, o indivíduo, a ser bom, a não ser ávido, a ser livre da inveja, da ambição? É este naturalmente o nosso interesse. O homem só pode ser bom quando é livre — livre, não para fazer o que bem entende, mas para compreender o movimento total da vida. Para isso requer-se uma escola completamente diferente, uma educação completamente diferente; requerem-se pais e professores que compreendam tudo o que a liberdade implica. De outro modo, só teremos mais tirania, e não menos, porque o Estado só quer eficiência. Precisa-se de homens eficientes para se ter uma nação industrializada, precisa-se de homens eficientes para matar, lutar, destruir — e nisto se concentra toda a atenção dos governos atualmente existentes. E os governos se separam ainda mais dos indivíduos, pela ação das chamadas religiões. Nenhuma religião organizada ousa sacudir o jugo e dizer para o governo: "Você está errado". Ao contrário, abençoam os canhões e cruzadores de batalha. Durante a última guerra apareceu um livro intitulado "Deus foi meu co-piloto" de autoria de um homem que bombardeara cidades, assassinando milhões de pessoas. Naturalmente aqui em Madanapale, esta questão da guerra não lhes toca de perto. Mas não há dúvida de que a guerra é apenas uma expressão, uma manifestação ampliada de nossa vida de cada dia. Vivemos numa batalha sem tréguas com nós mesmos e com o nosso próximo, somos ambiciosos, queremos poder, mais prestígio, posição mais alta; e este mesmo espírito aquisitivo se manifesta no grupo e na nação. Queremos ser poderosos, para defender a nós mesmos ou para agredir a outros, assim por diante... 

Não importa, pois, o que você pensa ou o que eu penso a respeito do comunismo ou da democracia; o que importa é descobrir como se pode libertar a mente. Porque, só a mente livre é capaz de compreender a Verdade, conhecer Deus, e sem esta compreensão a vida significa muito pouco. É a compreensão da Verdade ou Deus — a real experiência dele, não a crença nele — que tem a máxima importância, principalmente nesta hora em que o mundo se encontra em tamanho caos e miséria.

Krishnamurti em, DA SOLIDÃO À PLENITUDE HUMANA

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

O que sois, o governo é

            PERGUNTA: Que devemos fazer para termos um governo deveras bom, e não simplesmente o governo “do povo pelo povo”?

            KRISHNAMURTI: Senhores, para terdes um bom governo, deveis em primeiro lugar compreender o que significa “governo”. Não façamos uso de palavras sem “referente”, palavras sem significação, sem algo em que se apóiem. A palavra relógio tem “referente”, mas a expressão “bom governo” não o tem. Para acharmos o seu “referente”, precisamos examinar o que significa “governo” e o que significa “bom”. Mas dizer, simplesmente, o que é um “bom governo” não tem sentido algum.
            Vejamos, pois, em primeiro lugar o que se entende por “bom”. Não estou esmiuçando, não estou procedendo como um estudante discutindo numa união; porque é muito importante descobrirmos o que estamos falando, em vez de fazermos, simplesmente, emprego de palavras que pouca significação têm. Bem sei que nos nutrimos de palavras. Produz impressão dizermos que temos um governo “do povo pelo povo”, e agitarmos a nossa bandeira — bem sabeis como é isso, como ficamos fascinados por palavras, quando os nossos corações e nossas mentes estão vazios. Verifiquemos, pois, o que significa “bom governo”.
            Que significa “bom”? “Bom” tem naturalmente um “referente”, baseado no prazer ou na dor. “Bom” é o que dá prazer, “mau” o que causa dor, quer exterior, quer interiormente (física ou psicologicamente). Isso é um fato. Estamos apreciando o fato, e não o que gostaríeis que ele fosse. Visto que buscais o prazer sob várias formas: segurança, conforto, poder, dinheiro — o fato é que o prazer é o que chamamos “bom”; e qualquer coisa que perturbe o estado de prazer, dizemos que “não é boa”. Não estou discutindo filosoficamente, mas com base na realidade. O prazer é o que desejais. Assim, evidentemente, chamais bom àquilo que vos dá segurança, conforto, posição, poder, garantia. Estais compreendendo? Isto é, um bom governo é aquele órgão que pode dar-vos o que desejais; e se o governo não vos dá o que quereis, tratais de derrubá-lo — se não for um governo totalitário. Mas até mesmo um governo totalitário pode ser destruído, se o povo disser: “Não o queremos”. Entretanto, nos dias de hoje é quase impossível a revolução física, porque os aviões e outras máquinas de guerra sem as quais não é possível, modernamente, uma revolução, estão nas mãos do governo. Assim, “bom” é aquilo que desejais, não é verdade? Senhores, não nos iludamos com palavras sobre o “bem” abstrato e o “mal” abstrato. O fato é que, em vossa vida diária, chamais “bons”, “nobres”, “eficientes”, etc., aqueles que vos dão o que desejais. O que desejais é satisfação, sob diferentes formas, e àquilo que vô-la pode dar, chamais benéfico.
            O governo, portanto, é o órgão que criais com o vosso desejo, não é verdade? Isto é, o governo sois vós mesmos. O que sois, o governo é, — o que é um fato bem evidente no mundo. Detestais um de terminado país e elegeis um governo que apóie o vosso ódio. Tendes inclinações comunalistas, e criais um governo com o vosso ponto de vista comunalista, — o que, mais uma vez, representa um fato bem óbvio, sobre o qual não há necessidade de nos estendermos. Visto que o que sois o governo é, como podeis ter um “bom governo”? Só podeis ter um bom governo quando houverdes transformado a vós mesmos. Do contrário, o governo não passa de mera máquina administrativa, um grupo de pessoas que elegestes para vos darem aquilo que desejais. Dizeis que não desejais a guerra, mas nutris todas as causas geradoras da guerra, como o nacionalismo, o comunalismo, etc. Sendo esta a vossa condição, criais um governo, uma sociedade à vossa imagem e semelhança. E tendo criado esse governo, o governo, por sua vez vos explora. Temos, pois, um círculo vicioso. Só pode haver um governo “bom” — não quero chamá-lo “bom” — só pode haver um governo são, quando fordes sãos. Senhores, não estejais a sorrir. Isso é um fato; não somos sãos, não somos criaturas humanas racionais, puras. Estamos desequilibrados, e por isso os nossos governos são desequilibrados. Será que julgais, senhores, que, vendo o mundo inteiro avassalado pela aterradora catástrofe da guerra e a produção de máquinas de guerra, será que julgais que um homem são não deseja pôr termo a isso? Um homem são procura averiguar quais são as causas a guerra, em vez de dizer: “esta é minha pátria, e eu tenho de defendê-la” — o que é infantil e estúpido.
            Pois bem: uma das causas da guerra é a avidez — a avidez por serdes algo maior do que vós — a qual vos leva a identificar-vos com a nação. Dizeis “sou hinduísta”, sou “budista”, sou “cristão”, sou “russo”, isto ou aquilo. Esta é uma das causas da guerra. E um homem equilibrado diz: “Quero livrar-me dessa insana limitação, que leva sempre à destruição final”. Precisamos primeiro criar sanidade, e não um plano de um governo novo, ou disso que chamais “governo bom”, e para serdes sãos precisais saber o que sois, precisais tomar conhecimento de vós mesmos. Mas isso não vos interessa. O que vos interessa é agitar bandeiras, ouvir discursos ocos, ser estimulados. Tudo isso são sintomas de insanidade, e como podeis esperar um governo são, quando os cidadãos não estão inteiramente despertos, quando só estão semi-vigilantes e desequilibrados?
            Senhores, se estais confusos, vós criareis o chefe confuso e ouvireis a voz desse homem confuso. Se não estais confusos, se estais lúcidos, não esperais que o governo vos diga o que deveis fazer. Porque desejais um governo? Porque, não sabendo amar racionalmente, humanamente, precisais de alguém que vos diga o que deveis fazer; por essa razão multiplicam-se as leis — temos leis e mais leis, determinando o que devemos e o que não devemos fazer. A culpa, portanto, é vossa. Vós sois responsáveis pelo governo que tendes ou ides ter. Porque, a menos que vos transformeis radicalmente, o que sois o vosso governo é. Se tendes uma mentalidade comunalista, criareis um governo igual a vós. E que significa isso? Mais desordem, mais destruição.
            Nessas condições, só haverá uma sociedade sadia, um mundo sadio, quando vós, como parte da sociedade, do mundo, vos libertardes, isto é, vos tornardes sadios. E só haverá sanidade, se abandonardes a autoridade, se vos livrardes do espírito nacionalista, do espírito patriótico, se tratardes os entes humanos como entes humanos, e não como brâmanes ou como indivíduos pertencentes a qualquer outra casta ou nação. E é impossível tratar os entes humanos como entes humanos se lhes dais rótulos, se os designais por um termo, se lhes dais um nome, como “hindú”, “russo”, isso ou aquilo? É muito mais fácil pôr etiquetas nos outros, porque então podemos passar por eles e dar-lhes pontapés, ou lançar bombas sobre a Índia ou o Japão. Mas se não tendes rótulos, e ides ao encontro das pessoas simplesmente como seres humanos, que acontece então? Deveis estar muito despertos, ser muito sensatos, nas vossas relações com outro. Mas como não desejamos fazer isso, criamos um governo acomodado às nossas conveniências.

Krishnamurti – 15 de agosto de 1948 – Novo Avesso à Vida

Os governos são a expressão da violência


PERGUNTA: Porque meio podeis influenciar os chefes de um partido ou os membros de um governo e trabalhar através deles?

KRISHNAMURTI: Pela razão muito simples de que os chefes são fatores de degeneração na sociedade, e os governos são a expressão da violência. E como se pode, como pode qualquer homem que realmente deseja compreender a verdade, trabalhar por meio de instrumentos que são opostos à realidade? Ora, porque desejamos guias políticos ou religiosos? Pela razão muito clara que desejamos ser dirigidos, desejamos que nos digam o que devemos fazer ou o que devemos pensar. Nossa educação, nossas organizações sociais e religiosas estão baseadas nisso: elas não nos dizem como devemos pensar, mas o que devemos pensar. Em tais condições, naturalmente, tendes necessidade de guias, de chefes. Porque estais confusos, porque estais a desintegrar-vos, porque sofreis e não sabeis o que fazer, apelais para alguém, para guias políticos, religiosos, ou econômicos, para que vos ajudem a sair desta caótica condição de existência. Ora, pode qualquer guia, político ou religioso tirar-vos, desta miséria, desta confusão? Prestai atenção, por favor: temos aqui uma questão muito importante. Porque o posto de guia implica poder, posição, prestigio; o posto de guia implica exploração — tanto pelo que é guiado como pelo guia. Surge o guia porque os que são guiados querem ser guiados. Quer isso dizer que o seguidor explora o guia, e o guia explora o seguidor. Sem o seguidor, que é do guia? Vê-se frustrado, sente-se perdido. E sem guia, que é feito do seguidor? Temos, portanto, um processo de mútua exploração; e onde existe o desejo de poder, de posição, de domínio, de guia, não existe compreensão. Quando o guia se torna a autoridade, a pessoa que decide sobre todos os assuntos, políticos ou religiosos, então o seguidor se torna mero fonógrafo, mero autômato; e visto como a maioria das pessoas prefere repetir, prefere ficar vendo os guias agirem, o resultado é que nos tornamos improdutivos, incapazes de pensar. Foi isso, exatamente, o que aconteceu no mundo.
            Nosso problema, portanto, é: Porque necessitamos de guias ou chefes? Pode alguém conduzir-vos para fora da confusão, que vós mesmo estais criando? Outros poderão apontar-vos as causas de vossa confusão, mas ficai certos de que esses não se tornam guias. Eu, por exemplo, vos estou mostrando a causa da confusão, mas não estou com isso me tornando vosso guia nem vosso guru. Compete-vos percebê-la e proceder de acordo, ou deixá-la de lado. Se, porém, eu vos induzisse a entrar para uma organização, se me tornasse a vossa autoridade, nesse caso eu me tornaria importante; por conseguinte, a vossa confusão continuaria a existir, e estaríeis meramente a fugir da vossa confusão e a ligar muita importância à minha pessoa; mas é à vossa confusão que deveis ligar importância, e não a mim. Portanto, eu estou fora do jogo.
            O que tem importância é que compreendais o vosso próprio sofrimento, vossa própria confusão, vossa própria dor, e vossa própria existência desastrada. E, para compreender necessitais de alguém, seja quem for? O que precisais é observar com precisão, com clareza, com olhos não embaciados pelo preconceito. E isso deveis fazer por vós mesmo, deveis olhar para dentro de vós mesmo, para descobrir se tendes preconceitos. Quer isso dizer que deveis estar cônscio de vosso próprio processo, de vossas próprias idiossincrasias. Como em geral não nos mostramos dispostos a descobrir a nós mesmos e a examinar o processo do autoconhecimento, procuramos um guia — ou, antes, criamos um guia. O guia se torna, assim, importante, porque nos ajuda a fugir de nós mesmos. O guia pode ser adorado, guardado numa gaiola, e dele se pode murmurar. O guia, portanto, é na verdade um fator degenerativo. Positivamente, quando o indivíduo, quando uma sociedade, quando uma civilização apela para um guia, isso indica um estado de desintegração. Uma sociedade criadora não tem guia, porque, nela, cada indivíduo é uma luz para si mesmo. Uma sociedade assim é o resultado das relações entre pessoas que estão em busca de autoconhecimento e compreensão, profundos, fundamentais; e tais pessoas não têm necessidade de uma sociedade estática, com os seus guias ou chefes, com suas autoritárias organizações sociais.

Krishnamurti – Da Insatisfação à Felicidade – 29 de fevereiro de 1948

O governo é o que nós somos


PERGUNTA: Um homem que abomina a violência pode tomar parte no governo de um país?

            KRISHNAMURTI: Ora, que é governo? Afinal de contas, um governo é, um governo representa o que nós somos. Na chamada democracia, seja qual for a sua significação, nós elegemos, para nos representar, aqueles que são iguais a nós, aqueles de quem gostamos, que têm a voz mais forte, a mente mais inteligente, ou o que quer que seja. Assim, evidentemente, o governo é o que nós somos, não achais? E que somos nós? Somos uma massa de reações condicionadas — violência, avidez, aquisicionismo, inveja, volúpia de poder, etc. Naturalmente o governo é o que nós somos, isto é, a violência sob diferentes formas; e como pode um homem em cujo ser realmente não existe a violência, pertencer, quer em nome, quer de fato, a uma estrutura que é violenta? Pode a realidade coexistir com a violência, que é o que chamamos governo? Pode um homem que busca ou que experimenta a realidade ter qualquer coisa em comum com os governos soberanos, com o nacionalismo, com uma ideologia, com a política de partidos, com um sistema de poder? O homem pacífico pensa que, aderindo a um governo, estará habilitado a prestar algum serviço útil. Que acontece, quando ingressa no governo? A estrutura é tão poderosa que o absorve, e ele muito pouco pode fazer. Senhor, isso é um fato, a que assistimos hoje no mundo. Quando uma pessoa ingressa num partido, ou se candidata a uma eleição para o parlamento, ou que quer que seja, tem de aceitar o programa do partido. Por conseguinte, deixa de pensar. E como pode um homem que se entregou a um outro — a um partido, a um governo, ou a um guru — achar a realidade? E como pode aquele que busca a verdade ter qualquer relação com a política das potências?
            Vede, Senhores, fazemos tais perguntas, porque nos agrada depender da autoridade exterior, do ambiente, para a transformação de nós mesmos. Esperamos que os chefes, os governos, os partidos, os sistemas, os padrões de ação, de alguma maneira nos transformarão, de alguma maneira implantarão a ordem e a paz em nossas vidas. Esta é por certo a base de todas as perguntas deste gênero, não é verdade? Pode um outro, seja um governo, um guru, ou um demônio, dar-vos a paz e a ordem? Pode alguém trazer-vos felicidade e amor? De certo que não. A paz só pode nascer depois de perfeitamente compreendida a confusão que nós mesmos criamos, compreendida não no nível verbal, mas interiormente; depois de afastadas as causas da confusão e da luta, teremos sem dúvida a paz e a liberdade. Entretanto, sem cuidarmos de eliminar as causas, preferimos recorrer à autoridade externa, para que nos dê paz; e o exterior é sempre submergido pelo interior. Enquanto existir o conflito psicológico, a ânsia de poder, de posição, etc., qualquer que seja a estrutura exterior, por melhor que tenha sido edificada, por mais benéfica e ordeira que seja, sempre será dominada pela confusão interior. Por conseguinte, é óbvio que devemos dar toda a importância ao interior e não ficar na mera dependência do exterior.

Krishnamurti – 7 de março de 1948 – Da Insatisfação à Felicidade

Tendes o governo que desejais - então, porque reclamais?

Que se entende por "governo"? Pessoas investidas de autoridade, um pouco burocratas, membros de gabinete, o primeiro-ministro, etc. Isso é o governo? Quem o elege? Sois vós, não é verdade? Sois os responsáveis por ele, não é exato? Tendes o governo que desejais - então, porque reclamais?... Sois vós os responsáveis e não o governo, porque o governo é a projeção, o prolongamento de vós mesmos - os seus valores são os vossos valores... garanto que também quereis ser exploradores, na ocasião oportuna, e por isso sustentais este jogo... Senhores, deveria existir uma classe de pessoas independentes do governo, não pertencentes à sociedade, à margem da sociedade, — para atuarem como guias. Essas são os “açoitadores”, os profetas, que vos apontam vossos grandes erros. Mas não existe nenhum grupo desses, porque o governo, no mundo moderno, não pode apoiar um tal grupo, um grupo sem autoridade, que não pertence ao governo, que não pertence a nenhuma religião, casta ou nação. É só um grupo desses que pode atuar como um freio aos governos. Porque os governos se estão tornando cada vez mais prepotentes, pondo ao seu serviço uma maioria de seres humanos, e em conseqüência os cidadãos, em números cada vez maiores, se vão tornando incapazes de pensar por si mesmos. O governo os controla e lhes diz o que devem fazer. Assim, só quando existe um grupo daqueles, um grupo enérgico, inteligente, ativo, só então há esperança de salvação. De outro modo, todos nós vamos acabar como empregados do governo, e o governo mais e mais nos dirá o que devemos fazer, e nos ensinará o que pensar, e não a pensar.

Krishnamurti - A Arte da Libertação - página 94

Todos temos um político de tocaia em algum lugar da nossa mente

Qualquer um que seja capaz de fingir com convicção, que consiga ser hipócrita, se tornará seu líder político, se tornará seu sacerdote religiosamente. Tudo que ele precisa é de hipocrisia, tudo o que ele precisa é de dissimulação, tudo que ele precisa é de uma "fachada" para se esconder por trás. Os seus políticos vivem vidas duplas, os seus sacerdotes levam vida dupla — uma pela porta da frente, a outra pela porta dos fundos. E aquela vivida pela porta dos fundos é a vida real deles. Aqueles sorrisos pela porta da frente são pura falsidade, aquelas caras tão inocentes são puramente cultivadas.

Se você quiser ver a realidade do político, precisará olhá-lo pela porta dos fundos. Deste ângulo ele aparece na sua nudez, do jeito como ele é; e para o sacerdote a coisa é assim também. Esses dois tipos de pessoas dissimuladas têm dominado a humanidade. Muito cedo eles descobriram que, se você quer dominar a humanidade, deve torná-la fraca, fazê-la sentir-se culpada, não-merecedora. Destrua a sua dignidade, tire-lhe toda a glória, humilhe-a. E encontraram maneiras tão sutis de humilhar, que eles nem aparecem "na foto"; você mesmo fica encarregado de se humilhar, de se destruir. Eles lhe ensinaram uma forma de suicídio lento. Você reconhece este homem? Com exceção dos mais inocentes e sinceros de nós, todos temos um político de tocaia em algum lugar da nossa mente. De fato, a mente é política. É da sua própria natureza planejar, montar esquemas, e tentar manipular situações e pessoas de maneira a conseguir o que quer. Nesta carta, a mente é representada pela serpente recoberta de nuvens, que "fala com uma língua bífida". O que é importante perceber, porém, a propósito desta figura, é que ambas as caras são falsas. A face cândida, inocente, do tipo "confie em mim", é uma máscara, e a face diabólica, venenosa, do tipo "vou tirar vantagem de você", também não passa de uma máscara. Políticos não têm faces verdadeiras. Seu jogo é na totalidade uma mentira. Dê uma boa examinada em si mesmo para verificar se você tem estado fazendo esse jogo. O que você vai encontrar poderá ser doloroso de ver, mas não tão doloroso quanto continuar agindo igual. No final, esse jogo não serve ao interesse de ninguém, e muito menos ao seu. O que quer que você consiga por esse caminho, irá transformar-se em pó nas suas mãos.

Osho, The White Lotus Chapter 10

A política é apenas instrumento da exploração

Pergunta: De que maneira poderia um homem de estado que compreendesse o que o senhor está a dizer, dar-lhe expressão nos assuntos públicos? Ou não é mais provável que se retirasse da política quando compreendesse as suas falsas bases e objetivos?

Krishnamurti: Se ele compreendesse o que estou a dizer, não separaria a política da vida na sua totalidade; e não vejo porque deveria retirar-se. Afinal, a política atualmente é apenas o instrumento da exploração; mas se ele considerasse a vida como um todo, não só política – e por política ele quer dizer apenas o seu país, o seu povo, e a exploração de outros – e considerasse os problemas humanos não como nacionais mas como problemas do mundo, não como problemas americanos, hindus ou alemães, então, se ele compreendesse aquilo de que falo, seria um verdadeiro ser humano, não um político. E para mim, essa é a coisa mais importante, ser um ser humano, não um explorador, ou meramente um especialista num curso de ação específico. Tentei explicar isso ontem na minha palestra. Penso que é onde reside o mal. O político só lida com a política; o moralista com a moral, o chamado instrutor espiritual com o espírito, cada um pensando que ele é o especialista, e excluindo todos os outros. Toda a nossa estrutura de sociedade se baseia nisso, e portanto estes líderes dos vários departamentos geram maiores estragos e maior miséria. Ao passo que se nós como seres humanos víssemos a ligação íntima entre todos eles, entre políticos, religião, a vida econômica e social, se víssemos a ligação, então não pensaríamos e agiríamos separadamente, de maneira individualista.

Na Índia, por exemplo, há milhões de pessoas a morrer à fome. O Hindu que é nacionalista diz; “Vamos em primeiro lugar tornar-nos intensamente nacionais; então seremos capazes de resolver este problema da fome.” Ao passo que para mim, a maneira de resolver o problema da fome é não tornar-se nacionalista, mas antes pelo contrário; a fome é um problema mundial, e este processo de isolamento apenas incrementa mais a fome. Portanto se o político lidar com os problemas da vida humana apenas como um político, então esse homem cria maior devastação, maior mal, maior miséria. Mas se ele considerar o todo da vida sem diferenciação entre raças, nacionalidades e classes, então ele é verdadeiramente um ser humano, embora possa ser um político.

Krishnamurti - Ojai, California, 11ª Palestra - 30 de Junho de 1934.
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill