A consciência humana é semelhante
em todos os homens... É formada de muitas camadas de medo, ansiedades,
prazeres, pesares e todas as formas de fé. De vez em quando, talvez, nessa
consciência há também o amor, a compaixão e, nessa compaixão, uma espécie
completamente diferente de inteligência. E há sempre o medo do término, da
morte. Os seres humanos, no mundo todo, desde os tempos imemoriais, têm tentado
descobrir se há alguma coisa sagrada além de todo o pensamento, alguma coisa
que seja incorruptível e intemporal.
Existem as várias consciências
grupais; os homens de negócios com suas consciências, os cientistas com as suas
e o carpinteiro com a sua; elas pertencem ao conteúdo da consciência e são
produto do pensamento. O pensamento criou coisas maravilhosas, da
extraordinária tecnologia dos computadores à telecomunicação, aos robôs, à cirurgia
e à medicina. O pensamento inventou as religiões; todas as organizações
religiosas de todo mundo são formadas pelo pensamento. (1)
(...) O pensamento inventou o
computador, mas o pensamento humano é limitado e a inteligência mecânica do
computador está superando a inteligência do homem... Nós seres humanos, fomos “programados” biologicamente,
intelectualmente, emocionalmente, psicologicamente, durante milhares de anos, e
repetimos o padrão do programa reiteradamente. Nós paramos de aprender e
devemos indagar se o cérebro humano, que foi programado durante tantos séculos,
será capaz de aprender e transformar-se imediatamente numa dimensão totalmente
diferente. Se não formos capazes disso, o computador, que é muito mais capaz,
rápido e exato, irá assumir o comando das atividades do cérebro. (2)
(...) A nossa consciência foi programada
durante milhares e milhares de anos para pensar em nós como indivíduos, como
entidade separada, lutando, em conflito desde o momento em que nascemos até a
morte. Somos programados para isso. Nunca o constatamos, nunca perguntamos se é
possível ter uma vida absolutamente sem conflito. Como nunca perguntamos, nunca
aprenderemos. Repetimos. É inato em nossa existência o estar em conflito — a
natureza está em conflito, esse é o nosso argumento — e pensamos que o
progresso somente se faz através do conflito. As organizações religiosas, em
toda a história, mantiveram a ideia de salvação individual. Estamos perguntando
muito seriamente se há uma consciência individual, se vocês, como seres
humanos, têm uma consciência separada do resto da humanidade. Vocês têm que
responder a isso, não apenas brincar com isso.
Tendo sido educados, programados,
condicionados para sermos indivíduos, então a nossa consciência é toda essa
atividade do pensamento. O medo e a perseguição ao prazer são os movimentos do
pensamento. O sofrimento, a ansiedade, a incerteza e os profundos
arrependimentos, ferimentos, o peso de séculos de pesares, tudo faz parte do
pensamento. O pensamento é responsável pelo que chamamos de amor, que se tornou prazer sensual, algo a ser
desejado. (3)
(...) O pensamento criou os
problemas que nos cercam, e os nossos cérebros são treinados, educados,
condicionados para a solução dos problemas. O pensamento criou os problemas,
como a divisão entre nacionalidades. O pensamento criou a divisão e o conflito
entre as várias estruturas econômicas; o pensamento criou as várias religiões e
divisões entre elas e, por conseguinte, há conflito. O cérebro é treinado para
tentar solucionar esses conflitos que o pensamento criou. É essencial que entendamos
profundamente a natureza do nosso pensar, a natureza das reações que surgem do
nosso pensar. O pensamento domina nossas vidas, não importa o que façamos; seja
qual for a ação que se realize, o pensamento está por trás dessa ação.
(...) O pensamento é um movimento
no tempo e no espaço. O pensamento é memória, lembrança das coisas passadas. O
pensamento é a atividade do conhecimento, conhecimento que foi acumulado
durante milhões de anos e armazenado como memória no cérebro. Se vocês
observarem a atividade do nosso pensar, verão que a experiência e o
conhecimento constituem a base da nossa vida. O conhecimento nunca está
completo: ele caminha sempre com a ignorância. Achamos que o conhecimento
solucionará os nossos problemas, seja o conhecimento do sacerdote, do guru, do
cientista, do filósofo ou do mais recente psiquiatra da moda. Mas nunca
questionamos se o conhecimento em si pode solucionar quaisquer dos nossos
problemas — exceto, talvez, os problemas tecnológicos.
O conhecimento vem com o tempo.
Para aprender uma língua, vocês precisam do tempo. Aprender uma habilidade ou
dirigir um carro com eficiência leva tempo. O mesmo movimento do tempo é
convertido para o campo psicológico; aí, também dizemos: “Tenho que ter tempo
para aprender a meu respeito”; “tenho que ter tempo a fim de mudar ‘aquilo que sou’ para ‘aquilo que devo ser’”. Converter a
atividade do mundo externo ao mundo psicológico significa que o tempo é um
grande fator em nossa vida — o futuro, o passado e o presente. O tempo é
pensamento. O tempo é necessário para a aquisição do conhecimento pela
experiência, tanto ao mundo externo quanto interiormente. Foi assim que fomos programados.
Sendo assim programados, pensamos que o tempo é necessário para
produzir uma mudança profunda e fundamental na estrutura humana. Nós usamos
o tempo como pensamento — “eu sou isto, devo ser aquilo”. Vocês também diriam
no mundo técnico: “não sei como construir um computador, mas vou aprender”. Tempo, conhecimento, memória, pensamento
são uma única unidade; não são atividades separadas, mas um único
movimento. O pensamento, o resultado do conhecimento, é eternamente incompleto
e, por conseguinte, limitado, porque o conhecimento é incompleto. Tudo quanto é
limitado deve produzir conflito. A nacionalidade é limitada. A crença religiosa
é limitada. Toda experiência deve ser limitada. (4)
Fonte: Krishnamurti, em:
(1) A rede do pensamento – pág. 17
(2) A rede do pensamento – pág. 18
(3) A rede do pensamento – pág. 19
(4) A rede do pensamento – pág. 20-21-22