Enquanto não começarmos a investigar esse processo a que chamamos mente, enquanto não nos familiarizarmos com nosso modo de pensar e o compreendermos, não poderemos descobrir o que é o amor. Não pode haver amor enquanto nossas mentes desejarem certas coisas do amor ou exigirem que ele atue de determinada forma. Quando imaginamos o que deve ser o amor e lhe damos certos motivos, criamos gradativamente um padrão de ação com relação ao amor; mas isso não é amor, é meramente nossa ideia do que deve ser amor.
Digamos, por exemplo, que eu tenha minha esposa ou marido, como vocês tem um sari ou um casaco. Se alguém lhes tomar o casaco, vocês ficarão ansiosos, irritados, encolerizados. Por quê? Porque consideram esse casaco propriedade sua; vocês o possuem, e através de sua posse vocês se sentem enriquecidos, não é? Mediante a posse de muitas roupas vocês se sentem enriquecidos, não só fisicamente, mas também interiormente; e quando alguém lhes leva o casaco, vocês ficam irritados porque interiormente estão sendo privados daquela sensação de riqueza, daquela sensação de posse.
Ora, a sensação de posse cria uma barreira com relação ao amor, não é mesmo? Se eu tenho alguém, se o possuo, será isso amor? Eu o possuo como quem possui um carro, um casaco, um sari, porque na posse de alguém, essa dependência emocional a outrem, é o que chamamos amor; mas se examinarem isto, verificarão que, por trás da palavra "amor", a mente está tendo satisfação na propriedade. Afinal, quando possuímos muitos saris bonitos, ou um belo carro, ou uma grande casa, a sensação de que isto tudo são coisas nossas nos dá interiormente grande satisfação.
Por isso, ao desejar, a mente cria um padrão e fica presa nesse padrão; e então fica cansada, entorpecida, estúpida, alheada. A mente é o centro dessa sensação de posse, a sensação de "eu" e de "meu": "Eu possuo alguma coisa", "sou um grande homem", "sou um desprezível", "sou insultado", "sou lisonjeado", "sou esperto", "sou muito bonita", "quero ser alguém", "sou filho ou filha de alguém". Essa sensação de "eu"e de "meu" é o próprio centro da mente, é a própria mente. Quanto mais a mente tiver essa sensação de ser alguém, de ser grande ou muito esperta, ou muito estúpida, e assim por diante, tanto mais construirá paredes em torno de si mesma e se encerrará, entorpecendo-se. Então ela sofre, pois nesse encerramento inevitavelmente há dor. E, porque sofre, a mente diz: "O que devo fazer?" Mas em lugar de derrubar as paredes que a sufocam por meio da consciência, da reflexão cuidadosa, do exame detido e profundo da compreensão de todo o processo por meio do qual elas são edificadas, a mente luta para encontrar alguma coisa externa com que encerrar-se novamente. Assim, a mente se torna aos poucos uma barreira para o amor; e sem compreender o que é a mente, o que seja entender os processos de nosso próprio pensar, a fonte interna da ação, não poderemos descobrir o que é amor.
(...) Não é a mente também um instrumento de comparação?(...) Enquanto a mente estiver comparando não haverá amor; e ela está sempre comparando, ponderando, julgando, não é mesmo? está sempre buscando encontrar fraquezas; logo, não há amor. Quando pai e mãe amam os filhos, eles não comparam um filho com outro. Mas vocês se comparam com alguém melhor, mais nobre, mais rico; estão sempre preocupados consigo mesmos em relação a alguma outra pessoa e, assim, criam em si próprios uma ausência de amor. Desse modo, a mente se torna cada vez mais comparadora, mais e mais possessiva, mais e mais dependente, estabelecendo assim um padrão em que se vê presa. Porque é incapaz de contemplar seja o que for como uma novidade, como uma coisa realmente nova, ela destrói o próprio perfume da vida, que é o amor.
Krishnamurti em, O VERDADEIRO OBJETIVO DA VIDA