(...)Ele percebeu claramente que a religião de seus patrícios não apresentava condições satisfatórias e pareceu-lhe ter chegado o momento de lhe introduzir grandes reformas, ou melhor, uma renovação total.
Foi-nos contado que ele se afastou, gradualmente da companhia dos seus familiares e buscou a solidão de uma caverna no Monte Hara (mais ou menos três léguas de Meca), onde, à semelhança dos anacoretas cristãos no deserto, permaneceria por três dias e noites, mergulhado em orações e meditação... Tornou-se suscetível de ter visões, êxtases e transes... Por fim, segundo o relato, o que lhe havia aparecido em sonhos tornou-se visível sob a forma de um anjo, cuja aparição lhe trazia uma mensagem divina.
Essa forma de revelação lhe ocorreu aos 40 anos... Estava ele instalado, como de hábito, no mês do Ramadan, na caverna do Monte Hara, jejuando, orando e meditando, para elevar seus pensamentos à contemplação da VERDADE divina... Enquanto Maomé, no silêncio da noite, se aquecia envolto em seu manto, ouviu uma voz que o chamava. Descobrindo a cabeça, viu-se envolvido por uma ONDA DE LUZ de tal esplendor, que lhe era intolerável. Recobrando o domínio, percebeu um anjo, sob forma humana, que se aproximando, desdobrou diante dele um pano de seda, onde certos caracteres estavam escritos. "Leia", disse-lhe o anjo. "Não sei ler!", replicou-lhe Maomé. "Leia", repetiu o anjo, "em nome do Senhor, que criou todas as coisas, que criou o homem a partir de uma pinta de sangue. Leia em nome do MAIS ALTO, que ensinou o homem o uso da pena, que derramou em sua alma o desejo de conhecimento e lhe ensinou o que ele antes ignorava".
Logo após Maomé sentiu que SUA MENTE SE ABRIA, iluminada pela luz celestial, e leu o que estava escrito no pano, que continha o decreto de Deus, tal como depois foi promulgado no Corão. Quando ele terminou, o mensageiro celestial anunciou: "Maomé, em verdade és o profeta de Deus! E eu sou o seu Anjo Gabriel!"
O relato diz-nos que Maomé regressou trêmulo à Cadijah, pela manhã, sem saber se o que tinha visto e ouvido era realmente verdade, e se ele era o profeta escolhido para realizar a reforma que por tanto tempo havia sido objeto de suas meditações, ou se tudo não passava de uma visão, de uma deturpação dos sentidos, ou, pior ainda, da aparição de um espírito do mal.
Vida de Maomé, por Washington Irving