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quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Qual é a única solução para os nossos problemas?

Temos problemas incontáveis; e quanto mais pensamos neles, conscientemente, tentando resolvê-los, tanto mais crescem as complicações e se multiplicam os problemas. Uma vez que estamos tratando de problemas não originados na mente superficial, mas resultantes de lutas, conflitos, ambições, agitações que se processam nas profundezas inconscientes, se se não operar uma transformação radical e fundamental naquele nível profundo, muito pouco valor terá qualquer reforma de remendos que se fizer no nível superficial — no terreno econômico, social, político, etc. Pode-se ver que as revoluções não nos alteraram fundamentalmente o processo do viver. A transformação que se opera no nível consciente não passa de uma simples continuidade modificada, pois nesse nível a mente opera de modo superficial, calculando, julgando, pensando; mas esse "processo" de calcular, pesar e julgar é a continuidade de uma coisa condicionada; por conseguinte, por esse meio não se resolve o problema de modo nenhum; o que se faz é apenas modificá-lo, alterar a sua direção; todavia, a nova direção é confusa, do mesmo modo

Enquanto quisermos resolver nossos problemas no nível superficial, com ideia contra ideia, argumento contra argumento, lógica contra lógica — tudo isso reações da mente superficial — é bem óbvio que os resultados que a mente obterá serão produtos de pensamento condicionado. Nesse "processo", por conseguinte, não há revolução psicológica, profunda, fundamental. Creio, o mais importante atualmente não é a revolução no nível superficial, mas a revolução no nível inconsciente, profundo, porque vivemos muito mais nesse nível, e nosso ser está mais lá do que no nível superficial

Assim sendo, não acham importante que escutemos de maneira que o inconsciente absorva — se assim me posso expressar — o que nos é transmitido, e a revolução, por conseguinte, não seja uma revolução consciente? Considero muito importante que se escute de tal maneira que a transformação seja inconsciente, e que tenhamos uma nova perspectiva da vida não fundada na ação consciente deliberada, mas na revolução não produzida pelo "processo" deliberado do pensamento. 

Afinal, nós temos tantos problemas em níveis diversos — problemas econômicos, sociais, religiosos; o problema do amor, da morte, o problema das relações, da penúria, o que é Deus, se há continuidade, o que é imortalidade, o que é aquele estado de "atemporalidade", o que é criação, etc., etc. Temos problemas inumeráveis e a eles sempre nos aplicamos com a intenção de resolvê-los com nossa mente consciente, nossa mente comum, a mente que tem pensamentos, a mente que é resultado do tempo, resultado da tradição, da chamada educação (que é o processo de "nos condicionarmos" numa determinada ideia, atividade ou padrão — comunista, socialista, capitalista, católico, etc.) e com esse condicionamento queremos resolver os inúmeros problemas; mas, é bem óbvio, uma mente condicionada não pode resolver tais problemas. 

Necessitamos de uma solução inteiramente diferente, de uma revolução diferente — de natureza psicológica, interior, fundamental. Isso, parece-me, só será possível quando souberem escutar não só a mim, mas a todas as coisas: a conversação que se trava ao redor de vocês, o diálogo que tem com a esposa, o marido, os filhos, o patrão, as conversas no trem, no ônibus, as falas do mendigo, a melodia de uma canção, o canto dos pássaros, o marulho das ondas. Se souberem escutar sem interpretação, sem tradução, haverá então a possibilidade de se realizar a revolução inconsciente. 

Acho que o que se faz mais necessário, nos dias atuais, é esta revolução — e não uma série de líderes, não um determinado sistema político. Porque todos os líderes falharam completamente; porque os sistemas que eles advogam, ou que criaram, são o produto da mente condicionada e seus resultados serão sempre condicionados — de modo que nunca mais sairemos da rede de problemas em que nos vemos embaraçados. Esse caminho não conduza à felicidade humana, à ação humana criadora, ao descobrimento do que é verdadeiro. 

O descobrimento do que é verdadeiro não se efetua por meio de esforço consciente. Se compreendermos isso verdadeiramente[...] chegaremos ao estado em que a mente reconhecerá a sua incapacidade de atender aos nossos problemas. Então talvez nos seja oferecida a possibilidade de descobrirmos uma nova fonte de ação, uma fonte diferente, cujo descobrimento nos habilitará a encontrar uma nova maneira de pensar, de sentir de viver, de existir. 

Nossos problemas não são individuais — porque não existe a entidade "indivíduo". O indivíduo — vocês — pode ter nome diferente, corpo diferente, viver numa casa separada; mas o conteúdo da mente de vocês é o mesmo conteúdo da minha mente. O que pensam eu penso; são ambiciosos, e eu também; o que são, eu sou, e o é o vizinho de vocês. Temos um problema coletivo e não um problema individual. Vocês, como indivíduo "condicionado" dentro de um certo sistema de ideias, não podem resolver este problema da existência; ele será resolvido quando vocês e eu o estudarmos juntos, e não separadamente. A ação coletiva só poderá vir a efeito, só poderá se realizar quando houver pensamento que não seja coletivo. Mas, como já sabemos, a ação coletiva implica atualmente pensamento coletivo; pensamento coletivo é pensamento "condicionado"; e é isso o que nos interessa, em virtude de toda espécie de propaganda, da educação, da compulsão, etc., etc. Os fazem pensar coletivamente, tradicionalmente — quer seja uma tradição nova, quer velha; fazem com que se ajustem, a pensarem segundo uma norma coletiva, esperando-se que desse modo produzirão ação coletiva; mas não é possível a ação coletiva, visto que pensamento coletivo é sempre pensamento condicionado

[...] Entretanto deve haver uma maneira de agir que não seja a de vocês ou a minha, que não seja a do comunista, do socialista, do católico, do cristão, do hinduísta, do budista; tal é a maneira de agir que resulta do descobrimento da Verdade. O descobrimento da Verdade não depende de vocês e de mim, da mente condicionada de vocês ou da minha mente condicionada. O descobrimento da Verdade ocorrerá apenas quando vocês e eu reconhecermos a nossa mente condicionada, o nosso estado condicionado. 

Se vocês e eu pudermos descobrir o que é a Verdade, desse descobrimento virá a ação coletiva. Mas o pensar coletivo não conduz à ação coletiva, e sim, somente, ao sofrimento em escala maior, como de fato está ocorrendo atualmente. Talvez possamos, porém, vocês e eu juntos, (porque nesse caso não sou eu quem está guiando, e não são vocês que estão seguindo) descobrir o processo do nosso próprio pensar. Eu não o posso mostrar para vocês, para o aceitarem ou rejeitarem, meramente; vocês é que tem que descobri-lo enquanto vamos andando juntos; vocês precisam observar o próprio estado mental, não só no nível consciente mas também inconscientemente, em todos os momentos do dia, nas suas relações, não só enquanto estão aqui a me ouvir, mas também depois de saírem daqui. 

Só pode nascer o sentimento de que o descobrimento da Verdade não é individual, que a Verdade não é coletiva nem individual, mas A VERDADE, depois de compreenderem todo o processo do pensar. O pensar é coletivo; não se pode pensar independentemente; não há pensar individual; o que pensam é pensamento coletivo, pois estão "condicionados"como hinduístas, cristãos ou muçulmanos; estão aprisionados no molde da tradição, que é pensamento coletivo. Podem estar condicionados dentro do molde, supostamente como indivíduos, mas o molde é coletivo; podem estar condicionados como comunista, todavia o condicionamento é coletivo. O "coletivo" não pode descobrir o que é verdadeiro, e nem o pode o indivíduo, porquanto não há pensamento individual, pois tudo é pensamento coletivo. 

[...] Em última análise, as palavras que estou empregando, os pensamentos que estou expressando, as tendências de nosso pensar, tudo é resultado de pensamento e ação coletiva; ainda que eu me considere um indivíduo distinto, atribuindo-me um nome, morando numa choça ou num palacete, meu funcionamento, meu "processo", é todo coletivo. Pode "o coletivo" encontrar o que é verdadeiro? O "coletivo" é a mente condicionada, a mente presa à tradição, à autoridade, a toda sorte de temor consciente ou inconsciente, a mente buscando sem cessar a segurança. Pode essa mente, que é a mente coletiva, achar a Verdade? A Verdade é aquilo que nunca se contaminou, que se não pode conceber, premeditar, ler nos livros, que não pode lhes ser dada por outrem. A única solução para os nossos problemas é o descobrimento do que é a Verdade.Esta é a única revolução capaz de nos influir radicalmente na existência, na nossa vida de cada dia, em nossas relações diárias. 

Uma vez que o descobrimento daquilo que é a Verdade é de vital significação e importância, não devemos[...] indagar com todo o interesse se a mente é capaz de se despojar de todo o seu condicionamento, para ter a possibilidade de descobrir o que é a Verdade? Esse descobrimento do que é a Verdade não se verifica por meio de esforço consciente. Acho muito importante se compreender que não se pode ir à Verdade. E a Verdade só pode nos vir imperceptivelmente, quando não a esperamos. Qualquer forma de expectativa, de esperança, é uma forma de "projeção" — projeção do "eu", sendo "eu" o coletivo. Por conseguinte, nosso problema é este: compreensão do conflito, da luta, da vida de cada dia, das nossas relações, nossas ambições, nossas paixões e desejos, nosso espírito de imitação, a medonha degradação que vai dentro de nós, a corrupção, a escuridão, a morte, que constantemente nos acompanha; e compreendido tudo isso, o descobrimento de algo existente além dos limites da mente. E esse estado só é realizável quando compreendermos o processo da nossa mente, e não quando procurarmos imaginar o que ele seja, ou lhe especular a respeito. Tão-somente ao compreendermos o processo do nosso pensar e vermos o quanto estão condicionadas as nossas mentes, só então há uma possibilidade de descobrir o que é a Verdade, a qual, só ela, pode nos libertar de nossos problemas. 

Jiddu Krishnamurti em, Autoconhecimento — Base da Sabedoria

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Só a Verdade pode nos libertar dos problemas

[...] Queremos ser amados, e, também, amar; desejamos possuir a capacidade de descobrir e compreender a Verdade — a Verdade não ouvida da boca de outrem, não achada num determinado livro. Queremos conhecer a Verdade, experimentar a Verdade diretamente, sem interpretação. 

Temos problemas incontáveis; o dia inteiro é cheio de problemas — que espécie de ação empreender, que profissão adotar, o desejo de preenchimento e ( por falta de compreensão dele) a cadeia sem fim de frustração. A fim de resolver estes problemas, apelamos em geral para alguém, para um livro, um sistema, um líder, um guru, ou para nossa experiência pessoal. Entretanto, se observarmos atentamente, o nosso desejo de achar uma solução por intermédio de alguém, de um guru, de um livro, de uma panaceia política, de um guia, verá que ele só nos leva à frustração. Não é isso o que acontece, na vida de quase todos nós?

[...] Vocês possuem livros religiosos, possuem guias e filósofos, observam numerosos rituais e, todavia, sempre estão acompanhados do temor, da frustração, da desesperança, da amargura, da ansiedade. Tal é o fado de todos nós!

E à medida em que vamos envelhecendo, com uma carga cada vez maior de experiências e desenganos, vemos que estamos perdendo a coisa mais essencial da nossa vida: a fé, não é exato? Entendo por "fé", não a mesma coisa que vocês estão acostumados a entender — a fé no líder, a fé no guru, e na experiência pessoal. Vocês podem não acreditar em coisa alguma, e fazem muito bem; porque, se não acreditam em nada, possuem uma possibilidade de descobrimento. Entretanto, o viver sem fé leva ao cinismo, ao ceticismo, a uma vida de gozos superficiais, e superficial beneficência. Se não nos tornamos cínicos, nos tornamos pessoas muito ativas e prestativas; mas aquela chama tão essencial ao pensar criador, é negada, sufocada. Creio ser essa coisa, essa chama, que nos cumpre encontrar, e não a solução para um problema qualquer, pois as soluções dos problemas são relativamente fáceis. 

Se são inteligentes, se possuem capacidade e energia, lhes é então relativamente simples estudar o problema. O estudo perfeito do problema representa, justamente, a sua solução, porquanto a solução não se acha fora do problema. Porém, para se estudar o problema, descobrir a verdade que ele encerra, para isso, necessita-se energia, vitalidade; e essa vitalidade, essa energia, são destruídas quando seguem alguém, quando obedecem ao guru, ao guia político, ou a um sistema econômico. Toda energia criadora de vocês se dissipou no seguirem alguma coisa, no disciplinarem suas mentes de acordo com um determinado padrão de ação. Se falha ou se morre o guia de vocês, se veem sós. 

Ora, é possível termos aquela fé criadora — se posso usar tal expressão — sem a identificarmos com um determinado padrão de pensamento? Não me refiro aqui à fé num guru, num livro, na experiência pessoal, mas àquela fé, àquela confiança que nasce do direto experimentar, por nós mesmos — prescindindo de tradições e mentores, compreendendo o problema diretamente, nos aplicando a ele com energia, com aquela extraordinária confiança, aquela capacidade de lhe descobrir a verdade intrínseca. Essa fé, sem dúvida é a verdadeira solução. Porque, sem ela, não somos entes humanos criadores. O que se faz necessário no mundo, hoje em dia, não são líderes, nem sistemas, nem gurus, mas, sim, a capacidade, por parte de cada indivíduo, para descobrir por si mesmo o que é a Verdade. 

A Verdade não é coisa de vocês ou  minha. A Verdade não é pessoal. É algo que surge quando a mente se acha muito lúcida, simples, direta, silenciosa. Só então surge a Verdade. Não podemos perseguir a Verdade. Tentamos persegui-la quando estamos dominados pela ânsia de solução para determinado problema. 

O que se necessita, pois, é a confiança, a fé imprescindível para o descobrimento da Verdade. Não podemos descobrir o que é a Verdade, se nossas mentes estão condicionadas. Infelizmente, a janela pela qual observamos a vida, está condicionada. Estamos condicionados como hinduístas, muçulmanos, cristãos ou budistas — isto é, estamos condicionados para pensar de uma determinada maneira. A conduta, o padrão de ação nos é inculcado desde a infância. E, por conseguinte, quando crescemos e começamos a experimentar, o fazemos através dessa cortina de condicionamentos; esta é uma óbvia consequência psicológica, quer nos agrade, quer não. 

Nunca somos livres para descobrir. Até agora abrigamos uma determinada forma de condicionamento — capitalista, ou socialista. Dizemos agora: "esta forma é insensata; nos tornemos comunistas". Se tornar comunista também é condicionamento. Por meio de um condicionamento, se pode resolver algum problema? Ao contrário, só se pode resolver um problema quando somos livres para meditar nele a fundo e experimentá-lo diretamente. E visto que estamos tão condicionados — religiosa, econômica, climaticamente, enfim, de todos os modos — não somos livres para olhar, observar, descobrir. Estamos agrilhoados, principalmente neste país; somos incapazes de pensar independentemente, livremente, por nós mesmos, sem ajuda dos guias, dos livros, dos líderes.[...] Tão inutilizadas estão as nossas mentes pela imitação, que somos incapazes de abandonar todos os livros e todos os guias, para refletirmos por nós mesmos sobre cada problema e descobrirmos a Verdade. 

[...] Nos achamos numa tremenda crise, quer reconheçamos, quer não. E, no meio desta crise, não podemos continuar seguindo um livro anacrônico ou um guia qualquer; temos de encontrar a Verdade no nosso próprio coração, e só a encontraremos se nossa mente estiver "descondicionada". Enquanto houver o condicionamento que nos faz buscar, seguir, ou criar ideologias e adorar ídolos; enquanto houver condicionamento da nossa mente, nos fazendo proceder como hinduístas, comunistas, socialistas, capitalistas, ou o que quer que seja, não encontraremos a Verdade contida em problema algum. Só quando vocês e eu descobrimos a Verdade, que não é pessoal, individual, haverá a possibilidade de se promover uma revolução que não seja uma revolução de ideias, mas a revolução da Verdade. Dela necessitamos nos tempos atuais. 

Importa igualmente descobrir qual é a relação de vocês para com a Realidade Criadora, ou como quiserem chamá-la — pois os nomes não têm importância. Essa Realidade Criadora nunca será encontrada, enquanto a mente de vocês estiver cristalizada, atulhada de ideias e palavras sem nenhuma significação. Não a encontrarão, não a descobrirão, se a mente de vocês não é capaz de se libertar do pensamento tradicional. 

A Verdade não é uma estrutura mental. A mente não pode perceber a Verdade. A Verdade não é produto da mente; ao contrário, enquanto a mente estiver em atividade, tentando imaginá-la, descobri-la, desenterrá-la, jamais a encontrará. Apenas a encontrará, quando houver a compreensão que liberta a mente e lhe dá a única possibilidade de profundo silêncio. É essencial uma mente silenciosa, uma mente tranquila, de uma tranquilidade que não é produzida por disciplina, coerção ou persuasão. Uma mente disciplinada não é uma mente livre; uma mente estreita, condicionada, é incapaz de compreender o que é a Verdade. A mente, porém, que compreende, que penetra, capaz de "experimentar" diretamente, na ação, nas relações, no viver de cada dia — essa mente é também capaz de descobrir a Verdade; e essa Verdade é que nos liberta dos problemas.

[...] Os problemas são criados pelo nosso pensar, nosso viver, nossas ações, e queremos achar uma solução fora dos nossos pensamentos, nossas atividades e relações de cada dia. Por isso estamos sempre à espera de alguém que nos diga o que devemos fazer. E como há sempre quem esteja muito disposto a nos dizer o que devemos fazer, a essas pessoas chamamos líderes, guias; consequentemente, no fim de nossa busca encontramos a busca, a frustração, a desesperança, a amargura; nossa vida foi toda desperdiçada; e começa a desintegração do nosso próprio ser. Assim, pois, só no estudo  do problema pode ser encontrada uma solução verdadeira.

Jiddu Krishnamurti em Autoconhecimento — Base da Sabedoria

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Por que é tão difícil a solução de nossos problemas?

Krishnamurti: Vocês têm uma terrível preocupação de resolver problemas, não é verdade? Eu não a tenho.  Sinto muito. Logo de início eu lhes disse que não me interessava resolver problemas, vem seus, nem meus. Não sou protetor de vocês ou guia. Vocês são o próprio instrutor e o próprio discípulo. Aqui estão para aprender, e não para perguntarem a outro o que devem e o que não fazer. Aqui não há nenhuma questão, sobre o que se deve fazer por um inválido, ou por alguém que não tem dinheiro suficiente, ou que é iletrado, etc, etc. Aqui estão para aprender de si mesmos a respeito dos problemas que possuem, e não para serem instruídos por mim. Portanto, não me coloquem nessa falsa posição, porque eu não quero lhes instruir. Se o fizesse, me tornaria um guia, um guru, e iria aumentar as muitas inutilidades já existentes no mundo com que se explora o próximo. Estamos aprendendo, não mediante estudo, porém pelo nos mantermos vigilantes, despertos, totalmente conscientes de nós mesmos; nossa relação, por conseguinte, é completamente diferente da relação de mestre e discípulo. Este orador não está lhes instruindo, nem lhes dizendo o que devem fazer — isso seria completa falta de maturidade.

(...) Não vou lhes dizer o que devem fazer em relação aos seus problemas. Vou lhes apontar como aprender, e o que é aprender; e verão então que, quando aprendem a respeito de um problema, o problema termina. Mas se apelam para alguém, lhe pedindo que diga o que devem fazer a respeito de um problema, vocês se tornam como uma criança irresponsável, cujos passos são guiados por outro, e terão mais problemas ainda. isto é verdadeiro e simples, e, assim sendo, peço-lhes de uma vez por todas que o acolham na mente e no coração de vocês. Aqui estamos para aprender e não para sermos instruídos. Ser instruído é confiar à memória o que se ouve de outro; mas a mera repetição, de memória, não traz a solução de problemas. Só há maturidade no movimento do aprender. O uso do conhecimento, daquilo que foi aprendido meramente de memória, como meio de resolver os problemas humanos, procede de falta de maturidade, e só pode criar mais padrões, mais problemas. 

O simples desejo de resolver um problema é uma fuga aos problemas, não acham? Não penetrei o problema, não o estudei, não o explorei, não o compreendi. Não conheço a beleza, ou a feiura, ou a profundidade do problema; minha única preocupação é resolvê-lo, afastá-lo de mim. Esta ansiedade de resolver um problema, sem o ter compreendido, é uma fuga ao problema; por conseguinte, torna-se mais um problema. Toda fuga gera novos problemas.

Pois bem, tenho um problema que desejo compreender completamente. Não desejo fugir dele, não desejo "verbalizar" a respeito dele, não desejo falar para outro sobre ele; só quero compreende-lo. Não estou esperando que ninguém me diga o que fazer. Sei que ninguém pode me dizer o que devo fazer; e que, se alguém o fizesse e eu aceitasse sua instrução, isso constituiria  um ato muito fútil e absurdo. Assim, tenho de aprender sem ser instruído e sem fazer uso da lembrança do que aprendi a respeito de anteriores problemas, para atender o problema presente. Oh, não percebem a beleza disso!

(...) Tenho um problema, e desejo compreende-lo, aprender a respeito dele. Para aprender a respeito dele, não posso trazer as lembranças do passado e, com ajuda delas, ocupar-me com o problema; porque o problema novo exige uma maneira nova de estudá-lo, e não posso aplicar-me a ele com minhas lembranças mortas, estúpidas. O problema é ativo, e portanto, tenho de ocupar-me dele no presente ativo; por conseguinte, o elemento tempo deve ser afastado totalmente.

Desejo descobrir como surgem os problemas — os problemas psicológicos. Como disse, se compreendo toda a estrutura causadora dos problemas e fico, por conseguinte, livre de por mim mesmo criar problemas, saberei então como agir em relação ao dinheiro, ao sexo, ao ódio, em relação a tudo na vida; e, no lidar com essas coisas, não irei criando novos problemas. Tenho assim, de descobrir de que modo surge o problema psicológico, e não a maneira de resolvê-lo. Entendem? Ninguém pode me dizer como surge o problema; eu mesmo devo compreender isso.

(...) Para mim, como disse, a liberdade é da mais alta importância. Mas a liberdade de modo nenhum pode ser compreendida, se não há inteligência; e a inteligência só pode vir quando temos completamente compreendido, por nós mesmos, as causas dos problemas. A mente deve estar alertada, atenta, num estado de super-sensibilidade, de modo que cada problema seja resolvido assim que se apresenta para nós. De outro modo, não há verdadeira liberdade; só há uma liberdade periférica, fragmentária, sem nenhum valor. Isso é o mesmo que um homem rico dizer que é livre. Santo Deus! Ele é um escravo da bebida, do sexo, do conforto, de dúzias de coisas. E o homem pobre que diz: "Sou livre, porque não tenho dinheiro" — esse tem outros problemas. A liberdade, pois, e a manutenção dessa liberdade, não pode ser uma mera abstração: ele deve constituir para vocês, como ente humano, uma necessidade absoluta, porque é só quando existe a liberdade, que podem amar. Como podem amar se são gananciosos, ambiciosos, competidores?

(...) Eu não tenho interesse em resolver o problema ou em procurar alguém que me diga como resolvê-lo. Nenhum livro, nenhum guia, nenhuma igreja, nenhum sacerdote o podem me dizer. Há milênios que nos entretemos com essas coisas, e continuamos carregados de problemas. O frequentar uma igreja, a confissão, a oração — nada disso resolverá nossos problemas, que apenas continuam a se multiplicar, como atualmente está acontecendo. Assim, pois, como surge um problema?

Como disse, quando não há contradição dentro de nós mesmos, não há problema algum. A auto-contradição implica conflito do desejo. Mas o desejo em si nunca é contraditório. Por certo, o que cria a contradição são os objetos do desejo. Porque pinto quadros, ou escrevo livros, ou por qualquer coisa estúpida que faço, desejo ser famoso, aplaudido. Quando ninguém me reconhece os méritos, há uma contradição e fico em estado lastimoso. tenho medo da morte, que não compreendi; e nisso a que chamo "amor", há contradição. Vejo, pois, que o desejo é o começo da contradição — não o desejo em si, mas os objetos do desejo são contraditórios. Se tento mudar ou negar os objetos do desejo, dizendo que me aterei a uma só coisa e a nada mais, essa coisa, por sua vez, se torna também um problema, porque tenho de resistir, erguer barreiras a tudo o mais. Assim, o que devo fazer, não é meramente mudar ou reduzir os objetos de meu desejo, porém compreender o desejo em si. 

Krishnamurti em, A MENTE SEM MEDO - 14 de julho de 1964


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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill