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segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Experiência, satisfação, dualidade e meditação

Todos nós desejamos experiências de alguma natureza: a experiência mística, a religiosa, a sexual, a experiência de possuir muito dinheiro, poder, posição, domínio. Tornando-nos mais velhos, podemos ter acabado com as exigências de nossos apetites físicos, porém exigimos experiências mais amplas, profundas, significativas e tentamos, por vários meios, obtê-las: expandindo a nossa consciência, por exemplo, o que com efeito é uma arte, ou tomando drogas de toda espécie. Este é um velho expediente, existente desde tempos imemoriais — mastigar um pedaço de folha ou experimentar o mais novo produto químico, a fim de provocar uma alteração temporária na estrutura das células cerebrais, uma sensibilidade maior e uma percepção mais intensa que proporcione um simulacro da realidade. Essa exigência de sucessivas experiências denota a pobreza interior do homem. Pensamos que por meio delas podemos fugir de nós mesmos, mas essas experiências são condicionadas pelo que somos. Se a mente é mesquinha, ciumenta, ansiosa, a pessoa poderá tomar a mais moderna droga, porém só verá sua própria e insignificante criação, as projeções sem importância de seu próprio fundo condicionado.

A maioria exige experiências completamente satisfatórias e duradouras, que não possam ser destruídas pelo pensamento. Assim, atrás dessa exigência, está o desejo de satisfação, e esse desejo de satisfação dita a experiência; por conseguinte, temos de compreender não só essa matéria de satisfação, mas também a coisa que se experimenta. Ter uma grande satisfação é experimentar um grande prazer; quanto mais duradoura, profunda e ampla a experiência, tanto mais agradável e, portanto, o prazer dita a forma de experiência que queremos; o prazer é justamente a medida com a qual avaliamos a experiência. Tudo o que é mensurável encontra-se nos limites do pensamento e tem a propriedade de criar a ilusão. Podeis ter experiências maravilhosas e vos sentirdes completamente frustrado. Tereis inevitavelmente visões em conformidade com vosso condicionamento; vereis o Cristo ou o Buda ou outro qualquer em quem credes, e quanto mais crente fordes, tanto mais intensas serão as vossas visões, as projeções de vossas exigências e ânsias.

Assim, se na busca de uma coisa fundamental, tal como a verdade, o prazer é a vossa medida, já projetastes o que a experiência será e, por conseguinte, ela já não é válida.

Que entendemos por experiência? Há nela alguma coisa nova ou original? A experiência é um feixe de memórias reagindo a um desafio, e só pode reagir de acordo com o passado, e quanto mais hábil fordes no interpretar a experiência, tanto mais reage esse passado. Assim, deveis questionar não só a experiência de outrem, mas também a vossa própria. Se não reconheceis uma experiência, não há experiência nenhuma. Toda experiência já foi experimentada, senão não a reconheceríeis. Reconheceis que uma experiência é boa, má, bela, sagrada etc., conforme o vosso condicionamento e, por conseguinte, o reconhecimento de uma experiência tem de ser inevitavelmente velho.

Quando exigimos uma experiência da realidade — como todos nós a exigimos, não? — para experimentá-la, devemos conhecê-la e, tão logo a reconhecemos, já a projetamos e, portanto, ela não é real, porquanto está ainda no âmbito do pensamento e do tempo. Se o pensamento pode pensar sobre a realidade, isso não pode ser a realidade. Não se pode reconhecer uma experiência nova. É impossível. Só reconhecemos aquilo que já conhecemos e, por conseguinte, quando dizemos que tivemos uma nova experiência, ela não é absolutamente nova. A busca de mais experiência pela expansão da consciência, como se tem feito por meio de várias drogas psicodélicas, está ainda no campo da consciência e, por conseguinte, é muito limitada.

Descobrimos, pois, uma verdade fundamental, ou seja que a mente que está a buscar e a ansiar por experiências mais amplas e profundas é uma mente muito superficial e embotada, porquanto está sempre vivendo com suas memórias.

Agora, se não tivéssemos experiência alguma, que nos aconteceria? Dependemos de experiências, de desafios, para nos mantermos despertos. Se não houvesse conflito em nosso interior, se não houvesse mudanças, perturbações, estaríamos todos dormindo a sono solto. Assim, os desafios são necessários à maioria das pessoas; pensamos que, sem eles, a mente se tornará estúpida e pesada e, por conseguinte, dependemos de um desafio, de uma experiência, para termos mais animação, mais intensidade, para termos uma mente mais penetrante. Mas, com efeito, essa dependência dos desafios e das experiências, para nos conservarmos despertos, só torna a nossa mente mais embotada ainda; não nos mantém realmente despertos. Assim, pergunto a mim mesmo: "É possível nos mantermos totalmente despertos — não superficialmente, em alguns pontos de meu ser, porém totalmente despertos, sem nenhum desafio ou experiência?" Isso exige uma grande sensibilidade, tanto física como psicológica; significa que devo estar livre de todas as exigência, porque, no momento em que exijo uma experiência, a terei. E, para ficar livre da exigência de satisfação, torna-se necessária uma investigação de mim mesmo e uma compreensão total da natureza da exigência.

Toda exigência nasce da dualidade: "Sou infeliz, e tenho de ser feliz". Nessa própria exigência — tenho de ser feliz — está a infelicidade. Quando uma pessoa se esforça para ser boa, nesse próprio ser bom está o seu oposto — ser mau. Tudo o que se afirma contém o seu próprio oposto; e o esforço que se faz para dominá-lo torna mais forte aquilo contra que se luta. Quando exigis uma experiência da verdade ou da realidade, essa própria exigência nasceu de vosso descontentamento com o que ê; por conseguinte, a exigência cria o oposto. No oposto está o que foi. Temos, pois, de ficar livres dessa incessante exigência, porquanto, do contrário, nunca se acabará a galeria da dualidade. Isso significa conhecer a si próprio de maneira tão completa que a mente não mais se ponha a buscar.

A mente, então, não exige experiência; não pode pedir ou conhecer um desafio; não diz "Estou dormindo", "Estou acordada". Ela é, toda ela, o que é. Só a mente frustrada, limitada, superficial, condicionada, está sempre a buscar o mais. Será possível, então, viver neste mundo sem o mais — sem essa perene comparação? É, decerto, mas temos de descobri-lo por nós mesmos.

A investigação completa dessa questão é meditação. Esta palavra tem sido empregada, tanto no Oriente como no Ocidente, de uma maneira muito lamentável. Há diferentes escolas de meditação, diferentes métodos e sistemas. Certos sistemas ensinam: "Observa os movimentos do dedo grande de teu pé, observa-o, observa-o, observa-o"; outros advogam o ficar sentado numa certa postura, respirando regularmente ou praticando o percebimento. Tudo isso é completamente mecânico. Outro método dá-vos uma certa palavra, e vos diz que, se ficardes repetindo essa palavra, ela vos proporcionará uma certa experiência fundamental, extraordinária. Isso é puro absurdo. É uma forma de auto-hipnose. Se ficardes repetindo indefinidamente Amém ou Om ou Coca-Cola, é óbvio que tereis uma certa experiência, porque, pela repetição, a mente se aquieta. Esse é um fenômeno bem conhecido, praticado há milhares de anos na índia; chama-se Mantra Ioga. Pela repetição pode-se induzir a mente a tornar-se branda e macia, entretanto ela continua pequenina, vulgar, mesquinha. O mesmo efeito se obteria com apanhar no jardim um pedaço de pau, colocá-lo sobre a lareira, e oferecer-lhe todos os dias uma flor. Daí a um mês o estaríeis adorando, e se deixásseis de depositar uma flor diante dele, isso seria um pecado.

Meditação não é seguir um sistema; não é repetição e imitação constantes. Meditação não é concentração. Um dos truques de certos instrutores de meditação é insistirem em que os seus discípulos aprendam a concentração, ou seja fixar a mente num pensamento e expulsar todos os outros pensamentos. Essa é uma das coisas mais estúpidas e mais maléficas, e qualquer colegial é capaz de fazê-la, se obrigado a tal. Significa que ficais empenhado numa contínua batalha entre a obrigação de vos concentrardes, a um lado, e a vossa mente, a outro lado, que se põe a fugir para outras e variadas coisas — quando, ao contrário, devemos estar atentos a cada movimento da mente, aonde quer que ela vá. Quando vossa mente foge, isso significa que estais interessado em alguma outra coisa.

A meditação exige uma mente sobremodo vigilante; a meditação é a compreensão da totalidade da vida, na qual não existe mais nenhuma espécie de fragmentação. Meditação não é controle do pensamento, porque, quando o pensamento é controlado, gera conflito na mente; mas, quando se compreende a estrutura e origem do pensamento, assunto que já examinamos, o pensamento então não mais interfere. Essa compreensão da estrutura do pensar é sua própria disciplina, que é meditação.

Meditação é estar cônscio de cada pensamento e de cada sentimento, nunca dizer que ele é certo ou errado, porém simplesmente observar e acompanhar seu movimento. Nessa vigilância, compreendeis o movimento total do pensamento e do sentimento. E dessa vigilância vem o silêncio. O silêncio criado pelo pensamento é estagnação, coisa morta, porém o silêncio que vem quando o pensamento compreendeu a sua própria origem, sua própria natureza, compreendeu que nenhum pensamento é livre, porém sempre velho — esse silêncio é meditação, na qual o meditador está de todo ausente, porque a mente se esvaziou do passado.

Se lestes este livro durante uma hora, isso é meditação. Se apenas recolhestes umas poucas palavras e juntastes algumas idéias, para sobre elas refletirdes mais tarde, isso então já não é meditação. Meditação é um estado em que a mente olha todas as coisas com toda a atenção e não apenas com algumas partes dela. Ninguém pode ensinar-vos a prestar atenção. Se algum sistema vos ensina a estar atento, estais então atento ao sistema, e isso não é atenção. A meditação é uma das maiores artes da vida — talvez a maior de todas — mas não se pode de modo nenhum aprendê-la de alguém — e essa é que é a sua beleza. Ela não tem técnica e, por conseguinte, nenhuma autoridade. Quando estais aprendendo a conhecer-vos realmente, quando vos observais, observais vossa maneira de andar, de comer, o que dizeis, vossas tagarelices, vosso ódio, vosso ciúme, se estais cônscio de tudo isso, em vós mesmo, sem nenhuma escolha, isso faz parte da meditação.

Assim, a meditação pode verificar-se quando estais sentado num ônibus ou passeando numa floresta toda de luz e de sombra, ou ouvindo o canto dos pássaros, ou olhando o rosto de vossa mulher ou de vosso filho.

Na compreensão dada pela meditação há amor, e o amor não é produto de sistemas, de hábitos, da observância de um método. O amor não pode ser cultivado pelo pensamento. O amor pode, talvez, nascer quando há silêncio completo, um silêncio no qual esteja de todo ausente o meditador; e a mente só é capaz de silêncio quando compreende seu próprio movimento como pensamento e sentimento. Para se compreender esse movimento de pensamento e de sentimento, não pode haver condenação enquanto se observa. Observar dessa maneira é disciplina, e essa qualidade de disciplina é fluida, livre, e assim não é a disciplina do ajustamento.

Krishnamurti - Liberte-se do passado

A Transformação do Homem (7 vídeos)

"Estamos lidando com a vida diária real de cada ser humano. Estamos lidando com fatos reais, como o medo, prazer, sofrimento, morte e se há alguma coisa sagrada na vida. Porque se não encontrarmos algo real, algo que seja verdadeiro, a vida tem muito pouco significado. Mas para isso você precisa ser sério, sério de fato. Ouvir com cuidado, com atenção, com um sentimento de afeição, sem concordar ou discordar. Se você realmente se importa em descobrir como viver corretamente, qual é a relação correta entre os seres humanos, então penso que você compartilharia, inteiramente, tudo que foi abordado em nosso diálogo." - J.Krishnamurti

- Estes diálogos com o físico Dabid Bohm e o psiquiatra Davis Shainberg trazem à luz a questão da fragmentação da mente que é profundamente condicionada pela raça e nacionalidade, religião e ideologia, todas elas
produzindo divisão, medo e conflito.

A Transformação do Homem

Diálogos realizados entre David Bohm (Físico), David Shainberg (Psiquiatra), e Krishamurti. São 7 Diálogos com duração de aproximadamente 1 hora realizados em Brockwood Park em Maio de 1976, abordando vários temas como:

1 - Estamos conscientes de que estamos fragmentados?
2 - Um Modo Mecânico de Viver leva a Vida à Desordem.
3 - A Consciência pode esvaziar a si própria?
4 - Sobre a Criação de Imagens.
5 - Existe o Cérebro Inconsciente?
6 - O Observador é a coisa Observada?
7 - O que é a Morte? A Morte tem algum significado?

Introdução


Estamos conscientes de que estamos fragmentados?


Existe Segurança Pscológica?


Posso Mudar Completamente na Própria Raiz?


Na solidão você pode estar completamente seguro


Existe o Cérebro Inconsciente?


O Observador é a coisa Observada?


O que é a Morte? A Morte tem algum significado?

domingo, 6 de janeiro de 2013

Áudio: Diálogo sobre a ausência de uma educação psíquica

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Questionário da Criança ferida

As perguntas desta seção permitem uma visão geral do quanto a criança que há em você está ferida ou magoada. Na segunda parte, apresento um índice mais específico de suspeitas para cada estágio de desenvolvimento.

A IDENTIDADE

1. Sinto-me ansioso/a e temeroso/a sempre que tenho de fazer alguma coisa nova.
( ) SIM ( ) NÃO

2. Gosto de agradar as pessoas (uma pessoa legal) e não tenho identidade própria.
( ) SIM ( ) NÃO

3. Sou um/a rebelde. Sinto-me vivo/a quando estou em conflito.
( ) SIM ( ) NÃO

Nas profundezas do meu eu secreto, sinto que há alguma coisa errada comigo.
( ) SIM ( ) NÃO

4. Tenho mania de guardar tudo, é difícil para mim me desfazer de alguma coisa.
( ) SIM ( ) NÃO

5. Sinto-me inadequado/a como homem/mulher.
( ) SIM ( ) NÃO

6. Sinto-me confuso/a sobre minha identidade sexual.
( ) SIM ( ) NÃO

7. Sinto-me culpado/a quando defendo meus pontos de vista e teria preferido ceder sempre.
( ) SIM ( ) NÃO

8. Tenho dificuldade em começar alguma coisa.
( ) SIM ( ) NÃO

9. Tenho dificuldade em terminar as coisas.
( ) SIM ( ) NÃO

10. Raramente tenho um pensamento realmente meu.
( ) SIM ( ) NÃO

11. Estou sempre criticando minha incapacidade.
( ) SIM ( ) NÃO

12. Considero-me um/uma grande pecador/a e tenho medo de ir para o inferno.
( ) SIM ( ) NÃO

13. Sou rígido/a e perfeccionista.
( ) SIM ( ) NÃO

14. Sinto que nunca correspondo às expectativas, nunca faço a coisa certa.
( ) SIM ( ) NÃO

15. Sinto-me como se não soubesse o que quero realmente.
( ) SIM ( ) NÃO

16. Sinto-me impulsionado/a a ser um/a grande realizador/a.
( ) SIM ( ) NÃO

17. Acredito que só tenho valor quando pratico sexo. Tenho medo de ser rejeitado/a e abandonado/a se não for eficiente nessa atividade.
( ) SIM ( ) NÃO

18. Minha vida é vazia.
( ) SIM ( ) NÃO

19. Sinto-me deprimido/a a maior pane do tempo.
( ) SIM ( ) NÃO

20. Não sei realmente quem eu sou. Não tenho certeza de quais são os meus valores nem de que penso sobre as coisas.
( ) SIM ( ) NÃO

EXIGÊNCIAS BÁSICAS

21. Não tenho contato com as necessidades do meu corpo. Não sei quando estou cansado/a, com fome ou com vontade de fazer sexo.
( ) SIM ( ) NÃO

22. Não gosto de ser tocado/a.
( ) SIM ( ) NÃO

23. Geralmente faço sexo sem ter vontade.
( ) SIM ( ) NÃO

24. Tive ou tenho atualmente distúrbios digestivos.
( ) SIM ( ) NÃO

25. Sou viciado/a em sexo oral.
( ) SIM ( ) NÃO

26. Raramente sei o que estou sentindo.
( ) SIM ( ) NÃO

27. Envergonho-me sempre que fico zangado/a.
( ) SIM ( ) NÃO

28. Raramente fico zangado/a, mas quando acontece, sou uma fúria.
( ) SIM ( ) NÃO

29. Tenho medo da raiva de outras pessoas e sou capaz de qualquer coisa para controlá-las.
( ) SIM ( ) NÃO

30. Tenho vergonha de chorar.
( ) SIM ( ) NÃO

31. Tenho vergonha de ficar assustado/a.
( ) SIM ( ) NÃO

32. Quase nunca demonstro emoções desagradáveis.
( ) SIM ( ) NÃO

33. Sou obcecado/a por sexo anal.
( ) SIM ( ) NÃO

34. Sou obcecado/a por sexo sadomasoquista.
( ) SIM ( ) NÃO

35. Tenho vergonha das funções do meu corpo.
( ) SIM ( ) NÃO

36. Sofro de perturbações do sono.
( ) SIM ( ) NÃO

37. Passo muito tempo olhando pornografia.
( ) SIM ( ) NÃO

38. Tenho me exibido sexualmente de forma a ofender outras pessoas.
( ) SIM ( ) NÃO

39. Sinto-me sexualmente atraído por crianças e tenho medo de ceder a essa atração.
( ) SIM ( ) NÃO

40. Acredito que comida e/ou sexo são minhas maiores necessidades.

SOCIAL

41. Basicamente desconfio de todos, inclusive de mim mesmo.
( ) SIM ( ) NÃO

42. Fui casado/a ou estou casado/a com um/a viciado/a.
( ) SIM ( ) NÃO

43. Sou obsessivo/a e controlador/a nos meus relacionamentos.
( ) SIM ( ) NÃO

44. Sou viciado/a.
( ) SIM ( ) NÃO

45. Eu me isolo e tenho medo das pessoas, especialmente, dos representantes da autoridade.
( ) SIM ( ) NÃO

46. Detesto ficar sozinho/a e sou capaz de qualquer coisa para ter companhia.
( ) SIM ( ) NÃO

47. Geralmente faço o que os outros esperam que eu faça.
( ) SIM ( ) NÃO

48. Evito conflitos a todo custo.
( ) SIM ( ) NÃO

49. Raramente digo não e sinto que as sugestões dos outros são como ordens a que devo obedecer. ( ) ( ) SIM ( ) NÃO

50. Tenho um exagerado senso de responsabilidade; é mais fácil para mim me preocupar com outra pessoa do que comigo.
( ) SIM ( ) NÃO

51. Geralmente não digo não e depois me recuso a fazer o que os outros pedem, usando uma variedade de meios manipuladores, indiretos e passivos.
( ) SIM ( ) NÃO

52. Não sei resolver conflitos com outras pessoas. Ou domino meu oponente ou me afasto dele completamente.
( ) SIM ( ) NÃO

53. Raramente peço explicação de coisas que não entendo.
( ) SIM ( ) NÃO

54. Freqüentemente adivinho o significado do que os outros dizem e respondo baseado/a nessa adivinhação.
( ) SIM ( ) NÃO

55. Nunca me senti muito chegado/a a meu pai ou a minha mãe.
( ) SIM ( ) NÃO

56. Confundo amor com piedade e amo as pessoas das quais posso ter pena.
( ) SIM ( ) NÃO

57. Ridicularizo meus erros e os dos outros.
( ) SIM ( ) NÃO

58. Cedo com facilidade e concordo com o grupo.
( ) SIM ( ) NÃO

59. Sou extremamente competitivo/a e não sei perder.
( ) SIM ( ) NÃO

60. Meu maior medo é de ser abandonado/a e faço qualquer coisa para não terminar um relacionamento.

Se você respondeu sim a dez perguntas, ou mais, precisa começar um trabalho muito sério. Este livro (VOLTA AO LAR - Como resgatar e defender sua criança interior) é para você.

Sobre o ficar-consigo-mesmo e ir fundo na inquietação

Um sentimento básico de nossa época parece-me ser a fragmentação  Muitas pessoas sentem-se internamente fragmentadas. Elas têm a impressão de serem puxadas de um lado a outro pelas muitas exigências impostas a elas, na profissão, na família, no sacerdó­cio, na comunidade política. Muitas vezes elas não sabem que papel representam. Trocam-no tantas vezes que nem sabem mais quem são verdadeiramente. Não têm mais tranquilidade interior. Quando voltam do trabalho, à noite, não conseguem desligar-se. A intranquilidade persegue-as até no sono. Em toda essa atividade infatigável elas não estão consigo mesmas. Não estão em contato com seu "eu" verdadeiro. São empurradas de um compromisso a outro. Sua alma não as acompanha mais. Não está onde o corpo precisa estar, para cumprir todas as suas obrigações.

Uma antiga história monacal fala dessa fragmentação: "O patriarca Poimen perguntou ao patriarca José: 'Diga-me como poderei tomar-me monge?' Ele respondeu: 'Se você quer encontrar a paz, em todos os lugares, então diga, em todas as suas ações: Eu - quem sou eu? E não julgue ninguém!"'

A palavra grega que designa monge, "monachos", às vezes é derivada de "monas = unidade, ser uno". Um homem jovem sente-se fragmentado. Ele quer voltar para si mesmo, para sua unidade, e encontrar a paz. Ele quer estar consigo mesmo, em todos os lugares. Poimen o aconselha a perguntar, em tudo o que fizer: "Eu - quem sou eu?" E procurar sua verdadeira identidade.

Quem é esse, que está agindo assim? Será que há apenas uma parte de mim no trabalho? Será que estou envolvido por inteiro? Há uma parte de mim em outro lugar? Na verdade, a pergunta de Poimen é a seguinte: "Como posso ser inteiro?" Como posso estar por inteiro naquilo que faço? Como posso viver como uma pessoa inteira, que sempre e em todos os lugares é una consigo mesma? Como posso encontrar minha unidade nas muitas coi­sas que faço e que muitas vezes me fragmentam? Além dessas perguntas, que se dirigem ao "eu" verdadeiro, passando pelos muitos papéis que representamos e pelas muitas máscaras que usamos, Poimen ainda exige que o jovem não julgue ninguém. Quando julgo, não estou comigo mesmo, mas com o outro. Por meio do julgamento que faço dos outros, desvio-me de mim mesmo. Poimen quer levar o interpelante a ficar com ele mesmo. Só assim ele descobrirá quem é na verdade. Só assim ele encontrará o caminho para sua unidade, para seu ser inteiro. Só assim ele será um monge.

Muitos sentem-se fragmentados porque descobrem em si facetas que não combinam com sua auto-imagem. Assustam-se diante de suas fantasias sádicas, de seus desejos masoquistas e de suas tendências destrutivas. Não sabem como reagir adequada­mente a suas facetas obscuras, se devem reprimi-las e abafá-las ou simplesmente fugir delas.

(...)


1. A akedia

O antigo monacato fala do fenômeno da fragmentação, sobretu­do na descrição da akedia. Normalmente akedia é traduzido por ausência de ânimo, ou indolência. Mas na verdade é a incapaci­dade de ser uno consigo mesmo, com o momento presente, com a própria situação de vida. Evagrius Ponticus descreve um monge que e assediado pelo demônio da akedia:

"Primeiro ele aparece para o monge, fazendo com que o sol, (fitando se movimenta, só o faça muito lentamente, e então o dia passa a ter a duração de no mínimo cinqüenta horas. O monge se sente impelido a olhar constantemente pela janela, a deixar a cela, a olhar cuidadosamente para o sol, para tentar saber o quanto ele ainda está distante da nona hora; a olhar para várias direções, para talvez ver um ou outro de seus irmãos deixar a cela. Lentamente o demônio faz com que no coração do monge surja um enorme ódio do local em que se encontra, de sua vida atual e também do trabalho que ele executa, ele (o demônio) faz o monge acreditar que o amor entre os irmãos está morto e que não há ninguém que lhe possa dar algum ânimo. Se, durante essa fase, alguém por acaso chega muito perto do monge, então o demônio utiliza a oportunidade para aprofundar ainda mais esse ódio. Ele consegue fazer o monge sentir um forte desejo de estar em outros lugares, onde este pode obter mais facilmente o que precisa para viver, onde é mais fácil encontrar trabalho, e onde existe uma promessa maior de sucesso " (Evagrius, 12).

A akedia dilacera-nos interiormente. Tornamo-nos insatisfeitos com nós mesmos, com o local em que vivemos, com as pessoas que convivem conosco, com o tempo que nos parece tão entediante, com o trabalho, com o modo de vida, com tudo.

Há uma rejeição de tudo o que nos cerca. Mas há, igualmente uma rejeição de nossa própria pessoa. Sentimo-nos insatisfeitos, mas também não sabemos o que queremos verdadeiramente. Rebelamo-nos contra tudo. Mas não temos um objetivo. Apegamo-nos a ilusões aleatórias. Não conseguimos usufruir o momento presente. Quando oramos, temos a impressão de que na verdade deveríamos estar trabalhando. Quando trabalhamos, tudo nos parece difícil. Sentimo-nos cansados, temos a impressão de trabalharmos excessivamente, de estarmos estressados. Mas quando resolvemos descansar, não sabemos o que fazer com o tempo livre. Ele nos parece entediante e inútil. Nunca estamos efetivamente no lugar em que nos encontramos naquele instante, e nunca vivenciamos o momento presente. Sempre estamos em outro lugar, e ao mesmo tempo em lugar nenhum. A akedia é a definição mais radical de fragmentação interna que pode acometer as pessoas. Ela não é apenas a doença típica dos monges, é sem dúvida também um fenômeno dos tempos atuais.

A fragmentação do homem de hoje não se mostra apenas, como em Paulo, na cisão entre vontade e ação, entre lei e pecado, mas sobretudo na cisão entre desejo e realidade. Por causa da akedia confrontamo-nos frequentemente com desejos irrealistas, ilusões infantis sobre a vida, expectativas exageradas. Exigimos tudo dos outros e ficamos zangados quando eles não nos possibilitam ter a vida que sonhamos. Mas os outros podem até se esforçar em realizar nossos desejos. Nunca o conseguirão. Pois nossos desejos são imensos, incomensuráveis. Neles é que nos abrigamos, fugindo da realidade deste mundo. Negamo-nos a dizer sim a nosso "ser" humano, com suas restrições e limitações. Achamos que podemos reivindicar tudo, infinitamente.

A sociedade, a Igreja, a família, a empresa, são como grandes mães, das quais sempre esperamos tudo. E são culpadas quando nos sentimos insatisfeitos. Nem percebemos como essa postura nos remete à postura de uma criança insatisfeita, que também não sabe o que quer. Ela só sabe que não quer aquilo que lhe oferecem.

Pascal Bruckner descreveu essa postura como típica de nossa sociedade. É a negação de se compatibilizar com a realidade. Queremos sempre mais. Temos a impressão de que a ciência e o estado só existem para satisfazer todos os nossos desejos: "Todos os dias exigimos, em todos os campos, um desenvolvimento mais veloz. A técnica alimenta em nós a religião da ganância, com ela o possível torna-se desejável e o desejável necessário. Merecemos o melhor. A indústria e a ciência acostumaram-nos a uma tal produtividade, que ficamos furiosos quando as descobertas se tornam mais raras, quando a satisfação que sentimos com sua concretização é obrigada a esperar. 'Isso é insuportável', clamamos - com a imensa raiva de uma criança temperamental que, diante de um brinquedo, bate o pé e grita: eu quero isso"' (Bruckner, 71s). Mas essa criança temperamental não sabe o que quer realmente. Está sempre insatisfeita. É imatura, nunca descobriu seu próprio eu. E sem a experiência de nosso próprio centro somos dilacerados pelos desejos, puxados de um lado a outro pelas impressões externas.

2. O ficar-consigo-mesmo

Como método de cura para a akedia, Evagrius sugere aguentar firme, permanecer no próprio Kellion (pequena habitação do monge eremita). Precisamos permanecer com nós mesmos, para encontrarmos novamente nosso centro.

"Na hora da tentação você não deveria procurar pretextos mais ou menos fidedignos para deixar sua cela, mas permanecer decididamente dentro dela e ser paciente. Simplesmente aceite o que a tentação lhe traz. Sobretudo, encare de frente essa tentação da akedia, pois ela é a pior de todas, mas tem como resultado uma grande purificação da alma. Fugir desses conflitos ou espantá-los torna o espírito inábil, covarde e temeroso" (Evagrius, 28).

O que acontece quando permaneço na cela sem fazer alguma coisa determinada, sem orar, meditar ou ler alguma coisa? Milhares de pensamentos me acometem. Surgem sentimentos, lembranças, decepções, suposições, saudades. Às vezes aflora um caos de emoções. Se eu não fugir, mas aguentar firme, as emoções poderão lentamente se ordenar. Nesse caso a pergunta de Poimen é bastante útil: "Eu - quem sou eu?" Essa pergunta coloca os diversos pensamentos e sentimentos numa ordem, segundo sua relação com meu "eu" verdadeiro. Assim, muita coisa se revelará totalmente sem importância. Outras coisas vão ocupar minha atenção. Gradualmente chegarei a meu problema central. Qual é a questão fundamental de minha vida? Qual é meu anseio mais profundo  Em que momento vivo distante de minha verdade? Quem sou realmente? Como é essa imagem original, não falsificada, que Deus fez de mim? Não encontrarei uma resposta imediata para isso, a qualquer momento a pergunta pelo "eu" verdadeiro reaparecerá  Simplesmente estou aqui. Estou em meu centro. Estou em contato comigo mesmo, com o ser, com o mistério. Estou junto a Deus, diante de Deus e em Deus. E uma paz profunda me cerca. A presença amantíssima e curadora de Deus me envolve. Isso me basta. A fragmentação é suprimida. Tudo é uno.

Se eu me esquivar dos problemas, nunca encontrarei uma solução. Se eu ceder a minha fragmentação e me virar para cá ou para lá, serei cada vez mais dilacerado. Preciso aguentar tudo isso sozinho, por mais difícil que seja. Preciso ir ao fundo de minha inquietação. Então encontrarei as ilusões que criei sobre a vida, minhas pretensões exageradas e fantasias megalômanas infantis. E quando eu as reconheço e identifico como aquilo que são realmente — um pé atolado na infantilidade — então poderei reconciliar-me lentamente comigo mesmo e com minha situação. Se eu permanecer pacientemente comigo mesmo e aguentar, então as forças que estão se fragmentando em meu interior se unirão novamente, eu voltarei a ser uno e encontrarei de novo meu centro.

O ficar-consigo-mesmo é um caminho importante para reconciliarmos os opostos dentro de nós, para nos aguentarmos em nossa cisão. Evagrius descreve outros caminhos para nos livrarmos do domínio das paixões. A "apatheia" é um estado no qual as paixões não nos dominam mais, elas passam a nos servir, e se aquietam. Na "apatheia" posso lidar livremente com minhas paixões. Não fico mais amarrado a elas, dependente delas. Na verdade elas me levam à vida, e finalmente a Deus. Só quando alcanço essa liberdade interior, quando nada mais que vem de fora me domina, só então encontro meu "eu" verdadeiro. Evagrius diz que na "apa­theia" eu posso ver minha própria luz. Posso tomar consciência de meu cerne mais profundo. E ele é uma luz muito clara. A luz é para mim uma imagem do "eu", o cerne mais profundo do ser humano, no qual também mora Deus, a verdadeira luz.

Relato sobre o estado de consciência elevado e ampliado

Como a transformação de meu estado de consciência é a particularidade mais importante de minha experiência, aquela sobre a qual desejaria chamar a atenção, devido à extensão incalculável de seus resultados, é necessário que eu me estenda um pouco mais sobre esta modificação extraordinária, que durante muito tempo considerei como uma anomalia ou uma ilusão.

O estado de consciência elevado e ampliado, permeado por uma indizível felicidade de ordem supraterrestre, o qual experimentei quando da primeira manifestação da serpente de fogo em mim, era um fenômeno interior, de natureza subjetiva, indicando uma expansão do campo de consciência, ou do eu conhecedor, sem forma, Invisível e infinitamente sutil. Em o observador dentro do corpo, sempre além de qualquer exame, impossível de definir ou descrever. A partir da unidade de consciência que eu era originalmente, dominada pelo ego, e à qual eu estava habituado desde a infância, eu me expandia repentinamente em um círculo de consciência resplandecente, que se alargava cada vez mais, até que um máximo fosse atingido: o “eu” continuava a ser o que sempre fora, mas em lugar de uma unidade constrangedora, limitadora, ele próprio estava agora cercado de uma esfera de consciência luminosa de grandes dimensões. À falta de melhor comparação, eu diria que de minúsculo clarão que era, a consciência em mim se tornara um vasto lago de luz irradiante; o “eu”, completamente imerso nesse lago, tinha ao mesmo tempo pleno conhecimento do volume beatificamente resplandecente da consciência ao redor, tanto próxima quanto longínqua. Para ser mais preciso, havia a consciência do "eu" ao mesmo tempo que um campo de consciência de vasta expansão, existindo simultaneamente, distintos e, no entanto, sendo apenas um.

Este fenômeno notável, indelevelmente impresso em minha memória, tão real que dele me recordo da mesma maneira que quando ele se produziu, não tornou a se repetir em todo o seu esplendor original senão muito tempo depois. Durante as semanas e os meses penosos que se seguiram, não houve nenhuma semelhança entre minha experiência inicial e as condições mentais extremamente perturbadas que vivi, com exceção do fato de que eu estava dolorosamente consciente de que ocorrera uma expansão, de uma maneira ou de outra, produzida naquilo que constitua a área de minha consciência, e que ela estava sujeita com freqüência a contrações parciais.

Quando de minha vinda para Jammu, eu havia recobrado meu equilíbrio mental e, ao cabo de pouco tempo, fui plenamente restituído a mim mesmo, com todos os meus traços individuais e as minhas particularidades. Mas a incontestável modificação em minha faculdade cognitiva – que eu havia notado depois de certo tempo e que me era constantemente lembrada quando contemplava um objeto exterior ou uma imagem mental interior – não sofreu nenhuma mudança. O único fato novo é que, à medida que o tempo passava, o círculo luminoso em minha cabeça se tornava cada vez maior, em graus imperceptíveis, com um aumento correspondente à expansão da consciência. Não havia dúvida alguma de que agora olhava o universo com a ajuda de uma superfície mental notavelmente ampliada, e que, por conseguinte, a imagem do mundo que eu percebia era refletida por uma superfície maior que aquela que provem meu espírito durante todos os anos desde minha infância até o momento de minha visão extática. A capacidade da esfera de minha consciência, sem dúvida alguma, havia aumentado, pois eu não podia me equivocar a respeito de um fato que eu constatava continuamente durante o estado desperto.

O fenômeno era tão estranho e tão fora do comum que estava convencido de que seria inútil buscar o exemplo de um caso análogo, mesmo se a insólita transformação fosse devida à ação do despertar da kundatini e não a uma singular anomalia que afetasse apenas a mim. Compreendendo também a futilidade de querer revelar a outrem essa evolução inteiramente fora do comum e mau dita, eu a conservava estritamente em segredo, e não disse nada, mesmo àqueles que me eram intimamente próximos. Como meu estado físico e mental não me causava mais nenhum mal estar, com exceção do fato de que apresentava essa inexplicável particularidade, deixei pouco a pouco de me preocupar com ele.

Conforme já expliquei ... nos estados iniciais de minha experiência dir-se-ia que observava o mundo através de uma bruma mental, ou, para ser mais claro, como se uma fina camada de poeira, extremamente fina, estivesse suspensa entre mim e os objetos percebidos. Não era um defeito ótico, pois minha visão estava mais penetrante do que nunca e a bruma parecia envolver não os objetos sensoriais, mas os órgãos perceptivos. A poeira estava sobre o espelho consciente que refletia a imagem dos objetos. Dir-se-ia que os objetos percebidos eram vistos através de um meio esbranquiçado, que os fazia parecer como se uma película uniforme e muito fina de pó de giz os cobrisse, sem baralhar nem de leve seu contorno, nem velar a cor normal própria de cada um. Essa película estava suspensa entre mim e o céu, os galhos e as folhas das árvores, a grama verde, as casas, as ruas pavimentadas, as roupas e os rostos das pessoas, emprestando a todos uma aparência esbranquiçada; era exatamente como se o centro de consciência em mim – que interpretava as impressões sensoriais – operasse agora através de um meio branco, que necessitava ser ainda mais refinado e purificado para se tornar de todo transparente.

Tal como no fenômeno de ampliação das imagens visuais, eu estava totalmente desorientado e não encontrava uma explicação satisfatória para a aparência esbranquiçada dos objetos percebidos. Nenhuma mudança de tempo, lugar ou condições atmosférica exercia qualquer efeito sobre casa transformação. Ela era tão evidente à luz das lâmpadas quanto ao sol, tão sensível sob a clara luz da manhã quanto sob o crepúsculo. De fato, a mudança era interior e não era afetada pelas variações de influências externas. Perplexo e permanecendo calado, continuei passando os dias e as noites em Jammu a ocupar-me de meus deveres e a aplicar-me às minhas tarefas como faziam todos os outros. A única razão plausível que eu podia entrever naquela mudança em minha faculdade cognitiva era esta: o princípio que anima o corpo e reside nele, agora fazia funcionar esse mecanismo através de um meio vital modificado; este conduzia a uma modificação na qualidade e no comportamento das correntes nervosas que comandam as funções dos órgãos, assim como na qualidade das impressões sensoriais e de sua interpretação pelo espírito observador. Mas tudo o que acontecera e que ainda acontecia era de tal forma despido de precedentes e inacreditável, que eu me sentia mais à vontade em mim mesmo, tratando tudo aquilo como uma anomalia, do que considerando o como um crescimento natural governado por leis biológicas – o que ao final viria a se confirmar.

Desta maneira, preso de dúvidas e inquietude, eu continuava a passar meu tempo em diversas atividades, até certo dia ensolarado em que estava a caminho de meu escritório: eu olhava ao acaso a fachada do Palácio Rajgarh, no qual estão instaladas as repartições do governo, e passeava o olhar pelo céu, pelo telhado e pela parte superior dos edifícios. A princípio olhava de relance, displicentemente; depois, tocado por alguma coisa estranha em sua aparência, com maior atenção, incapaz de desviar meu olhar; por último cravado no lugar, eu fixava com espanto aquele espetáculo, incapaz de acreditar no que meus olhos testemunhavam. Olhava uma cena que me era familiar antes de minha experiência maior e durante os últimos meses, mas o que eu via agora era tão extraordinário que fiquei completamente paralisado pela surpresa. Contemplava uma cena que não pertencia a este mundo mas a algum reino feérico: a fachada do edifício, antiga, degradada pelo tempo, sem ornamentação e banal, e a abóbada do céu acima dela, banhada pela viva luz do sol, estavam ambas iluminadas por um brilhante clarão prateado que lhes conferia uma beleza e um fausto gloriosos, e criava um efeito maravilhoso de sombras e claridade, impossível de se descrever. Ofuscado, encantado, voltei meus olhos para outras direções, para ser de novo fascinado pelo reflexo prateado que transfigurava todas as coisas. Certamente, eu era a testemunha de uma nova fase de minha transformação. O resplendor que percebia de todos os lados e em todos os objetos não emanava deles mas devia ser, sem nenhuma dúvida, a projeção de minha própria luminosidade interior.

Pandit Gopi Krishna. Koundalini, L’Enegie évolutrice en l’homme, Courrier du Livre, Paris, 1978. 

Ecce Homo 02 - O Sagrado

Inteligência Integral

INTELIGÊNCIA INTEGRAL: O DESAFIO TRANSDICIPLINAR
Roberto Crema

O crescimento exponencial do conhecimento, desconectado de uma visão global; os perigos de uma tecnociência triunfante e efetiva, desvinculada da consciência planetária e do afetivo; enfim, de um obscurantismo nefasto causado por um saber crescentemente acumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido faz do religar conhecimento ao amor o mais instigante desafio do momento. Nesse sentido, vale recordar as palavras de Martin Heidegger: Nenhuma época acumulou sobre o homem conhecimentos tão numerosos quanto a nossa. Nenhuma época conseguiu apresentar seu saber do homem sob uma forma tão pronta e tão facilmente acessível. Mas também nenhuma época soube menos o que é o homem. A constatação é óbvia: diante dos cenários da mundialização, nenhuma inteligência meramente especializada pode responder satisfatoriamente, pois os problemas são globais. Necessitamos de uma inteligência integral, para fazer frente aos tremendos desafios deste século que está nascendo, entre gemidos e risos de uma humanidade em processo de parto. Como afirma o conhecido axioma holístico, Pensar globalmente, agir localmente. Para não agir loucamente, vale acrescentar.

O desafio transdisciplinar é um dos mais instigantes e importantes, nos horizontes contemporâneos. Desde 1986 que a Declaração de Veneza lançou um brado, com valor também de senha, que podemos traduzir como Pontes sobre todas as fronteiras. No documento de Locarno, de 1992, foram destacados os quatro pilares de uma educação transdisciplianr: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver, aprender a Ser. Testemunhando nossa vocação de flexibilidade, integração e de abertura, esta proposta conspiratória e lucidamente radical, que questiona as raízes, encontra-se nas grades curriculares do Ministério da Educação de nosso país.

Aprender a conhecer e a fazer de forma integrada, através da experiência viva e com discernimento continua sendo uma arte a ser devidamente aplicada e aperfeiçoada. Para tal, necessitamos de uma escola do Olhar, pois a visão é a véspera do conhecimento. Abrir o olhar para si, para o outro, para o Universo e o Totalmente Outro, eis uma lição fundamental. Um olhar fluídico, que não fica paralisado num único alvo, capaz de acompanhar a dança do agora. Mudar o mundo é mudar o modo de olhar... Necessitamos, também, de uma escola da Escuta. Escutar antecede compreender. Precisamos transcender esta crise ab-surda, esta surdez diante dos alaridos e canções da realidade.

Não será esta a tarefa fundamental da escola: facilitar que o Aprendiz da Vida, a grande Mestra, incline o seu coração para aprender com os próprios passos, para florescer plenamente onde os seus pés foram plantados? Enfim, como aprender a viver com? Como aprender a ser só, a só Ser, na afirmação do poeta? O cultivo destes fundamentos, para os quais nos convocam o documento de Locarno, é uma grandiosa aventura de reencantamento do mundo e da própria existência.

Estranhamente persiste, em nosso meio, a popular ilusão de que o ser humano se torna plenamente humano, de forma automática, desde que haja as salutares condições básicas e higiênicas. Acontece que nós não nascemos humanos; nós nos tornamos humanos, através de um processo de autorealização que exige um enorme investimento de tempo e de energia, em trilhas evolutivas. O ser humano introduziu uma outra qualidade de evolução neste planeta: a evolução consciente e intencional. Sinto ter que dizer que ser humano dá muito trabalho... Darwin, como um bom naturalista, compreendeu a evolução natural. Acontece que, como sempre nos lembra Leloup, o ser humano é uma mistura de genes e de aventura. É uma possibilidade, um devir, um embrião de plenitude em cada um de nós. Como afirma a sábia parábola, daquele que foi um ícone de totalidade e plenitude humana, há que se investir nos talentos que nos foram confiados. Os que, medrosa e indolentemente os enterram, não serão convidados para o banquete da excelência, conformando a horda medíocre da normose.

Uma nova educação precisa transgredir a normose reinante e decadente. Com suavidade e vigor, com paciência e atrevimento, com flexibilidade e destemor. É com este intuito que quero apontar para esta epopéia a ser desbravada: educar para a Vida, educar para a excelência, educar para Ser.

No cerne da crise contemporânea encontra-se o que tenho denominado de síndrome de analisicismo. Os seus sintomas são muito evidentes: a competitividade extremada, o exercício sistemático da brutalidade, a compulsividade de controlar e subjugar – dividir para reinar! -, a religião do consumismo e a falta generalizada de cuidado, ou seja, o desamor. O império do analisicismo é caracterizado por uma dissociação crônica e pela supressão do reino da interioridade, da subjetividade, da desconexão com o sagrado, determinada pelo mito da objetividade. O sujeito degenerou-se em objeto...

Uma educação que queira facilitar a arte de conviver terá que se lançar na revolucionária proposta de uma alfabetização psíquica. Trata-se da tarefa ousada e imprescindível de colocar a alma nos bancos escolares, desde o pré-primário até as universidades, facilitando que o aprendiz desenvolva inteligência psíquica. Sobretudo com o desenvolvimento das funções básicas, pesquisadas por Jung: pensamento, sentimento, sensação e intuição. A educação convencional apenas tem se ocupado, de forma fragmentada, com o pensamento e a sensação. Incluir em nossos currículos o tema do sentimento e da intuição, harmonizando-as e integrando-as com as demais, é uma tarefa de grande alcance e pertinência, visando o resgate de uma consciência mais vasta, de integridade e de inteireza.         Educar a alma é desenvolver, também, a inteligência emocional. Sabemos que há emoções naturais, que representam verdadeiros mecanismos homeostáticos, que ajudam o organismo na sua sobrevivência individual e coletiva. Necessitamos de uma pedagogia do afeto, que facilite o desenvolvimento de vínculos afetivos. A alegria é uma lição fundamental, na escola da existência. A tristeza é uma estratégia saudável, no contato com as perdas. Aprender a lidar com a raiva é imprescindível, na relação com o mundo. E o medo é outra lição que precisa ser trilhada, no confronto com o desconhecido.

A alfabetização psíquica solicita, também, o desenvolvimento da inteligência relacional. Carl Rogers afirmava que o grupo foi a maior descoberta do século XX. Neste século, foram criadas e aperfeiçoadas técnicas e dinâmicas de grupo, variadas e sofisticadas. Por que não empregá-las no cotidiano escolar? Como aprender a conviver sem o exercício do envolvimento grupal e comunitário, com uma facilitação competente, de forma a se adquirir competências atitudinais diante dos conflitos, dificuldades e impasses do coexistir? Uma educação profilática é a que facilita a aquisição de responsabilidade, ou seja, habilidade em responder. Assim, a educação exerceria a sua função preventiva, diante de tantas mazelas, a nível individual, social e ambiental, derivadas da ignorância psíquica, do desconhecimento dos recursos da alma.

O desenvolvimento da inteligência onírica é outro imperativo e constitui um capítulo muito importante na nova educação. Sonhar constitui um nível de realidade que tem a sua lógica própria, complementar à da vigília. Nessa direção, outra tarefa bastante nobre de uma educação integral é a de facilitar a abertura de visão e de escuta para o exercício de uma inteligência hermenêutica, que habilite o educando a interpretar e compreender os sonhos, pesadelos, tombos, encontros e desencontros da jornada existencial.

Educar requer, ainda, uma abertura para a pedagogia contemplativa, da meditação, do despertar da plena atenção, tão enaltecida pelos antigos e atuais mestres da consciência. Todas as grandes tradições sapienciais são dotadas de tecnologias de desenvolvimento da qualidade noética, do despertar de uma escuta silenciosa, para abrir seu coração para o novo. A mesmice dos trilhos acaba por enferrujar nossas relações, que se alimentam de novidade, de criação. Penso no maior educador do Ocidente que, ao iniciar o seu ensino público, realizou o milagre de transformar a água em vinho... Para a festa não acabar, afirma Leonardo Boff. Transformar a água de um cotidiano previsível e rotineiro no bom vinho de renovação e recriação permanente... eis uma lição básica da pedagogia perene. Este milagre de renovação emana da inteligência noética, trazendo encantamento e graça para um existir mais pleno.  Aqui nos deparamos com o pressuposto antropológico mais pleno, que integra corpo, alma, consciência e Essência. A dimensão noética é a de um espelho que reflete alguma coisa que está além da existência, o Sopro da Vida. Em hebraico, Ruah; em grego, Pneuma; em latim, Espírito. Enfim, a Fonte a partir da qual o reencantamento da existência torna-se possível. Existência é o que passa; Vida é o que É, o que resta quando já nada mais resta, o toque de eternidade na finitude de nosso existir.

Através da escuta noética, entretanto, podemos transpirar esta realidade essencial. Como afirmava Graf-Durckheim, saúde plena – acrescentemos também, educação plena – é quando a essência transparece na existência. É quando nos fazemos congruentes: o que pensamos coincide com o que somos; o que falamos coincide com o que pensamos; o que fazemos coincide com o que falamos...

Não é possível educar para a Vida, sem o resgate da autêntica espiritualidade. Para isto, temos que transgredir a normose educacional em voga, rumo a uma transdisciplinaridade, com a virtude da transculturalidade, que possa nos abrir os horizontes do potencial da espécie para o tema fundamental da transcendência, da transparência, enfim, da transfiguração, apanágio de uma educação centrada na consciência de inteireza. Quando a ignorância existencial se desfaz, o Sol da essência, que habita o relicário mais íntimo de nossas almas, poderá transparecer, iluminando e aquecendo nossas trilhas existenciais.

Estas lições são exper ienciais. O Sagrado é uma experiência, a partir da qual jorra os valores do respeito, da bondade, da fraternidade, da inclusividade. Para percorrermos a lição da sacralidade, necessitamos de todos os nossos olhos. O olho físico percebe a realidade física. O olho psíquico abrange o universo psíquico. O olho noético acolhe o espaço do Silêncio e do Imaginal, transparecendo a Essência. O Olho do Espírito penetra todos os olhares, abrindo-nos para a Realidade Viva, para a Mansão do Amor.

Finalmente, se não educarmos para a condição do Sujeito, seguiremos reduzindo tudo à condição objetal, na alienação imperialista de um único estado de consciência, com a sua lógica racional, empírica e materialista, elevada aos altares por um paradigma esgotado e ultrapassado. Uma educação integral é a que acolhe, de acordo com a física contemporânea, todos os níveis de realidade (somática, psíquica, noética e essencial) com as suas lógicas próprias e complementares.  A iniciação a um novo aprender a aprender, que religa razão ao coração, ciência à consciência, efetividade à afetividade, existência à essência, requer a adoção de uma abordagem transdisciplinar que nos favoreça um estado intensificado de aprendizado e de evolução: sair do cacoete para o samba!

(Síntese extraída por Jane Farias Chagas do texto apresentado no V Congresso Holístico Pan-Americano e VIII Congresso Holístico Nacional: Pedagogia Iniciática – Educar Para Ser, Roberto Crema, 2002).

Alfabetização Psíquica

Educar a Alma: Alfabetização Psíquica
por: Roberto Crema

Uma educação que queira facilitar a arte de conviver terá de se lançar na revolucionária proposta de uma alfabetização psíquica. Trata-se da tarefa ousada e imprescindível de colocar a alma nos bancos escolares, desde o pré-primário até as universidades, facilitando que o aprendiz desenvolva a inteligência psíquica. Sobretudo com o desenvolvimento das funções básicas, pesquisadas por Jung: pensamento, sentimento, sensação e intuição. A educação convencional apenas tem se ocupado, de forma fragmentada, com o pensamento e a sensação. Incluir em nossos currículos o tema do sentimento e da intuição, harmonizando-as e integrando-as com as demais, é uma tarefa de grande alcance e pertinência, visando o resgate de uma consciência mais vasta, de integridade e de inteireza.

Educar a alma é desenvolver, também, a inteligência emocional. Sabemos que há emoções naturais, que representam verdadeiros mecanismos homeostáticos, que ajudam o organismo na sua sobrevivência individual e coletiva. Necessitamos de uma pedagogia do afeto, que facilite o desenvolvimento de vínculos afetivos. A alegria é uma lição fundamental, na escola da existência. A tristeza é uma estratégia saudável, no contato com as perdas. Aprender a lidar com a raiva é imprescindível, na relação com o mundo. E o medo é outra lição que precisa ser trilhada, no confronto com o desconhecido.

Quando o aprendiz não tem acesso ou reprime a expressão emocional das emoções autênticas, um disfuncional repertório emotivo substitutivo é adquirido. Na análise transacional, conhecemos bem o que são denominados 'disfarces', emoções distorcidas que encobrem as naturais, que estão interditadas. Os mais típicos disfarces são a ansiedade, depressão, fobia, inadequação, culpa, vergonha, ressentimento, ódio, inveja, ciúme, vingança, triunfo maligno, entre outros.

Por outro lado, é necessário o desenvolvimento da inteligência onírica. Este é um capítulo muito importante na nova educação. Sonhar constitui um nível de realidade que tem a sua lógica própria, complementar à da vigília. Estudar o Livro dos Sonhos, registrando, cuidando e aprendendo a aprender com os sonhos nossos de cada noite, é uma tarefa básica para o autodesenvolvimento. No Ocidente, o sonho tem sido objeto de pesquisa científica há mais de um século, a partir da escuta analítica e psicoterápica até os complexos laboratórios. Sabemos que o sonho exerce uma função compensatória, corrigindo a unilateralidade da consciência de vigília. Equivalente aos pensamentos, os sonhos representam valiosas amostragens existenciais, reportagens do processo de individuação. Apontam direções criativas, soluções inesperadas, advertências, também vinculando-nos ao inconsciente coletivo. Às vezes, são verdadeiras parábolas, plenas de múltiplos sentidos. Aprender a cuidar dos sonhos e a honrá-los no cotidiano, ampliando a arte interpretativa, faz parte de um existir lúcido, com qualidade psíquica.

Já há escolas, como a Casa do Sol, da Unipaz-Brasília, onde as crianças iniciam a jornada diária partilhando os seus sonhos, como em certas culturas tribais, onde a alma é valorizada e, também, educada.

Os antigos Terapeutas da Alexandria estudavam as escrituras também para se qualificarem na arte de interpretar os sonhos. E pesquisavam-nos, para se aperfeiçoarem na arte de compreender os textos sagrados, as crises e as doenças. Uma tarefa bastante nobre de uma educação integral é a de facilitar a abertura de visão e de escuta para o exercício de uma inteligência hermenêutica, que habilite o educando a interpretar e compreender os sonhos, pesadelos, tombos, encontros e desencontros da jornada existencial.

Finalmente, uma alfabetização psíquica solicita, também, o desenvolvimento da inteligência relacional. Carl Rogers afirmava que o grupo foi a maior descoberta do século XX. Neste século, foram criadas e aperfeiçoadas técnicas e dinâmicas de grupo, variadas e sofisticadas. Por que não empregá-las no cotidiano escolar? Como aprender a conviver sem o exercício do envolvimento grupal e comunitário, com uma facilitação competente, de forma a se adquirir competências atitudinais diante dos conflitos, dificuldades e impasses do coexistir? Uma educação profilática é a que facilita a aquisição de responsabilidade, ou seja, habilidade em responder. Assim, a educação exerceria a sua função preventiva, diante de tantas mazelas, a nível individual, social e ambiental, derivadas da ignorância psíquica, do desconhecimento dos recursos da alma.

Entretanto, se o nosso pressuposto for meramente psicossomático, estaria totalmente inviabilizada a pedagogia iniciática. Para aprender a conviver, necessitamos do resgate da consciência psíquica.

A educação psíquica

Até agora lidamos apenas com a educação que pode ser dada a toda criança nascida sobre a terra, e que se ocupa somente com faculdades puramente humanas. Mas não é inevitável parar aí. Todo ser humano traz escondido dentro de si a possibilidade de uma consciência superior, que ultrapassa os esquemas de sua vida atual e o faz participar de uma vida mais alta e mais vasta. Realmente, em todo ser altamente evoluído é esta consciência que governa sua vida e organiza ao mesmo tempo as circunstâncias de sua existência e sua reação individual a estas circunstâncias. O que a consciência mental do homem não sabe e não pode, esta consciência sabe e faz. Ela é como uma luz que brilha no centro do ser e irradia através das espessas camadas da consciência exterior. Alguns têm uma vaga presciência de sua presença; muitas crianças estão submetidas à sua influência, que às vezes se faz sentir bem distintamente em suas ações espontâneas e mesmo em suas palavras. Infelizmente, como os pais na maioria das vezes não sabem o que isto é e não entendem o que está acontecendo com seu filho, sua reação em relação a estes fenômenos não é boa, e toda a sua educação consiste em tornar a criança tão inconsciente quanto possível neste domínio, para concentrar toda a sua atenção nas coisas exteriores, dando-lhe assim o hábito de considerá-las como as únicas importantes.

A Mãe
Revista “Ananda”, Caderno Especial VII, Novembro-Dezembro 1977

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Áudio: O aprendizado espiritual não pode vir das palavras



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Celebração

Você algum dia já pensou por que, em todo o mundo, em todas as culturas, todas as sociedades, há sempre alguns dias no ano destinados à celebração?

Esses dias de celebração são apenas uma compensação, porque essas sociedades tiraram toda a celebração de suas vidas e, se não houver alguma forma de compensação, a vida de um indivíduo poderá tornar-se um perigo para uma determinada cultura.

Essa compensação lhe é dada para que você não se sinta completamente imerso em miséria, em tristeza. Mas essas compensações são falsas. O show de fogos e luzes não fará com que você fique feliz. É coisa para crianças. Para você, é apenas um aborrecimento.

Mas em seu mundo interior pode haver fogos, canções e alegrias.

Lembre-se sempre de que a sociedade compensa você quando ela sente que aquilo que foi reprimido pode explodir em uma situação perigosa se não houver alguma compensação. A sociedade, então, encontra alguma forma de permitir que você deixe vazar o que está reprimido.

Mas isso não é uma verdadeira celebração, não pode nunca ser verdadeira. Uma verdadeira celebração deve vir de sua vida, deve estar na sua vida.

A vida deve ser uma celebração contínua, um festival de fogos e luzes durante o ano inteiro.

Osho, em "Osho de A a Z: Um Dicionário Espiritual do Aqui e Agora"

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Apontamentos sobre a experiência mística

Nem por qualquer manipulação da mente, nem por mudanças artificialmente criadas no ritmo metabólico do corpo, nem com o auxílio de algum instrumento ou drogas, a consciência mística pode ser introduzida num sistema que não esteja geneticamente maduro para a sua manifestação. É somente entre homens e mulheres cujo cérebro e sistema nervoso já alcançaram certo estágio de maturidade, que a Ioga — ou qualquer outra disciplina — pode ter o efeito de gerar processos biológicos que levam à iluminação.

os que têm uma experiência súbita, espontânea do estado místico — e seu número é legião —, estão organicamente amadurecidos para o evento e só precisam de um estimulante ou de um impulso para que venha o êxtase.

(...) Quem é abençoado com a visão mística, mesmo que esteja na pobreza, é intimamente monarca. Vive em integral consciência da Luz gloriosa, que brilha não só no seu interior mas em todos os objetos do mundo circundante. O senso de identidade entre a imanência externa e interna continua sempre, ininterrupto. Um manto resplandescente de consciência cobre o observador e os objetos observados, sem nunca retirá-lo da precisão das imagens dos sentidos. A percepção de uma Presença divina em toda parte, criando a noção do Um em Muitos — traço persistente da experiência mística —, é um aspecto inalienável da iluminação.

Gopi Krishna

Gopi Krishna fala sobre a kundalini


Trechos  de uma entrevista conduzida por  Tom Kay a GOPI KRISHNA

Tk: Sr. Krishna, você teve uma experiência de Kundalini. Eu desejo que você possa explicar o que é uma experiência de Kundalini  e o que são suas  ramificações.

GK: Antes que eu comece descrever minha própria experiência, talvez seria melhor dar um detalhe pequeno sobre o que significa o  Kundalini. Nós não estamos usando a totalidade do cérebro humano. De acordo com várias estimativas, a maioria de nós usa somente dez por cento do cérebro e de acordo com uns somente oito por cento. Isso significa que 90 por cento do cérebro são inutilizados, isso é ainda uma margem grande no cérebro que poderia ser usado para outras finalidades, e a natureza forneceu-o para determinadas finalidades que não são conhecidas ainda pela ciência. De acordo com a tradição indiana, há uma região no cérebro abaixo da coroa e sobre o pallette que é chamado Brahmarendra ou a cavidade de brahman. Esta região pode ser ativada por determinadas disciplinas e quando ativada pode dar ao indivíduo a mesma visão do universo que todos os grandes místicos da terra descreveram. Quando do Despertar, a Ascensão, a energia normal do corpo ou do sangue não pode abastecer o centro. Necessita um combustível psíquico mais poderoso e mais confiável. Este combustível vem do sistema reprodutivo, que é transformado em um tipo de radiação e essa radiação desperta faz a função central.

Em meu caso o despertar ocorreu na idade de 34 anos, em 1937. Eu meditava há 17 anos e então repentinamente, durante o Natal, quando eu estava sentado com as pernas cruzadas, em estado de meditação, uma coisa estranha aconteceu. Algo explodiu em meu cérebro numa corrente de luz prata que elevou-se pela minha espinha, de maneira cintilante, até atingir meu cérebro inteiro e eu senti-me expandir em todos os sentidos. Esta expansão era tão incrível, tão espantosa que eu pensei de que algo incomum tinha acontecido em meu ouvido internamente. Depois que isto ocorreu em mim, tive outras duas experiências do mesmo tipo que se sucedeu, então, em intervalos curtos e longos.

Mas algo estava mudando em mim e eu poderia perceber esta mudança por muito tempo, dia e noite. O fato, é que eu passei por crises graves durante esse período. Finalmente, tornei-me estável nessas condições de consciência aos 49 anos de idade. Desde então tenho vivido nesta circunstância. Devo dizer que antes dos  meus 30 anos eu vivi neste mundo pensado, visto e percebido da mesma maneira que as pessoas normais , mas depois dos 49 anos, eu tenho vivido em dois mundos diferentes. Um é o mundo normal dos sentidos e da razão, e o outro é um mundo muito mais elevado, muito mais feliz e totalmente à parte de qualquer coisa que podemos conhecer na da terra. É o mundo da consciência una.  

Tk: Como você vê o mundo?

GK: Nós sabemos o que todas as pessoas percebem deste mundo. Eu posso compreender o que você percebe dele, você pode compreender o que eu percebo dele. Isto é, esta percepção é uniforme. Todos têm a mesma percepção. Mas esta outra percepção é diferente. Nesta outra percepção você não vê o mundo como uma criação contínua, real, objetiva. A criação objetiva real é a consciência una. Você vê a consciência em toda parte. Você vê o oceano como um ser... Você vê o oceano com vida; você vê uma montanha com vida; você vê o céu com vida; você vê a terra com vida; você vê a vida ou a consciência  em toda parte. E esta vida ou consciência una não é algo inoperante ou que é algo que você pode compreender.  É o despertar amável. É maravilhoso e a cada momento você o vê, você o percebe. A maravilha do despertar cresce mais profundamente. Nunca me canso de sentar-me quieto e de refletir em meu próprio Eu. Nunca me canso de olhar o céu. O céu, para mim, não é como era antes de meus  30 anos; é algo fascinante. É uma visão tão bonita, extremamente fascinante de se ver por dias e meses. Ou seja, há no ar uma fonte de felicidade, um reino novo, eu devo dizer, uma fonte aberta. Isto é provavelmente o significado que Cristo quis mostrar quando disse, "o reino do Céu está dentro de você." Este é o Nirvana de Buda; e este é o estado de vida oculto, transcendental, mencionado pelos místicos sufis. No ato, neste estado inativo, o que nós percebemos é que somos a consciência  em seu formato mais mágico, em seu formato  glorioso, e não consciências como um ponto que olha só através dos olhos ou na audição através das orelhas, mas uma consciência que tem seus próprios canais e que sabe que é mestre e não escrava das forças do mundo material, consciência que sabe quem é o criador. É infinito: é imortal. Neste estado não nos sentimos como um rei, mas como o mestre do que vê. Não é o ego. Eu devo dizer que não é o ego; é a condição verdadeira  desta consciência. Esta é a razão porque se diz que nenhum místico mudaria sua condição nem por um reino. É algo ultra original, tão glorioso, tão elevado que não tenho nenhuma palavras para descrever este estado.

Tk: Que tipo de vida deve viver uma pessoa que desperta a Kundalini?

GK: A fim de  tornar este espaço livre, eu gostaria de dizer que não é a Kundalini em si, Kundalini é o poder, o mecanismo. Mas realmente, é despertada a atividade de uma determinada região no cérebro. Isto significa que a natureza já fornece um potencial no cérebro que tem que despertar. Isto significa que o cérebro pode evoluir organicamente e ter um desempenho mais elevado. Esta é minha experiência, que o cérebro humano ainda está evoluindo organicamente no sentido dos grandes místicos, no mesmo sentido dos grandes gênios. Para esta evolução algum tipo de vida é necessário. Por exemplo, durante toda nossa vida esta evolução já acontece branda, lenta, fora do alcance, e nós temos que cooperar com ela. Quando nós não cooperamos com a evolução interna nós criamos problemas para nós. Foi para essa finalidade, que nos últimos 5.000 anos, pelo menos, grandes profetas grandes vem nascendo. Começando com os Vedas, então o Buda, então o Cristo, então Mohammed, então o  guru Nanak, e todos os profetas  antigos da Bíblia, foram de  tempos em tempos nascendo  e dando à humanidade um sentido de como viver quando o cérebro evoluir além do normal. Ensinamentos como o sermão  da montanha, os dez mandamentos, os discursos de Buda, o Bhagavad-Gita, e todos ensinamentos contidos nas escrituras religiosas da terra -- todos são significativos ensinamentos  para regular nossa vida de modo que nós possamos viver na harmonia com a lei da evolução que governa a vida. Estes revolucionários vem regular a vida dos seres humanos de modo que possam trabalhar em harmonia com a lei da evolução que se realiza dia e noite na atividade de seus cérebros. Quando partem desta lei da evolução, trazem sempre calamidades ou problemas... No  tempo atual ,tal ocasião é resultado dos nossos desvios das leis da evolução e o resultado é que nós estamos ameaçados em muitos sentidos. A vida a ser vivida é justa como você vê no sermão da montanha - uma vida de humildade, uma vida de amor, uma vida de pureza , uma vida em que você deseja para outros o que você deseja para você mesmo, uma vida na  qual você é puro, você não é sofisticado, você não se acha completamente  inteligente, você não é esperto, você não usa sua inteligência ou vivacidade,astúcia,para fazer exame do que pertence a outro, uma vida de pureza extrema  e uma vida do simplicidade,onde  você não desperdiça os recursos da terra. Como você sabe, cada animal satisfaz  a suas necessidades básicas com os recursos reciclados da terra. O homem é a única criatura que está desperdiçando os recursos básicos para seus próprios luxo e prazer. Isso é o que o sermão da montanha significa : ensinar que essa  humanidade  deve viver simplesmente, vidas bonitas, puras, compassivas. Esse é o tipo de vida necessário para o despertar de Kundalini....

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Comentários sobre a "experiência mística"

A simples conservação da mente focalizada num ponto único não é, em si mesma, iluminação. Só quando há um fluxo de energia para o cérebro é que a mente pode fugir das cadeias do corpo e observar a transformação desse mesmo cérebro numa entidade oceânica, com estupefação e temeroso respeito.

A sensação de luz, fogo ou de iluminação interior é um sinal que distingue o fluxo dessa força psíquica. O intelecto continua a funcionar ao fundo, pois de que outra forma tal condição poderia ser descrita? Isso está claramente mencionado nas escrituras hindus. Se a intensa concentração e a focalização de um único ponto fossem pré-condições indispensável, então outras formas de ioga — como por exemplo, a ioga da ação destituída do egoísmo, ou a devoção e a descriminação intelectual (a "sabedoria de Platão") — seriam inteiramente ineficazes para induzir ao estado místico.

Nesse caso, como poderíamos explicar as experiências dos que têm relances esporádicos de iluminação? Há todo um exército de homens e mulheres talentosos que, sem qualquer disciplina ou prática de ioga, receberam a experiência que lhes foi imposta de uma forma que deixou marca permanente em todo o curso de suas vidas. O impacto da experiência foi tão forte que eclipsou outros casos extraordinários que tinham vivido. Entre essas pessoas estão notáveis cientistas e eruditos, cuja agudeza de percepção e nitidez de observação não sofrer a menor sombra de dúvida.

Entre eles estão figuras eminentes, tais como Pascal, Tenyson, Wordsworth, Charlotte Brönte, Walt Whitman, Richard M. Bucke, George Elliot, D.H. Lawrence, Nietzsche e muitos outros. Suas descrições desse estado extraordinário possuem certos aspectos que, para quem passou pela mesma experiência, fixam imediatamente o selo da autenticidade.

Algumas sentenças de três ou quatro desses casos vão esclarecer o que quero dizer: "Eu estava tomado de uma satisfação tranquila, quase passiva, sem realmente pensar, mas deixando que as ideias, imagens, emoções, fluíssem por si mesmas, por assim dizer, através da minha mente", diz Bucke. "Súbito, sem qualquer aviso, vi-me envolvido numa nuvem com cor de chama. Por um instante pensei em fogo... Logo depois tive uma sensação de exultação, de júbilo imenso, acompanhada, ou imediatamente seguida, de uma iluminação intelectual impossível de descrever... Vi que o universo não é composto de matéria morta, mas, ao contrário, é uma Presença Viva..."

A experiência de Arthur Koestler é de certa forma diferente, mas refere-se, claramente, à mesma súbita transformação da consciência. "Esse clichê teve um efeito forte e inesperado. Vi a fórmula de Einstein que abalou o mundo — energia igual à massa multiplicada pelo quadrado da velocidade da luz — pairando como uma névoa rarefeita sobre as geleiras, e essa imagem trazia consigo infinita paz e tranquilidade... A sensação de estar sufocado pela indignação foi sucedida por uma quietude relaxada e pela autodissolvente calma da sensação oceânica..."

A versão de Nietzsche também parece diferente, mas se a examinarmos mais detidamente, transmite o mesmo significado e mostra a mesma expansão da consciência. "Alguém já observou que a música liberta o espírito e dá asas ao pensamento?... O céu cinzento da abstração parece fremir com os relances dos relâmpagos, a luz é forte bastante para revelar todos os pormenores das coisas, para permitir que alguém lute com seus problemas, e o mundo é observado como que do alto de uma montanha... Respostas inesperadas tombam sobre seu colo, pequena tempestade de granizo e sabedoria, de problemas resolvidos. Onde estou eu?"

A expansão da consciência não só aparece como uma sensação de beatitude, de calma e paz, uma sensação oceânica ou a percepção de uma Presença Infinita, mas, também, muitas vezes, com problemas resolvidos e enigmas respondidos. Ela tem vindo através da história, e continuará a vir até o fim dos tempos, com novas obras-primas de música, poesia e arte, novas descobertas da ciência e novos horizontes para o pensamento filosófico.

É um erro separar a experiência mística dos impulsos criativos da mente humana. A consciência humana cresce num círculo sempre crescente, e, nesse processo, continua a atirar para o regaço da humanidade tudo quanto é precioso em literatura, arte e ciência. Cada grande intelectual, cada gênio, dotado com criatividade, está muito próximo da fronteira a partir do qual tem início o território místico. A visão e a experiência podem vir a qualquer momento.

O maior obstáculo é a antagônica estrutura mental da própria pessoa. Todos os sistemas de ioga, na Índia, e cada forma de disciplina religiosa, de culto ou de oração são destinados a ultrapassar as barreiras colocadas pelo intelecto supercrítico, pelo dogma, pelo ceticismo, pelo ego, pelo orgulho e por outros traços recalcitrantes da mente.

Há também outras concepções errôneas sobre o estado beatífico. Sobre a realidade do tempo, por exemplo. "Uma terceira característica de todos os místicos metafísicos", diz Bertrand Russell, "é a negação da realidade do tempo. Isso é o resultado da negação da divisão; se tudo é um, a distinção entre passado e futuro deve ser ilusória".

É um erro sério negar a realidade do tempo ou do espaço ou, em outras palavras, a realidade do universo visível, com base na experiência mística. Nenhum astronauta sensível iria negar a realidade do ambiente encontrado na terra baseando-se na sua experiência do espaço exterior. Tal estrutura mental seria desastrosa para a sua própria segurança. No transe místico, o que se observa é o mundo de vida e consciência. É uma proposição diferente do mundo dos fenômenos. Portanto, o que é testemunhado ali não pode ser aplicado, palavra por palavra, ao mundo exterior.

Essa estrutura mental muitas vezes tem levado àquela apatia em relação aos problemas da vida, que segurou com mão de ferro tantas pessoas inteligentes, até que a moderna ciência veio demonstrar as enormes potencialidades presentes na matéria para modelar a vida da humanidade. O místico que pretender ignorar as exigências básicas de seu corpo, sentido o arrebatamento de sua extasiante experiência, perderia, depois de algum tempo, não apenas o arrebatamento, mas talvez também a vida.

A perda do sentido de tempo ocorre, também, nos excitantes jogos de amor, no sono e no sonho, quando observamos uma cena absorvente ou ouvimos música, ou estamos empenhados num trabalho criativo. Amantes que se encontram clandestinamente veem as horas passar como se elas não tivessem duração, enquanto meia hora de espera parece uma eternidade.

No transe místico, o sentido de tempo se perde por causa da intensidade da experiência e da natureza intemporal da própria consciência. O mesmo pode acontecer, em menor grau, quando lemos um livro absorvente, ou ouvimos uma história impressionante narrada por um perfeito contador de histórias. No êxtase perene, a existência do mundo temporal continua no ambiente de uma Presença Intemporal. Se não fosse assim, não haveria possibilidade de uma evolução maior da consciência para um estágio místico.

O Samadhi autêntico, ou experiência transcendental, é como a entrada num país maravilhoso onde a própria consciência, e não o mundo dos sentidos, torna-se o fascinante objeto de contemplação. A mente e o intelecto permanecem inabaláveis na observação de um estonteante espetáculo que se situa além do que quer que se conheça na Terra, mesmo em sonhos. Observem as palavras de Tennyson, quando ele diz: "Senti minha alma e meu espírito crescerem poderosamente com tão vasto círculo de pensamento".

A única chave para a compreensão da consciência mística está no tratar o fenômeno como uma metamorfose na capacidade cognitiva do observador. A alma cresce vigorosamente e o olho mental amplia-se imensamente. Quando a mente de um iluminado se volta para o interior, o panorama que ele descortina é o de um colossal mundo de vida que torna pequeníssima a imagem do mundo exterior — fazendo-o insignificante. O que se sente é uma Presença Viva, um inexprimível oceano de consciência difundido por toda parte. A imagem do mundo parece flutuar, como o reflexo num espelho, ocupando apenas uma pequena porção da sua limitada periferia.

Isso também é verdadeiro em relação ao estado místico com experiências visionárias. A imagem de Deus ou da Deidade, percebida na visão, não é apenas uma imagem terrena, envolvida em espaço e tempo, mas algo supraterrâneo e divino, imanente e majestoso, que reúne forma e feitio por causa da própria consciência do vidente, consciência que se expandiu altamente. Em outras palavras, a visão é uma projeção da própria consciência mística.

O que desejo enfatizar é o fato de que a consciência mística — seja de natureza esporádica, seja um traço permanente da personalidade — não é habitual ou comum como estado de percepção humana. Mesmo que a função do pensamento seja detida pela prática de uma disciplina qualquer, a dimensão da consciência que observa não é materialmente afetada.

Desde que a distinção entre o sujeito e o objeto da contemplação continue a existir, a experiência do Samadhi não se dá. O sujeito e o objeto devem tornar-se um, e a consciência deve fluir para si mesma, levando a uma nova área de percepção nunca antes experimentada. "O eu, harmonizado pela ioga, vê o Eu existente em todos os seres, e em toda a parte vê a mesma coisa", diz o Bhagavd Gita (6.29). Não há ambivalência nessa declaração. A implicação é clara e fica além da dúvida. O objetivo fundamental da ioga é criar uma consciência que vê o mundo visível sob uma nova luz, não como algo alheio ou estranho a ela, mas como parte inseparável dela própria. Isto indica, claramente, a metamorfose do observador.

Olhando para os objetos que o rodeiam, ele agora vê algo novo, que antes jamais observara. Percebe a diferença nas formas, as durações do tempo e as distâncias, tão distintamente como antes, talvez mais nítidas do que antes. Mas, ao mesmo tempo, vê todas essas coisas integradas na consciência como as pérolas de um colar estão integradas no fio que corre através de todas elas. A consciência, agora, torna-se a realidade primordial para o místico em estado de vigília, de sonho ou de transe. É por essa razão que, na Índia, todas as autoridades em estados superiores de consciência concordam no ponto que diz que o estado transcendental cobre todos os outros estados de consciência.

A consciência iluminada, que vê o divino em cada objeto, em cada escaninho e em cada recanto do universo, não perde, portanto, o senso da forma, mas percebe distintamente tudo, como antes. Pelo contrário, outra faculdade é acrescentada à mente, capacitando-a para perceber o que nunca vira antes: o palpitante mundo da vida, os inexprimíveis fluxos da consciência fluindo por todos os lados, como águas transparentes de um lago translúcido que fazem com que numerosas criaturas aquáticas, e as plantas que vivem sob a superfície, se tornem distintamente visíveis sem a menor transformação de suas formas. A sensação de admiração e de respeitoso temor, de uma experiência realizada, de uma alegria sem peias e da convicção da imortalidade flui dessa excitante transformação testemunhada pela própria pessoa.

Para onde quer que a consciência iluminada olhe, ela vê a projeção de si mesma, diversificada nos inumeráveis objetos que observa. Mas isso não é tudo. Quando os contatos externos são excluídos e a consciência paira sobre si mesma, ela deixa depressa a âncora do corpo e, estendendo-se em brilhantes vagas de percepção não diferenciada, assume a proporção do ilimitado oceano, no qual o ego dissolvido retém apenas a individualidade necessária para se sentir uno com um universo estupendo do ser, que não tem princípio nem fim.

A presente confusão entre professores de ioga e alguns cientistas nasce do fato de que a experiência mística não tem sido estudada da mesma forma metódica com que se estuda qualquer outro misterioso fenômeno físico. Tem-se dado demasiada confiança às versões de alguns autores modernos que se colocam em posição de místicos sem terem realmente tido a verdadeira experiência mística. Poucos investigadores dos dias atuais têm qualquer ideia concreta sobre a topografia da região que estão explorando. Quase todos os investigadores têm opiniões próprias sobre o caso e tentam encontrar uma evidência confirmadora para mostrar que estão com a razão. Isso é a própria antítese do que seja a abordagem correta do numinoso.

O intelecto deveria apresentar-se como uma lousa limpa, pois tratamos aqui com aquelas áreas da criação que se situam além da sondagem da razão. Isso eliminaria a possibilidade de julgamento apressado e irrefletido, posição que tem sido adotada recentemente.

Considera-se, por exemplo, esta declaração de Aldous Huxley: "Isso acontecerá como resultado de descobertas bioquímicas que tornarão possível, para grande número de homens e mulheres, alcançar uma autotranscendência radical e uma compreensão mais profunda da natureza das coisas. E essa revivescência da região será, ao mesmo tempo, uma revolução. De atividade que se ocupava principalmente com símbolos, a religião se transformará numa atividade preocupada principalmente com a experiência e a intuição — e com o misticismo cotidiano, fundamentando e dando significação ao raciocínio do cotidiano, às tarefas e deveres cotidianos, às cotidianas relações humanas".

A inferência óbvia é que o uso de reagentes bioquímicos ou drogas tornaria possível aos seres humanos provarem o sabor da experiência mística. Nada pode ser mais errado nem estar mais distante da resposta verdadeira. Não há dúvida de que a experiência mística implica, essencialmente, uma transformação biológica do cérebro, mas essa transformação é do mesmo tipo da concepção e do crescimento de um embrião.

A criança vem a ser, sem dúvida, como o resultado de certos processos bioquímicos, mas poderemos acaso fazê-la sem o auxílio do sêmen humano? A transformação do cérebro, que leva à consciência transcendental, precisa do toque superinteligente, orientador, da força vital que está na base de todos os fenômenos da vida.

É esse elemento misterioso no sêmen humano o responsável por toda a agitada atividade que ocorre no útero. Trata-se de um meio cósmico que nenhum engenho humano jamais conseguiu criar. Vindas da pena de escritores de tanta popularidade como Aldous Huxley, declarações como as que fez têm prejudicado grandemente a investigação de fenômenos místicos, descrevendo-os como uma alteração da consciência que as drogas poderiam tornar possível.

"O elemento criativo da mente humana, esse estado latente, que pode conceber deuses, esculpir estátuas, mover o coração dentro dos símbolos da grande poesia, ou inventar fórmulas da física moderna", diz Loren Eiseley, "emerge de forma misteriosa, como partículas elementares que saltam, em momentânea existência, em grandes cíclotrons, para desvanecerem-se outra vez como fantasmas infinitesimais. A realidade que conhecemos em nosso limitado prazo de existência apouca-se diante do potencial invisível dos abismos, cuja margem a ciência se detém".

O estado místico autêntico assinala uma mudança na profundidade de toda a personalidade humana e o desenvolvimento de um novo órgão de percepção, conhecido desde tempos imemoriais com diversos nomes, tais como Terceiro Olho, Sexto Sentido, Olho da Sabedoria, Visão Divina e outros.

(...) Acreditar que métodos superficiais, tais como drogas, hipnose, meditação orientada, mantras ou estados mentais passivos e sonolentos possam levar à iluminação é ter um conhecimento superficial da experiência mística. A experiência mística, mesmo quando esporádica, denota um salto para uma dimensão mais ampla da consciência que é alvo da evolução da raça humana.

"Se Deus e a alma humana fossem completamente diferentes, nenhuma quantidade de raciocínio lógico e de meditação poderiam levar-nos à realidade de Deus", diz Radhakrishnan. A consciência de Deus é tanto um dom original dos seres humanos quanto a autoconsciência. Há degraus na consciência de Deus, como há degraus de autoconsciência. Em muitos homens, elas são enevoadas e confusas; somente na alma redimida elas se manifestam por completo".

Portanto, na experiência mística, testemunhamos uma nova variedade de consciência que é absolutamente indescritível por aqueles que não a experimentaram alguma vez. "Tudo quanto podemos observar diretamente no mundo físico acontece dentro da nossa cabeça e consiste em eventos mentais, pelo menos num sentido da palavra mental", diz Bertrand Russell. "Consiste, também, em eventos que forma parte do mundo físico. O desenvolvimento deste ponto de vista leva-nos à conclusão de que a distinção entre mente e matéria é ilusória. A matéria do mundo pode ser chamada de física ou de mental, ou de nenhuma das duas, como quisermos; na verdade, as palavras não servem para nenhum propósito".

Na consciência mística perene, a posição do sujeito e do objeto permanece a mesma, com uma diferença: agora, a consciência subjetiva domina a cena... O panorama que se estende até o derradeiro limite do horizonte e o vácuo do céu circundante, ao lado de todos os objetos físicos amontoados nele, parecem estar repletos de imanência, de uma gloriosa e inexprimível Presença, calma, serena e beatificante, intocada pelos acontecimentos e sublevações, por mais violentos que sejam. É como o leito profundo de um oceano que permanece imperturbado mesmo quando a mais furiosa tempestade chicoteia a superfície das águas, levantando massas, agitadas violentamente, de ondas em turbilhão.

Para o iluminado, portanto, o mundo divino e o das formas existem lado a lado, sem causar a menor confusão. A mudança em profundidade da consciência observadora revela um mundo novo e sutil, um mundo vivo e palpitante de indizível beleza, harmonia, felicidade e paz.

Gopi krishna — o Despertar da Kundalini

A Melhor Resolução de Ano Novo

Perguntaram a OSHO:

Se fosse para tomar uma única RESOLUÇÃO de ANO NOVO, qual você sugeriria?

Esta e só esta pode ser a resolução de ano novo: Eu resolvo nunca fazer qualquer resolução porque todas as resoluções são restrições do futuro. Todas as resoluções são prisões. Você decide hoje em vez de amanhã? Você destruiu o amanhã.

Permita que o amanhã tenha sua própria existência. Deixe que ele venha à maneira dele! Deixe-o trazer seus próprios presentes.

Resolução significa que você irá permitir apenas isso e que você não irá permitir aquilo. Resolução significa que você gostaria que o sol nascesse no oeste e não no leste. Se ele nasce no leste, você não vai abrir as suas janelas, você vai manter as janelas abertas para o oeste.

O que é resolução? Resolução é luta. Resolução é ego. Resolução é dizer: "Eu não posso viver de forma espontânea." E se você não pode viver de forma espontânea, você absolutamente não vive - você só finge.

Então, deixe apenas uma resolução estar lá: eu nunca vou fazer quaisquer resoluções. JOGUE FORA TODAS AS RESOLUÇÕES! DEIXE A VIDA SER UMA ESPONTANEIDADE VERDADEIRA. A única regra de ouro é que não existem regras de ouro.

Osho, em "Walk without Feet, Fly without Wings and Think without Mind"
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill