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sexta-feira, 16 de março de 2018

Um diálogo sobre a morte


UM DIÁLOGO SOBRE A MORTE

Jiddu Krishnamurti (K): Mrs. Jayakar e eu vamos manter uma conversação muito séria, um diálogo muito sério — muito sério. De modo que se vocês não compreendem ou se se aborrecem, tenham a bondade de sair tranquilamente. De acordo?

Pupul Jayakar: (PJ): Krishnaji, se dos interrogantes que, segundo sinto, bate nas profundezas mesmas da mente humana, é sobre o “vir a ser” e o “deixar de ser”, ou seja, sobre a vida e a morte. A totalidade da existência humana gira em torno da maravilha do nascimento e o medo da morte. Todos os impulsos do homem, suas exigências, seus desejos, seus temores, suas ansiedades, descansam entre estes dois polos: o nascimento e a morte.

Em certo nível, compreendemos o nascimento e a morte, mas penso que essa compreensão se acha só no nível superficial. E, a menos que compreendamos a fundo todo o problema da existência, contida entre esses dois extremos — todo o problema que subjaz na terminação de algo —, sempre estarão conosco o medo, a ansiedade, a escuridão e as sombras que rodeiam a palavra: “fim”.

K: Por que faz uso da palavra “problema”? Porque faz desse intervalo entre nascimento e a morte um problema?

PJ: Em si mesmos, o nascimento e a morte são fatos, porém a mente jamais pode deixá-los tranquilos. A mente se agarra a um e recusa ao outro.

K: Mas, por que você usa a palavra “problema”?

PJ: É um problema devido às sombras que rodeiam essa única palavra “fim”. Existem o júbilo e o esplendor do que vemos com vida, e está a exigência interna de agarrar-nos a ela a toda costa e fugir do que implica um fim. Isto é um problema. Disso surgem o medo, a dor, todos os requerimentos...

K: Qual é a pergunta, então?

PJ: Como exploramos isto? Como podemos liberar-nos da escuridão que rodeia a palavra “fim”? Como podem nossas mentes olhar a morte com simplicidade e observá-la pelo que ela é?

K: Você está realmente considerando a morte, ou considera esse grande período entre a vida e a morte? Que dizer, está incluindo o processo do viver, com toda a sua complexidade, sua miséria, sua confusão — tudo isso — em sua consideração do fim? Esta interessada em descobrir o que significa a morte e o que é este largo processo de luta, conflito, confusão, etc., ao qual nos agarramos em nossa evasão do outro? Interessa-se no movimento total que isso implica?

PJ: Veja, há um movimento total da existência, que contém a vida e a morte. Mas, se ampliamos tanto seu alcance, não creio que se possa chegar à angústia e a dor do fim.

K: Você está investigando a dor final, ou investiga todo o processo do viver e do morrer, o qual inclui o sofrimento, o medo e tudo o mais?

PJ: O que você acaba de dizer é correto: trata-se do movimento total do viver e do morrer, que é a existência. Você fala da terminação da dor; eu falo desse medo, dessa angústia que é a dor do fim.

K: De acordo, de acordo.

PJ: Ambas as coisas são ligeiramente distintas. Está a dor, a angústia de “algo que é” e deixa de ser... Há algo que é maravilhoso, que é belo, que enche nossa vida, e por detrás está sempre latente o conhecimento de que isso deve ter um fim.

K: O que é o “fim”?

PJ: O fim é esse processo em que algo que existe, que se sustenta, deixa de ser; já não é mais acessível aos nossos sentidos.

K: Não entendo totalmente.

PJ: Senhor, algo é, e na natureza mesma desse “ser”, está o sentido do fim disso, deu desaparecimento pela eternidade.

K: Por que faz uso da palavra “eternidade”?

PJ: Por que nesse fim há uma condição de absoluto. Nele não existe um amanhã.

K: Agora espere um instante: o fim de quê?

PJ: O fim daquilo que se sustenta. Existe a dor de que algo tão maravilhoso se termine.

K: É tão maravilhoso?

PJ: Permita-me passar a algo que é muito mais direito. Você existe. O fato de que não existirá causa uma grande angústia. Você existe.

K: O que entende por “você existe”?

PJ: K é. Nessa afirmação: “K é”, está a angústia de “K deixando de ser”.

K: A morte é inevitável. Esta pessoa, K, vai terminar algum dia. Para ele isso carece de importância; não há medo, não há nenhuma angústia. Mas você olha a essa pessoa e diz: “Oh! Meu Deus, vai morrer!” Portanto, se posso usar essa palavra como você a usou, é sua angústia. Bem, agora, por quê?

PJ: Isso é...

K: Por quê?

PJ: Por que você pergunta “por quê”?

K: Morre alguém. Tenho vivido com essa pessoa. Tenho amado a essa pessoa. Morre, e eu me sinto perdido. Por quê? Por que me encontro nesse terrível estado, um estado de desespero, de solidão? Por que choro e me angustio? Por que sofro? Não estamos discutindo isto a partir de um ponto de vista intelectual; falamos muito mais seriamente que isso. Perdi a essa pessoa. Tem sido querida para mim; foi minha companheira na vida. Chega a seu fim. Penso que é verdadeiramente importante compreender o fim, porque existe algo totalmente novo quando há um fim para todas as coisas.

PJ: Por isso disse que não se pode levantar o “por que” disso.

K: O “por que” está tão só levantado como uma investigação.

PJ: Minha dor, não é inevitável? Essa pessoa era o perfume de minha existência.

K: Sim, eu o amava. Foi minha companhia sexual e, graças a ela, me sentia realizado, interminavelmente rico. E ela, essa pessoa, chega a seu fim.

PJ: Isso não é doloroso?

K:  É. Morre meu filho ou meu irmão. É uma dor tremenda. Derramo lágrimas. Estou cheio de ansiedade. Então, a mente diz: “Devo achar consolo no pensamento de que vou encontrar-me com ele em minha próxima vida”. Eu pergunto: Por que leva o homem consigo a carga desta dor? Sei que a morte de alguém é dor; sei que é devastador. É como si fosse arrancada de raiz a totalidade de minha existência. É como uma árvore maravilhosa desgarrada, derrubada num instante.

Debato-me na dor porque jamais havia compreendido verdadeiramente, a fundo, o que é o fim. Tenho vivido quarenta, cinquenta ou oitenta anos, e durante todo esse período jamais dei-me conta de qual é o significado do fim — por fim a algo que considero valioso. Nunca coloquei totalmente fim à crença, ao apego, ou seja, terminando com ele de modo tal que não continue em outra direção.

PJ: O que é que torna a mente incapaz de termina a si?

K: O medo, supostamente. Tomemos um exemplo muito corrente, um exemplo que é comum a todos nós: o apego. Pode-se terminar, sem nenhum motivo ou direção, com o apego, com sua complexidade, com todas as suas implicações? Pode-se não sentir apego por nada — pela experiência, pelos conhecimentos adquiridos, as recordações? Depois de tudo, o final dos conhecimentos o que vai ocorrer quando a morte chegar. E o conhecimento é ao que se agarra-se. O conhecimento a respeito de uma pessoa a que tenho estimado, a que tenho cuidado, com a qual tenho vivido. Está a recordação da beleza e do conflito que isso envolvia. Bem, agora, terminar de maneira total, absoluta, com a recordação de tudo isso, é morte.

PJ: Frequentemente você diz: “Viver, entrar na casa da morte”.

K: Sim. Tenho dito.

PJ: O que isso exatamente significa?

K: “Convidar a morte enquanto vivemos” não significa cometer suicídio tomando uma pílula e, desse modo, deixando de existir. Creio que é muito importante convidar a morte enquanto vivemos. Eu o tenho feito.

Veja, a mesma palavra “fim”, contém uma profundidade de significado. Digamos que há algo, uma recordação de uma experiência que aprecio, a que me agarro porque me brinda com um grande deleite, um sentido de profundidade e bem-estar. Agarro-me a essa recordação. Concorro à oficina, trabalho, mas a recordação é tão extraordinariamente perdurável e vital, que permaneço agarrado a ela; portanto, jamais descubro o que significa colocar-lhe fim. Penso que tem um grande sentido colocar fim, cada dia, a tudo quanto se tem acumulado.

PJ: Pode-se terminar com o apego.

K: Isso é a morte.

PJ: Isso não é a morte.

K: A que você chamaria de morte? Ao organismo que chega ao seu fim? Ou a imagem que formei com respeito a esse fim?

PJ: Quando você o reduz a isso, eu diria que é a imagem que se formou acerca de alguém; mas na morte há muito mais que isso.

K: Por suposto, tenho vivido com você, tenho sentido estima por você, e sua imagem está profundamente arraigada em mim. Você morre, e a imagem cobra uma força maior. Naturalmente, coloco flores num santuário dessa imagem; dedico-lhe palavras poéticas. Mas o que está se vivendo é a imagem. Eu falo de colocar fim nessa imagem. A mente não pode penetrar numa dimensão totalmente nova se existe o vestígio de uma recordação de algo. Por que “o outro” é atemporal. A outra dimensão é eterna, e se a mente há de penetrar nela, não deve conter em si elemento algum do tempo. Creio que isto é lógico, racional.

PJ: Mas a vida não é lógica; a vida não é racional.

K: Certamente que não. Para compreender — sem o tempo — aquilo que é eterno, a mente deve achar-se livre de tudo o que tenha acumulado psicologicamente, o qual é tempo. Em consequência, tem que haver um fim.

PJ: Portanto, não é possível explorar o fim?

K: Oh, sim, o é.

PJ: Em que consiste a exploração do fim?

K: O que é o fim, o fim da continuidade? A continuidade de um determinado pensamento, de uma tendência, de um desejo particular; estas são as coisas que outorgam uma continuidade à vida. Nesse grande intervalo entre o nascimento e a morte, há uma profunda continuidade, igual que um rio. O caudal das águas faz que o rio seja maravilhoso, como o Ganges, o Rin, o Amazonas... e nós não podemos ver a beleza do rio. Vivemos na superfície deste vasto rio da vida e não podemos ver sua beleza porque estamos sempre na superfície.

PJ: O fim da vida é o fim da superfície.

K: Sim, o final da superfície.

PJ: O que é que morre?

K: Tudo o que se acumulou, tanto externa como internamente . Tenho bom gosto, e tenho levantado uma grande empresa que me produz muitíssimo dinheiro; possuo uma formosa casa, uma bela esposa, filhos encantadores, um bonito jardim. E minha vida tem dado continuidade a tudo isso. E isso há de findar.

PJ: Senhor, se importa se exploro um pouco? Você quer dizer que com a morte do corpo de K, chegará a seu fim a consciência de K? Por favor, estou dando muita importância a isto.

K: Você tem dito estas coisas: A consciência de K e o fim do corpo. O corpo haverá de terminar, a causa de um acidente, de uma enfermidade. Isso é óbvio. O que é a consciência dessa pessoa?

PJ: Uma abundante, imensa, infinita compaixão.

K: Sim. Eu não chamaria consciência a isso.

PJ: Uso a palavra “consciência” porque se vincula com o corpo de K. Não posso pensar em outra palavra. Poderia dizer “a mente de K”.

K: Sigamos com a palavra “consciência”, se lhe parece bem, e consideremo-la.  A consciência de um ser humano é seu conteúdo. O conteúdo é todo o movimento do pensar. A linguagem, a especialização, as crenças, os dogmas, os rituais, o sofrimento, a solidão, o desespero, um sentimento de temor... tudo isso é o movimento do pensar. Se o movimento do pensar chega a seu fim, a consciência tal como a conhecemos não existe.

PJ: Mas o pensar, como movimento na consciência — tal como a conhecemos —, não existe na mente de K. Sem dúvida, há um estado de ser que se manifesta quando eu estou em contato com K. Se manifesta ainda quando você não o converta em pensamento.

K: Não, não. Deve-se ser muito cuidadoso ao assinalar algo: A consciência tal como a conhecemos é movimento do pensar; é um movimento do tempo.

PJ: Sim.

K: Veja isso claramente. Esta consciência é o movimento do pensar. Por conseguinte, quando o pensamento, depois de investigar, chega a seu fim — não no mundo material, senão no mundo psicológico —, a consciência como a conhecemos, não existe.

PJ:  Senhor, você pode usar outra palavra, mas um estado de ser que se manifesta em K.

K: Sim, isso é perfeitamente certo.

PJ: Que palavra usarei?

K: Não estou lhe pedindo que troque palavras, mas digamos, por exemplo, que através da meditação — a verdadeira meditação e não a estupidez que se aceita como tal — você tem chego a um ponto que é absoluto. E assim o diz.

PJ: Sim.

K: E eu vejo isto. O percebo. Para mim, é um estado supremamente extraordinário. Graças a você, ao meu contato com você, eu percebo esta imensidão. E todo meu impulso, meu esforço, diz que devo capturar esse estado. Mas você o tem; desde logo, na é você, Pupul, quem o tem. Está aí. Não é seu nem meu. Está aí.

PJ: Mas está aí graças a você.

K: Não graças a mim. Está aí.

PJ: Onde?

K: Não tem lugar.

PJ: Só até um ponto posso aceitar o que você disse.

K: Muito bem... Antes de tudo, isso não é seu nem meu.

PJ: Eu só sei que se manifesta na pessoa de K. Portanto, quando você diz que não tem um lugar, não posso aceitá-lo.

K: Naturalmente, porque tem identificado a K como isso.

PJ: Mas K é isso.

K: Espere... quem sabe. Mas K disse que isso não tem absolutamente nada que ver com K nem com qualquer outra pessoa. Está aí. A beleza não é sua nem minha. Está aí. Em uma árvore, em uma flor... está aí.

PJ: Mas senhor, o poder curativo e a compaixão que há em K, não está ali fora.

K: É claro que não. Não estão ali fora.

PJ: Falo a respeito do poder curativo e a compaixão de K.

K: Mas isso não é K. Isso não é isto (K assinala para o corpo)

PJ: Mas deixará de manifestar-se; isso é o que digo, acerca disso que estou inquirindo.

K: O capto, o capto. Claro, compreendo o que trata de dizer. Questiono isso.

PJ: O que você entende por “questiono isso”?

K: Isso pode manifestar-se através de X. Aquilo que tem se manifestado ou que está se manifestando, não pertence a X. Não tem nada a ver com X. Não tem nada a ver com K.

PJ: Estou disposta a aceitar isso também, ou seja, que isso não pertence a K. Mas K e “isso” são inseparáveis.

K: Muito bem, mas quando você identifica “isso” com a pessoa, penetramos em algo muito delicado.

PJ: Quero investigá-lo devagar. Tomemos ao Buda. Qualquer coisa que tenha sido a consciência do Buda, ou qualquer coisa que tivesse se manifestado através dele, deixou de ser.

K: Eu questiono isso. O coloco em dúvida. Sejamos muito cuidadosos. Falemos acerca de Buda. Você disse que a consciência do Buda cessou quando ele chegou a seu fim, correto? Manifestava-se por meio dele e ele era “isso”; e quando ele morreu, você disse que “isso” desapareceu.

PJ: Não recordo haver dito que isso desapareceu. Só digo que já não se pode mais estabelecer contato com isso.

K: Naturalmente não.

PJ: Por que disse “naturalmente não”?

K Porque ele meditava... e tudo o mais. Estava iluminado, e deu com ele. Por conseguinte. Por conseguinte, entre ele e “isso” não havia divisão alguma. Eu, seu discípulo, digo: “Deus meu, ele está morto e com sua morte tudo se findou”.

PJ: Sim, isso se findou.

K: Eu digo que não. Aquilo que é o bem jamais pode findar-se. Ao igual que o mal (uso a palavra “mal”, ainda quando há demasiada obscuridade implicada nessa palavra), continua no mundo, correto? O mal é completamente diferente daquilo que é o bem. O bem existe e sempre existiu, mas não como o oposto do mal. O mal tem continuado por si mesmo.

PJ: Mas estamos nos afastando...

K: Não estou muito seguro, mas não importa, siga adiante.

PJ: Você disse que “isso” não desaparece.

K: O bem jamais pode desaparecer.

PJ: Eu me refiro a essa grande compaixão iluminada. Agora posso pôr-me em contato com ela.

K: Mas você pode colocar-se em contato com ela ainda se essa pessoa não existe. Essa é toda a questão. Isso nada tem que ver com uma pessoa em especial.

PJ: É o que você diz acerca de ser uma luz para si mesmo? O relaciona com o fato de pôr-se em contato com “isso” sem a pessoa?

K: Não “pôr-se em contato”. Isso pode ser percebido, vivido; está aí para que você chegue até isso e o contenha. A fim de que chegue até isso e o receba, o pensamento ou a consciência tal como a conhecemos, tem que findar-se, porque o pensamento é realmente o inimigo “disso”. O pensamento é, obviamente, o inimigo da compaixão. De acordo? E o ter essa chama requer, exige, não um grande sacrifício disto ou daquilo, senão uma inteligência desperta, uma inteligência que veja o movimento do pensar. E a percepção mesma do pensar termina com este. Isso é a verdadeira meditação.

PJ: Que significado tem, então, a morte?

K: Nenhuma. Nada significa, porque você está vivendo com a morte o tempo todo. Eu não creio que vejamos a importância e beleza do findar. O que vemos é a continuidade com suas ondas de beleza e toda sua superficialidade.

PJ: Eu viajo amanhã. Separo-me completamente de você?

K: Não, não de mim; se separa “disso”. Separa-se dessa eternidade com toda sua compaixão, e tudo mais.

É simples. Encontro-me com o Buda. Escuto-lhe muito cuidadosamente. Ele me causa uma tremenda impressão e, então, se vai. Mas a verdade do que ele disse permanece. Ele me disse, com muito cuidado: “Seja uma luz para si mesmo, de modo tal que a verdade se encontre em você”. Essa semente é a que está florescendo em mim. Ele se vai, mas a semente está florescendo. E eu poderia dizer: “O perdi: lamento haver perdido a um amigo ou a alguém que verdadeiramente amava”, mas o importante é que floresça a semente da verdade. Essa semente, que tem sido plantada por minha percepção, por meu estado de alerta e por meu interesse em escutar, essa semente florescerá. Do contrário, que sentido tem que alguém a tenha? Se X tem esta iluminação extraordinária — uso essa palavra para expressar um sentido de imensa compaixão, amor, e tudo isso —, si só essa pessoa o tem e morre, então, pra que?

PJ: Posso formular uma pergunta, por favor? Qual é, então, a razão de ser dessa pessoa?

K: Qual é sua razão de ser, o motivo da existência dessa pessoa? É de manifestar “isso”, de encarnar “isso”. Mas por que deveria haver um motivo? Uma flor não tem motivo. A beleza não tem um motivo; existe. E se trato de encontrar um motivo, não há flor nem beleza. Não intenciono fazer um mistério de tudo isso ou de envolvê-lo em uma névoa. Como disse, isso está aí para que qualquer possa chegar a isso e recebê-lo.

De modo, Pupul, que a morte, como o nascimento, é um sucesso extraordinário. Mas o nascimento e a morte se acham, até agora, separados. A ansiedade da continuidade é a desgraça do homem. E se a continuidade pode terminar cada dia, se estará vivendo com a morte. Isso é renovação total; é a renovação de algo que carece de continuidade. Por isso é essencial compreender o significado que tem colocar fim, totalmente, à experiência ou ao que tem sido experimentado e permanece, como recordação, na mente (Pausa).

Poderíamos investigar, em caso que haja tempo, a questão de se um ser humano pode viver sem o tempo e sem o conhecimento — aparte, é claro, está o conhecimento físico?

PJ: Não é isto o que dissemos até agora, que a verdadeira natureza do problema é poder viver com a morte? Quer dizer, quando a mente é capaz de viver com o fim de todas as coisas, é capaz de viver com o fim do tempo e do conhecimento.

K: Sim. Mas tudo isto pode ser tão só um montão de palavras.

PJ: Não, senhor. Umas das coisas é que não se pode fazer nada a respeito, mas pode escutar e observar, nada mais... Senhor, estou chegando a algo bastante diferente.

K: Prossiga, por favor.

PJ: Você crê que na mente pode haver uma aprendizagem para enfrentar-se à morte final?

K: O que há que se aprender, Pupul? Não há nada que aprender.

PJ: A mente deve receber sem agitação.

K: Sim.

PJ: Deve receber uma declaração como essa sem agitação. Então, quem sabe, quando chegue finalmente a morte, não haverá agitação.

K: Sim, correto. Por isso a morte tem uma beleza extraordinária, uma vitalidade extraordinária.
Brockwood Park
6 de junho de 1981

A raiz do medo


A RAIZ DO MEDO

Pupul Jayakar (PJ): Você tem dito, Krishnaji, que a inteligência é a máxima segurança quando enfrentamos ao medo. O problema é o seguinte: numa crise, quando o medo que brota do inconsciente nos inunda, onde há lugar para a inteligência? A inteligência exige negar aquilo que assim se apresenta. Nos exige escutar, ver e observar. Mas quando a totalidade do ser é inundada por um medo incontrolável, medo que tem uma causa mas cuja causa não podemos discernir imediatamente, nesse estado, onde há lugar para a inteligência? Como se encara os medos primitivos, arquetípicos, que se acham na base mesma da psique humana? Um destes medos é o medo da destruição de si mesmo, o medo de não ser.

Jiddu Krishnamurti (K): O que estamos explorando juntos?

PJ: Como tratar o medo? Você não tem respondido isso. Tem falado da inteligência dizendo que é a máxima segurança. Assim é; mas quando o medo nos inunda, onde está a inteligência?

K: Você está dizendo que, no instante de uma grande onda de medo, a inteligência se acha ausente. E pergunta: Como se pode lidar com essa onda de medo nesse instante? Essa é a pergunta?

Sunanda Patwardhan (SP): Vê-se o medo como se fossem os ramos de uma árvore. Mas nós tratamos com estes medos um por um, e assim não nos libertamos do medo. Existe uma qualidade que vê a totalidade do medo sem os ramos?

K: K perguntou: Vemos as folhas, os ramos, ou chegamos na raiz mesma do medo?

SP: Podemos chegar até a raiz a partir de cada ramo particular do medo?

K: Averiguemos.

PJ: Através de um só medo, pode-se chegar a ver a totalidade do medo.

K: Compreendo. Você diz que há temores conscientes e inconscientes, e que os temores inconscientes se tornam extraordinariamente intensos por momentos, e que nesses momentos a inteligência não atua. E pergunta como se pode, então, lidar com essas ondas de medo incontrolável. Não é essa a pergunta?

PJ: Este medos parecem adotar uma forma material; é algo físico o que a si o oprime.

K: Sim, nos transtorna neurologicamente, biologicamente... Exploremos. O medo existe, conscientemente ou nas profundezas, quando há uma sensação de solidão, um sentimento de que os demais nos abandonaram completamente, uma sensação de total isolamento, de não ser, de absoluto desamparo. E nestes momentos, quando surge um medo profundo, ingovernável, um medo que não temos evitado, é óbvio que a inteligência se acha ausente.

PJ: Pode-se sentir que se tenha enfrentado aos temores conhecidos, mas que se está atolado no inconsciente.

K: E então, nesse florescer mesmo há inteligência. Mas, como você lida com o outro? Por que o “inconsciente” — usaremos pelo momento esta palavra “inconsciente” — dá abrigo a estes medos? Ou é que o inconsciente os convida? Acaso os contêm, existem em suas profundidades tradicionais, ou é algo que o inconsciente recolhe do entorno? E, por que o inconsciente abriga medos, qualquer forma de medo? Forma parte intrínseca do inconsciente, a história racial, tradicional do homem? Encontra-se nos genes herdados? Como você encara este problema?

PJ: Podemos discutir o segundo, ou seja, que o medo é pego do entorno?

K: Antes de tudo, ocupemo-nos do primeiro. Por que o inconsciente abriga medos? Por que consideramos que as capas mais profundas da consciência são o depósito, o resíduo do medo? Isso está imposto pela cultura em que vivemos, pela mente consciente que, sendo incapaz de enfrentar-se ao medo, o tenha jogado para baixo, de modo tal que este medo permanece no nível do inconsciente? Ou é que a mente, com todo o seu conteúdo, não tem resolvido seus problemas e teme ser incapaz de resolvê-los? Quero averiguar qual é o significado do inconsciente. Quando você disse que chegam estas ondas de medo, eu lhe respondi que estão sempre ali, mas que, numa crise, se toma consciência delas.

SP: Existem na consciência. Por que você disse que estão no inconsciente?

K: Em primeiro lugar, a consciência está composta de seu conteúdo. Sem seu conteúdo, não existe a consciência. Um de seus conteúdos é este medo básico, e a mente consciente jamais o aborda; está aí, mas ela nunca diz: “Tenho que afrontá-lo”. Em momentos de crise, essa parte da consciência se acha desperta e está amedrontada. Mas o medo segue sempre aí.

PJ: O medo sempre está aí. Forma parte da herança cultural do homem?

K: O medo está sempre aí. Forma parte de nossa herança cultural? Ou é possível que se possa nascer num país, numa cultura que não admita o medo?

PJ: Não existe uma cultura semelhante.

K: Claro que não existe tal cultura. E então me pergunto: O medo, forma parte da cultura ou é inerente ao homem? O medo, tal como existe no animal, em toda a criatura vivente, é uma sensação de não ser; é a sensação de ver-se destruído.

PJ: O instinto de conservação adota a forma do medo.

K: É que a estrutura total das células tem medo de não ser? Esse medo existe em todo criatura vivente. Mesmo a minúscula formiga tem medo de não ser. Vemos que o medo está aí, vemos que forma parte da existência humana; e se se torna tremendamente consciente dele numa crise. Como se enfrenta a isso nesse momento, quando chega a onda do medo? Por que esperamos a crise? Só pergunto.

PJ: Não se pode evitá-lo.

K: Espere um momento. Dissemos que o medo está sempre aí, que forma parte de nossa estrutura biológica e psicológica. Toda a estrutura humana, a totalidade de nosso ser, sente medo. Este forma parte da mais diminuta criatura vivente, da mais insignificante das células. Por que esperamos que venha uma crise e o revele? Essa é uma aceitação extremamente irracional do medo.

Pergunto: Por que deveria ter uma crise para enfrentar-me ao medo?

PJ: De outro modo, este não existe. Veja, senhor, posso lidar inteligentemente com certos medos. Por exemplo, é possível afrontar com inteligência o medo da morte. É igualmente possível enfrentar-se inteligentemente a outros medos?

K: Você disse que pode afrontar com inteligência estes medos, mas eu o ponho em dúvida. Ponho em dúvida que se enfrente, ainda a certos medos — tal como você o expressa — inteligentemente. Ponho em dúvida que se possa ter alguma inteligência antes de haver resolvido o medo. A Inteligência é luz, e não se pode lidar com a escuridão quando não há luz. A luz existe unicamente quando não há escuridão. Eu questiono que você possa afrontar o medo inteligentemente quando o medo existe. Digo que não pode. Pode racionalizá-lo, pode ver sua natureza, pode evitá-lo ou transcendê-lo, mas isso não é inteligência.

PJ: Eu diria que a inteligência radica em uma lúcida percepção do medo quando este surge, em deixá-lo tranquilo, em não tratar de modificá-lo, em não voltar-lhe as costas, o qual leva a dissolução do medo. Mas você disse que onde está a inteligência, o medo não surge.

Nandini Mehta (NM): Não surgirá?

K: Nós não o permitimos que surja.

NM: Eu penso que o medo surge, mas nós não deixamos que floresça.

K: Veja, eu questiono completamente toda a resposta a uma crise. O medo está aí; por que necessitamos uma crise para despertá-lo? Você diz que ocorre uma crise e o medo desperta. Uma palavra, um gesto, um olhar, um movimento, um pensamento, são desafios que, segundo você, acarretam medo. Eu pergunto: Por que esperamos que haja uma crise? Estamos investigando. Você sabe o que significa “investigar”? Significa “seguir a pista”. Por conseguinte, estamos seguindo a pista. Não dizemos isto, aquilo ou o outro. Seguimos a pista disto, e eu pergunto: Por que espero uma crise? Um gesto, um pensamento, uma palavra, um olhar, um murmúrio... qualquer coisa destas é um desafio.

NM: Eu não busco a crise. Do único que me dou conta é de que o medo surge e caio paralisada.

K: Cai paralisada, por quê? Isso indica que, para você, é necessário um desafio. Por que não entra em contato com o medo antes do desafio? Disse que uma crise desperta o medo. Uma crise inclui um pensamento, um gesto, uma palavra, um murmúrio, um olhar, uma carta... É um desafio que faz que se desperte o medo? Eu me pergunto: Por que não deveria se estar desperto ao medo sem que haja um desafio? Se o medo está aí, deve achar-se desperto; ou está dormindo? E se está dormindo, por que o está? A mente consciente teme que o medo possa despertar? O adormeci ao negar observá-lo?

Vamos devagar, estamos seguindo o rastro de um cometa espacial. Por acaso a mente consciente tem temido observar o medo e, portanto, o tem mantido quieto? Ou o medo está aí, desperto, mas a mente consciente não quer deixá-lo florescer? Você admite que o medo forma parte da vida humana, da existência?

PJ: Senhor, o medo não tem uma existência aparte, independente da experiência exterior e de seus estímulos.

K: Espere, eu questiono isso, não o aceito. Você disse que sem os estímulos externos, o medo não existe. Se isso é certo para você, deve sê-lo para mim, porque sou um ser humano.

PJ: Incluo tanto os estímulos externos como os internos.

K: Eu não divido o externo do interno; é tudo um só movimento.

PJ: O medo não tem uma existência aparte dos estímulos.

K: Você se afasta do tema, Pupul.

PJ: Você pergunta: Por que não olhar o medo, por que não enfrentar a ele?

K: Eu me pergunto: Devo esperar uma crise para que este medo se desperte? Isso é tudo o quanto pergunto. Se o medo está aí, quem o fez adormecer? Isso ocorre porque a mente consciente não pode resolvê-lo? A mente consciente se preocupa por resolver o medo e, ao não ser capaz de fazê-lo, o adormece, o sufoca, E, quando ocorre uma crise, a mente consciente se vê sacudida e o medo aparece. De modo que me pergunto: Por que deve a mente consciente reprimir o medo?

SP: Senhor, o instrumento da mente consciente é a análise, a capacidade de reconhecer. Com isto ela não pode enfrentar-se adequadamente com o medo.

K: Não, não pode. Mas o que se requer é a verdadeira sensibilidade, não análise. A mente consciente não pode lidar com o medo; portanto, diz: “Quero afastá-lo, não posso olhá-lo”. Veja o que você faz. Espera que venha uma crise para que o medo se desperte, e a mente consciente está todo o tempo evitando a crise. A evita raciocinando, racionalizando. Somos mestres nesse jogo. Digo-me, pois, que se o medo está aí, se acha desperto. Você não pode adormecer algo que forma parte de nossa herança. A mente consciente só supõe que tenha adormecido ao medo. E se vê sacudida quando ocorre uma crise. Em consequência, aborda o medo de uma maneira diferente. Esse é o meu levantamento. Isso é correto? O medo básico é o medo da não existência, uma sensação de completo temor, de incerteza; medo de não ser, de morrer. Por que a mente não traz à luz esse medo e se move com ele? Por que deve esperar por uma crise? É por que são preguiçosos e, por isso, não possuem a energia necessária para chegar até a raiz do medo? É irracional o que estou dizendo?

PJ: Não é irracional. Estou tratando de ver se é válido.

K: Dissemos que toda criatura vivente tem medo de não ser, de não sobreviver. O medo forma parte de nossas células sanguíneas. Todo nosso ser experimenta o medo à não existência, ao medo de morrer, de ser destruído. Assim, pois, o medo ao não ser forma parte tanto de nossa estrutura psicológica como da biológica, e me pergunto por que é necessária uma crise, por que deve adquirir importância o desafio. Eu me oponho ao desafio. Quero estar à frente do desafio, não atrás.

PJ: Não se pode participar do que você está dizendo.

K: Por que não pode? Vou mostrar-lhe. Sei que vou morrer, mas tenho intelectualizado, racionalizado a morte. Portanto, quando digo que minha mente está muito mais adiante que a morte, não o está. Só o está com o pensamento, e isso não é estar muito mais adiante.

PJ: Tratemos de captar a realidade disto. Se se enfrenta a morte e sente que está um passo adiante dela; mas se se move e, subitamente, se dá conta de que não se adiantou à morte.

K: Entendo isso. Tudo é resultado de um desafio, seja que tenha tido lugar ontem ou a um ano atrás.

PJ: Então, a pergunta é, Com que instrumento, com que energia, de que dimensão se vê? E, o que é o que se vê?

K: Quero ser claro. O medo forma parte de nossa estrutura, de nossa herança. Biologicamente, psicologicamente, as células cerebrais têm medo de não ser. E o pensamento diz: “Não vou olhar esta coisa”. E quando aparece o desafio, o pensamento não pode terminar com ele.

PJ: O que significa para você: “O pensamento disse: ‘Não quero olhar o medo?’”?

NM: Senhor, quer olhar-se a si mesmo.

K: O pensamento não pode observar sua própria terminação. Só pode racionalizar a respeito. Eu lhe pergunto: Por que a mente espera um desafio? É necessário? Se você disse que é necessário, então o está esperando.

PJ: Eu digo que não o sei. Só sei que se apresenta um desafio e surge o medo.

K: Não, um desafio desperta o medo. Atenhamo-nos a isso. E eu lhe pergunto: Por que esperar por um desafio para que o medo se desperte?

PJ: Sua pergunta é um paradoxo. Você diria que não espera um desafio que o evoca?

K: Não me oponho completamente ao desafio. Você não entendeu meu levantamento. Minha mente não aceitará um desafio em nenhum momento. Dizer que estou dormindo e que é necessário um desafio para despertar-me, é uma afirmação errônea.

PJ: Não, senhor, isso não é o que eu digo.

K: Em consequência, o medo está desperto. O que é que dorme, então? A mente consciente? Ou o que está adormecida é a mente inconsciente? E, há certas partes da mente que estão despertas?

PJ: Quando estou desperta, estou desperta.

NM: Você convida o medo?

K: Se você está desperto, nenhum desafio é necessário. De modo que se recusa o desafio. Sim, como dissemos, faz parte de nossa vida que devamos morrer, então, se está desperto todo tempo.

PJ: Não todo o tempo. Não se está consciente do medo todo o tempo. Este se encontra aí todo o tempo debaixo do tapete, mas não se o observa.

K: Eu digo: Levante o tape e observe. Está aí. Isso é o que levanto. Está aí e se acha desperto. De modo que não é necessário um desafio que o desperte. Todo o tempo tenho medo de não ser, de morrer, de não triunfar. Esse é o medo básico de nossa vida; está aí, em nosso sangue, sempre vigilante, montando guarda, protegendo-se. Mas está totalmente desperto. Jamais dorme, nem sequer por um momento. Assim que ao se necessita de um desafio. O que você faz com respeito ao medo e o modo como o aborda, isso vem depois.

PJ: Esse é o fato.

Achyut Patwardhan (AP): Ao ver tudo isto, você não aceita o fator da desatenção?

K: Disse que o medo está desperto, não estou falando de atenção.

AP: O medo está ativo, opera.

K: É como uma serpente na residência, está sempre aí. À mente consciente lhe preocupa o modo de lidar com o medo, e como não pode fazê-lo, se afasta. A mente consciente recebe, então, um desafio e trata de enfrentar-se a ele. Pode enfrentar-se a uma criatura vivente? Isso não necessita de um desafio. Mas, devido a que a mente consciente cegou-se contra o medo, o desafio se torna necessário. Correto, Pupul?

NM: Quando se pensa no medo isso é tão só um pensamento; essa sombra segue estando na mente.

K: Siga-lhe o rastro, não salte para conclusões. Você tem saltado para conclusões. Minha mente recusa o desafio. A mente consciente não permitirá que a despertem os desafios. Está desperta. Mas você admite o desafio. Eu não o admito. Não se encontra dentro de minha experiência. O próximo passo é: Quando a mente consciente se acha desperta ao medo, não pode evitar algo que está ali. Vejamos passo a passo, não pulemos para conclusões a cada segundo. De modo que a mente consciente sabe que o medo está aí, plenamente desperto. Então, o que é o próximo que faremos?

PJ: É aí onde radica nossa insuficiência.

NM: Eu estou desperta.

K: Você confunde toda a questão. É a mente consciente quem teme a isto. Quando se acha desperta, não está amedrontada. Em si mesma, não está amedrontada. A formiga não está amedrontada. Se a esmagam, a esmagam. É a mente consciente que diz: “Tenho medo disto — de não ser”. Mas quando topo com um acidente, quando se explode um avião, não há medo. No instante da morte, digo: “Sim, agora sei o que significa morrer”. Mas a mente consciente, com seus pensamentos, diz: “Meu Deus, vou morrer, não quero morrer, não devo morrer, me protegerei”; essa é a coisa que tem medo. Nunca obervaram uma formiga? Jamais está assustada; se alguém a mata, morre. Agora você vê algo.

NM: Senhor, já viu alguma vez uma formiga? Se se põe um pedaço de papel na frente da formiga, esta se esquiva.

K: Quer sobreviver, mas não está “pensando” a respeito da sobrevivência. Assim que voltamos a isso. O pensamento cria o medo; só o pensamento diz: “Morrerei, estou só, não me realizei”. Veja-o: isso é a eternidade atemporal, é a verdadeira eternidade. Veja o quão extraordinário é. Por que devo estar amedrontado, se o medo é uma parte de meu ser? Só quando o pensamento diz que a vida deve ser diferente, há medo. Pode a mente permanecer completamente imóvel? Pode ser completamente estável? Então surge essa coisa. Quando essa coisa está desperta, qual é, então, a raiz central do medo?

PJ: Senhor, isso alguma vez lhe ocorreu?

K: Várias vezes, muitas vezes, quando a mente está completamente estável e não retrocede diante nada, quando não aceita nem recusa, quando não racionaliza, nem foge, quando não há movimento de nenhum tipo. Chegamos até a raiz disso, verdade?

Nova Delhi
13 de novembro de 1972

Energia e atenção


Pupul Jayakar: A maioria das pessoas vê que, a causa das diversas pressões que operam sobre a mente humana — violência e terror — há uma contradição do espaço disponível para nossa exploração e uma incapacidade para afrontar situações complexas. Eu sugiro que não examinemos problemas específicos, senão que ponhamos desnudemos a estrutura da mente humana, o qual nos enfrentaria cara a cara com a estrutura do pensamento, já que só então é possível, para cada um de nós, investigar nas complexidades que ocupam nossa consciência.

Krishnamurti: Temos considerado juntos o movimento do medo, olhando com palavras comuns e facilmente compreensíveis. Você tem escutado essas declarações? Como as têm ouvido e qual tem sido o impacto que elas tem tido sobre você? Dissemos que o desejo, o tempo, o pensamento, as múltiplas feridas psicológicas — a totalidade deles — é medo. Qual tem sido o impacto dessa declaração? Tem tido só um impacto verbal, lógico, ou o impacto tem sido real, profundo? Temos conversado num nível donde você tem visto a verdade do que se tem dito?

Pupul, digamos que você me comunica não a descrição verbal, senão a verdade mesma de tudo isso. Como eu escutaria essa declaração? Não a resistiria, nem compararia o que você disse, comparando com algo que já conheço, senão que escutaria o que realmente expressa. Isso penetraria em minha consciência. Penetraria nessa parte da consciência que está disposta a compreender inteiramente o que você está dizendo...

PJ: Senhor, nós estamos falando do futuro do homem, do perigo que significa a tecnologia fazendo-se cargo das funções humanas. O homem parece paralisado. Você tem dito para que para ele se abrem unicamente dois caminhos: o caminho do prazer ou o caminho do movimento interior. Eu lhe pergunto acerca de “como” desse movimento interior.

K: Quando você pergunta “como”, está pedindo um sistema, um método, uma prática. Isso é óbvio. Do contrário, ninguém pergunta “como”? Como tenho que tocar piano? Como tenho que fazer isto ou aquilo? A palavra “como” implica um método, uma determinada maneira de atuar, tudo isso. Portanto, quando você pergunta “como”, está de volta no mesmo velho padrão da experiência, o conhecimento, a memória, o pensamento, a atividade.

Bem, agora, podemos, por um momento, deixar atrás o “como” e observar a mente, o cérebro? Pode haver uma pura observação disso, uma observação que não seja uma análise? A observação é completamente diferente da análise. Na análise existe sempre a busca de uma causa; estão o analisador e o analisado. Isso dá a entender que há um analisador separado do analisado. Tal separação é falsa, não é factual; o factual é o que está ocorrendo agora.

A observação se acha totalmente livre da análise. É possível simplesmente observar, sem nenhuma conclusão, nenhuma direção, sem nenhum motivo? É possível ter tão só um mirar puro, claro? Obviamente, é possível quando você observa aquelas formosas árvores; isso se mostra muito simples. Ou seja, eu posso focar aquela árvore e posso fazê-lo sem nenhuma distorção, porque estou focando oticamente, e nessa observação não tem lugar o processo de análise. Vou mais além. Porém, olhar como opera todo o movimento da existência, observando sem nenhuma distorção é, no geral, algo completamente diferente.

Então, a pergunta é: Pode haver uma observação de toda a atividade do medo, sem tratar de achar a causa, sem perguntar como temos de colocar-lhe um fim, sem tentar reprimi-lo, sem tentar escapar? É possível olhar simplesmente todo o movimento do medo e permanecer com ele? Por “permanecer com ele” entendo observá-lo sem que nenhum movimento do pensar afete na observação. A atenção surge com esse observar. Esse observar é atenção total. Não é concentração; é atenção. É como focar uma luz brilhante num objeto. No enfoque dessa energia, que é luz, nesse movimento, o medo chega a seu fim. A análise nunca terminará com o medo; você pode comprová-lo. Portanto, surge a pergunta: Minha mente é capaz de ter uma semelhante atenção que reúna toda energia de meu intelecto, de minha emoção, de meus nervos, como para poder olhar todo este movimento do medo, olhá-lo sem que haja oposição nem apoio nem recusa?

PJ: O pensamento surge na observação, e não permanece com a observação do medo. Então, o que ocorre ao pensamento? Deixa-se de lado? O que se faz? O pensamento surge, não há dúvida: isso também é um fato.

K: Apenas escute. Quem fala explicou não só os temores pessoais, senão também os temores da humanidade, que constituem esta corrente, a corrente na qual se acha incluído o pensamento, o tempo e o desejo de terminar com ele, de ir mais além. Você pode observar isso, observá-lo sem nenhum movimento? Porque qualquer movimento é o pensar.

PJ: Você pode dizer que o movimento é medo, mas nessa observação surge o pensamento, o qual é também um fato.

K: Por favor, escute. Eu falei do desejo, do tempo e do pensamento; disse que o pensamento é tempo, e que o desejo forma parte do pensamento. Você tem despregado todo o mapa do medo, no qual incluí o pensamento. Veja, Pupul, não é uma questão de reprimir o pensamento, isso é impossível. Por conseguinte, primeiro tem que observá-lo. Mas, desafortunadamente, nós não concedemos atenção a nada.

Pupul, você acaba de dizer algo acerca do pensamento. Eu escutei isso muito, muito cuidadosamente, prestei atenção ao que você estava dizendo. Você pode escutar desse modo?
PJ: Durante um instante de atenção, não há pensamento; depois, o pensamento aparece. Este é o estado da mente. Não há um fazedor, já que isso é bastante óbvio. Não é possível permanecer imóvel nem dizer que o pensamento não haverá de surgir. Se é uma corrente, é uma corrente que flui.

K: Estamos discutindo o que é observação?

PJ: Sim, estamos discutindo a observação. Nessa observação eu tenho enfrentado este problema, porque é o problema da atenção, do autoconhecimento, é o problema de nossas mentes, o problema de que, ao observar, surge o pensamento. Então, o que você faz com o pensamento?

K: Quando em sua atenção surge o pensamento, você deixa totalmente de lado o medo, mas persegue o pensamento. Não sei se me expresso claramente. Você observa o movimento do medo. Nessa observação surge o pensamento. O movimento do medo não é importante. O que importa é a aparição do pensamento e a atenção total que dedicamos a esse pensamento. Existe esta corrente do medo. Você disse: “Diga-me o que devo fazer. Como estando presa no medo, ei de acabar com ele? Revele-me não o método, não o sistema, não a prática, senão o findar do medo”. Você vê que a análise não terminará com o medo; vê que isso é óbvio. Portanto, pergunta-se: O que terminará com o medo? Uma percepção total do medo, uma percepção não dirigida?

Jagannath Upadhayata (JU):  Você fez uma observação acerca de observar o movimento do medo. Eu não aceito a distinção que você faz entre análise e observação. Não concordo com sua recusa da análise. Só mediante a análise podem desfazer-se por completo a estrutura da tradição e o peso que a memória tem sobre nós. Só quando isso está desfeito, é possível a observação. Do contrário, o que estaria observando seria tão só uma mente condicionada. Por sua insistência na observação como algo distinto da análise, talvez exista a possibilidade ou a probabilidade de que ocorra esse tipo de acidentes ou sucessos súbitos, de que outras pessoas têm falado. Portanto, surge a circunstância na qual tem lugar o sákti ou transmissão de poder.

PJ: Essa é a natureza característica de observar o medo? Respondo a parte da pergunta. A natureza do observar ou olhar ou escutar o medo, é da mesma índole que olhar uma árvore, ou escutar um pássaro? Ou você se refere a uma escutar e um ver que são mais que uma observação auditiva e ótica? E se são mais, o que é esse “mais”?

Achyut Patwardhan (AP):  Eu vejo um grande perigo no que Upadhyayaji tem dito. Ele disse que não pode haver uma observação a menos que esteja acompanhada da análise, e que se há uma observação sem análise, essa observação pode ter que depender do despertar acidental de um discernimento instantâneo. Ele fala disso como de uma possibilidade. Eu sinto que, a menos que a observação esteja expurgada da análise, é incapaz de livrar-se das traves do conceitual, do processo em que temos sido educados, processo donde a observação e a compreensão intelectual marcham juntas. Bem, agora, a observação que não tem sido depurada da compreensão verbal, se distingue da observação pura. Por conseguinte, em minha opinião, é indispensável estabelecer que a análise é um obstáculo para a observação. Devemos ver, como um fato, que a análise nos impede de observar.

K: Senhor, compreendemos claramente que o observador é o observado? Eu observo essa árvore, mas não sou essa árvore. Também observo diversas reações e as nomeio “cobiça”, “inveja”, etc. Bem, agora, o observador, se acha separado da cobiça? O próprio observador é o observado, ou seja, a cobiça. Isto está claro, não intelectualmente senão de fato? Você vê a verdade disso como uma profunda realidade, uma verdade absoluta? O observador é o passado.

Tenho medo. Esse medo sou eu; não estou separado desse medo. Assim, pois, o observador é o observado. E na ação de ver essa verdade que é absoluta, só existe o fato: o fato de que o medo sou eu e de que não estou separado do medo. Então, qual a necessidade de análise?

Veja, nessa observação — se é observação pura — se revela toda essa coisa, e dessa observação sem análise, eu posso explicá-lo todo logicamente.

Nós não temos claro este ponto especial de que o pensador é o pensamento, o experimentador, a experiência. O experimentador, quando experimenta algo novo, o reconhece. Eu experimento algo. Para dar-lhe um significado, devo introduzir todos os registros anteriores da minha experiência; tenho que recordar a natureza dessa experiência. Portanto, a estou situando fora de mim mesmo. Mas, quando me dou conta de que o experimentador, o pensador, o analisador é o analisado, é o pensamento, é a experiência, nessa percepção, nessa observação não há divisão alguma, não há conflito. Portanto, quando se compreende a verdade disso, pode explicar logicamente toda a sequência que implica.

JU: Isso é um fato? É uma verdade? Como se sabe se isso é a verdade, quando a experiência...?

K: Vamos devagar. Digamos que estou enfurecido. No instante da fúria não há, em absoluto, um “eu”; só existe essa relação chamada “fúria”. Um segundo depois, digo: “Tenho estado enfurecido”, e já me separei da fúria, a separei de mim mesmo.

PJ: Sim.

K: A tenho separado, pois, um instante mais tarde; estou eu e está a fúria. Então a reprimo, a racionalizo. Uma reação que é o “eu”, já a tenho dividido em “eu” e “não eu”, e então começa todo o conflito. Dissipo energia em analisar, em reprimir, em achar-me em conflito com a fúria. Mas quando vejo que a fúria sou eu, quando vejo que estou composto de reações: fúria, medo, etc., a energia se concentra; não há dissipação de energia em absoluto. Com essa energia que é atenção, mantenho esta relação chamada medo. Não me afasto dela, porque sou isso. Então, devido a que concentrei toda minha energia nisso, esse fato que chamo “medo” desaparece.

Você queria averiguar de que maneira o medo pode chegar a seu fim. Será lhe mostrado. Enquanto houver uma divisão entre você e o medo, o medo continuará. É como ocorre entre o árabe e o judeu, entre o hindu e o muçulmano: enquanto existe essa divisão, tem que haver conflito.

PJ: Mas, senhor, quem observa?

K: Não há um “quem” que observa. Só existe o estado de observação.

PJ: Gera-se espontaneamente?

K: Bem, agora, você me disse que isso não é análise, que não é isto, que não é aquilo, e eu descarto todas essas coisas. Não as discuto; as descarto e minha mente está livre de todos os processos conceituais, analíticos do pensamento. Minha mente presta atenção ao fato de que o observador é o observado.

PJ: Senhor, quando se observa a mente, Vê-se o movimento extraordinário que há nela. Este movimento se encontra mais além do controle ou a capacidade de ninguém, nem sequer para dar-lhe uma direção. Está aí. Nesse estado, você diz: conceda atenção ao medo.

K: O que implica: Conceda toda a sua energia...

PJ:  O que, na realidade, quer dizer: Dirija a atenção a isso que está em movimento. Quando nos é formulada uma pergunta, a resposta aparece de imediato em nossas mentes. Sem dúvida, em sua mente, as respostas não aparecem; você mantém a pergunta. Bem, agora, o que é que dá a você a capacidade de sustentar o medo na consciência? Não creio que nós tenhamos essa capacidade.

K: Não o sei; não creio que seja uma questão de capacidade. O que é capacidade?

PJ: Eliminarei a palavra “capacidade”. Há uma ação de sustentar o medo.

K: Isso é tudo.

PJ: Ou seja, este movimento que flui, se detém, se imobiliza.

K: É assim.

PJ:  O medo termina. Com nós isso não ocorre.

K: Poderíamos discutir um fato? Podemos sustentar qualquer coisa em nossas mentes durante um minuto ou sequer por alguns segundos? Podemos sustentar algo? Amo; posso permanecer com esse sentimento, essa beleza, essa clareza que traz consigo o amor? Posso conte-lo, simplesmente conte-lo e não dizer que é o amor e que não é? Posso tão só contê-lo, igual a um vaso que contém a água?

Senhor, quando você tem uma libertária percepção holística direto no medo, o medo se encerra. A libertária percepção holística não é análise, tempo, recordação; a libertária percepção holística não é nenhuma dessas coisas. É a percepção instantânea de algo. Temos isso. Frequentemente temos esta sensação de total clareza a respeito de algo. Isto é teórico? Todos parecem que estão céticos...

JU: Senhor, eu percebo que quando você fala de clareza, existe esse instante de clareza. Aceito isso, Mas isso tem que vir como resultado de algo que ocorre. Tem que mover-se de fase em fase, de nível em nível. Minha clareza não pode ser a mesma que sua clareza.

K: Senhor, a clareza é clareza; não é sua nem minha. A inteligência não é sua nem minha.

PJ: Se me permite, eu gostaria que investigássemos algo diferente. Ao observar o movimento da mente, não há um ponto em que eu diga que tenha observado algo de maneira total e isso se encerrou.

K: Você jamais pode dizer isso.

PJ: Senhor, a observação da qual você fala é um estado de ser; você se move na base da observação; sua vida é uma vida de observar.

K: Sim, correto.

PJ: A partir desse observar surge a ação; surge a análise; advém a sabedoria. Observar, é isso? Desafortunadamente, nós observamos e então penetramos na outra esfera do observar; portanto, em nós sempre tem lugar este outro processo dual. Nenhum de nós sabe o que é este estado de observar. Ninguém pode dizer que é uma vida que se baseia no observar.

K: Não, eu penso que isso é muito simples. Você não pode observar a uma pessoa, observá-la sem nenhum preconceito, sem nenhum conceito?

PJ: Sim.

K: O que significa essa observação? Você me observa, ou eu a observo. Como você observa? Como você olha? Como você reage a essa observação?

PJ: Com toda a energia que tenho. Eu o observo... Não, senhor, esta investigação está se tornando muito pessoal, de modo que não prosseguirei com isto.

K: Afasto-me, então, disso.

PJ: Eu não posso dizer que não sei o que é achar-se num estado de observar sem o observador.

K: Digamos que estou casado. Podemos tomar como um exemplo? Tenho vivido com minha esposa durante certo número de anos. Conservo todos as recordações desses cinco ou vinte anos. De que maneira a observo? Diga-me. Estou casado com ela; tenho vivido com ela, sexualmente e tudo mais. Quando a vejo pela manhã, como a observo? Qual é a minha reação? Vejo-a de um modo novo, como se a olhasse pela primeira vez, ou a olho com todas as recordações que inundam minha mente?  

Observo alguma coisa pela primeira vez? Quando olho para a Lua, a Lua nova que surge junto com a estrela vespertina, vejo-a como se nunca antes a tivesse visto? Vejo a maravilha, a beleza, a luz? Observo qualquer coisa como se fosse pela primeira vez?

Interlocutor: Podemos, por acaso, morrer para nossos ontens, podemos morrer para o nosso passado?

K: Sim, senhor. Sempre olhamos com a carga do passado. Por conseguinte, não há um olhar verdadeiro. Isto é muito importante. Quando olho a minha esposa, não a vejo como se estivesse vendo seu rosto pela primeira vez. Meu cérebro está aprisionado pelas recordações a seu respeito, acerca disto ou daquilo. Assim, pois, a estou olhando sempre a partir do passado. É possível olhar a Lua, a estrela vespertina, como pela primeira vez, ou seja, sem todas as associações vinculadas com elas? Posso ver o pôr do Sol que tenho visto na América, na Inglaterra, na Itália, etc., como se o estivesse vendo pela primeira vez? Se posso fazê-lo, isso implica que meu cérebro não está recordando os anteriores pôr de Sol que conheci. Nós, vemos algo como se fosse pela primeira vez?

I: Muito raramente... Você pergunta: Pode-se ver a Lua e a estrela vespertina sem a interferência do passado? Quem sabe é a recordação da primeira vez o que nos faz observar.

K: Entendo o que disse, e isso nos conduz a outra pergunta: É possível não registrar, exceto o que é absolutamente necessário? Por que eu deveria registrar o insulto ou o elogio que posso ter recebido esta manhã? Ambos são a mesma coisa. Você me elogiou dizendo que foi uma boa palestra, e ela disse que fui um idiota. Por que deveria registrar qualquer das duas declarações?

PJ: Você formula a pergunta como se tivéssemos a opção de registrar ou não registrar.

K: Não há opção. Formulo uma pergunta a fim de investigar. Veja, o cérebro registrou esta manhã o esquilo sobre o parapeito; registrou os cometas voando e registra tudo o que você tem dito e está dizendo agora em nossa discussão. Tudo se registra; é como um disco de fonógrafo tocando uma e outra e outra vez. A mente está todo o tempo ocupada, não é assim? Bem, agora, em meio dessa ocupação você não pode escutar, não pode ver claramente. Você tem que investigar, pois, o por que de o cérebro estar ocupado. Eu estou ocupado Deus, ele está ocupado com o sexo, ela, com seu marido, enquanto que algum outro está ocupado com o poder, a posição, a política, a destreza, etc. Por quê? É que quando o cérebro não está ocupado há o medo de não ser nada? É porque a ocupação me faz sentir que estou vivo, e se não estou ocupado com algo digo que me sinto perdido? É por isso que nos achamos ocupados de manhã até a noite? Trata-se de um hábito? Ou é uma maneira que o cérebro tem de tornar-se agudo? Esta ocupação está destruindo o cérebro, tornando-o mecânico. Não sei se você me segue. Acabo de afirmar isto. Como o escuta? Vê que está realmente ocupado e, a ver isto, permanece com isso? Observe, então, o que ocorre.

Quando há ocupação, não há espaço na mente. Eu sou a acumulação de todas as experiências da humanidade. E, se soubesse ler o livro que sou, veria que a história de toda a humanidade sou eu mesmo. Estamos muito condicionados a esta ideia de que todos somos indivíduos separados, de que todos temos cérebros separados, e deque os cérebros separados com sua atividade egocêntrica vão renascer uma e outra e outra vez. Eu questiono todo esse conceito de que sou um indivíduo, o que não quer dizer que sou o coletivo, porque há uma diferença. Eu não sou o coletivo. Sou a humanidade.

Nova Delhi
5 de novembro de 1981
Fogo na mente

quinta-feira, 15 de março de 2018

O tempo como fator de adulteração da percepção do agora

O que tenho por essencial é de fato essencial?

♫ Fogo Na Mente - Leandro Bomfim no Estúdio Muda

quarta-feira, 14 de março de 2018

A natureza exata da codependência não é a codependência

terça-feira, 13 de março de 2018

A dificuldade de se manter como um verdadeiro educador

Um estado de ser que é atração sem contradição

segunda-feira, 12 de março de 2018

Só corre atrás de sonhos, quem ainda está dormindo

sábado, 10 de março de 2018

O condicionamento de buscar algo que faça o coração vibrar

quinta-feira, 8 de março de 2018

Não há estados de consciência, só há estados mentais

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill