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sábado, 31 de março de 2018

Existe um estado cerebral que seja holístico?


Existe um estado cerebral que seja holístico?

O mundo está em crise, que não é meramente econômica, mas sim psicológica. Temos vivido na Terra por milhões de anos e, neste longo período, sofremos todos os tipos de catástrofes e guerras. Desapareceram civilizações inteiras e também aquelas culturas que moldaram o comportamento dos seres humanos. Houveram grandes líderes, tanto políticos como religiosos, com todos os seus enganos para os seres humanos. E depois dessa enorme evolução do cérebro humano, somos o que sempre fomos: primitivos, bárbaros, cruéis, e nos preparamos para a guerra. Hoje em dia, cada nação armamento de loja E os seres humanos ainda estão presos nessa roda do tempo. Nós não mudamos muito; ainda somos bárbaros, com todos os tipos de crenças e superstições. Mas afinal, onde estamos?

[...]Então perguntamos: mudaremos com o tempo? Ou seja, ao longo do tempo, em cinquenta mil ou um milhão de anos, mudará a mente humana, o cérebro humano? O tempo não tem nenhuma importância? Vamos falar sobre todas essas coisas.

Os seres humanos estão psicologicamente feridos. Em todo o mundo, os homens sofrem de um enorme sofrimento, dor, tristeza, solidão e desespero. Sem dúvida, o cérebro criou as coisas mais maravilhosas, tanto ideológica, como tecnológica e religiosamente. O cérebro tem uma capacidade extraordinária; mas esta é muito limitada. Tecnologicamente nós avançamos em alta velocidade; no entanto, psicologicamente, internamente, somos muito primitivos, bárbaros, cruéis, irrefletidos, insensíveis e indiferentes com o que acontece. Não apenas somos indiferentes à corrupção que se estende no campo ecológico, mas também para com a que existe em nome da religião, da política, dos negócios, etc. A corrupção não consiste apenas em passar dinheiro por debaixo da mesa ou contrabandear mercadorias no país, mas começa onde existe interesse próprio, que é a origem da corrupção.

[...] Nós usamos nossa energia, nossa capacidade, nossa compreensão intelectual em uma única direção, na tecnológica. No entanto, nunca entendemos o comportamento humano ou por que somos o que somos depois deste longo período de evolução... Nós ganhamos muito dinheiro, conseguimos ter casas grandes, carros, etc., mas psicologicamente, internamente, no subjetivo, estamos praticamente paralisados, porque dependemos dos outros para nos dizer o que devemos fazer ou pensar.

[...] Devemos investigar o seguinte: nossa relação com o mundo, que se torna mais e mais complexo; nossa relação uns com os outros, por mais íntima que seja; nossa relação com um ideal; nosso relacionamento com o nosso guru, e com o que chamamos Deus. Temos que investigar seria e profusamente essa qualidade do cérebro que compreende ou tem uma percepção direta sobre o mundo externo e todo nosso mundo interno. Deve ficar claro que nós não tentamos indicar um caminho, um método, um sistema ou de nenhuma maneira tentamos ajudá-lo. Pelo contrário, nós somos seres humanos independentes, isso não é uma afirmação cruel ou indiferente. Pelo contrário, somos como dois amigos que falam sobre essas coisas juntos, tentando entender o mundo: o meio ambiente, todas as complexidades da economia e a divisão de religiões e nações. Amizade significa que não tentamos persuadir, nos impor, nem impressionar um ao outro. Somos amigos e, portanto, há uma certa qualidade de afeto, de compreensão, de intercâmbio. Estamos nessa posição.

Assim, começamos primeiro por ver o que é o cérebro. Quem lhes fala não é um especialista do cérebro, mas tem falado com diferentes pessoas que o são. O cérebro, localizado no interior do crânio, é um extraordinário instrumento. Acumulou um enorme conhecimento de quase tudo, inventou as coisas mais incríveis, como os computadores, os velozes meios de comunicação e os instrumentos de guerra. Nesse campo, o cérebro tem liberdade absoluta para inquirir, para inventar e para investigar. Começa com o conhecimento, e acumula mais e mais saber. Se certa teoria não funciona, a descarta. Sem dúvida, o cérebro não é tão livre na hora de investigar o “eu”; está condicionado, moldado, programado para ser hindu, muçulmano, cristão, budista, etc. Como um computador, o cérebro humano está programado: que as guerras são necessárias, que temos de pertencer a certo grupo, que nossas raízes são parte do mundo, etc. E isso é verdade, não é um exagero. Todos estamos programados pela tradição, pela constante repetição dos jornais e revistas, por milhões de anos de pressão. O cérebro tem liberdade em uma direção: o mundo da tecnologia; mas este mesmo cérebro, que é enormemente capaz, se vê limitado por seu próprio interesse. Nosso cérebro, que é completamente livre em uma direção, no psicológico está atrofiado.

É possível que o cérebro humano seja totalmente livre para ter uma enorme energia? Não para fazer travessuras, não para ter mai poder e dinheiro (ainda que se deva ter um pouco de dinheiro), senão para inquirir, para descobrir uma maneira de viver livre do medo, do sentimento de solidão, do sofrimento, e para se perguntar pela natureza da morte, da meditação e da verdade. É possível que o cérebro humano, que foi condicionado durante milhões de anos, seja totalmente livre? Ou os seres humanos estão condenados a serem escravos e a nunca conhecerem o que é a liberdade? Não se trata de uma liberdade abstrata, senão da liberdade do conflito, porque vivemos nele. Um fator comum em todos os seres humanos, desde que nascem até que morrem, é essa luta constante, essa busca de segurança, por isso nunca a encontram, e ao se sentirem inseguros buscam por segurança. Assim, é possível que os seres humanos neste mundo moderno, com todas as suas complexidades, vivam sem sombra de conflito? Porque o conflito adultera o cérebro, reduz sua capacidade, sua energia e, portanto, logo se esgota. À medida que você envelhece, pode observar em si mesmo esse conflito permanente.

O que é o conflito? Por favor, não esperem que eu responda; isso não tem nenhuma graça. Faça-se essa pergunta, exercite sua mente para descobrir qual é a natureza do conflito. É evidente que onde há dualidade há conflito: “eu” e “você”, minha esposa e eu, a divisão entre o meditador e a meditação. Enquanto existir divisões entre nacionalidades, entre religiões, entre pessoas, entre o ideal e o fato, entre “o que é” e “o que deveria ser”, haverá conflito. Essa é a lei. Sempre que haja divisão, a que existe entre o árabe e o judeu, entre o hindu e o muçulmano, entre pai e filho, etc., haverá conflito. Isso é um fato. Essa divisão também é o “mais”: “Não sei, mas se me derem uns anos a mais, saberei”. Espero que entendam isto.

Quem cria essa divisão entre “o que é” e “o que devera ser”? Existe uma divisão entre o que chamo Deus, sempre que essa entidade exista, e eu mesmo; há uma divisão entre querer paz e estar em conflito. Essa é a verdadeira realidade de nossa vida cotidiana. Por isso quem lhes fala, pergunta, do mesmo modo que vocês deveriam fazê-lo: quem cria essa divisão, não só no externo senão também internamente? Por favor, façam-se essa pergunta. Quem é o responsável dessa confusão, dessa interminável luta, dor, solidão, desespero, e dessa sensação de sofrimento da qual, segundo parece, o ser humano nunca pode escapar? Quem é o responsável por tudo isso? Quem é o responsável por essa sociedade na qual vivemos? Neste país há uma enorme pobreza. Entendem tudo isso ou nunca haviam pensado nisso? Ou estão tão ocupados com sua própria meditação, com seus deuses, com suas metas, com seus problemas, que nunca pensaram nisso, que nunca o haviam questionado?

Há várias coisas implicadas nisso. Aqueles que são bastante inteligentes, conscientes e sensíveis, sempre buscaram por uma sociedade igualitária. Têm-se perguntado: pode haver igualdade de oportunidades, é possível eliminar as diferenças de classes de modo que não haja divisão entre o trabalhador e o diretor, entre o carpinteiro e o político? E nós queremos saber: há justiça no mundo? Houve diversas revoluções, como a francesa e a russa, que tentaram estabelecer uma sociedade onde houvesse igualdade, justiça e bondade. Mas não tiveram sucesso; ao contrário, de diferentes modos regressaram ao velho modelo. Assim, têm que se investigar não só por que os seres humanos vivem em constante conflito e sofrimento e por que buscam segurança, senão também a natureza da justiça. Existe realmente justiça neste mundo? Existe? Você é inteligente e o outro não é. Você goza de todos os privilégios e o outro não tem nenhum. Você vive numa enorme casa e o outro em uma cabana com apenas uma comida por dia. Logo, há realmente justiça? Não é importante descobrir por si mesmo e, portanto, ajudar a humanidade? [Sinto muito, não quis dizer “ajudar”; retiro essa palavra]. Para compreender e descobrir s na realidade existe a natureza da justiça, devemos investigar com grande afinco a natureza do sofrimento, e se de verdade é possível eliminar o auto interesse. Também devemos investigar o que é a liberdade e o que é a bondade.

Cada ser humano tem criado essa sociedade na qual vivemos, com sua cobiça, sua inveja, sua agressividade e sua busca de segurança. Nós temos criado a sociedade em que vivemos, para logo nos convertermos em escravos dessa sociedade. Entendem tudo isto? A partir do medo do ser humano, do sentimento de solidão e da busca da segurança (sem nunca entender o que é a insegurança e buscar sempre a segurança) temos criado a nossa cultura, nossa sociedade, nossas religiões e nossos deuses. Assim, pois, voltamos ao princípio. Quem estabeleceu essa divisão? Porque a divisão e o conflito existem. Isso é uma verdade absoluta. Pense nisso, senhor. Não foi o pensamento o que tem dividido o mundo em cristãos, budistas, judeus, árabes, hindus e muçulmanos? Tem sido o pensamento?

Em consequência, perguntamos: o que é o pensamento? Vivemos através da ação do pensamento. Trata-se do fator central de nossas ações. Não é certo? Por meio do pensamento ganhamos dinheiro, o pensamento me separa de você, separa o esposa da esposa, o ideal de “o que é”. Mas, o que é o pensamento? O que é pensar? Pensar não é uma atividade da memória? Por favor, senhores, não aceitem nada do que diz este que lhes fala. Devem incorporar o benefício da dúvida e questionar suas próprias experiências, suas próprias ideias. Quem lhes fala diz, como um amigo, a quem pode lhe escutar, e isso depende de vocês, que o pensamento tem criado essa divisão. O pensamento é o responsável pelas guerras e todos os deuses que o homem tem inventado. O pensamento é quem levou o homem até a Lua, criou o computador e todos estes instrumentos extraordinários do mundo tecnológico. E o pensamento também é o responsável pela divisão e o conflito entre “o que é” e “o que deveria ser”. Este último é um ideal; é algo que se deve alcançar, algo que tem que se conquistar, porém também é afastar-se de “o que é”. Por exemplo, os seres humanos são violentos. E isto se trata de um fato óbvio. Inclusive depois de um longo período de tempo, o homem não está livre da violência. Mas inventou a não violência. Não só a criou, senão que também a busca. Sem dúvida, se realmente é honesto, deve reconhecer que é violento. Ao buscar isso a que chama “não violência”, semeia sem cessar a semente da violência. Isso é algo evidente, é um fato.

Neste país se fala muito de não violência, o qual é vergonhoso, porque todos somos violentos. A violência não é só física; também se pode considerar violência a imitação, o conformismo, o afastar-se de “o que é”, de modo que a violência só pode ser eliminada completamente da mente humana, do coração humano, quando não há um oposto. O oposto é a não violência, o qual não é algo real, senão que não é nada mais do que uma fuga da violência. Se você não escapa, então só existe violência. Mas não somos capazes de enfrentar esse fato. Sempre escapamos do fato, buscamos desculpas, razões econômicas, inumeráveis métodos para superá-la, mas a violência permanece aí, e o mesmo fato de tratar de superá-la é parte da violência.

Para enfrentar a violência, é necessário prestar-lhe atenção e não escapar dela. Deve ver o que é, ver a violência que há entre homem e mulher, tanto de gênero com de outras formas. Não há violência quando se busca mais e mais, e se tenta “chegar a ser” mais e mais? Trate de ver a violência e permanecer com ela; não fuja, não tente reprimi-la, nem transcendê-la, já que tudo isso implica conflito. Viva com ela, observe-a; de fato, valorize-a, e não a traduza a partir de seus deuses, seus agrados ou desagrados. Tão só veja-a e observe-a com enorme atenção. Se presta atenção completa a algo, é como acender uma luz brilhante, e então verá todas as qualidades, as sutilezas, as implicações, verá todo o mundo da violência. Quando se vê algo com muita clareza, esse algo desaparece. Mas nos recusamos a ver as coisas desse modo.

Agora, perguntamos: quem tem criado o conflito entre os seres humanos, com o meio ambiente, com os deuses, com tudo? Alguma vez e perguntaram por que se consideram indivíduos? O são realmente? Ou têm sido programados para acreditarem que o são? Sua consciência é igual a do resto dos seres humanos: sofrem, se sentem sós, têm medo, buscam o prazer e evitam a dor. Isso mesmo ocorre com cada ser humano deste mundo, o que é um fato psicológico. Pode ser que você seja mais alto, mais moreno, mais ruivo, mas tudo isso são ornamentos externos, como o clima, a comida, etc. E a cultura também é algo externo. Não obstante, no psicológico, no subjetivo, nossa consciência é comum ao resto dos seres humanos. Pode ser que você não goste disto, mas é um fato. De modo que, psicologicamente, você não é diferente do resto da humanidade. Você é a humanidade. Não diga: “Sim”; não tem nenhum sentido só aceitá-lo como uma ideia. É um fato irrefutável que você é o resto da humanidade, e não alguém diferente. Talvez tenha um cérebro melhor, mais riquezas, mais astúcia e melhores livros; mas deixe tudo isso de lado porque são coisas superficiais, são adornos. No interior, cada ser humano deste mundo compartilha o sofrimento com você. Você percebe o que isso significa? Significa que quando diz que é o resto da humanidade, tem uma enorme responsabilidade. Significa que tem um enorme afeto, amor e compaixão, e ao essa ideia estúpida de que “todos somos um”.

Devemos investigar o que é pensar e por que se tornou tão importante. Sem a memória é impossível pensar. Se não tivéssemos memória não poderíamos pensar. Nossos cérebros (que são iguais aos do resto da humanidade, e não são pequenos cérebros independentes) estão condicionados pelo conhecimento, pela memória. E ambos se baseiam na experiência, tanto do mundo científico como do mundo subjetivo. Nossas experiências, por mais sutis, por mais espirituais e por mais pessoais que sejam, sempre são limitadas. Por isso nosso conhecimento, que é o resultado da experiência, também é limitado. Podemos somar mais e mais conhecimento, mas por mais que acrescentemos, o que acumulamos é limitado. Estamos dizendo que a experiência ao ser limitada, o conhecimento também o é, seja este do passado, do presente ou do futuro.

Conhecimento significa memória, a qual se guarda no computador ou no cérebro. Assim, o cérebro é memória. E esta dirige o pensamento, o que é um fato. Daí que o pensamento sempre é limitado. Estão de acordo? É lógico, racional, não é algo inventado; é assim. A experiência é limitada; por conseguinte, o conhecimento também é.

Continuando, perguntamos: existe outra atividade que não seja divida, que não esteja fragmentada, que não seja separada? Existe uma atividade holística que nunca seja dividida, como o “você” e o “eu”? A divisão é o que cria o conflito. Agora, como você descobrirá, por si mesmo, quer dizer, ver que o pensamento divide, que cria conflito, que forma uma sociedade e logo se separa dela? O pensamento é o único instrumento que temos tido até agora. Você pode dizer que há outro instrumento que é a intuição. Mas pode ser irracional; é possível inventar algo e viver nessa ilusão.

Com toda seriedade perguntamos (se você compreendeu a natureza do pensamento e se existe outra ação ou forma de viver que não seja fragmentada, separada como o mundo e eu, ou eu e o mundo): existe esse estado do cérebro, ou esse estado do não cérebro, que seja totalmente holístico, completo?

Se são sérios, se são livres, o descobrirão. Têm que se libertar de tudo o que têm acumulado, mas não fisicamente (por favor, não cancelem sua conta bancária, ainda que de todos os modos não o farão), senão tratem de eliminar toda acumulação psicológica. Isto se mostra muito difícil; significa que devem ser livres. Como sabem, etimologicamente a palavra liberdade também significa “amor”. Quando há liberdade, nenhuma limitação e essa enorme profundidade, também há amor. Para descobri-lo, e para que apareça essa forma de vida holística, livre de interesse próprio, você deve estar livre de atrito e conflito na relação.

Vivemos em relação. Podemos viver no Himalaia, num mosteiro, numa pequena cabana ou num palácio, mas não é possível viver sem se relacionar. Relacionar-se significar “estar relacionado”, “estar em contato com”, não só física e sexualmente, senão também estar em total contato com o outro. Não obstante, nunca estamos deste modo com o outro. Inclusive na relação mais íntima, home-mulher, cada um persegue suas ambições pessoais, suas próprias realizações, sua forma de viver oposta à do outro, do mesmo modo que duas linhas paralelas que nunca se encontram. Nesse tipo de relação, sempre existe algum conflito. Enfrentem esse fato.

Mas, o que é que cria o conflito entre dois seres humanos? Em sua relação com sua esposa, com seu esposo ou com seus filhos (que é a relação mais íntima), o que é que cria o conflito? Façam-se essa pergunta, senhores. Não se deve ao fato de terem uma imagem de sua esposa e ela ter uma imagem de você? Essa imagem que se construiu com muito, muito cuidado, seja num período curto ou muito longo, esse registrar constante no cérebro da relação com o outro, cria a imagem de sua esposa ou esposo; e essa imagem é a que divide. Em especial, quando se vive na mesma casa com todo esse caos, então foge-se tornando-se monge ou o que quer que seja. Mas ali também tem seus próprios problemas, seus próprios desejos, suas próprias buscas, que novamente se convertem em conflito.

Podemos viver sem nenhuma imagem do outro, realmente sem nenhuma imagem? Alguma vez já tentaram isso? Observem a lógica, o sentido comum: enquanto funciona o maquinário que cria as imagens, que registra insultos ou elogios, isso cria uma imagem do outro, e a imagem é o fator que cria divisão. Logo, é possível viver sem nenhuma imagem? Nesse momento descobrirá o que é a verdadeira relação, porque não haverá nenhum conflito nela, o que é totalmente necessário se se quer compreender a limitação do pensamento e investigar uma holística maneira de viver, livre de qualquer fragmentação.

Outro fator se deve a que, desde a infância, temos sido educados para que tenhamos problemas em nossas vidas. Quando somos enviados à escola, temos que aprender a ler, a escrever, etc. Aprender a escrever constitui um problema para o menino. Por favor, sigam isto com determinação. A matemática, a história, a química se convertem num problema, de modo que, desde a infância, se educa ao menino para que viva com problemas, seja o problema de Deus, ou muitíssimo mais. Por isso, nossos cérebros estão condicionados, educados, acostumados a viver com problemas, pois que desde a infância o fazemos. O que ocorre quando educamos o cérebro com problemas? Nunca os resolve, só gera outros. Quando um cérebro está treinado para ter problemas, para viver com eles, ao tratar de solucioná-los, nesse mesmo ato de solucioná-los, cria outro problema. Desde a infância temos sido treinados e educados para viver com problemas, portanto, ao estar assentados neles, nunca os solucionamos totalmente. Só um cérebro livre, que não está condicionado para ter problemas, pode solucioná-los. Ter problemas continuamente é uma de nossas marcas porque, em consequência, nossos cérebros nunca estão calmos, livres para observar, para olhar.

Por esta razão, perguntamos: é possível não ter nenhum problema e enfrentá-los? Sem dúvida, para compreendê-los e resolvê-los completamente, o cérebro deve estar livre. Observe a lógica. A lógica, junto com a razão, são necessárias. Só então se pode ir mais além da lógica e da razão. Mas se você não é lógico, se não avança passo a passo, sempre se enganará e terminará vivendo em algum tipo de ilusão. Descobrir uma maneira de viver que permita enfrentar os problemas, resolvê-los e não cair preso neles, requer uma enorme observação e atenção, perceber-se e assegurar-se de que nunca, nem por um segundo, se engana a si mesmo.

Primeiro deve haver ordem. E esta só surge quando não há problemas, quando há liberdade, mas não a liberdade para fazer o que se quer, porque isso não é liberdade em absoluto. Escolher este guru ou aquele outro, este livro ou aquele, não é mais que outra forma de confusão. Onde há escolha, não há liberdade. Você só escolhe quando o cérebro está confuso. Quando o cérebro tem clareza, então não há lugar para escolha, já que só existe percepção direta e ação correta.

Krishnamurti, 2 de fevereiro de 1985
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quinta-feira, 29 de março de 2018

Há uma atividade cerebral que está além do pensamento?


Há uma atividade cerebral
que está além do pensamento?


DB: Acho que agora devemos descobrir se existe alguma atividade cerebral que está mais além do pensamento, você não acha? Porque se poderia perguntar, por exemplo, se a percepção faz parte das funções cerebrais.

K: Enquanto não houver uma percepção livre de escolha..., percebo e nessa percepção eu escolho.

DB: Sim, o que pode não estar totalmente claro é o que há de errado em escolher, entende?

K: A escolha implica confusão.

DB: Mas a palavra em si não indica isso explicitamente. Olhe...

K: Em última análise, sempre escolhemos entre duas coisas.

DB: A escolha pode ser entre comprar um objeto ou outro.

K: Sim, eu posso escolher entre esta mesa e aquela.

DB: Quando eu compro uma mesa eu escolho a cor.

K: Ou a mesa que é melhor.

DB: Aparentemente, não há confusão nisso. Eu não vejo porque escolher a cor que eu quero implicaria em confusão.

K: Essa escolha não implica confusão, não significa um problema.

DB: A confusão, eu diria, existe quando a escolha se aplica à psique.

K: Exatamente, isso é tudo.

DB: Tendemos a... Você sabe, a linguagem nos confunde facilmente.

K: Falamos sobre a psique que escolhe.

DB: Que na realidade escolhe para se tornar algo.

K: Sim, escolhe se tornar algo e escolhe quando existe confusão.

DB: Você quer dizer que, por causa da sua confusão, a mente escolhe, não é isso? E consciente de quem está confusa, tenta chegar a um estado melhor.

K: E a escolha implica dualidade.

DB: Sim, mas agora, à primeira vista, você diria que você introduziu outra dualidade: entre a mente e o cérebro.

K: Não, isso não é uma dualidade.

DB: É importante esclarecer isso.

K: Não há dualidade nisso.

DB: Qual é a diferença?

K: Bem, vamos dar um exemplo muito simples. Os seres humanos são violentos e por causa desse pensamento projetaram a não-violência, criando assim uma dualidade: o fato e o não-fato.

DB: Ou seja, essa dualidade existe entre um fato e algo que é uma mera projeção da mente.

K: O ideal e o fato.

DB: O ideal não é real, e o fato sim.

K: Efetivamente. O ideal não é factual.

DB: Exatamente: não é factual. Mas, por que você chama essa divisão entre ambos de dualidade?

K: Porque eles estão divididos.

DB: Bem, pelo menos eles parecem estar.

K: Eles estão divididos e todos nos debatemos entre eles, entre, digamos, os ideais totalitários comunistas e os ideais democráticos, ambos produto do pensamento, que é limitado, o qual gera uma terrível confusão no mundo.

DB: Sim, está claro que uma divisão foi criada; mas o aspecto importante disso, o que queríamos investigar, eu acho, é se dividimos algo que é indivisível: a psique.

K: Isso mesmo. Você não pode dividir a violência e a chamar a uma parte de não-violência.

DB: Certo. E você não pode dividir a psique em violência e não-violência, não é assim?
K: É o que "é".

DB: É o que é; de modo que se é violento, não pode ser dividido em uma parte violenta e outra não violenta.

K: Exatamente. Está muito claro! Portanto, podemos ficar com o que "é" em vez de inventar ideais do que "poderia" ou "deveria" ser?

Brockwood Park, segunda conversa com David Bohm
20 de junho de 1983
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Por que somos prisioneiros da escolha?


Por que somos prisioneiros da escolha?

K: Você disse não temos escolha, por quê?

I: É assim que a natureza humana é.

K: Não. O cavalheiro diz que não temos escolha. O que você quer dizer com "escolha"? O perigo é uma escolha? Por que você escolhe?

I: ... O condicionamento.

K: Não, não diga a primeira coisa que vem à mente.

I: No nível biológico, vamos supor que você gosta de fumar, ou o que for, ok? É perigoso mas agradável, portanto, o pensamento pode escolher.

K: Sim. Olhe, senhor, estamos tentando descobrir o profundo significado da palavra "escolha". Eu escolho entre dois tipos de tecido para um par de calças ou um abrigo. Espere, espere. Eu escolho ir a um certo lugar e não a outro; entre este guru e aquele; eu escolho acreditar nisso e não nisso, e eu pergunto se você pode ouvir com carinho para descobrir assim por que escolhe. Qual é a origem de sua escolha?

I: A desatenção.

X: Mais uma vez, o prazer.

K: Não, não. Quando você escolhe? Não é a incerteza o que faz você escolher? Para a pessoa que vê com absoluta clareza, não há escolha. É assim.

I: Eu escolho quando não sei.

K: E o que isso nos diz, senhor? É verdade: quando não se sabe. E você acha então que você encontrará...?

I: Em um dos casos eu escolho com certeza, e no outro com incerteza.

K: Eu entendo, mas não vamos nos enredar nas palavras. Quando alguém tem clareza verdadeira, não escolhe. Quando você conhece o caminho exato para chegar a um lugar, não há escolha; somente quando está inseguro começa a escolher, ou a perguntar, a consultar, a indagar. O que estou dizendo é que, no nível psicológico, a escolha aparece apenas quando se está confuso, inseguro, não é assim? Quando você vê algo claramente, não há nenhuma necessidade de escolher. Ou seja, que apenas uma mente confusa escolhe. Vocês ficaram todos em silêncio.

I: Podemos explorar por que a mente escolhe?

K: Aguarde, senhor. Se quer compreender, por favor, observe tudo isto. Estamos examinando, tratando de averiguar juntos por que o cérebro registra. Parte de sua função biológica, orgânica, é registrar; mas o que perguntamos é por que se produz algum registro no sentido psicológico.

Alguém respondeu que não temos escolha a respeito. Bem, a palavra “escolha” implica que há duas coisas entre as quais escolher. Quando você vê um perigo, não escolhe, de acordo? Você vê um perigo e age, não diz: “Bem, deveria ir para esquerda ou para a direita? O que será correto?”

 (Risos).

E de modo similar, pergunto: no nível psicológico, que necessidade temos de registrar? Ajuda-nos a proteger-nos?

I: Sim. Na vida, a principio o que importa é a sobrevivência do corpo, mas a mente logo monopoliza praticamente todo nosso interesse.  

K: Isto é o que estamos dizendo, que a sobrevivência física depende da sobrevivência psicológica. Por quê?

I: Porque esta última confere um sentido de identidade.

K: Identidade com quem?

X: Porque na realidade não sabemos o que é correto?

K: E, portanto, se dispõe a averiguá-lo?

Como averiguará o que é correto quando sua mente está insegura e confusa?

Não. Estão se afastando do tema. Perdoem, mas vocês não aprofundam em cada passo.

Por que registramos psicologicamente?

I: Porque quero fazê-lo.

X: Porque não estou completo.

K: Não, senhores. Olhem em seu interior e o averiguem.

I: Para acumular experiência.

K: Experiência que é conhecimento, que logo se converte em memória; porque sem a memória, sem o conhecimento, você não é nada. De modo que dizemos: “Diabos! Tenho que ter conhecimentos para ser alguém!”

Não é assim? É a isto que se refere?

I: Você quer se proteger.

K: Sim, e no aspecto biológico, orgânico, se protege; é algo que temos aprendido a fazer muito bem, apesar das guerras e dos terroristas..., exceto as vítimas, é claro.

Mas você diz que se protege psicologicamente. O que é que protege?

I: Creio que é...

K: Responda, por favor. O que é que está protegendo?

I: Toda essa memória.

K: Sua ideia de si mesmo.

I: Temos a mente tão abarrotada que seu conteúdo se tornou mais importante que a experiência corporal. Nossa mente se converteu nessa miscelânea e somos mais conscientes dela que de nosso corpo; por isso acreditamos que a mente é o que devemos proteger.

K: Ou seja, que você presta mais atenção a seu corpo que a seu cérebro.

I: Não, ao contrário.

K: Sim, siga se enredando. (Risos).

Olhe, senhor, registramos psicologicamente para ser algo, não é certo? Registro onde nasci, isso é fácil, porque ao cérebro foi ensinado a aceitar certa estratificação social que, psicologicamente, me proporciona uma posição, uma sensação de poder, de superioridade. Esses registros psicológicos vão dando uma progressiva solidez ao ego, ao “eu”, não o vê?

Não aceite o que eu digo; por favor, olhe a si mesmo. Se não houvesse em você nenhum registro psicológico, você teria um ego?

I: Não.

K: É óbvio.

Psicologicamente você é agressivo, bruto, violento; isso lhe dá uma sensação de..., já sabe, autoridade, segurança. Este processo de registro pouco a pouco vai criando psicologicamente o sentido de “eu”. Isto é um fato, não?

Eu, minha opinião, meu juízo, minha esposa, meu marido, minha filha, sua filha, minha casa, minha qualidade, minha experiência, minhas feridas, meus medos, meus...

Psicologicamente sou tudo isso. Compreende? Isso é um fato. Não conta que você esteja de acordo com quem fala; é assim.

A pergunta então é por que tenho criado este ego, por que existe esse constante processo de fortalecimento do “eu”.

I: Para protegê-lo.

K: Para proteger o que?

I: Simplesmente me apego ao “eu” cada vez mais.

K: Sim, senhor. Depois de criá-lo se apega a ele, se torna dependente dele; diz: “Não me atrevo a destruí-lo”.

I: É como um castelo de areia.

K: Areia... Não divague; deixemos os exemplos e atenhamo-nos a uma só coisa.

Pergunto-lhe:

Que necessidade temos de todo esse processo, que é a origem dos problemas e de imensas dores?

Devido a ele, primeiro me sinto ferido, tenho medo, me consomem a ansiedade, o ciúme, a ambição e logo penso que não deveria senti-me assim, que deveria...

Você já conhece a batalha emocional, contínua, cada vez mais penosa, mais intensa.

E o que é que estou criando? É real essa estrutura? Compreende?

Real no sentido de palpável, como o é este microfone que realmente posso tocar.

Posso tocar a estrutura psicológica do “eu”?

Obviamente não; portanto, não é mais que uma acumulação de palavras. É difícil aceitar isto. Na relação, acumulo ofensas, elogios, consolos; isso pouco a pouco me leva a depender de você, e se você me ofende, me apego a você para não sentir-me ferido.

Por que o fazemos?

Brockwood Park, primeiro palestra pública,
29 de agosto de 1978
A Atenção e a Liberdade Interior

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Não há liberdade na escolha


Não há liberdade na escolha

K: Existe alguma necessidade de escolher? A decisão implica escolha.

A: Sim.

K: E a escolha implica que a mente está confusa e se debate entre isso e aquilo.

A: Creio que etimologicamente significa fazer um corte radical, uma vala.

K: Sim, mas a mente que vê claramente não tem uma escolha. Não decide. Atua.

A: Certo. Isso não nos traz de volta a negação do fazer?

K: Nós acreditamos que somos livres porque escolhemos. Podemos escolher, não?

A: Sim.

K: É livre a mente que tem a capacidade de escolher?

Por acaso a mente que escolhe não é uma mente livre?

Porque a escolha, como é óbvio, implica estar entre isto e aquilo, o que significa que a
mente não vê claramente e é por isso que ela escolhe.

A escolha existe quando há confusão.

Uma mente que vê claramente não escolhe: está agindo.

A: Isso mesmo.

K: Eu acho que essa é a grande armadilha que nos temos feito: o pensamento de que somos livres para escolher, que a escolha é um sinal de liberdade. Eu, ao contrário, digo que a escolha é um sinal de uma mente confusa e que, portanto, não é livre.

Quarta conversa com Allan W. Anderson,
San Diego, 1974
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Percepção é observar em silêncio e sem escolha


Percepção é observar em silêncio e sem escolha

“Percepção é observar em silêncio e sem escolha “o que é”. Nessa percepção, o problema se desdobra e se compreende então em sua totalidade”.

 K: Isso mesmo, senhor. Você me diz: "Perceba", e eu, que estou cego, acredito que diante de mim há um elefante.

Como eu posso...?

Compreende?

Estou cego e quero ver a luz; você me diz: "Perceba sua cegueira", e eu respondo: "Sim, mas o que significa perceber?"

R: Perceber, consciência, atenção: que é a diferença?

K: Na percepção a qual me refiro, não há escolha; há simplesmente uma percepção.

No momento em que a escolha aparece, a percepção deixa de ser.

R: Compreendo.

K: A escolha é medida, é divisão e, portanto, não tem lugar na percepção.

Nessa simples percepção, o dizer que este quarto me agrada ou não me agrada, se acaba.

R: Sim.

K: Na atenção, no atender, não há divisão.

R: O que significa que não há escolha.

K: Deixe isso por um momento. Atenção significa que não há divisão, que não há um "eu" que atende. Não há divisão e, portanto, não há medida nem limites.

K: Eu vejo como você vê, e digo: "Eu gosto" ou "Eu não gosto", mas o perceber-me disso põe fim à escolha; percebe-se isso, isso é tudo. Agora, na atenção não há alguém que atende, então não há divisão.

R: Mas o ensinamento do Buda é que, na prática desta meditação, não há discriminação alguma, não há nenhum julgamento de valor, preferência ou rejeição, mas simplesmente se vê.

K: Se se atende com todo o seu ser, com os ouvidos, os olhos, o corpo, os nervos, com a totalidade da mente e o coração, isto é, com afeto, com amor, com compaixão, nessa atenção total, o que acontece?

R: O que acontece então, claro, é uma revolução interna absoluta e completa.

K: Não, eu pergunto qual é o estado dessa mente cuja atenção é total.

Olhe, essa mente não tem qualidade, não tem centro e ao não ter um centro, não tem fronteiras. Isto é uma realidade, não adianta imaginá-lo.

Brockwood, 1979, segunda palestra com budistas
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A percepção sem escolha e o conflito


A percepção sem escolha e o conflito

“Viajava uma vez pela Índia em um automóvel com um grupo de pessoas. Ia sentado na frente, ao lado do motorista e as três pessoas que ocupavam o assento detrás falavam sobre a percepção; queriam discutir comigo seu significado.

O automóvel ia muito rápido. NO meio do caminho havia uma cabra, e o motorista, que não prestava muita atenção, atropelou ao pobre animal.

Os senhores que as minhas costas debatiam sobre a percepção, não se aperceberam do que havia ocorrido.
Você ri, mas é isto o que todos estamos fazendo.

Temos um interesse intelectual na ideia da percepção, na investigação verbal, dialética da opinião; mas a realidade é que não temos a percepção do que ocorre.”


Bem, podemos observar em silêncio o que acontece em nós, sem escolher, sem verbalizar?

Quando nos encontramos nosso rosto no espelho, podemos ver como penteamos nossos cabelos, como escovamos nossos dentes, nos barbeamos, ou nos maquiamos, sem distância, da maneira mais direta e o mais preciso possível, sem qualquer distorção?

Para isso, precisamos entender o processo da escolha.

Por favor, pergunte-se por que você escolhe psicologicamente, em seu interior; porque diz:
"Eu farei isso, e aquilo não." "Isso está bem, aquilo está errado", "Sou violento, mas devo ser não violento; orgulhoso, mas um dia serei humilde".

Compreenda?

A escolha interior é constante.

Mas há alguma escolha quando há clareza?


Deixando de lado a escolha de objetos, a que faz essa escolha interna?

Podemos examiná-lo?

O ser humano, provavelmente por causa de sua herança do macaco, no mundo todo é uma criatura muito violenta e consciente do que a violência gera, em si mesmo e na sociedade, diz:

"Deixemos de ser violentos, pratiquemos a não-violência; falemos sobre isso; usemo-la como instrumento político".
Uma das criações características da Índia é precisamente a não-violência, embora já haviam aqueles que falavam dela muito antes. Então, bem, somos violentos, você e eu , se é que sou violento de algum modo, ao ver isso dizemos:

"Eu serei capaz de ser não violento", o que é uma escolha, não?

Quando há separação no pensar, posso dissociar pensamento e ação: penso uma coisa e digo ou faço outra diferente. E o resultado dessa separação são o conflito e a hipocrisia.

Pode-se aprofundar muitíssimo nessa questão do conflito e quando se começa a compreender sua natureza e estrutura, suas nuances sutis, a medida que observa verá que, nesse mesmo observar sem escolha, o conflito termina.

Isso requer grande atenção a cada pensamento e ação, para cada nuance do sentir mais profundo.

Se alguém quer acabar com o conflito, deve dar atenção extraordinária; não uma atenção superficial, não amanhã ou na próxima semana, mas uma atenção viva em todos os momentos.

Ojai, 1985, primeira palestra pública
A Atenção e a Liberdade Interior
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segunda-feira, 10 de junho de 2013

Descobrindo o extraordinário significado da vida

Pergunta: Os dias se sucedem nesta fútil jornada da existência. Que significa tudo isso? Tem a vida algum significado?

KRISHNAMURTI: Quase todo mundo faz esta pergunta, não é verdade? Quase todos nos achamos confusos; e quando perguntamos se a vida tem alguma finalidade, significação, queremos que nos garantam que tem, ou que nos digam qual é o alvo, a finalidade da vida. 

Ora, a vida tem algum algo, alguma finalidade? Qual é o estado da mente que faz esta pergunta? Certamente é muito importante  averiguar isto do que descobrir se a vida tem alguma finalidade. Afinal, que é a vida? Ela pode ser compreendida pela mente? A vida são tristezas e alegrias, sorrisos e lágrimas, e lutas infindáveis; é a insondável profundeza e a beleza de todas as coisas e de nenhuma coisa. A vida é imensa e não pode ser compreendida por uma mente pequena. E a mente pequena é que faz tal pergunta. Porque a mente pequena se acha confusa — e este é o caso da maioria de nós — ela deseja saber qual é a finalidade da vida. Confusos, que estamos, politicamente, economicamente e, também, espiritualmente, interiormente, queremos uma diretiva, queremos que nos digam o que fazer. E quando o perguntamos, a resposta que recebemos é invariavelmente confusa, porque a mente confusa "projeta" e traduz a resposta. 

A questão, por conseguinte, não é saber qual é a finalidade da vida — porque não podemos prender o vento em nossa mão nem fechar dentro de uma moldura a vastidão da vida, para adorá-la. Mas o que se pode fazer, é ver o estado de confusão em que vos achais e descobrir como a ele atender. Uma vez tenhamos compreendido a nossa confusão, nunca mais perguntaremos qual é a finalidade da vida, porque então estaremos vivendo, não mais estaremos agrilhoados ao tirânico padrão de uma dada sociedade, comunista ou capitalista. E esse próprio viver encontrará a resposta apropriada. 

A mente confusa que busca claridade, só encontrará mais confusão. Não é exato isso? Se estou confuso e busco um caminho, uma diretriz, tanto o caminho como a diretriz hão de ser também confusos. Só a mente esclarecida pode achar o caminho, se caminho existe — e não a mente confusa. Ora, isto é muito simples e óbvio. 

Pois bem. Se compreendo que é inútil buscar uma diretriz enquanto estou confuso, continuarei a procurá-la? Ou desistirei de recorrer a qualquer pessoa, pedindo-lhe uma diretriz, percebendo que minha escolha de um guru, um político, um livro, ou de determinados valores, há também de ser confusa? Penso, pois, essencial compreendermos a totalidade de nossa confusão, não teoricamente, mas como experiência real.

O fato é que estais confusos, mas tendes medo de reconhece-lo. Andais nervosos, apreensivos, porque se admitirdes que estais confusos, não sabereis o que deveis fazer. E, assim, vos lançais no torvelinho da ação imediata. Mas se vos tornais cônscios da totalidade de vossa confusão, que acontece? Ao saberdes que qualquer movimento da mente confusa só pode acarretar mais confusão, não vos detendes imediatamente? Cessa então toda a busca; e quando a mente confusa detém a sua busca, desaparece também a confusão e há um novo começo. Isto é muito simples; o difícil é reconhecermos para nós mesmo que estamos confusos. 

Assim, pois, estais experimentando, realmente e não apenas verbalmente, este estado de confusão em que vos achais? Se estais, então não perguntareis a mais ninguém qual é o significado da vida. Se percebeis realmente a vossa confusão, se realmente a experimentais, como um fato, uma realidade, deixareis com toda a certeza de fazer perguntas, exigências, buscas, e esse próprio ato, essa própria cessação, é o começo de uma investigação de qualidade inteiramente nova. Descobrirá então a mente o extraordinário significado da vida, sem que ninguém o diga.

Atualmente, queremos ser tirados de nossa confusão por outra pessoa; mas ninguém nos pode guiar para fora de nossa confusão. Enquanto existir escolha, tem de haver confusão. Escolha indica confusão. No entanto, temos um orgulho imenso dessa faculdade de escolher, a que chamamos "livre arbítrio". E só a mente que não escolhe, mas percebe diretamente, sem interpretação, sem ser influenciada, é só esta mente que não está confusa e, portanto, se acha capacitada para descobrir o incognoscível. 

Krishnamurti — Da solidão à plenitude humana 

terça-feira, 2 de abril de 2013

O que é escolhido não pode ser verdadeiro.


O que é escolhido não pode ser verdadeiro.
(...)
Para conhecerem a plenitude, a realidade, precisam de estar num estado de intenso percebimento, que só podem atingir, quando enfrentam uma crise.

A maioria de vocês tem passado por crises de várias espécies, relativas a dinheiro, pessoas, amor e morte, e quando são colhidos numa destas crises, vocês têm de escolher, de decidir. Como decidem? A decisão de vocês nasce do medo, do desejo, da sensação.

Assim, estão apenas adiando; estão escolhendo o que é conveniente, o que é agradável, e, por conseguinte, estão meramente criando outra sombra pela qual terão de passar.

Só quando sentem o absurdo da atual existência de vocês, e isto não apenas intelectualmente, mas com todo o coração e mente — quando realmente sentem o absurdo desta escolha contínua — então, deste percebimento, nasce o discernimento. Então, não escolhem, agem.
(...)
Alguns cientistas sustentam que a hereditariedade explica as tendências e peculiaridades do indivíduo, e outros afirmam que ele é o resultado do ambiente , meramente uma entidade social. Destas afirmações, que nos confundem, qual devemos escolher?

Que é o homem? Como compreendermos o significado da morte e a profunda angústia que a acompanha? Aceitando meramente as várias afirmações, poderemos resolver a tristeza e o mistério da morte? Seremos capazes de escolher por entre essas explicações, aquela que é verdadeira? Será isso um assunto de escolha?

O que é escolhido não pode ser verdadeiro. O real não pode ser encontrado nos opostos, porque os opostos são apenas o jogo recíproco de relações. Se o que é verdadeiro não pode ser encontrado nos opostos, o que é escolhido não conduz à compreensão da verdade, então, o que se deve fazer? Devem compreender por vocês mesmos o processo do próprio ser e não aceitar meramente as investigações dos cientistas ou as afirmações das religiões. Ao discernirem plenamente o processo do próprio ser, serão capazes de compreender o sofrimento e angústia da solidão que advém com a sombra da morte. Enquanto não perceberem profundamente o processo de vocês mesmos, a consideração do além, a teoria da reencarnação, a explicação dos espíritas tem de permanecer superficial, proporcionando consolação temporária, que só impede o despertar da inteligência. O discernimento é essencial para a compreensão do processo do "eu".

É só por meio do discernimento que poderão resolver os múltiplos problemas que o processo do "eu" sempre cria para si mesmo.

Vocês procuram se libertar do sofrimento, por meio de explicações, de entorpecentes, da bebida, dos divertimentos ou da resignação, e não obstante o sofrimento continua. Se quiserem colocar fim à tristeza, precisam de compreender o processo de divisão na consciência, que cria conflito e torna a mente um campo de batalha de muitos desejos. Pelo discernimento sem escolha, desperta-se a intuição criadora, a inteligência, que é a única a poder libertar a mente — coração dos múltiplos processos sutis da ignorância, do desejo e do medo.   
(...)
Onde há escolha e capacidade de escolha há somente limitação. Somente quando cessa a escolha, há libertação, plenitude, pujança de ação, que é a vida mesma. A criação é sem escolha, como a vida é sem escolha, como o entendimento é sem escolha. Assim, é a verdade; é uma ação contínua, um eterno vir-a-ser, em que não há escolha.

É discernimento puro.

Krishnamurti — O medo – 1946 - ICK
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill