Interrogante: Todos nós, os teosofistas, estamos fundamentalmente
interessados na Verdade e no Amor, tanto como você está. Você não podia ter
ficado na nossa Sociedade, ajudando-nos, em vez de se separar de nós e
fazer-nos acusações?
Krishnamurti: Em primeiro lugar,
muitos de vocês estão achando isso divertido; outros estão um tanto quanto
agitados, outros apreensivos. Não o estão sentido? Vamos investigar.
Fundamentalmente, estamos, vocês
e eu, procurando a mesma coisa? Pode-se procurar a Verdade no seio de uma
organização qualquer? Vocês podem colocar um rótulo em vocês, e procurar a
verdade? Podem ser hinduístas e dizer: "Estou procurando a verdade?"
Porque, então, o que estão procurando não é a Verdade, mas a confirmação de uma crença.
Podem pertencer a qualquer a qualquer organização, a qualquer grupo espiritual,
e procurar a Verdade? Pode-se achar a Verdade coletivamente? Conhecem o amor,
quando acreditam? Não sabem que quando acreditam fortemente em alguma
coisa e eu acredito no contrário, não existe amor entre nós? Quando acreditam
em certos princípios hierárquicos e em certas autoridades, e eu não creio,
pensam que existe comunhão entre nós? Quando toda a estrutura de pensar de
vocês é o futuro, o vir-a-ser por meio da virtude, quando vão ser alguém no
futuro, quando o processo do pensar de vocês está baseado na autoridade e em
princípios hierárquicos, pensam que existe amor entre nós? Vocês podem se
servir de mim, por conveniência, e eu servir-me de vocês, por conveniência. Mas
isso não é amor. Vejamos com clareza. Não se agitem a respeito destas questões.
Não as compreenderão, se se agitarem por causa delas.
Para descobrir se realmente estão
em busca da Verdade e do amor, devem investigar, não acham? Se investigassem,
se descobrissem, interiormente, e, portanto, agissem, exteriormente, o que
aconteceria? Ficariam fora da sociedade (da vossa sociedade Teosófica) não é
verdade? Se duvidassem de suas crenças, não estariam de fora? — Enquanto houver
sociedades e organizações, — as chamadas organizações espirituais com
"direitos adquiridos", na propriedade, na crença, no saber — as
pessoas a elas pertencentes, evidentemente não estão em busca da verdade. Podem
dizer que estão. Cabe-lhes, pois, averiguar se estamos, fundamentalmente,
buscando a mesma coisa. Vocês podem ver a verdade por intermédio de um Mestre,
por intermédio de guru? Pensem bem nisso, senhores. É problema de vocês. Pode-se
descobrir a verdade através do tempo, no vir-a-ser alguma coisa? Pode-se
descobrir a verdade por intermédio do Mestre, do discípulo, do guru?
Que podem eles dizer-lhes, fundamentalmente? Só podem aconselhar-lhes a dissolver
o "eu". Estão fazendo isso? Se não estão, então, evidentemente, não
estão procurando a verdade. Não sou eu que estou dizendo-lhes que não estão procurando
a verdade, mas p fato é que se dizem: "Vou ser alguém", se ocupam uma
posição de autoridade espiritual, não podem estar em busca da verdade. Sou
muito claro, a respeito desses assuntos e não estou procurando persuadir-lhes a
aceitar ou rejeitar — o que seria estupidez. Não posso fazer-lhes acusações,
como diz o interrogante. Apesar de me ouvirem há vinte anos, continuam
com suas crenças; porque é uma coisa muito reconfortante sabermos que
temos quem cuide de nós, que temos mensageiros especiais para o futuro, que
irão ser algo belo, agora, no final dos tempos. Assim continuarão, porque
possuem os seus "direitos adquiridos, suas propriedades, seus empregos,
crenças e conhecimentos. Não duvidam deles. A mesma coisa acontece no mundo
inteiro. Não é só este ou aquele grupo de indivíduos, mas todos os grupos — católicos,
protestantes, comunistas, capitalistas — se encontram nas mesmas condições.
Todos têm os seus direitos adquiridos. O homem que é verdadeiramente
revolucionário, que interiormente está percebendo a verdade sobre todas essas
coisas, esse homem achará a Verdade. Saberá o que é o amor, não numa data
futura, porque isso nenhum valor tem. Quando um homem tem fome, quer comer
agora e não amanhã. Mas vocês possuem cômodas teorias, sobre o tempo,
sobre o correr do tempo, a que estão presos. Por conseguinte, onde está a
ligação, onde está a relação entre vocês e eu, ou entre vocês e aquilo que
estão tentando descobrir? E, no entanto, todos falam de amor, de fraternidade,
e tudo o que fazem é o contrário. É um fato evidente, senhores, que no momento
em que há organização, há necessariamente intrigas para a conquista de postos,
de autoridade; conhecem bem isso.
Assim, o necessário não é que eu
lhes acuse ou que vocês me acusem e me expulsem. O problema não é este. É claro
que precisam repelir um homem que lhes diz que aquilo que acreditam, o que
fazem é errado; ou, interiormente, deveriam fazer, porque eu digo que me oponho
àquilo que desejam. Se realmente desejam procurar, se realmente desejam achar a
Verdade e o amor, deve haver unidade de propósitos, abandono completo de todos
os seus direitos adquiridos; o que significa que devem ficar interiormente vazios,
pobres, sem estar buscando, sem estar conquistando posições de autoridade, como
expoentes ou portadores de mensagens dos Mestres. Precisam estar despojados de
tudo. Como, entretanto, não desejam isso, naturalmente adquirem rótulos,
crenças e várias formas de segurança. Senhores, não rejeitem o que digo;
averiguem se de fato estão — como dizem — fundamentalmente em busca da Verdade.
Tenho minhas dúvidas. Duvido, realmente, quando lhes ouço dizer "estou em
busca da Verdade". Não podem procurar a Verdade, porque a busca de vocês é
uma projeção de si mesmos, de seus próprios desejos; o "experimentar"
de vocês dessa projeção é uma experiência que desejam. Mas quando não estão
buscando, quando a mente se acha quieta e serena, sem nenhum desejo, nenhum
motivo, nenhuma compulsão, verão então que vem o êxtase. Para que o êxtase
venha, precisam estar despojados de tudo, vazios, sós. A maioria das pessoas
ingressa em tais organizações porque são gregárias, porque elas são grêmios e o
ingressar em grêmios tem suas vantagens, socialmente falando.
Pensam que irão achar a Verdade, enquanto estão em busca de conforto, de satisfação,
de segurança social? Não, senhores; devem ficar sós, sem arrimo algum, sem
amigos, sem guru, sem esperança, interiormente despidos tudo, vazios. Só
então, assim como se pode encher uma taça vazia, pode o vazio interior
encher-se com aquilo que é eterno.
Jiddu Krishnamurti — 20 de janeiro de 1952 – Quando o pensamento cessa
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