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quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

A busca espiritual

Pergunta a Osho:
O que significa ser um buscador espiritual?

Em primeiro lugar, significa duas coisas. Uma, que a vida tal como é conhecida exteriormente não é completa; a vida tal como é conhecida de fora não tem sentido.

No momento em que alguém se torna alerta para o fato de que toda essa vida é uma coisa sem sentido, a busca se inicia.

Essa é a parte negativa, mas a não ser que essa parte negativa esteja presente, a positiva não pode vir.

A busca espiritual significa, em primeiro lugar, um sentimento negativo: um sentimento de que a vida, tal como ela é, não tem sentido.

Todo o processo acaba na morte: pó sobre pó. Nada permanece conclusivo em si mesmo. Você passa pela vida em tal agonia, em tamanho inferno, e nada conclusivo é alcançado.

Esse é o lado negativo da busca espiritual. A própria vida o auxilia a chegar a ele. Esse lado — essa negatividade, essa angústia, essa frustração — é a parte que o mundo está fazendo.

Quando você se torna realmente alerta para o fato da insignificância da vida tal como é vivida, sua busca comumente começa, porque você não pode ficar tranquilo com uma vida sem sentido.

Com uma vida sem sentido, um abismo é criado entre você e tudo o que a vida é. Uma brecha intransponível cresce, tornando-se mais e mais larga. Você se sente desamparado.

Então, a busca por alguma coisa significativa, feliz, é iniciada. Essa é a segunda parte, a parte positiva.

Busca espiritual significa chegar a um acordo com a realidade atual, não com uma projeção sonhadora. Toda a nossa vida é apenas uma projeção, sonhos projetados. Ela não existe para conhecer o que é; existe para se obter o que é desejado.

Você pode tomar a palavra "desejo" como um símbolo do que nós chamamos de vida. A vida é uma projeção dos desejos: você não está à procura do que é; está à procura do que é desejado.

Você continua desejando e a vida continua sendo frustrante porque ela é como é. Ela não pode ser como você quer. Você fica desiludido. Não porque a realidade seja antagônica a você, mas sim porque você não está em sintonia com a realidade, apenas com seus sonhos.

Seus sonhos têm uma desilusão que o arruínam. Enquanto você está sonhando, tudo está certo; mas quando qualquer sonho é alcançado, tudo se torna desilusão.

Busca espiritual significa conhecer essa parte negativa: esse desejar é a raiz causal da frustração.

Desejar é criar um inferno por livre e espontânea vontade. Desejar é estar no mundo: ser mundano é desejar e continuar desejando, sem nunca tornar-se alerta de que cada desejo não dá em nada além de frustrações. Uma vez que você se torna alerta para isso, então não mais deseja.

Ou seu único desejo é conhecer o que realmente é. Nesse momento, você decide: "Não continuarei projetando a mim mesmo, conhecerei o que é. Não porque devo ser desse modo e a realidade deva ser daquele outro modo, mas apenas por isto: quero conhecer a realidade seja ela qual for — nua como ela é. Não projetarei, não entrarei nisso. Quero encontrar a vida como ela é".

Positivamente, busca espiritual significa encontrar a existência tal como ela é, sem qualquer desejo. No momento em que não houver nenhum desejo, o mecanismo de projeção não estará mais funcionando. Então, você poderá ver o que é.

Uma vez conhecido, este "o que é" — aquele que é — lhe dará tudo.

O desejo sempre promete e nunca dá. Os desejos sempre prometem felicidade, êxtase, mas isso nunca vem. Cada desejo dá em troca apenas mais desejos. Cada desejo cria em seu lugar apenas desejos ainda maiores e mais frustrantes.

Uma mente não-desejosa é aquela que está engajada na busca espiritual. Um buscador espiritual é aquele que está completamente alerta para o absurdo do desejo e está pronto para conhecer o que é.

Quando a pessoa está pronta para conhecer o que é, a realidade aparece por todos os cantos, por todos os lados.

Mas você nunca está presente. Você está em seus desejos, no futuro. A realidade está sempre no presente — aqui e agora —, mas você nunca está no presente. Está sempre no futuro: nos desejos, nos sonhos. Você está adormecido nos seus sonhos, nos seus desejos. E a realidade está aqui e agora.

Quando esse sonho for interrompido e você estiver acordado para a realidade que está aqui e agora, no presente, haverá um renascimento. Você chegará ao êxtase, à satisfação, a tudo o que sempre foi desejado e nunca alcançado.

Osho, em "Eu Sou a Porta"

Áudio: Diálogo sobre o medo da solidão e do abandono


 
Out: É o medo do desamparo.
 
DP: É o medo de caminha sozinho, é isso?
 
Out: Que começa… Qual que é o primeiro medo da criança? Não é quando os pais saem de perto? Você já viu uma criança quando os pais perdem ela, no supermercado, o estado de pânico… Ela nem ouve! Você está tentando silenciar, acalmar ela, ela nem ouve. Então, eu acho que esse profundo medo de ficar só com a realidade que somos, ou que pensamos ser, é que impede de a gente entrar em contato com a Realidade que somos… Esse medo de ficar com a realidade que pensamos ser, é que impede de a gente entrar em contato com a Realidade que somos
 
DP: Que realmente somos, não é?
 
Out: … Que não deve ter nada de solidão, de medo, que não deve ter nada de insegurança, que não deve ter nada de não criatividade, de não criativo…
 
DP: De super-criativo!
 
Out: Enquanto que essa realidade que nós pensamos ser… “Eu sou o Marcão”; “Eu sou o Nelson”, não é? Ela é só imitativa; ela não tem nada de criativo; ela não tem nada de liberdade; ela é medo puro. Então, o “outro” olhar pra você, para o que você está falando, se o cara tem um pouquinho de visão, eles está vendo aquilo que você não está falando por trás do que você está falando.
 
DP: Emitindo a energia…
 
Out: Ele está percebendo tudo! Ele está fazendo uma leitura psíquica enquanto você está falando um monte de coisa. Eu me lembro de uma frase, que eu acho muito interessante: “Aquilo que você é, grita tão alto, que eu não consigo escutar aquilo que você está falando.”…
 
DP: Olha que legal! Como é que é? Ah! Eu vou marcar isso ai!
 
Out:  Depois eu te mando por e-mail!
 
DP: Aquilo que você é…
 
Out: “Aquilo que você é, grita tão alto, que eu não consigo escutar aquilo que você está falando.”… Então, por exemplo, do mesmo modo que hoje você senta com uma pessoa e, em cinco minutos que ela está falando, você já vê, não é?
 
DP: Ele também vê, também?
 
Out: Aquele que está usando o sistema…
 
DP: Ele vê também isso com a gente? Não é isso?
 
Out: Aquele que funciona na base do sistema, que já tem uma visão do sistema, ele usa o medo, porque ele está vendo que você ainda é suscetível ao medo; e cria a influência.
 
DP: Ele influencia você!
 
Out: Então assim, pra mim, a questão básica é: medo da solidão e do desamparo… O medo da solidão e do desamparo, faz a gente é… manter contatos dependentes, que nos limitam; não contatos que “nos empurram para o Ser que somos”; que nos desafiam à “excelência do Ser que somos”. Agora, quando você, está cansado disso e fala: “Não! Eu vou sentar com a minha solidão; eu vou sentar com esse meu medo,  eu vou olhar ele”, a primeira coisa, essas pessoas que não estão afim disso já te descartam, não é? Eles já vão te rotular de “mala”, de “chato”, de “depressivo”, de qualquer coisa… Menos de alguém sério, que está realmente afim de ver a essência do sofrimento humano, superar isso e trazer uma resposta, trazer algum apontamento; ele não pode trazer a resposta para o outro mas, pode trazer um apontamento… “Eu vi; venci o mundo; venci a rede do pensamento condicionado e estou aí! Alguém quer conversar comigo?”… Se a gente conseguir sentar com isso — com essa solidão, com esse medo de fazer frente à solidão; se a gente compreender esse medo e essa solidão — há como a gente transcender isso! Se transcender isso… “Cumpadre!”… Qual vai ser o problema?
 
DP: Tem que transcender, então… A chave, então está em transcender o medo e a solidão, não é? Medo e solidão…
 
Out:  Mas, porque, esse medo e essa solidão, estão baseados numa identificação corpórea, numa identificação de espaço-tempo… “Eu vou ficar sozinho!”… Está no futuro!… “Eu vou ter provações!”… Corpo físico que está falando. Agora, se nessa observação, você sair dessa ilusória identificação com isso que você pensa ser — que está preso na dimensão do tempo e espaço — se a gente chegar numa percepção — não intelectual, como estamos tendo aqui —… E que não tem problema nenhum, porque, quando o ser humano nasce, o que sai primeiro é a cabeça, depois é que passa o coração… Então, não tem problema nenhum a gente estar tendo essa identificação intelectualmente. Se a gente compreender isso, e ter uma experiência da Realidade que somos, que é atemporal e que é imaterial, que vence a ideia de morte… Que é isso que o filme “Matrix”, quando o personagem Neo, toma aquelas balas no peito, e pensa que morreu… E ai ele vê a ilusão…
 
DP: Que é a morte!… É uma baita ilusão, não é?
 
Out: Se você tiver isso, se tiver essa percepção toda, aonde que você pode ser um prisioneiro?  Aonde que você pode ser controlado? Aonde que você pode ser iludido, aonde que você pode ser iludo por essas influências externas?… Ai, se você tiver toda essa percepção, você não vai ter “algo novo, original e autêntico?”… Se você tiver algo realmente original, autêntico, você acha que você vai ter privação?
 
DP: de nada, não é?
 
Out: Porque, do mesmo jeito, que a rede do pensamento é “uma rede”, que está ai…  Eu estou conversando aqui com você, mas não estamos vendo sinal de celular, de tv, mas está aqui!… Se você tiver uma antena poderosa, você pega o sinal. Então, do mesmo jeito que tem essa rede emitindo sinais de condicionamento, também tem uma rede de consciência.
 
DP: Ela também está aqui, não é?
 
Out: Então, quem estiver nessa rede de consciência, vai ficar consciente… “Tem um cara, que deram o nome de ‘Marcão’, lá no Brasil, que acessou alguma coisa diferente e está falando alguma coisa diferente!”
 
DP: Vamos lá procurar o cara; mas vamos lá buscar ele!
 
Out: Do mesmo jeito que a gente tomou consciência de Nietzsche, Osho, Krishnamurti, Ramana Maharshi, Nisagardata, não é?…
 
DP: Como é que esses caras vieram parar na nossa mão? Isso é que eu fico imaginando!
 
Out: Porque, essa consciência que somos, nos levou a um estado onde você recebe a informação dessas consciências; ou “Dessa Consciência” através dessas entidades ai.  Então, eu percebo, o grande medo que o pensamento cria de você olhar para essa solidão, olhar para essas dependências, para todas essas formas de dependências que estão ai dentro e que a gente tenta desesperadamente não ver, e não deixar também que os outros vejam que nós temos.  
 
DP: tenta esconder, não é?
 
Out: É! Então assim, se a gente superar o medo de primeiramente olhar, por nós mesmos; se a gente conseguir ver por nós mesmos, que é o que mostra o filme “Batman Begins”… “Olha! Desce na caverna do Ser que você é, sozinho, e vê os seus medos!”
 
DP: Vê o medo, o medo que ele tem lá dos morcegos!
Out: Do morcego!… Olha pra isso!… O interessante, é que o morcego, é um ser que vive de “sugar”…  
 
DP: É!
 
Out: Então, você vê: é uma representação fantástica de como nossos medos “sugam a energia vital”… Se a gente conseguir fazer esse mergulho no Ser que somos, sair dos medos do “eu” para o mergulho no “Ser que somos”… Acabou, cumpadre!… Você vai ter uma mensagem!… Vai ser revelada a mensagem que você tem!… O sopro que você tem!…
 
DP: Que é teu, não é?
 
Out: Que não é seu!…  Que é dessa Consciência que você é!
 
DP: Que vêm através de você de maneira diferente, não é?
 
Out: Esse “você”, não vai mais existir!
 
DP: Entendi! Não tem mais o “você”…
 
Out: Porque, a grande ilusão, é que nós ainda estamos identificados com essa “entidade buscadora”…
 
DP: Porque a gente é um só, digamos assim?
Out: Mais ou menos isso! A gente ainda acredita no próprio esforço, no que eu tenho que fazer… Você não chegou aqui e disse: “Nelsão, eu vou fazer um ano de retiro de silêncio!”… Você já pensou o esforço que é ficar um ano em silêncio?… Então é uma outra — pra mim — é uma outra ideia do pensamento descentralizante, para tirar você do centro de onde você está, físico, criando a ideia que fora desse centro físico que você está, possa chegar à um centro psíquico… Porra! Por que que eu não posso entrar, me centralizar aqui dentro desse “centro descentralizado”? (risos)
 
DP: Você acha que tem essa possibilidade!
 
Out: É fato! Esse centro aqui está descentralizado, mas, por que eu não posso ficar no meio desse centro descentralizado, centrado? Porque, senão, eu continuo dependente de lugares aonde eu possa me centralizar.
 
DP: Entendi! É outra dependência, não é?
 
Out: É uma outra dependência!… Então assim, para mim, é momento, está sendo momento de “olhar”… Olhar de forma minuciosa…
 
DP: Profundamente!
 
Out: Profundamente e destemida… Todos os auto-enganos que eu criei, até aqui, todas as ilusões com que me identifiquei, todos os desacertos e ver… E deixar que a percepção disso… Encaminhe os acontecimentos, sem ter…
 
DP: Influências, vamos dizer assim?
 
Out:… Do próprio observador escolhendo. Entendeu?
 
DP: Entendi!… Ficar meio que no vazio, vamos dizer assim!
 
Out:… Vamos ver no que vai dar!
 
DP: O ego não quer isso, não é? É engraçado!
 
Out: Vamos ver no que é que vai dar!… O que vai dar disso!… Mas não negar nada!
 
DP: Não negar nada?
 
Out: Não negar nada!… Eu vou te mandar um áudio de ontem; a reunião de ontem… Nossa! Foi fantástica! Ontem, o tema que nós estudamos foi… É… “Não tente disfarçar a sua falta de sanidade”… Porque é assim: não tenta disfarçar que você ama… Você não ama!… Não adianta, cara!… Você é um puta cara egoísta, interesseiro…. — que nem eu —… Quando eu falo “você”, estou falando a entidade nossa, tá? A entidade que nós pensamos ser… Ela é mesquinha, interesseira, gananciosa, calculista, fria, ressentida, não é?… Envergonhada, complexada… É tudo isso!… Sagaz, vingativa, retalhadora… A gente tem que olhar a realidade do “freguês”… Se a gente conseguir ver toda a realidade do “freguês”, quem sabe, entre em contato com esse que está vendo a realidade do “freguês”… E o “freguês”…. Se dissolva!
 
DP: Entendi! Ai não vai ter mais isso, não é?
 
Out: Não sei se vai ter, mas, o fato, é que aqui tem!… Eu te pergunto: quem você ama?
 
DP: Eu não sei o que é isso! Na realidade a gente não sabe.
 
Out:… Nem à você mesmo! Você olha no espelho e tem vergonha de você! Você tem raiva das próprias limitações!… Porra! Se tem isso comigo mesmo, como eu possa saber isso no externo?… Com quem você tem uma autêntica, uma genuína intimidade? Ou seja, não esconde nada, nada?… Eu não tenho isso com minha esposa!… Tem sempre, algumas arestas…
 
DP: Que não pode falar!
 
Out:… Que eu tenho medo de falar!… Porque eu tenho medo do abandono; eu tenho medo da solidão; eu tenho da incompreensão… Então, esse medo do abandono e da solidão, fazem com que eu não seja 100%… Autêntico!…
 
DP: Sincero!
 
Out: Sincero: sim! Sou assim!… Sincero! Não é? Sim: eu sou assim!… Assim! tem algo em mim que está me mostrando que eu sou assim e eu sinto que… Mas há o medo… Então, a gente não sabe o que é o amor; não sabe o que é intimidade; não sabe o que é liberdade!… Como é que eu posso saber o que é liberdade se eu não consigo ser sincero?… Se eu não consigo ser autêntico, original?… Se eu não sei o que é amorosidade, não sei o que é liberdade, como é que eu posso saber o que é “criatividade”?… E, se eu não sei o que é criatividade, como eu posso ser feliz?… De que jeito?… Percebe?… Então é assim: meu momento, o momento que atravesso, é esse momento de olhar tudo, cara! Olhar, olhar! E dói olhar! Dói olhar o ego, porque o ego investiu tanto tempo nessa imagem dele, que ele não quer ver o Real. Não quer ver o monte de auto-ilusão, não é? De quanto ele se adulterou e de quanta gente ele adulterou; quantas pessoas também sofrem do processo de adulteração, porque ele botou o dedinho ali? Entendeu? Então, o momento é um momento que por vezes, é doloroso você pegar e ficar olhando, realmente, como é. Mas, e se não olhar isso?… O que não sai da sombra e é trazido à luz… O que você nega, não tem como ser transcendido! E ai eu percebo que a mente — o mecanismo dela —, é de também descentralizar você dessa observação, através de outras influências até tidas como “espirituais”.
 
DP: O que, por exemplo?
 
Out: Um retiro de um ano em silêncio!
 
DP: Também isso é uma grande armadilha? A mente arma armadilhas, não é isso?
 
Out: Entendeu? Um exemplo; estou usando isso como um exemplo. Eu não sou ninguém para dizer pra você…
 
DP: A própria mente está usando isso; isso que é difícil!
 
Out: Porque dá dor!… Meu! Presta atenção! está tudo ai e ninguém vê!… Você viu como a influência externa do personagem “Morpheus”, com o personagem “Neo”: “Quando você ver um Smith, saia correndo!… Saia correndo!”… Ele olhou para o Morpheus; ele tinha o Morpheus como uma autoridade psicológica e ele acreditou! Saiu correndo!… É o que o pensamento, o intelecto — porque o Morpheus é o intelecto!
 
DP: Sim!… É brincadeira! A rede do pensamento! (risos ao constatar a entrada dada por outras mulheres)…
 
Out: O Morpheus é o intelecto!… O intelecto diz para você: saia correndo! Saia correndo pro livro; saia correndo para uma escola mística; saia correndo para um grupo; saia correndo para um site; saia correndo para a prostituição; pro ganhar dinheiro; saia correndo, saia correndo!… Então, você percebe que o Neo, só…
 
DP: Conseguiu a coisa…
 
Out: Quando ele chegou num beco sem saída!
 
DP: E tomou uns tiros, não é?
 
Out: Quando ele chegou num beco sem saída!…Não tem mais pra onde correr!… Aí, o próprio pensamento vai matar uma ideia ilusória do Neo… Então, o pensamento acaba se suicidando… Porque quando o próprio pensamento, olha o “freguês”, tem uma percepção da sua ilusão, dessa identidade que ele acredita que fica no tempo-espaço…
 
DP: Estou entendendo!… Ele entra no Eterno, não é?
 
Out:… E ai não tem mais esforço para as investidas do pensamento! Não precisa mais sair correndo!… Ele começa a ver tudo “fora do tempo”…
 
DP: Fica devagar, engaçado, não é?
 
Out: Não tem mais tempo!
 
DP: Não tem mais tempo! Acaba o tempo!
 
Out: Então ele consegue “perceber”… Lembra que ele olha assim, até com uma cara meio abobada, assim, a loucura e o desespero do “Smith”, da rede do pensamento… Ai ele vai no centro — na natureza exata — do pensamento, entra lá e destrói por dentro da natureza exata, a rede do pensamento… E ele… Então assim: eu percebo que eu cheguei num momento, que não tem mais para onde correr, tá? Porque é até uma percepção de como todo conhecimento — e eu sei que há um conhecimento aqui —…
 
DP: Há o que? Há um conhecimento?
 
Out: Que há, “há” um conhecimento aqui dentro!… Foi lido muito, foi pesquisado muito, não é?… Há uma percepção que não adianta nem mais correr para o conhecimento…
 
DP: Para o conhecido, não é?
 
Out: Porque ele é profundamente limitado. Mesmo todo esse conhecimento não está conseguindo deter esse estado de solidão, ao estado de insatisfação, ao estado de crise de identidade, porque há uma, há um espaço entre observador e coisa observada.  Então, está num momento de ficar parado e observar. E o que vai dar? Não sei o que vai dar!… Então, tem hora que vem um medo, que vem uma carga de adrenalina tão grande, assim, vem uma ansiedade, da incerteza do que essa observação total que está ocorrendo, aonde ela pode levar… Que é o que o lado do personagem “Cypher”, lá… “Olha, eu não quero, eu quero que você me faça um cara famoso, com bastante dinheiro e que eu não lembre de mais nada!”…Lembra? Dele conversando com o Smith?… Tem hora que vem aquele sentimento: “Não, não, pera ai! Mas, eu vou me desintegra?… E se eu perder tudo o que eu tenho?… E se eu ficar sozinho?… O que é que vão pensar de mim?… O que é que as pessoas vão dizer?”… Entendeu? Então assim: você fica aqui e fica vendo tudo isso!… Todo ataque dos Smiths… Você lembra que no início, o ataque dos Smith, eram só dois… (a lógica e a razão?)…  
 
DP: Depois veio um monte!
 
Out: Lembra disso? Lembra do segundo filme como que era?
 
DP: Lembro!
 
Out: Então é assim: tem dia que eu tenho Smith por tudo quanto é lado! tem dia que a rede do pensamento condicionado não dá trégua; fica se transvestindo muito rápido! Não é? Mas, com aquela consciência de que não adianta mais sair correndo…. Senta ai e ! (aquieta-te e sabe!)… Derrete se tiver que derreter!… Observa!… Sente tudo! Sente tudo!
 
Se eu for conversar com quem não é “iniciado” nisso — nesse processo de observação — eles vão falar que eu sou é…
 
DP: Paranoico!
 
Out: Não é paranoia! Como é que fala quando o cara gosta de sofrer?
 
DP: Auto-depressivo?
 
Out: Não! Masoquismo!… Esse cara é um louco! Isso é masoquismo!… Não, não é masoquismo!… Você não vê os “Titãs” com aquela música “Não fuja da dor… fugir da dor, é fugir da própria cura”… Meu! Não foge! Não foge do seu processo de “crucificação”… É tudo arquetípico, cara!… Tem caído cada ficha!… Meu! Eu não sei se teve um Jesus crucificado ou não, mas aquilo para mim é um arquétipo, de que você saiu tanto da horizontalidade, que você está com os pés e as mãos presas para não sair correndo e ficar só observando tudo… Se você conseguiu ficar preso, sem fugir, quem sabe, você tenha uma ressurreição ai!
DP: Sem fugir da dor, não é?
 
Out: Talvez, aquilo que você “pensa ser”, morre, e aquilo que você realmente é…
 
DP: Nasça!
 
Out: …Ressurge pelo espírito da observação!…
 
DP: Que é a observação profunda, não é Nelsão?
 
Out: Ai, com quem que você vai conversar isso?                          
 

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Tudo o que você tem a fazer é observar

Meditação, em resumo, é colocar a mente de lado. Por isso as pessoas que dizem que meditação é uma disciplina da mente estão absolutamente erradas. Não é uma disciplina da mente, porque, se você disciplinar a mente, ela se tornará mais forte. É melhor colocá-la de lado quando ela está mais fraca, indisciplinada. Uma vez que esteja disciplinada, ela vai lhe dar um combate duro.

Assim, é mais fácil para alguém que tem praticado concentração, porque concentração é um fenômeno mental. Sim, ela lhe dá uma mente melhor, uma mente disciplinada, mais penetrante. Mas colocar de lado essa mente será muito difícil. Primeiro você lhe deu força, deu-lhe certa cristalização. Concentração não é meditação, pois concentração é uma disciplina da mente, e meditação é colocar a mente de lado.

Na verdade, o termo inglês meditation não é a palavra certa, porque no Ocidente algo como meditação nem mesmo aconteceu. A palavra sânscrita é dhyana. O problema era o mesmo quando os monges budistas foram à China; eles não conseguiram encontrar a palavra adequada para traduzir dhyana para o chinês, então escreveram dhyana, que para o chinês soava como zana. Por isso o zen japonês é uma transfiguração da palavra dhyana.

A palavra meditação dá a ideia errada, como se você estivesse meditando sobre alguma coisa, como se fosse uma atividade não muito diferente de concentração. Você está se concentrando em alguma coisa, está meditando em alguma coisa, mas está sempre preocupado com alguma coisa. E dhyana é abandonar todos os objetos, abandonar qualquer coisa sobre o qual você possa se concentrar, contemplar, meditar; abandonando tudo, não resta nada, apenas aquele que estava se concentrando, apenas aquele que estava contemplando. Essa consciência pura é dhyana.

Em inglês, não há nenhuma palavra adequada, por isso você tem de entender que estamos usando meditação por dhyana. Dhyana significa um estado de ser em que não há nenhum pensamento, nenhum objeto, nenhum sonho, nenhum desejo, nada, apenas o vazio. Nesse vazio, você chega a se conhecer. Você descobre a verdade. Você descobre a subjetividade. É um silêncio perfeito.

Há métodos para se colocar a mente de lado, assim como há métodos para disciplinar a mente. Mas, no Ocidente, e mais ainda nos Estados Unidos, — porque, se o Ocidente é ruim, os estados Unidos são piores —, todos os livros que são best-sellers nos Estados Unidos de alguma forma dizem respeito a como aumentar a sua força de vontade, como influenciar pessoas e ganhar amigos, como ficar rico, colocando a mente acima da matéria… mas todos eles estão falando sobre a disciplina da mente (estive olhando esses livros, não agora, há quatro anos eu não toco num livro).

Certamente, se você disciplinar a mente, você é um competidor melhor, pode satisfazer a sua ambição mais facilmente, pode manipular as pessoas mais facilmente, explorar as pessoas mais facilmente. Você pode usar os outros como um meio para o seu fim. Friedrich Nietzsche escreveu um livro chamado A Vontade de Poder. Essa é a própria essência de todo o esforço ocidental: vontade de poder. Para obtê-la, é necessário primeiro que você tenha força de vontade, e força de vontade é um outro nome para a sua mente disciplinada, cristalizada.

Não, esses métodos não servirão. Você tem de aprender métodos para colocar a mente de lado. Ela já é poderosa demais; não a torne mais poderosa, porque você está alimentando o seu próprio inimigo. Ela já está cristalizada; a sua escola, a sua faculdade, a sua universidade, todas elas estão fazendo isso. Depois de permanecer nove anos como professor de universidade, eu me demiti. Falei ao vice-reitor: “Não posso fazer esse trabalho, porque isso está destruindo as pessoas”. Ele disse: “O que você quer dizer com destruir pessoas? Os alunos adoram você, eles não permitirão que você se vá. E eu não vejo motivo para você dizer que que não pode continuar destruindo pessoas”. Respondi: “Você não entenderá, porque, embora tenha nascido na Índia, você não conhece a Índia. Você foi educado no Ocidente”. Ele havia permanecido a vida toda no Ocidente. “Todos esses livros, todas essas psicologias que eu tenho de ensinar, estou ensinando contra mim mesmo. Sei que isso vai causar danos a essas pessoas. A mente delas já está em mau estado, e agora ficará mais forte. Suas correntes serão muito mais fortes, sua escravidão da mente será muito mais forte”.

As pseudo-religiões dependem da disciplina da mente. O trabalho da verdadeira religião é colocar a mente de lado. E é, de certa forma, muito simples. Essas disciplinas são muito difíceis. Treinar a mente para a concentração é muito difícil, porque ela continua se revoltando, continua outra vez nos velhos hábitos. Você a puxa novamente e ela escapa. Você a traz de novo ao assunto  no qual estava se concentrando e de repente vê que estava pensando em alguma outra, você esqueceu em que estava se concentrando. Não é um trabalho fácil. Mas colocá-la de lado é uma coisa muito simples, não é difícil, de modo nenhum. Tudo o que você tem a fazer é observar. O que quer que esteja acontecendo na sua mente, não interfira, não tente cessá-la. Não faça nada, porque o que quer que fizer se tornará uma disciplina. Assim, não faça absolutamente nada. Apenas observe.

Observar não é um fazer. Assim como você observa o por-do-sol ou as nuvens no céu ou as pessoas passeando pela rua, observe o tráfego dos pensamentos, sonhos e pesadelos, relevantes, irrelevantes, conscientes, inconscientes, qualquer coisa que esteja acontecendo. E é sempre hora do rush. Você simplesmente observa; você fica ao lado, despreocupado.

As pseudo-religiões não permitem que você fique despreocupado. Eles dizem que a avareza é ruim; assim, se um pensamento de avareza vem, você salta para impedí-lo; caso contrário, você se tornará avarento. A raiva é ruim; se um pensamento de raiva passa, você salta imediatamente; você tem de mudá-lo, tem de ser gentil e compassivo e amar o seu inimigo assim como a si mesmo. Se surge algo contra o seu inimigo… Não, você tem de amar o seu inimigo assim como si mesmo.

Assim, todas as religiões lhe deram idéias do que é certo e do que é errado, e, se a coisa errada estiver acontecendo, você certamente tem de impedi-la. Você tem de interferir, tem de saltar ali dentro e tirar essa coisa para fora. Você perde o ponto. É por isso que eu não lhe digo o que é certo e o que é errado. Tudo o que digo é que observar é certo; não observar é errado. Torno isso absolutamente simplificado: seja o observador.

Não é da sua conta se a avareza estiver presente; deixe-a passar; se a raiva estiver passando, deixe-a passar. Quem é você para interferir? Por que está tão identificado com sua mente? Por que você começa a pensar: “Eu sou avarento… eu tenho raiva?” Há apenas um pensamento de raiva passando. Deixe-o passar; você só observa.

(…) É simples a metodologia de observar a mente, você não tem nada a ver com ela… A maioria de seus pensamentos não é sua, mas dos seus pais, de seus professores, de seus amigos, dos livros, dos filmes, da televisão, dos jornais. Simplesmente conte quantos pensamentos são realmente seus, e você ficará surpreso ao constatar que nenhum pensamento é seu. Todos vem de outras fontes, todos são emprestados ou despejados pelos outros em você ou despejados por você mesmo em você. Mas nada é seu.

A mente está ai, funcionando como um computador; literalmente, ela é o computador. Você não ficará identificado com um computador. Se o computador esquentar, você não ligará. Se o computador se zangar e começar a dar sinais em palavras obscenas, você não ficará preocupado. Você verá o que está errado, onde alguma coisa está errada, mas permanecerá separado.

Apenas um clique… nem mesmo posso chamá-lo de método, porque isso o tornaria pesado; eu o chamo de clique. Simplesmente fazendo isso, um dia, de repente, você é capaz de fazê-lo. Muitas vezes você falhará; não é nada para se preocupar… Não há nenhuma perda, isso é natural. Mas, simplesmente fazendo-o, um dia acontece.

Uma vez que isso tenha acontecido, uma vez que você tenha, mesmo que por um único momento, se tornado o observador, você saberá como se tornar observador nas colinas, bem distante. E a mente toda está ai, bem profunda no vale escuro, e você não tem nada a fazer com ela. A coisa mais estranha sobre a mente é que, se você se tornar um observador, ela começará a desaparecer. Assim como a luz dispersa a escuridão, a observação dispersa a mente, seus pensamentos, sua parafernália toda.

Assim, a meditação é simplesmente observação, consciência. E isso revela que não tem nada a ver com invenção. Ela não inventa nada; ela simplesmente descobre aquilo que está ai. E o que está ai? Você entra e encontra um infinito vazio, tão tremendamente belo, tão silencioso, tão cheio de luz, tão fragrante, que você entrou no reino de Deus.

Nas minhas palavras, você entrou na divindade.

E, uma vez que você tenha estado neste espaço, sairá uma pessoa totalmente nova, um homem novo. Agora você tem a sua face original. Todas as máscaras desapareceram. Você viverá no mesmo mundo, mas não do mesmo modo. Estará entre as mesmas pessoas, mas não com a mesma atitude nem com a mesma abordagem.

Você viverá como um lótus na água; mas absolutamente intocado pela água.

A religião é a descoberta dessa flor de lótus dentro de você.

Osho  

Diálogo sobre a necessidade de retiro de silêncio

Dom Pepe: Estou decidido! Vou fazer um retiro de silêncio de um ano.

Outsider: Não acaba isso sendo uma espécie de escapismo místico, uma fuga geográfica?

DP: Não sei; pode até ser! Eu não sei também!

Out: Ficar, acreditar que se a gente sair daqui e for para algum ambiente e fazer um retiro de silêncio possa...

DP: Será que isso não pode potencializar? Tem muita gente que faz isso ai!... Se eu fizer um retiro de silêncio, será que eu não poderia potencializar?

Out: Mas o que é o silêncio? Silêncio físico?

DP: Não! Físico mesmo!... Você acha que não pode dar em nada?

Out: Não sei! Assim: no meu modo de vida, o fator de eu ficar muito isolado, que é uma escolha que fiz; não consigo estar em grandes ambientes, prefiro estar mais isolado; essa questão de ficar mais isolado, realmente parece que faculta de você ter menos interferências externas descentralizadoras. Por outro lado, a falta de interferência externa pode criar uma zona de conforto que impeça de você ver as suas reações que ocorrem quando você está tendo uma interferência externa.

DP: Entendi! Tem que viver os dois lados, não é?

Out: Eu não sei! Eu acho que o "meio termo" seria o... Por exemplo: Eu não fico direto lá, sozinho em casa... pelo menos um ou dois dias eu venho para cá, para este ambiente comercial, onde eu sofro influências de tudo: estou vendo o visual, mulheres, homens, as conversas, então, acaba dando para perceber aqui no freguês como é que tudo isso interfere.

DP: Tem que ter o meio termo, então, não é? Não pode ser radical, não é?

Out: Eu acho que isso, só se você está vivendo realmente uma crise existencial que está colocando em risco a sua sanidade; então, do mesmo jeito que fisicamente, quando uma pessoa está com uma doença muito grave, ela é tirada das atividades dela e entra numa "UTI" — unidade de tratamento intensivo — ; tiram até, toda roupa dela, para que não tenha preocupação nenhuma nem com estética, essa coisa; ela tem que ficar totalmente no organismo. Toda energia vital dela não pode ser desperdiçada, por isso que não tem contato com familiar, nem nada, que é para que a energia vital não se perca até no sentimentalismo, no apego parental. Então, acho que há determinados na vida do ser humano, que ocorre uma necessidade disso, — não por escolha —; acho que até faz parte de uma "inteligência psíquica" que faz você se isolar um período e se convergir, se converter para dentro, ali, voltar para cá (coração). Mas eu não sei se isso, se no momento, você pegar e disser: "Tá! Agora vou fazer um retiro — e tem um monte de cara que faz isso, que está fazendo isso; o último que fiquei sabendo foi aquele escritor e palestrante, Roberto Crema, que foi para a França e está com uns monges; deve estar lá há uns dois anos fazendo isso. Mas, não sei se é por aí; não sei. Se seu coração está pedindo por isso, "pau na máquina"! Não sei!

Eu estava lendo nesta semana, um texto sobre isso; quem fazia muito isso, eram os padres do deserto. Através dos padres do deserto é que surgiu o termo "Terapeuta"... Quando eles perceberam a falência do sistema, eles sentiram a necessidade de se retirar para local próximo à cidade.

DP: Próximo!

Out: Próximo à cidade, de fácil acesso, mas que não tivesse aquele contato da cidade, aquela coisa da cidade. E lá, eles construíam "pequenas celas" — inclusive, aquele local que eu lhe indiquei uma vez, a Uniluz...

DP: Uniluz? Está caro!

Out: Lá é baseado nos padres do deserto. Agora, você está me falando que está caro, ai eu já não sei, porque, antigamente, lá não era assim.

DP: Antigamente não era. Quando você me falou, lá estava numa transição... Antigamente você doava o quanto você queria... Agora está entre R$500,00 e R$700,00.

Out: Pra ficar lá o que? Um mês? E trabalhando ainda pra eles?... Legal, em!... Quer dizer que você paga e ainda vai trabalhar pros caras!...

DP: Pois é!

Out: Não tem jeito! O sistema corrompe mesmo!

DP: Corrompe. Porque antigamente eu lembro que lá, um amigo meu falou para mim que era só doar o quanto você queria, não é isso?

Out: Você ia ficar lá e trabalhando lá dentro, se trabalhando.

DP: Já corrompeu.

Out: Através dos trabalhos de lá, se trabalhando... Mas, que seja! Esse local foi baseado na experiência dos padres do deserto. Esses padres do deserto, se retiravam para vivenciar exatamente isso que a gente vive: essa inquietude que nós temos; essa inquietude que é uma inquietude metafísica... Esse vazio existencial!... Essa crise de identificação que a gente tem... Essa crise de identidade; crise de identificação no sentido assim: "Eu não consigo me identificar com nada que está ai, não é?"... Crise de identidade no sentido de você não mais se identificar com nada do que está ai; você não consegue se identificar com o "modelinho" que para trabalhar "tem que" ser assim, que eu "tenho que" ter um carro, que eu "tenho que" estar casado, que eu não sei o que, que eu não sei que lá, que eu "tenho que" ter filhos... Esse "modelinho" todo que é colocado de forma hipnótica na mentalidade de todo mundo. Então, esses caras, esses padres, eles ficavam o dia inteiro — de forma consciente —, e eles davam o nome de "Demônio do meio dia"... "Acídia"... Eles se trancavam na cela, o dia inteiro, só olhando para dentro... Porque não tem silêncio!... Você pode ter silêncio "físico", você pode subir para uma montanha, mas a cabeça ainda está gritando! E você pode estar no meio da torcida do Corinthians, lá, e estar totalmente equilibrado sem ser influenciado pelo movimento louco da torcida, não é? E o que eles faziam? No final do dia, eles se reuniam para jantar juntos. Então, quando eles se sentavam para jantar juntos, falavam sobre tudo o que estava passando na mente, como você está fazendo também agora aqui: "Olha Out, estou pensando em ficar um ano em retiro!" Talvez você precise! Não sei! Só seu ser mesmo é quem pode lhe indicar isso!... Eu sinto que eu preciso de recolhimento, só que meu recolhimento foi dentro da sociedade; é uma coisa muito conversada com a Deca, com a minha companheira... "Olha, nós vamos reduzir — foi traçado todo um plano — vamos reduzir nossas despesas, porque vai entrar menos da minha parte; pra gente poder, pra eu poder me dedicar totalmente à isso,!"... Porque que tenho plena certeza disso, hoje. Uma vez, esse cara que eu citei, o Roberto Crema, ele falou assim: "Na contemporaneidade que estamos vivendo, aquele que não for vocacionado, será um grande escravo do sistema"... Por que isso? Então, eu fiquei meditando sobre isso: é realmente um fato!... Nós não temos nada de criativo... Nós não temos nada de original... Nós não temos nada do Si-mesmo, manifesto... Isso está aí! Em estado dormente! Sufocado por todos esses condicionamentos que a gente tem feito um puta trabalho para se limpar deles. Então, como a gente não teve acesso à isso, não potencializou esses talentos — esses talentos, estão lentos — como a gente não potencializou isso, a gente fica "imitando", "copiando" coisas que a gente acha que talvez podem dar uma amenizada. Só que a gente já chegou a essa conclusão de que não adianta ter uma "puta grana", porque essa "puta grana", não resolve a questão da felicidade, a questão do sentimento de ser livre... pelo contrário; a gente, quando começa a ver a coisa crescer, está entrando dinheiro mas começa a estrutura toda crescer, a gente se sente preso, não aguenta, "chuta o pau da barraca" e vai embora! Então, eu vejo que, realmente precisa ter um processo de interiorização, e quem sabe nesse processo de interiorização, de autoconhecimento, a gente ter um "insight", uma "revelação", que traga qual que é a nossa "real vocação", entendeu? Porque, você sendo um cara vocacionado, você "nunca mais trabalha"... Não tem esforço!... tem alegria e felicidade, de você estar servindo; é diferente! O que a gente faz hoje, é um trabalho escravagista, que rouba uma energia vital ferrada, que não potencializa nada, e que você é só "mais um"... O cara olha para você e diz: "Vendedor de perfume? Está cheio de vendedor de perfume!" Ainda, se você tivesse um "insight" de uma essência completamente diferente que não tem no mercado...

DP: Seria diferente, não é?

Out: É diferente! Seria uma coisa completamente diferente, mas, não temos isso!... Então, a gente é só mais um! Quando a gente é só mais um, o cara que está inserido no sistema, identificado com o sistema, que compreendeu o sistema — em partes ele compreendeu — e usa o sistema de forma egocêntrica, de forma "não-inteligente" — ele olha para você e vê que você é só mais um, ele lhe explora! Você chega vendendo a R$100,00, ele fala: "Pago R$30,00!... Você quer? Não?... Próximo!"... E vai ter outro atrás de você que vai aceitar os R$30,00. Mas, se você tem algo vocacionado, quem sabe a gente... não é? Eu acredito que se você tiver algo profundamente diferente, que seja essencial para o ser humano, está cheio de cara ai que dá o que tiver para ter isso na mão, entendeu?... Alguém que facilite um apontamento com o qual ele possa compreender os seus conflitos, os seus vazios, os seus tédios, essas coisas. Isso ai tem mesmo; você tem isso no mundo corporativo, não tem?... "Não! Para falar sobre perfume, chama o Marcão, cara! Pra falar de perfume, só esse cara, tem que ser ele! Não quero saber! Vai lá!... Aluga apartamento pra ele, põe um carro bom na mão dele, se precisar, pague até a escola dos filhos dele, mas esse cara tem que estar com nós!"... Não é assim na corporação?

DP: Sim!

Out: Então, nisso, é a mesma coisa! Você não vê ai? Krishnamurti não viveu o tempo todo pra cima e pra baixo? Quem você acha que bancava ele?... Os "bacanas" bancavam ele! Não é?... Você pega ai, caras que não tem tanta percepção de mundo, que estão dentro do sistema... Esses padrecos da vida aí, esses padrecos cantor, eles não tem tudo garantido, tudo sustentado?... E estão só repetindo coisas que estão escritas secularmente, não é? Imagina se a gente tiver isso!

Agora, eu acredito que isso não virá se você não tiver uma seriedade — seriedade que eu quero dizer é no sentido de "série", não é? —... Realmente, eu me dedico à isso todo o dia. Como por exemplo, as pessoas tem que ter seriedade no sistema.... Eles não falam? "O cara é um cara sério! Trabalhador! Um cara que se dedica! Dá a vida pela empresa!"... Se a gente também tiver esse processo de seriedade de querer saber: "O que é que eu vim fazer nessa terra? Não é possível que é só vir aqui pra pagar conta e dar dinheiro para os outros"... Se a gente tiver essa seriedade eu acho que a gente vai chegar nessa resposta; agora, eu acho que para isso, eu acho que a gente tem que ter períodos em que você possa estar numa meditação sem essa enorme massa de influência dispersiva que o sistema traz pra você.

DP: Que é a rede do pensamento, não é?

Out: Que é a rede do pensamento!

DP: Que é muito feroz, que é muito poderosa!...

(nesse momento, duas mulheres se sentam duas mesas ao nosso lado, sendo que uma se senta, de pernas abertas, com um micro-shortes jens, voltada para nosso lado)

DP: Não! É impressionante essa coisa da rede do pensamento!... É pra te tirar da coisa mesmo! Tipo assim: você está saindo, está saindo, está saindo, você vai sair... Vem alguma coisa do tipo e tenta "laçar você"!

Out: Isso é direto, cara!

DP: Que louco!

Out: E eu percebo assim: A gente tem que estar atento às pistas que os caras deixar ai, não é? Eles falam; tem um dito popular, um preceito espiritual que fala: "A quem mais é dado..."

DP: Mais é cobrado!

Out: "...mais é cobrado!"... Quanto mais consciência você tem, do processo do pensamento condicionado; quanto mais consciência você tem do movimento da sociedade; quanto mais percepção você tem de como você está sendo influenciado por isso, mais o pensamento "se transveste" e tenta causar esse estado de hipnose, no qual você se identifica e se entrega praquilo... (dirigindo-se para as mulheres como um exemplo influenciante descentralizador)... isso eu tenho percebido direto!

DP: E, você acredita que, por exemplo, ele... É mutante! Você percebeu?

Out: Eu não tenho falado "mutante", mas é uma boa palavra; eu tenho usado a palavra "se transveste"... Ele se transveste! Que eu acho que é aquilo que os caras tentaram mostrar no filme "Matrix", quando o personagem "Smith" entra dentro de um outro corpo...

DP: É exatamente isso! É isso mesmo!

Out: Essa "mutação" que você está falando é esse "transvestir"... Ele só usa roupagem, ele pega uma outra roupagem, ele é uma roupagem e usa outra, e consegue entrar e vem...

DP: parece um computador, não é? Nossa!

Out: Eu vejo isso! Agora assim: também fica muito difícil, de você perceber facetas suas se você não estiver na vida de relação. Se você não tiver influências disso — (referindo-se as mulheres que factualmente davam entrada) —...

DP: Se não olhar pra isso profundamente...

Out: Você nunca vai perceber...

DP: Quem eu sou realmente!

Out: Que você não é imune à essas influências! Agora, uma vez que você percebeu a influência e percebeu ela funcionando, já criou uma imunidade. Agora, se eu trancar lá dentro do "Tibet", se eu me trancar dentro do meu quarto, sem ter nenhuma influência, isso estaria funcionando com o Cristianismo há muito tempo: os padres não se trancam? As freiras não se trancam? Cadê mudança no mundo? Cadê essas pessoas felizes? O que você mais pega quando vai conversar com freiras e padres, é um pessoal amargo, sem graça, xoxo, sem vida!

DP: em energia, não é?

Out: Só sabem falar aquelas decorebas!

DP: É isso mesmo: sem energia!

Out: Não toca a alma de quem tem um pouquinho de percepção, certo?

DP: Sim.

Out: Então, assim: a gente se isolar também...

DP: Não é o caminho!

Out: Não sei!... Pra mim, não é! Já houve um tempo de eu me isolar! Houve momentos que foram profundamente necessários eu sair senão eu iria enlouquecer... Eu sair fora de situações e ficar comigo, entendeu? E se deparar com essa solidão... Eu acho que tudo aponta para isso: para um estado em que você...

DP: Solitude, não é, digamos assim!

Out: É! Isso, isso!

DP: Solitude!

Out: É! vamos colocar solitude ou solidão, tanto faz! Uma cosia que eu venho percebendo é assim: a essência nossa, ela é solitária!... Você vê a criança!... A criança nasce, ela nasce sozinha, ela é solitária! E a gente vem fugindo disso, com incentivo da educação, com incentivo de família e de toda uma cultura, pra você se agrupar, pra você fazer parte e não manter contato com essa solidão, não é? Até assim: a solidão, ela é vista de uma forma perniciosa; em todos os ramos da sociedade, inclusive na arte. Pegue as músicas ai, o que elas falam sobre a solidão... Ela é sempre vista de forma depressiva, não é? penso hoje, que é o caminho do meio... Mas acho que isso só é possível conforme você vai se equilibrando... A coisa vai dando conforme você vai se equilibrando! Que ai, você começa a perceber. Ontem mesmo, a Deca, numa fala dela falou: "É muito fácil você ler Krishnamurti, não é? E aplicar isso quando você não está tendo uns grandes desafios perrenhos ai fora... Agora, você vai ver se isso funciona mesmo quando você está tendo, quando você está sendo desafiado por algum perrenho; ai você vai ver se isso é funcional ou não. Pra mim, no meu momento, não seria viável; talvez, para você, seja viável. Primeiro: eu não faço nenhum tipo de compromisso a longo prazo; então, é uma coisa que eu sempre tive: eu não consigo fazer compromissos a longo prazo!

DP: Eu também não!

Out: Compras muito longas, coisas assim, sabe? Eu quero acabar logo!

DP: Eu não consigo nem pagar!

Out: Quero liquidar tudo rápido!... Então assim: eu não faria algo nessa proposta assim tão longa. Lembra de quando você estava vivendo isso e eu te encontrei, na última vez, eu falei assim pra você: tem lá, por que você não fica uns três meses — três meses eu acho que é um tempo muito bom para você começar a refrescar e sentir o lado intuitivo. Mas, não adianta: você vai ter que voltar, não é? Enfim, eu, eu sinto que o meu momento, hoje, é esse: é aqui no meio da sociedade, tem que frutificar, florescer — não frutificar, mas florescer — onde a grande vida me plantou; ela me plantou aqui na sociedade; eu tenho que ter essa descoberta aqui mesmo! É óbvio que, eu tenho que saber, que eu preciso de momentos de repouso. Do mesmo jeito que eu preciso de momento de repouso físico... Quando você vai dormir você não quer barulho, você não quer interferência de nada. Também preciso de momentos, de repouso psíquico. Quando você vai comer... Quando você vai comer, você não quer ser incomodado; você desliga o celular, tudo, não é? Então, também, para eu me alimentar psiquicamente, eu também não quero ser incomodado. É uma coisa de recarregar as baterias... Mas, no resto, eu tenho que estar em contato, porque é aqui que o "bicho pega"... É aqui que você vê a sua tendência à normose, a sua, sabe...

DP: Sua vontade, os desejos...

Out: Você começa a perceber, olhar o desejo se manifestando, tentando tomar conta do corpo... Você olhar pra ele, do porque, o que é que está atrás dele... Porque é assim: o desejo... é porque você está insatisfeito. Você está insatisfeito, o pensamento começa a buscar alguma forma de prazer, que é desejo... Só que sempre frustra, não é? Sempre frustra! Traz um alívio imediato seguido de frustração ao quadrado. Mas isso, a gente já está careca de saber!

DP: É, percebe!

Out: Agora eu percebo isso é fato: Quanto mais você vai chegando nessa compreensão do movimento interno, mais o bicho ataca ferozmente... Engraçado que parece que até o externo colabora para isso, entendeu? Espreme! Espreme!... As fontes para você conseguir o mínimo necessário para conseguir uma existência digna, parece que também, também espreme! Espreme relações, espreme tudo! Por exemplo: ontem! Ontem eu escrevi um texto, sobre um sentimento que eu estou sentindo muito, que é um sentimento de solidão psíquica. Não física! Porque física, eu nem estou tendo tanto, porque assim, a gente, com essa busca do auto-conhecimento, você começa a ficar um cara mais seletivo, e também um cara mais ponderado no que você vai dizer, então você agride tanto as pessoas e também não permite ser agredido; então, você até tem pessoas em volta de você, só que, essa pessoas, elas estão totalmente enredadas pelo sistema; não tem como você falar nada do que você vive; não tem como você falar nada sobre sua percepção de mundo... Não tem! Você pode até tentar e vai ver que em cinco minutos elas já começam a abrir a boca de sono! Porque aquilo, dá um nó no cérebro delas! Com cinco minutos de conversa, você entra pra uma energia que eles não estão preparados: isso descarrega eles! Então, você não tem feedback!

DP: É por isso que a pessoa quando você está conversando ela fica fugindo: porque ela não tem energia praquilo ainda, não é? Ela não está preparada!

Out: É! Então, você percebe isso, você fala: tenho que ficar em silêncio! E ai, você deixa a pessoa abrir a boca, só que a pessoa vai abrir a boca dentro daquilo que você já viveu lá atrás e que você já viu que é falso: que é a "Outrite"... Que é falar só de fora; só externalizar, ou então, ficar falando das pseudos-conquistas do ego dela...Dos planos, dos idealismos que a gente sabe que vai ser falido! Mais cedo ou mais tarde, vai falir aquilo!

DP: Não tem jeito!

Out: Porque não é do Ser!... É do ego!... E não adianta você querer chegar pra pessoa e querer falar contra que ela vai achar tudo: ela vai achar que você é um cara que está com inveja, que você é um cara falido, menos que você está "apontando pra algo" que faz sentido. Ela não vai nem querer meditar em cima disso que você está falando. Então sobra aquele, fica aquele, fica... Não tem "reverberação": Você joga, mas não tem retorno! Não tem, inclusive, o que tenho percebido, a mínima demonstração de interesse em questionar isso que você está falando... "Não! espera aí! Deixa eu ver o que o Marcão está falando! espera ai!... Mas do que você está falando ai?"... Não tem! A pessoa fica ali olhando pra você, ela está só olhando para você, mas a cabeça dela está pensando num jeito de fugir...

DP: Da conversa!

Out: Dessa conversa, de sair de perto de você... Porque aquilo não interessa pra ela... Porque aquilo não alimenta o ego dela... Ao contrário: isso é um puta de um alfinete! Vai fazendo furinhos e vai murchando. O meu sentimento tem sido um sentimento de solidão psíquica, que eu acho, que é providencial... Pra que? Pra que você também deixe de criar expectativas no externo (que ainda é manifestação do ego)... Já que você não tem mais expectativa no campo material, mas você ainda está tendo expectativa...

DP: No campo espiritual.

Out: Então quer dizer que você ainda está mendigando também! Então, talvez, esse estado, esse sentimento de solidão psíquica que está surgindo, está sendo um grande professor para levar à um estado de autonomia e centramento.

DP: Real, não é? Que é o Real!

Out: Eu fui viajar neste final de semana para a casa de uns conhecidos, na praia... Por sinal, foi fantástico ter ido pra lá porque deu para enxergar a doença do ser humano... Como o ser humano está doente, como ele está automatizado, como que...

DP: Um androide, não é?

Out: Um androide, sem centro nenhum! Sem centro nenhum! Ele não percebe absolutamente nada; ele não percebe; essa falta de percepção dá sinais claros no corpo físico dele, e também no corpo físico da natureza. Então, foi muito bom ter ido pra lá. Fui pra lá e, olhando tudo isso, olhando as pessoas, conversando com as pessoas, vendo o movimento e vendo o meu próprio movimento, caiu uma ficha muito poderosa pra mim: de um nome, de como a gente simbolizar através de um nome, a doença, a doença básica que dá origem á todas humanas...

DP: A doença básica que dá origem à todas as doenças?

Out: Presta atenção:... "Pensamentose Descentralizante"... "Ose" é doença; do pensamento; ou seja, a doença do pensamento descentralizante... Porque ele tira você do seu centro ai você facilmente sofre as influências do meio. Você, sem centro e, sofrendo as influências do meio, não tem como não ser adulterado; e você sendo adulterado, não tem como você não adulterar também!... Ser um agente...

DP: Do sistema! Um "Smith", "um Cipher", vai!

Out: A pensamentose leva à normose, que leva à neurose, que leva à esclerose e outras "oses" mais.

DP: Entendi!

Out: É óbvio!... Como é que eu posso me ajustar ao "normal" se eu não pensar conforme o normal?... Então, a base da doença é o pensamento mesmo.

DP: A base da doença do ser humano em geral é a identificação com o pensamento...

Out: Lógico! Essa doença que não deixa você ser do Ser, mas passa a ser do ego... funcionar nesse movimento...

DP: Automatizado, não é? Robótico! Androide, não é?

Out: Por que esse sentimento de solidão psíquica?... Porque está faltando centro! Você está apontando pra fora, não tem centro ainda!... Então, eu percebo que o grande lance é ficar...

DP: Observando, não é?

Out: Observando tudo que está ocorrendo em cada situação que vai se apresentando...

DP: Sem julgamentos, não é? Ou tem algum...

Out: Ou percebendo também como a mente está julgando...

DP: Porque eu percebo também a minha mente julgando sempre!

Out: Veja bem: eu acho que a gente precisa separar "julgamento" de "constatação".

DP: Ou de "discernimento", digamos assim.

Out: O julgamento, sempre é postulado pra quem é julgado, uma pena.

DP: Certo!

Out: Constatação, não! Constatação, quem constata é a testemunha... não tem um veredito final da constatação.

DP: É um fato, então, não é?

Out: O julgamento vem sempre com uma coisa de você querer punir... que eu acho que é o movimento inicial, não tem como fugir disso! Você começa a se deparar com isso, você começa a julgar todo mundo e... você fica até com um censo crítico muito ácido.

DP: Muito apurado!

Out: Muito apurado, muito ácido, não é? Maldoso até, tem que tomar muito cuidado... Eu lembro que assim: eu ataquei muito as pessoas com a escrita e com a palavra nesse momento. Mas ai você vai madurando e passa a ser só uma constatação, porque é fato! Contra fatos não tem argumentos!... Você está constatando! É fato mesmo! Te dou um exemplo simples: fui para Caiçara... Lotado!

DP: Onde fica Caiçara?

Out: Depois da Praia Grande, antes de Itanhaém...

Dp: Tá, tá!

Out: Lotado! Sujo pra cacete!... Cara, de cem em cem metros, tem uma boca de esgoto jogando a água pro mar... fedida pra caramba!... E todo mundo entrando na água, cara!... Eu na água lá, pertinho, tudo sujo!, sabe? E todo mundo nadando!... Eu estou julgando? Eu estou constatando um fato! É um fato a falta de consciência do ser humano, que na altura do campeonato, 2013, ainda não chegou para o sistema público e falou: escuta! Como que vocês até agora não pensaram num modo de não jogar essa água onde os banhistas vão estar e dar um jeito de sanear essa água para algum tipo de uso qualquer... "Olha, essa água é só para lavar carro", entendeu? Como é que as pessoas aceitam isso, não brigam por isso, não exigem os seus direitos e, além disso, elas se expõem fisicamente à isso?... É um antro de virose!... De cem em cem metros na praia, aquela poça de merda derretida indo pra água, de urina, e os pais com as criancinhas, com baldinho d'água... O que é que é isso, se não é a falta de centramento, de percepção?... Se você não está centrado, você não está vendo nada... Você não enxerga nada, não vê nada!

DP: Então, e quando o ser, por exemplo, ele não está centrado aqui, nele, ele pode e faz barbaridades, não é isso que você está vendo também? Não é isso que você está conseguindo perceber?

Out: Enquanto tem observador e cosia observada, haverá esforço e conflito... Observador e coisa observada ainda tem condicionamento ai. Você tem um condicionamento sexual... Você está aqui, observa a outra chegando toda condicionada, com o corpinho pintadinho, olhando aqui pra nós...

DP: Eu percebi, eu percebi!

Out: Se não tiver o observador, o que é que acontece? Você tem uma reação baseada lá no prazer, na memória que você teve de algo parecido com essa mulher que te provocou. Então, você esquece tudo "e vai pras cabeças!"... "Só pensa naquilo!"...

DP: Exatamente!

Out: Você vai ter uma reação, que não é ação, que pode te trazer prazer imediato mas que depois, vai te trazer dor de cabeça. Agora, se além desse observador há esse estado de testemunhar o que a coisa observada está gerando nesse observador, criou-se um espaço, que impede essa reação maluca.

DP: Nem tem reação, então!

Out: Você olha, vê, percebe...

DP: Percebe aqui também?

Out: Não nega aqui dentro, não nega aqui dentro...

DP: Não pode negar, não é?

Out: Que afetou, afetou...

DP: Mexeu, não é?

Out: Mexeu... mas ai, a testemunha vem e traz a pergunta: mexeu por que? Qual a natureza exata disso que está tentando te descentralizar?

DP: Por que isso te tira do centro, não é?

Out: É um exemplo! Nós pegamos esse exemplo da mulher ai, que eu sei que mexe bastante pra você, não é?

DP: É, esse negócio da rede é...

Out: E pra mim é assim: que todo esse trabalho, de todos esses tempos e até pela minha idade, parece que vai caindo, a libido parece que vai voltando para o lugar que lhe apetece, entendeu? Mas, não pode dizer que não tem um ser condicionado aqui dentro, que quando está fora do centro, se está desatento, vamos colocar assim, se não está nesse estado de vigilância... "Vigiai e orai sempre!", não é? Porque a gente não teve uma educação pra vigilância de si mesmo... Não teve! Quando você está meio disperso, por causa dessa hipnose do pensamento, essas influências batem, dão um toque e você não percebe. Então, enquanto está só no observador, é uma coisa, mas eu percebo que do observador, você vai começando a ter um estado de testemunha que começa inclusive a observar o observador enquanto...

DP: Tem um terceiro estágio, digamos assim?

Out: cara, eu não sei te nomear isso...

DP: Observador, observado e testemunha, digamos assim?

Out: É! Porque é assim: o observado, está sempre focado fora...

DP: O observador está focado fora!

Out: É! mas, daqui há pouco começa a testemunhar o próprio observador, enquanto observando... E aí também...

DP: A testemunha, digamos assim?

Out: É! Então começa a ampliar ainda mais essa distancia...

DP: Essa consciência?

Out: O centramento, vamos colocar assim; o poder de desidentificação com isso...

DP: Você não se identifica.

Out: A percepção da ilusão que é se entregar pra isso... Que é aquela cena do "Matrix", quando a Trinite vira pro Neo e fala assim — ele quer descer do carro — ela fala: "Não vai descer! Você já foi ai mil vezes antes, você já conhece aonde isso vai dar"... Então ele para, observa e fecha a porta e retoma o processo dele. Então, esse testemunhar ai, do próprio observador... "Não! Isso é falso! Esse valor finito ai, não tem o poder de matar essa sede do Infinito que você tem!"

DP: Exatamente! É isso mesmo! Valor finito, não é, cara?

Out: Então você olha... O cara para com um carrão ao seu lado, o pensamento, de imediato, compara o seu carro com um carro daquele; imediatamente ele vem e coloca que você...

DP: É menos do que o cara!

Out: É menos que o cara! E que você tinha que fazer alguma coisa a mais e etc, etc... E ai você vê o movimento também... mas não entra! Não entra e você fica observando... sem julgar ele... Há uma tomada de consciência do falso.

DP: É! É assim mesmo!

Out: mas, espera ai! Quando você comprou o seu carro, o seu carro era o top! Então, esse carro que você está vendo agora como o top, já já não é mais o top. E, se você entrar nessa, você "top-top"... (risos)

DP: É assim com tudo, é assim com tudo, já reparou? Já percebi já! Faz com a mulher, faz com a tua roupa, com teu tamanho...

Out: Tudo!

DP: Começa a comparar tudo, é uma coisa impressionante! Ele compara tudo e não está nada bom para você!

Out: Ai, se você não está esperto, o pensamento, pega inclusive esse seu, essa tomada de consciência da observação, e faz uso disso que está observando em você pra criar um conflito de que você... "Pô! Você não muda mesmo! Você isso, você aquilo!" e ai você fica mal. E você fica mal de ver a realidade que precisa ser vista; essa consciência está ai para que veja a falência e o limite desse observador, porque esse observador é isso: ele é inveja, ele é cobiça...

DP: O observador?

Out: É! É o que nós somos!

DP: Ah! O que nós somos, o que essa rede do pensamento tenta colocar que nós somos...

Out: Ou melhor, que nós somos não! Que nós ainda estamos identificados como sendo isso.

DP: porque isso é uma identificação da rede, não é?

Out: Agora, se ocorrer um lastro, dessa testemunha, que ainda está testemunhando, que é isso que os caras falam, "agora vejo em partes, mas depois veremos face a face"... O que também está explicitado no filme "Matrix", quando o Neo senta e olha para o espelho, lembra?

DP: Lembro!

Out: Que ele vê tudo fragmentado e daqui há pouco... Deixa de existir , ele toca e ele passa a ser o espelho! Ele começa a ter uma experiência de não dualidade. Então assim: se tiver um lastro dessa testemunha que supera essa distancia entre observador e coisa observada, quem sabe isso seja o que eles chamam de iluminação, ou fim do conflito.

DP: Ai acaba o conflito por total, não é?

Out: Porque ele vem a toda hora.

Por que tememos o anonimato?

"Por que será que ansiamos por sermos reconhecidos, por nos darem importância, por sermos incentivados? Por que nos prendemos ao nosso exclusivismo de nome, posição, aquisições? Será o anonimato degradante? E ser desconhecido,desprezível? Por que nós buscamos o famoso, o popular?

Por que não ficamos satisfeitos em ser nós mesmos? Será que temos tanto medo e vergonha do que somos que o nome, a posição e as aquisições se tornam muito mais importantes?

É curioso o quão forte é o desejo de ser reconhecido, ser elogiado. Na agitação da batalha o indivíduo faz coisas incríveis pelas quais é homenageado; torna-se um herói por matar um semelhante.

Por meio de privilégios, esperteza ou capacidade e eficiência, a pessoa chega a algum lugar perto do topo – embora o topo jamais seja o topo, pois sempre há mais e mais na embriaguez do sucesso.

O país ou a empresa é você mesmo; os assuntos dependem de você, você é o poder. A religião organizada oferece posição, prestígio e respeito; lá também você é alguém, separado e importante. Ou, então, você vira o discípulo de um professor, de um guru ou Mestre, ou coopera com eles em seu trabalho. Você ainda é importante, você os representa, compartilha da responsabilidade, você dá e outros recebem. Embora através de seus nomes, você ainda é agente. Você pode vestir uma tanga ou a túnica do monge, mas é você que está fazendo o gesto, é você que está renunciando.

De um jeito ou de outro, sutil ou grosseiramente, o Eu é alimentado e sustentado. À parte de suas atividades anti-sociais e prejudiciais, por que o Eu te de se preservar?

Embora estejamos em agitação e dor, com prazeres transitórios, por que o Eu se prende a recompensas exteriores e interiores, a buscas que, inevitavelmente, trazem dor e infelicidade? A sede por atividade positiva como o oposto da negação faz com que nos empenhemos para ser; nosso empenho faz com que nos sintamos vivos, sintamos que existe um propósito em nossas vidas, que gradualmente ficaremos livres das causas do conflito e da dor.

Pensamos que, se nossa atividade parar, nós seremos nada, estaremos perdidos, a vida não terá absolutamente sentido; então prosseguimos em conflito, em confusão, em antagonismo. Mas estamos também conscientes que há algo mais, que existe uma outra coisa que está acima e além de toda essa infelicidade. Assim, estamos em constante batalha interna conosco.

Quanto maior a exibição externa, maior a pobreza interna; mas a libertação dessa pobreza não é a única. A causa desse vazio interno é o desejo de tornar-se; e, faça o que fizer, esse vazio jamais poderá ser preenchido. Você pode fugir dele de um modo simples ou com refinamento; mas ele está tão perto de você quanto sua sombra. Você pode não querer olhar em seu vazio, mas, apesar disso, ele está lá.

Os adornos e as renúncias que o Eu adota jamais conseguem encobrir essa pobreza interior. Por suas atividades, internas e externas, o Eu tenta encontrar o enriquecimento, chamando-o de experiência ou dando a ele um nome diferente segundo sua conveniência e recompensa.

O Eu não pode jamais ser anônimo; ele pode usar um novo traje, dotar um novo nome, mas a identidade é sua própria substância. Esse processo de identificação impede a percepção de sua própria natureza.

O processo cumulativo da identidade constrói o Eu, positiva ou negativamente; e sua atividade é sempre fechada em si, por mais amplo que seja o cercado. Cada esforço do Eu de ser ou não ser é um distanciamento do que ele é. À parte de seu nome, seus atributos, idiossincrasias e posses, o que é o Eu? Existe o “mim”, o Eu, quando suas qualidades são retiradas? É esse medo de ser nada que impele o Eu para a atividade; mas ele é nada, é um vazio.

Se formos capazes de enfrentar esse vazio, ficar com essa solidão dolorosa, então todo o medo desaparecerá e uma transformação fundamental acontecerá. Para que isso aconteça deve haver a experiência daquele nada – que será impedida se houver um experienciador.

Se houver um desejo pela experienciação daquele vazio a fim de superá-lo, ir acima e além dele, aí não haverá experienciação; pois o Eu, como uma identidade, permanece. Se o experienciador tiver uma experiência, não existirá mais o estado de experienciador.

É a experienciação do que é, sem nomeá-lo, que traz a liberdade para o que é."

Jiddu Krishnamurt

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Áudio: Deixe de proteger sua suposta sanidade

Se quiser ler o texto lido antes das falas deste encontro, clique aqui.

Ramesh Balsekar - Quem quer saber, que?

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Deixe de proteger sua suposta sanidade

Jesus disse:

O cisco que está no olho de teu irmão, tu vês,
mas a trave que está no teu olho, não vês.
Quando lançares fora a trave do teu olho,
então, verás claramente
para tirar o cisco do olho de teu irmão.

O conhecimento-de-si é a coisa mais difícil — não porque seja difícil, mas porque você fica com medo de saber sobre si mesmo. Existe um grande medo. Todo mundo está tentando escapar, escapar de si mesmo. Esse medo tem de ser compreendido. E, se esse medo existe, seja o que for que você faça, não vai ajudar muito. Você pensa que quer se conhecer, mas se esse medo inconsciente estiver aí, você continuamente evitará, você continuamente tentará esconder, se enganar. Por um lado, você tentará se conhecer; por outro lado, criará todos os tipos de obstáculos, de modo que não possa se conhecer.

Conscientemente, você pode pensar “gostaria de me conhecer”; mas, no inconsciente — que é maior, mais forte, mais poderoso do que o consciente —, você evitará o conhecimento-de-si. Assim, o medo tem de ser compreendido. Por que você tem medo?

Primeira coisa: se você realmente penetrar-se, a imagem que você criou no mundo se revelará falsa. Todo o seu passado passará a não significar nada, porque ele foi como um sonho. Você investiu tanto nele… você viviu por ele… e agora saber que ele foi um fenômeno falso… você se sente ferido — então, toda a sua vida foi um desperdício.

Se o que quer que você tenha vivido foi uma pseudovida, não autêntica — se você nunca amou, mas apenas fingiu amar, como você pode encarar a si mesmo?… Porque, então, você virá a saber que a coisa toda é um fingimento: não somente você fingiu que ama, você também fingiu que é feliz quando ama. Você não enganou a mais ninguém além de si mesmo. E, agora, olhar para trás, olhar para dentro… o medo o pega.

Você tem pensado que você é algo único; todo mundo pensa.  Essa é a coisa mais comum neste mundo, a pessoa se pensar extraordinária, algo especial, “a escolhida”. Mas se você olhar para si, você virá a saber que não há nada, não há nada sobre o que ser egoísta. Então, aonde vai parar o ego? Ele desabará, ruirá no pó.

O medo existe; assim, você não olha para si mesmo. Ao não olhar, você pode continuar criando sonhos sobre si mesmo, si mesma, imagens sobre si mesmo, si mesma. E é muito fácil e barato criar uma imagem, mas é muito difícil e penoso ser realmente alguma coisa. A pessoa sempre escolhe o mais barato — e você escolheu o mais barato. Agora, olhar para si mesmo é muito difícil.

(…) Criar uma imagem de que você é único, é barato, mas ser único é árduo, muito penoso. Muitas e muitas vidas de luta, empenho, muitas vidas de esforço culminam em algo, quando você se torna único. Mas acreditar que você é único é simplesmente barato, você pode fazer isso agora mesmo, não tem necessidade de se mexer. E você tem acreditado em coisas baratas — eis porque o medo existe.

Você não pode olhar para  si mesmo. Tudo o que você tem pensado ser, você não encontrará aí — e você sabe muito bem disso. Quem saberia disso tão bem quanto você sabe?

(…) Você é alguém a seus olhos. Todos os demais podem saber que você não é ninguém, mas você não. Até mesmo um louco pensa que todo mundo é louco. Todo mundo lhe diz “Você é um louco!”, mas ele não ouvirá, porque isso é muito doloroso. Ele criará todos os tipos de argumentos, de racionalizações para dizer “eu não sou louco”.

(…) É sempre o outro que está errado, que é louco. Eis como você protege sua suposta sanidade — isso é uma proteção. E uma pessoa que não pode olhar para si mesma, basicamente não pode olhar, porque ela não apenas tem medo de olhar para si mesma: basicamente, ela tem medo de olhar. Porque, quando você olha para o outro, o outro pode ser tornar o espelho; quando você olha dentro do outro, o outro pode indicar algo sobre você. Você é refletido nos olhos do outro; assim, você não pode olhar para o outro. Você cria uma ficção sobre si mesmo e, então, cria uma ficção sobre os outros; então, você vive num mundo de sonhos — é assim que todo mundo está vivendo.

E, então, você se pergunta como ser bem-aventurado. Seu pesadelo é natural: o que quer que você tenha feito, somente um pesadelo pode brotar dali. E você pergunta como ficar à vontade… Ninguém pode ficar à vontade com ficção, somente com o fato. Por mais duro que possa ser aceitar, somente o fato pode deixá-lo não-tenso, somente o fato pode conduzi-lo em direção à verdade. Se você nega o factual, então, não há nenhuma verdade para você e, então, você ficar girando e girando em torno e nunca atinge o centro.

Osho – A semente de Mostarda

Constatações sobre a solidão


Se você realmente se importa em entrar em contato com o real, com a verdade — ou se preferir, pode usar a palavra Deus ou outra que lhe soe melhor aos ouvidos — se você realmente se importa em entrar em contato com aquilo que você realmente é — e não em manter aquilo que você sustenta ser através das desgastadas máscaras desse inseguro “eu” — prepare-se para o forte impacto da solidão que sempre esteve aí com você, prepare-se para constatação da limitação daquilo que pensamos ser “encontros”. Todo aquele que realmente se importa com a possibilidade da manifestação do real, não pode carregar consigo o medo que torna impossível o contato com a solidão que se é; é preciso ter a ousadia de se abrir para esse medo, para essa solidão e, nesse necessário estado de “abertura iniciática”, ser brindado com a sua benfazeja compreensão.  Quando se tem medo de fazer frente à solidão que se é, não há como se alcançar aquele estado de liberdade, felicidade e genuína amorosidade, cuja limitação da palavra amor, não tem como nos apresentar; ao contrário, quando não se é capaz de fazer frente a esse estado natural de solidão, não há como se vivenciar a realidade do que vem a ser a verdadeira liberdade do assim chamado “espírito humano”; não há como vivenciar de forma direta, holística, a realidade que significa a palavra “autonomia”, a realidade do que significa ser uma entidade “psicologicamente autossuficiente”. Sem isso, sem esse consciente estado de abertura, o que fica é a continuidade da sustentação de um limitado estado de ser cuja base é medo, dependências psicológicas, com suas inevitáveis e descabidas exigências, tanto de si mesmo, como dos demais seres humanos que nos cercam, bem como da própria natureza, da qual, ilusoriamente pensamos estar em relação. 

Outsider  

Compartilhando o e-mail de um Confrade

Olá Nelson e pessoal da confraria, tudo bem com vocês?

Quero dizer que estamos, aqui em Campinas, eu e mais dois amigos, ouvindo sempre os áudios e lendo os textos do pessoal da confraria de vocês. E tem sido uma experiência fantástica.

A primeira vez que eu ouvi alguém falar sobre Krishnamurti, foi quando fui fazer um trabalho da faculdade (pedagogia) juntamente com o professor Izack (arquiteto). Perguntei a ele qual seria a escola ideal, já que o tema do trabalho era sobre a escola da ponte de Portugal. A resposta dele foi curta: 

- Eu acredito muito na escola de Krishnamurti, imagino ser o ideal.

Aquilo ficou gravado na minha memória, e passaram alguns anos.

Sempre fui um cara diferente, enquanto a maioria estava correndo em uma direção, eu estava sentado sem querer seguir nem uma e nem outra direção, sempre questionando esse mundo. E achava que eu era anarquista, mas...rs...

Andei percorrendo vários caminhos, querendo achar a resposta desse incômodo que sempre me seguia. Era a politica, a escola, a família, a religião e principalmente todas as manias e costumes das pessoas, os alvos da minha crítica e observações.

Foi quando eu assisti ao filme Zeigeist e reencontrei o Krishnamurti! Ai eu comecei a ler um livro dele e depois vi vários vídeos no youtube, até encontrar a página da confraria. Começamos a nos juntar aqui em casa, quase que todos os dias, principalmente nos fins de semana. Enquanto que, a maioria das pessoas estão enchendo os barzinhos com suas mentes condicionadas, a gente fica aqui, também com as nossas mentes condicionadas, mas apontando para um outro lado, o lado do conhecimento do nosso interior, lado consciente.

É muito bom ouvir vocês, estamos aprendendo muito, dá vontade de participar, de trocar figurinhas. Dizemos aqui que, Krishnamurti colocou em ordem tudo aquilo que a gente sentia sobre esse mundo. Sempre enxergamos as coisas desfocadas, eram sentimentos muito fortes que chegavam em nossa mente, mas ele fez clarear muitas coisas.

Ainda estamos com aquele ar crítico sobre as coisas e pessoas, sofrendo por conta disso. A família e os amigos não entendem, e acabam tornando as coisas um pouco piores. Talvez seja uma fase, não sei. Sabemos que é desnecessário ficar tentando clarear a consciência das pessoas, e que mesmo assim, temos muito a fazer por nós mesmos.Tanta coisa a ser observada dentro de nós... Há tanta coisa a ser mudada, e tem de ser sem esforço, com o tempo, sem pressa.

Bom, é isso ai! Quero só escrever a vocês, e dizer que nós identificamos com o que vocês vêm fazendo. Espero que dure muito essa conecção; é um grande prazer aprender um pouco mais sobre a obra de Krishnamurti, e principalmente, ver que existem outras pessoas buscando mudar, e encontrar a verdade, o amor e a liberdade.

Um forte abraço em todos vocês e, deixa eu dar um chute na canela do Nelson, um chute krishnamurtiano pra você Nelson rsrs..., já que eu venho levando tantos de você que a minha canela está até roxa rsrs...

Beijo no coração de cada um, e que um dia a gente possa viver num mundo muito melhor! Repleto de pessoas especiais e conscientes. Força aí!

Dudu Duarte

Obs. : Posso curtir e compartilhar as postagens que eu gostar? Já fiz isso antes, mas não sei se vocês liberam pra isso, ok? Tomo muito cuidado em não normatizar essas coisas que têm real valor pra todos nós. É o que eu observei no filme brasileiro baseado em Krishnamurti, A Concepção. Ainda bem que não teve tanta visibilidade, pois achei que distorceu muito as idéias dele.

Sobre o coletivo estado de sabotagem psíquica

O ser humano, — que longe se encontra de “ser” humano — encontra-se de tal forma sabotado psiquicamente, que não consegue perceber as próprias limitações e os consequentes sofrimentos resultantes de tal sabotamento psíquico. Assim sendo, desperdiça sua energia vital para se mostrar como parte integrante e funcional da imensa massa que faz o “jogo dos contentes”.

Sinto que, diante de tal sabotagem, o ego humano desenvolveu uma capa protetora contra toda informação que aponte para a deformação psíquica resultante de tal herança sabotadora. Por melhor que sejam os argumentos, por melhor que sejam as oratórias, por melhor que seja o “estado de Presença” daqueles que tentam elucidar tamanha ausência de lucidez gerada por tal sabotamento hereditário, aqueles que se encontram inconscientes e, portanto, prisioneiros desse processo de sabotagem psíquica, não apresentam o menor sinal de interesse, não apresentam sinais de “sede de plenitude”, não apresentam aquela “vontade de quero mais” diante do novo paradigma que lhe é apresentado. Infelizmente, a constatação é a de que somente através de um poderoso “choque psíquico” apresentado pela vida, “choque psíquico” pela qual o caos possa se manifestar, trazendo consigo o necessário “ponto de saturação” — o qual gera o “ponto de mutação” — é que pode se dar a ocorrência do necessário estado de abertura que traz consigo a arte da “escuta iniciática”. A vivência tem demonstrado que, qualquer tentativa de transmissão da mensagem de um novo paradigma psíquico antes da ocorrência desse “choque psíquico”, desse “ponto de saturação”, mostra-se como puro desperdício de energia vital, como nas palavras de um grande místico, “é jogar pérola aos porcos”. Não se pode fazer um cavalo sedento beber água, enquanto ele insiste em ruminar capim seco. O falr dos outros, os comentários sobre a externa superficialidade transitória, supera em muito o tão necessário interesse pela busca de interioridade.

Outsider

O Difícil Facilitário do Verbo Ouvir

Um dos maiores problemas de comunicação, tanto a de massas como a interpessoal, é o de como o receptor, ou seja, o outro, ouve o que o emissor, ou seja, a pessoa, falou.

Numa mesma cena de telenovela, notícia de telejornal ou num simples papo ou discussão, observo que a mesma frase permite diferentes níveis de entendimento.

Na conversação dá-se o mesmo. Raras, raríssimas, são as pessoas que procuram ouvir exatamente o que a outra está dizendo.

Diante desse quadro venho desenvolvendo uma série de observações e como ando bastante entusiasmado com a formulação delas, divido-as com o competente leitorado que, por certo, me ajudará passando-me as pesquisas que tenha a respeito.

Observe que:

1) Em geral o receptor não ouve o que o outro fala: ele ouve o que o outro não está dizendo.

2) O receptor não ouve o que o outro fala: ele ouve o que quer ouvir.

3) O receptor não ouve o que o outro fala. Ele ouve o que já escutara antes e coloca o que o outro está falando naquilo que se acostumou a ouvir.

4) O receptor não ouve o que o outro fala. Ele ouve o que imagina que o outro ia falar.

5) Numa discussão, em geral, os discutidores não ouvem o que o outro está falando. Eles ouvem quase que só o que estão pensando para dizer em seguida.

6) O receptor não ouve o que o outro fala, Ele ouve o que gostaria ou de ouvir ou que o outro dissesse.

7) A pessoa não ouve o que a outra fala. Ela ouve o que está sentindo.

8) A pessoa não ouve o que a outra fala. Ela ouve o que já pensava a respeito daquilo que a outra está falando.

9) A pessoa não ouve o que a outra está falando. Ela retira da fala da outra apenas as partes que tenham a ver com ela e a emocionem, agradem ou molestem.

10) A pessoa não ouve o que a outra está falando. Ouve o que confirme ou rejeite o seu próprio pensamento. Vale dizer, ela transforma o que a outra está falando em objeto de concordância ou descordância.

11) A pessoa não ouve o que a outra está falando: ouve o que possa se adaptar ao impulso de amor, raiva ou ódio que já sentia pela outra.

12) A pessoa não ouve o que a outra fala. Ouve da fala dela apenas aqueles pontos que possam fazer sentido para as idéias e pontos de vista que no momento a estejam influenciando ou tocando mais diretamente.

Esses doze pontos mostram como é raro e difícil conversar. Como é raro e difícil se comunicar! O que há, em geral, são monólogos simultâneos trocados à guisa de conversa, ou são monólogos paralelos, à guisa de diálogo. O próprio diálogo pode haver sem que, necessariamente, haja comunicação. Pode haver até um conhecimento a dois sem que necessariamente haja comunicação. Esta só se dá quando ambos os pólos ouvem-se, não, é claro, no sentido material de "escutar", mas no sentido de procurar compreender em sua extensão e profundidade o que o outro está dizendo.

Ouvir, portanto, é muito raro. É necessário limpar a mente de todos os ruídos e interferências do próprio pensamento durante a fala alheia.

Ouvir implica uma entrega ao outro, uma diluição nele. Daí a dificuldade de as pessoas inteligentes efetivamente ouvirem. A sua inteligência em funcionamento permanente, o seu hábito de pensar, avaliar, julgar e analisar tudo interferem como um ruído na plena recepção daquilo que o outro está falando.

Não é só a inteligência a atrapalhar a plena audiência. Outros elementos perturbam o ato de ouvir. Um deles é o mecanismo de defesa. Há pessoas que se defendem de ouvir o que as outras estão dizendo, por verdadeiro pavor inconsciente de se perderem a si mesmas. Elas precisam "não ouvir" porque "não ouvindo" livram-se da retificação dos próprios pontos de vista, da aceitação de realidades diferentes das próprias, de verdades idem, e assim por diante. Livram-se do novo, que é saúde, mas as apavora. Não é, pois, um sólido mecanismo de defesa.

Ouvir é um grande desafio. Desafia de abertura interior; de impulso na direção do próximo, de comunhão com ele, de aceitação dele como é e como pensa. Ouvir é proeza, ouvir é raridade. Ouvir é ato de sabedoria.

Depois que a pessoa aprende a ouvir ela passa a fazer descobertas incríveis escondidas ou patentes em tudo aquilo que os outros estão dizendo a propósito de falar.

Artur da Távola
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill