Pergunta: Os indivíduos não se acham desenvolvidos por maneira igual em
suas capacidades. Se um possuir a capacidade de verificar intelectualmente a
Verdade, porém for cativo, emocional ou fisicamente, dever-se-ia abster de
ajudar os outros a se aproximarem da libertação embora ele próprio ainda não se
houvesse liberto completamente?
Krishnamurti: Formulemos
esta pergunta por uma outra forma. Deverei eu, que não atingi ainda, ajudar a
outros no caminho do atingimento? Deverei impedir a outrem de cair e de ser
esmagado na mesma estrada enquanto que eu próprio ainda estou sobre essa
estrada? Deverei auxiliar a um homem que se encontre caminhando sobre a estrada
da vida a orientar-se para a mesma meta; e deverei estender-lhe a mão compassiva
ou deixa-lo sozinho? Perguntas tais demonstram que não tendes ideia da verdade
ou do significado do atingimento da libertação e felicidade. Imaginais que
essas coisas estão longe de vossos semelhantes, em qualquer reino distante,
junto do mar ou das montanhas. Por que razão imaginais vós que eu gasto meu
tempo pela forma em que o faço? Ser-me-ia muito mais fácil, estaria mais calmo
se fosse para a solidão, como o fez Lao Tse quando atingiu a libertação. Tenho sido
um viajor sobre a estrada da vida; e, pelo fato de haver transitado por essa
estrada da vida; e, pelo fato de haver transitado por essa estrada, sei que muitos
há que se encontram lutando e desejando ajuda-los. Sei muito bem que eles não atingiram
a meta. Se a houvessem atingidos, estariam em paz. Eu não me intrometo com
pessoa alguma, nem me esforço por convencer seja a quem for de minha mensagem,
de minha atitude, de minha autoridade; porém, dado o fato de se encontrarem os
homens encerrados em prisões de desgraça, em gaiolas de tristeza, em limitações
de dor, quiser liberta-los, ou antes, despertar neles o desejo de, por
completo, destruírem essas gaiolas por si mesmo. Isto é o que cada um de vós
necessita fazer — atingir, para depois ajudar. Não quer dizer que não devais ajudar enquanto
vos encontrais em processo de atingimento. Seria esta a maneira egoísta
de encarar a vida. Os homens têm construído muitos mosteiros no mundo, por amor
a seus vários instrutores, porém, nenhum ainda foi construído pelo amor à vida.
Jamais podereis construir mosteiros sobre a forte corrente da vida.
Pergunta: Como aprendermos a estar em amor com a vida se o não estivermos?
Como aprendermos a gostar de todas as espécies de experiências se dela não gostarmos?
Como aprendermos a não ter medo se o tivermos?
Krishnamurti: Em primeiro
lugar, por admitir essas coisas todas, por não tentar evita-las. A partir do
momento que reconheçais que tendes medo, começa ela a desaparecer. Porém,
enquanto disserdes, “eu expulsei todo o temor”, enganando-vos a vós mesmos,
estareis ainda colhidos nas garras do medo. A partir do momento que conheçais a
vós mesmos em todas as vossas fraquezas, tereis vencido. Não necessitais de
aprender a como estar em amor com a vida; a própria vida vos ensinará. Se não estiverdes
em amor com a vida, a vida vos tornará infelizes e vos obrigará a estar em amor
com ela, por meio da tristeza, pela dor, pela solidão, pelo convidar-vos a
penetrar em suas águas abertas, onde tereis que lutar. Esta é a maneira única de
estar em amor com a vida, e não o repetir meras palavras, depois de afivelar
uma máscara. Estas perguntas surgem pelo fato de vos contentardes em repetir as
minhas palavras. Fazeis de mim uma máscara que vos assenta mal.
Pergunta: Como é que se pode trazer o Reino da Felicidade à realização perfeita
no mundo dos negócios? Ou quem sabe se o Reino da Felicidade não significa,
necessariamente, felicidade nas atividades do plano mundano? Não deve ser este
ultimo antes transcendido que transformado pelos homens?
Krishnamurti: Não concordo
com essa sugestão. A felicidade, se não puder ser trazida até o físico, não vale
a pena de ser possuída. Que importância tem o serdes felizes depois que
houverdes morrido? Quando compreenderdes o que significa a felicidade real,
pode ela ser alcançada neste momento e neste lugar, nas atividades diárias do
nosso mundo físico. Dado o fato de separardes o espirito da matéria, imaginais
que o espirito habita em qualquer local desconhecido, onde também deve estar a consumação
da felicidade. Se, porém, a felicidade de que falo somente existisse no reino
puramente do espirito e não pudesse ser realizada neste mundo, não seria digna
de ser possuída. Digo que, se ela for adequadamente compreendida, pode ser
imediatamente atingida. Se imaginardes que a felicidade só pode ser atingida na
esfera onde mora o espírito, negligenciareis e evitareis o físico. Podeis ver o
resultado disto na Índia, onde, na busca do que é espiritual, se tem ignorado o
que é material. Esta felicidade da qual falo tem de transformar o mundo, e não de
se encontrar pelo transcender o mundo. Enquanto a vida for mantida em
cativeiro, as expressões dessa vida serão imperfeitas.
Pergunta: Que passos sugeriríeis eu desce afim de encontrar o caminho
para minha alma, afim de que pudesse começar a viver em mais íntimo contato com
o Espírito Eterno?
Krishnamurti: Viver. Pelo
defrontar dos acontecimentos — não pelo tentar evita-los, não pelo buscar os
falsos e evanescentes confortos. Imaginais que a eternidade está oculta em
qualquer lugar distante; ao passo que ela está dentro de vós mesmos e em tudo
que vos rodeia. É pelo conservar o eterno dentro de vosso coração que o
presente se torna como o perfume de uma rosa.
Krishnamurti, 1930