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quinta-feira, 19 de abril de 2018

A sociedade torna o cérebro insensível

A sociedade torna o cérebro insensível

[...]PERGUNTA: O cérebro é coisa morta; e como pode tornar-se vivo?

KRISHNAMURTI: O cérebro é coisa morta? Ora, ele só está morto quando paralisado, quando os nervos já nenhuma sensibilidade têm. Mas, com a maioria de nós acontece que o cérebro se torna embotado, por efeito do conflito, da dor, do sofrimento, das inúmeras defesas e sanções de que vivemos cercados. Ele se torna embotado por causa do medo, dos preceitos e tabus da sociedade. Se vos especializastes numa única direção, como médico, cientista, engenheiro, o que quer que seja, uma parte de vosso cérebro pode ser muito brilhante, mas o resto, obviamente, se embota. Sabendo tudo isso, observando tudo isso, e sondando o mecanismo total do pensar, vereis que o cérebro não é inerte; portanto, temos de quebrar-lhe a inércia, e não, simplesmente, aceitá-la.

INTERROGANTE: Formulei mal a pergunta. O que eu queria perguntar era isto: Como pode uma coisa mecânica como o cérebro se tornar parte dessa totalidade chamada "a mente"?

KRISHNAMURTI: Senhor, quando dizemos que o cérebro é mecânico, dizemo-lo a sério? Penso que não. Se um homem perde o emprego, ou se sua mulher se passa para outro homem, ele não diz "meu cérebro é mecânico". Torna-se presa da ansiedade, do ciúme. Estais vendo, pois, como são equívocas as palavras? Dizeis que o cérebro é mecânico, e não pensais mais nisso. Não investigais, para ver se ele é realmente mecânico. Se o cérebro fosse coisa mecânica, como um computador, não teria problemas. Uma máquina não tem problemas; mas o homem que maneja a máquina tem problemas. Estais vendo quanto é fácil cairmos na armadilha de uma palavra e nela ficarmos aprisionados?

Como vimos há dias, biológica e psicologicamente, o cérebro é um instrumento que se pode tornar altamente penetrante, extremamente sensível. Mas a sociedade — e com esta palavra me refiro às nossas relações no emprego, na família, à total estrutura psicológica da sociedade — não irá torná-lo sensível. Pelo contrário, só quando, pela observação e a compreensão do mecanismo do pensamento, se compreende por inteiro essa estrutura psicológica da sociedade, de que fazemos parte — é só então que o cérebro se torna penetrante, vivo, ágil, alertado

Krishnamurti, Saanen, 14 de julho de 1963,
Experimente um novo caminho


É possível o cérebro tornar-se silencioso?

É possível o cérebro tornar-se silencioso?

[...] PERGUNTA: A deterioração mental que se está processando em cada um de nós não resulta de distração?

KRISHNAMURTI: Ora, senhor, por que razão somos distraídos? E porque não devemos ser distraídos? Enquanto vos falo, é distração escutar aquela corrente, escutar os pássaros, ver as folhas reluzindo ao sol? Isso, por certo, só se torna distração, se desejais afastar tudo mais para o lado, a fim de vos concentrardes no que estou dizendo. Distração denota conflito, não achais? Desejais prestar atenção ao que estou dizendo, mas a mente se desvia para o pássaro, o rio, o trem, a folha. Resistis a essas fugas da mente, desejais detê-las, obrigar a mente a voltar e, daí, por conseguinte, resulta distração, conflito. Mas, se, ao contrário, puderdes escutar ao mesmo tempo a corrente e o que se está dizendo, não há distração, não há contradição. Porque estais atento, não estais lutando contra a distração. No momento em que se luta contra a distração, há conflito e, por conseguinte, deterioração.

Assim, para a mente que está atenta não há distração. Experimentai o que estou dizendo. Escutai a corrente, ficai apercebido do pássaro que canta, notai aquela folha — se a estais vendo como eu a vejo, daqui — reluzindo ao sol, vede todas estas pessoas aqui presentes, vestidas de diferentes cores, olhando em direções várias, escutando em diferentes posturas, e não vos irriteis com a importunação destas moscas. Vereis então que não haverá distração alguma, e a mente estará, por conseguinte, sobremaneira vigilante. Mas a mente que está sempre a lutar contra a distração, porque deseja concentrar-se numa dada coisa, acha-se em conflito e, por conseguinte, num estado de deterioração.

PERGUNTA: É possível o cérebro ficar quieto, alguma vez?

KRISHNAMURTI: Este é com efeito um problema tremendo, uma vez que o cérebro é produto do tempo; ele vem à existência pela associação, por meio de reações nervosas, e acumulou durante séculos um cabedal de memória ou conhecimento instintivo, mediante o qual reage. Isto é um fato, e não uma explicação pessoal de cunho especulativo. O cérebro humano desenvolveu-se, do macaco ao homem primitivo e deste ao homem civilizado. Aprendeu, acumulou vastíssima experiência. Sabe quando há perigo, busca o prazer e procura evitar a dor. Tem inumeráveis desejos, ambições, impulsos, exigências, todos a solicitá-lo em diferentes direções.

Ora bem, em vista de tudo isso, a questão é se é possível ao cérebro — que acumulou tão extraordinária soma de experiência, na forma de memória, e que, neurologicamente é sensível, está sempre à escuta, observando, sentindo, interpretando — se é possível ao cérebro, em tais condições, ficar completamente quieto. Pode ele manter-se ativo, sensível, e ao mesmo tempo completamente tranquilo? Digo que pode, não teoricamente, porém de fato; e é só então que a mente, o cérebro, é capaz de meditação. O ato da meditação é uma coisa maravilhosa — mas não tratarei disto nesta manhã.

O interrogante, pois, deseja saber se é possível ao cérebro tornar-se quieto — esse cérebro tão altamente desenvolvido, com seu enorme cabedal de memória, mediante o qual está constantemente reagindo. Sendo produto de associação, experiência, de memória, resultado do tempo, pode, em algum tempo, o cérebro ficar quieto? A maioria das pessoas se acha em conflito, dividida por inumeráveis desejos: desejo de preencher-se, pintando, escrevendo, fazendo isto ou aquilo. Desejam tornar-se conhecidas, tornar-se alguém, neste mundo monstruoso e estúpido. E, nessas condições, pode o cérebro — que tanto é o consciente como o inconsciente — ficar totalmente silencioso? Se pode, de que maneira poderá saltar de um estado para o outro? Iremos examinando esse problema enquanto formos prosseguindo.

Krishnamurti, Saanen, 7 de julho de 1963,
Experimente um novo caminho

sábado, 31 de março de 2018

Existe um estado cerebral que seja holístico?


Existe um estado cerebral que seja holístico?

O mundo está em crise, que não é meramente econômica, mas sim psicológica. Temos vivido na Terra por milhões de anos e, neste longo período, sofremos todos os tipos de catástrofes e guerras. Desapareceram civilizações inteiras e também aquelas culturas que moldaram o comportamento dos seres humanos. Houveram grandes líderes, tanto políticos como religiosos, com todos os seus enganos para os seres humanos. E depois dessa enorme evolução do cérebro humano, somos o que sempre fomos: primitivos, bárbaros, cruéis, e nos preparamos para a guerra. Hoje em dia, cada nação armamento de loja E os seres humanos ainda estão presos nessa roda do tempo. Nós não mudamos muito; ainda somos bárbaros, com todos os tipos de crenças e superstições. Mas afinal, onde estamos?

[...]Então perguntamos: mudaremos com o tempo? Ou seja, ao longo do tempo, em cinquenta mil ou um milhão de anos, mudará a mente humana, o cérebro humano? O tempo não tem nenhuma importância? Vamos falar sobre todas essas coisas.

Os seres humanos estão psicologicamente feridos. Em todo o mundo, os homens sofrem de um enorme sofrimento, dor, tristeza, solidão e desespero. Sem dúvida, o cérebro criou as coisas mais maravilhosas, tanto ideológica, como tecnológica e religiosamente. O cérebro tem uma capacidade extraordinária; mas esta é muito limitada. Tecnologicamente nós avançamos em alta velocidade; no entanto, psicologicamente, internamente, somos muito primitivos, bárbaros, cruéis, irrefletidos, insensíveis e indiferentes com o que acontece. Não apenas somos indiferentes à corrupção que se estende no campo ecológico, mas também para com a que existe em nome da religião, da política, dos negócios, etc. A corrupção não consiste apenas em passar dinheiro por debaixo da mesa ou contrabandear mercadorias no país, mas começa onde existe interesse próprio, que é a origem da corrupção.

[...] Nós usamos nossa energia, nossa capacidade, nossa compreensão intelectual em uma única direção, na tecnológica. No entanto, nunca entendemos o comportamento humano ou por que somos o que somos depois deste longo período de evolução... Nós ganhamos muito dinheiro, conseguimos ter casas grandes, carros, etc., mas psicologicamente, internamente, no subjetivo, estamos praticamente paralisados, porque dependemos dos outros para nos dizer o que devemos fazer ou pensar.

[...] Devemos investigar o seguinte: nossa relação com o mundo, que se torna mais e mais complexo; nossa relação uns com os outros, por mais íntima que seja; nossa relação com um ideal; nosso relacionamento com o nosso guru, e com o que chamamos Deus. Temos que investigar seria e profusamente essa qualidade do cérebro que compreende ou tem uma percepção direta sobre o mundo externo e todo nosso mundo interno. Deve ficar claro que nós não tentamos indicar um caminho, um método, um sistema ou de nenhuma maneira tentamos ajudá-lo. Pelo contrário, nós somos seres humanos independentes, isso não é uma afirmação cruel ou indiferente. Pelo contrário, somos como dois amigos que falam sobre essas coisas juntos, tentando entender o mundo: o meio ambiente, todas as complexidades da economia e a divisão de religiões e nações. Amizade significa que não tentamos persuadir, nos impor, nem impressionar um ao outro. Somos amigos e, portanto, há uma certa qualidade de afeto, de compreensão, de intercâmbio. Estamos nessa posição.

Assim, começamos primeiro por ver o que é o cérebro. Quem lhes fala não é um especialista do cérebro, mas tem falado com diferentes pessoas que o são. O cérebro, localizado no interior do crânio, é um extraordinário instrumento. Acumulou um enorme conhecimento de quase tudo, inventou as coisas mais incríveis, como os computadores, os velozes meios de comunicação e os instrumentos de guerra. Nesse campo, o cérebro tem liberdade absoluta para inquirir, para inventar e para investigar. Começa com o conhecimento, e acumula mais e mais saber. Se certa teoria não funciona, a descarta. Sem dúvida, o cérebro não é tão livre na hora de investigar o “eu”; está condicionado, moldado, programado para ser hindu, muçulmano, cristão, budista, etc. Como um computador, o cérebro humano está programado: que as guerras são necessárias, que temos de pertencer a certo grupo, que nossas raízes são parte do mundo, etc. E isso é verdade, não é um exagero. Todos estamos programados pela tradição, pela constante repetição dos jornais e revistas, por milhões de anos de pressão. O cérebro tem liberdade em uma direção: o mundo da tecnologia; mas este mesmo cérebro, que é enormemente capaz, se vê limitado por seu próprio interesse. Nosso cérebro, que é completamente livre em uma direção, no psicológico está atrofiado.

É possível que o cérebro humano seja totalmente livre para ter uma enorme energia? Não para fazer travessuras, não para ter mai poder e dinheiro (ainda que se deva ter um pouco de dinheiro), senão para inquirir, para descobrir uma maneira de viver livre do medo, do sentimento de solidão, do sofrimento, e para se perguntar pela natureza da morte, da meditação e da verdade. É possível que o cérebro humano, que foi condicionado durante milhões de anos, seja totalmente livre? Ou os seres humanos estão condenados a serem escravos e a nunca conhecerem o que é a liberdade? Não se trata de uma liberdade abstrata, senão da liberdade do conflito, porque vivemos nele. Um fator comum em todos os seres humanos, desde que nascem até que morrem, é essa luta constante, essa busca de segurança, por isso nunca a encontram, e ao se sentirem inseguros buscam por segurança. Assim, é possível que os seres humanos neste mundo moderno, com todas as suas complexidades, vivam sem sombra de conflito? Porque o conflito adultera o cérebro, reduz sua capacidade, sua energia e, portanto, logo se esgota. À medida que você envelhece, pode observar em si mesmo esse conflito permanente.

O que é o conflito? Por favor, não esperem que eu responda; isso não tem nenhuma graça. Faça-se essa pergunta, exercite sua mente para descobrir qual é a natureza do conflito. É evidente que onde há dualidade há conflito: “eu” e “você”, minha esposa e eu, a divisão entre o meditador e a meditação. Enquanto existir divisões entre nacionalidades, entre religiões, entre pessoas, entre o ideal e o fato, entre “o que é” e “o que deveria ser”, haverá conflito. Essa é a lei. Sempre que haja divisão, a que existe entre o árabe e o judeu, entre o hindu e o muçulmano, entre pai e filho, etc., haverá conflito. Isso é um fato. Essa divisão também é o “mais”: “Não sei, mas se me derem uns anos a mais, saberei”. Espero que entendam isto.

Quem cria essa divisão entre “o que é” e “o que devera ser”? Existe uma divisão entre o que chamo Deus, sempre que essa entidade exista, e eu mesmo; há uma divisão entre querer paz e estar em conflito. Essa é a verdadeira realidade de nossa vida cotidiana. Por isso quem lhes fala, pergunta, do mesmo modo que vocês deveriam fazê-lo: quem cria essa divisão, não só no externo senão também internamente? Por favor, façam-se essa pergunta. Quem é o responsável dessa confusão, dessa interminável luta, dor, solidão, desespero, e dessa sensação de sofrimento da qual, segundo parece, o ser humano nunca pode escapar? Quem é o responsável por tudo isso? Quem é o responsável por essa sociedade na qual vivemos? Neste país há uma enorme pobreza. Entendem tudo isso ou nunca haviam pensado nisso? Ou estão tão ocupados com sua própria meditação, com seus deuses, com suas metas, com seus problemas, que nunca pensaram nisso, que nunca o haviam questionado?

Há várias coisas implicadas nisso. Aqueles que são bastante inteligentes, conscientes e sensíveis, sempre buscaram por uma sociedade igualitária. Têm-se perguntado: pode haver igualdade de oportunidades, é possível eliminar as diferenças de classes de modo que não haja divisão entre o trabalhador e o diretor, entre o carpinteiro e o político? E nós queremos saber: há justiça no mundo? Houve diversas revoluções, como a francesa e a russa, que tentaram estabelecer uma sociedade onde houvesse igualdade, justiça e bondade. Mas não tiveram sucesso; ao contrário, de diferentes modos regressaram ao velho modelo. Assim, têm que se investigar não só por que os seres humanos vivem em constante conflito e sofrimento e por que buscam segurança, senão também a natureza da justiça. Existe realmente justiça neste mundo? Existe? Você é inteligente e o outro não é. Você goza de todos os privilégios e o outro não tem nenhum. Você vive numa enorme casa e o outro em uma cabana com apenas uma comida por dia. Logo, há realmente justiça? Não é importante descobrir por si mesmo e, portanto, ajudar a humanidade? [Sinto muito, não quis dizer “ajudar”; retiro essa palavra]. Para compreender e descobrir s na realidade existe a natureza da justiça, devemos investigar com grande afinco a natureza do sofrimento, e se de verdade é possível eliminar o auto interesse. Também devemos investigar o que é a liberdade e o que é a bondade.

Cada ser humano tem criado essa sociedade na qual vivemos, com sua cobiça, sua inveja, sua agressividade e sua busca de segurança. Nós temos criado a sociedade em que vivemos, para logo nos convertermos em escravos dessa sociedade. Entendem tudo isto? A partir do medo do ser humano, do sentimento de solidão e da busca da segurança (sem nunca entender o que é a insegurança e buscar sempre a segurança) temos criado a nossa cultura, nossa sociedade, nossas religiões e nossos deuses. Assim, pois, voltamos ao princípio. Quem estabeleceu essa divisão? Porque a divisão e o conflito existem. Isso é uma verdade absoluta. Pense nisso, senhor. Não foi o pensamento o que tem dividido o mundo em cristãos, budistas, judeus, árabes, hindus e muçulmanos? Tem sido o pensamento?

Em consequência, perguntamos: o que é o pensamento? Vivemos através da ação do pensamento. Trata-se do fator central de nossas ações. Não é certo? Por meio do pensamento ganhamos dinheiro, o pensamento me separa de você, separa o esposa da esposa, o ideal de “o que é”. Mas, o que é o pensamento? O que é pensar? Pensar não é uma atividade da memória? Por favor, senhores, não aceitem nada do que diz este que lhes fala. Devem incorporar o benefício da dúvida e questionar suas próprias experiências, suas próprias ideias. Quem lhes fala diz, como um amigo, a quem pode lhe escutar, e isso depende de vocês, que o pensamento tem criado essa divisão. O pensamento é o responsável pelas guerras e todos os deuses que o homem tem inventado. O pensamento é quem levou o homem até a Lua, criou o computador e todos estes instrumentos extraordinários do mundo tecnológico. E o pensamento também é o responsável pela divisão e o conflito entre “o que é” e “o que deveria ser”. Este último é um ideal; é algo que se deve alcançar, algo que tem que se conquistar, porém também é afastar-se de “o que é”. Por exemplo, os seres humanos são violentos. E isto se trata de um fato óbvio. Inclusive depois de um longo período de tempo, o homem não está livre da violência. Mas inventou a não violência. Não só a criou, senão que também a busca. Sem dúvida, se realmente é honesto, deve reconhecer que é violento. Ao buscar isso a que chama “não violência”, semeia sem cessar a semente da violência. Isso é algo evidente, é um fato.

Neste país se fala muito de não violência, o qual é vergonhoso, porque todos somos violentos. A violência não é só física; também se pode considerar violência a imitação, o conformismo, o afastar-se de “o que é”, de modo que a violência só pode ser eliminada completamente da mente humana, do coração humano, quando não há um oposto. O oposto é a não violência, o qual não é algo real, senão que não é nada mais do que uma fuga da violência. Se você não escapa, então só existe violência. Mas não somos capazes de enfrentar esse fato. Sempre escapamos do fato, buscamos desculpas, razões econômicas, inumeráveis métodos para superá-la, mas a violência permanece aí, e o mesmo fato de tratar de superá-la é parte da violência.

Para enfrentar a violência, é necessário prestar-lhe atenção e não escapar dela. Deve ver o que é, ver a violência que há entre homem e mulher, tanto de gênero com de outras formas. Não há violência quando se busca mais e mais, e se tenta “chegar a ser” mais e mais? Trate de ver a violência e permanecer com ela; não fuja, não tente reprimi-la, nem transcendê-la, já que tudo isso implica conflito. Viva com ela, observe-a; de fato, valorize-a, e não a traduza a partir de seus deuses, seus agrados ou desagrados. Tão só veja-a e observe-a com enorme atenção. Se presta atenção completa a algo, é como acender uma luz brilhante, e então verá todas as qualidades, as sutilezas, as implicações, verá todo o mundo da violência. Quando se vê algo com muita clareza, esse algo desaparece. Mas nos recusamos a ver as coisas desse modo.

Agora, perguntamos: quem tem criado o conflito entre os seres humanos, com o meio ambiente, com os deuses, com tudo? Alguma vez e perguntaram por que se consideram indivíduos? O são realmente? Ou têm sido programados para acreditarem que o são? Sua consciência é igual a do resto dos seres humanos: sofrem, se sentem sós, têm medo, buscam o prazer e evitam a dor. Isso mesmo ocorre com cada ser humano deste mundo, o que é um fato psicológico. Pode ser que você seja mais alto, mais moreno, mais ruivo, mas tudo isso são ornamentos externos, como o clima, a comida, etc. E a cultura também é algo externo. Não obstante, no psicológico, no subjetivo, nossa consciência é comum ao resto dos seres humanos. Pode ser que você não goste disto, mas é um fato. De modo que, psicologicamente, você não é diferente do resto da humanidade. Você é a humanidade. Não diga: “Sim”; não tem nenhum sentido só aceitá-lo como uma ideia. É um fato irrefutável que você é o resto da humanidade, e não alguém diferente. Talvez tenha um cérebro melhor, mais riquezas, mais astúcia e melhores livros; mas deixe tudo isso de lado porque são coisas superficiais, são adornos. No interior, cada ser humano deste mundo compartilha o sofrimento com você. Você percebe o que isso significa? Significa que quando diz que é o resto da humanidade, tem uma enorme responsabilidade. Significa que tem um enorme afeto, amor e compaixão, e ao essa ideia estúpida de que “todos somos um”.

Devemos investigar o que é pensar e por que se tornou tão importante. Sem a memória é impossível pensar. Se não tivéssemos memória não poderíamos pensar. Nossos cérebros (que são iguais aos do resto da humanidade, e não são pequenos cérebros independentes) estão condicionados pelo conhecimento, pela memória. E ambos se baseiam na experiência, tanto do mundo científico como do mundo subjetivo. Nossas experiências, por mais sutis, por mais espirituais e por mais pessoais que sejam, sempre são limitadas. Por isso nosso conhecimento, que é o resultado da experiência, também é limitado. Podemos somar mais e mais conhecimento, mas por mais que acrescentemos, o que acumulamos é limitado. Estamos dizendo que a experiência ao ser limitada, o conhecimento também o é, seja este do passado, do presente ou do futuro.

Conhecimento significa memória, a qual se guarda no computador ou no cérebro. Assim, o cérebro é memória. E esta dirige o pensamento, o que é um fato. Daí que o pensamento sempre é limitado. Estão de acordo? É lógico, racional, não é algo inventado; é assim. A experiência é limitada; por conseguinte, o conhecimento também é.

Continuando, perguntamos: existe outra atividade que não seja divida, que não esteja fragmentada, que não seja separada? Existe uma atividade holística que nunca seja dividida, como o “você” e o “eu”? A divisão é o que cria o conflito. Agora, como você descobrirá, por si mesmo, quer dizer, ver que o pensamento divide, que cria conflito, que forma uma sociedade e logo se separa dela? O pensamento é o único instrumento que temos tido até agora. Você pode dizer que há outro instrumento que é a intuição. Mas pode ser irracional; é possível inventar algo e viver nessa ilusão.

Com toda seriedade perguntamos (se você compreendeu a natureza do pensamento e se existe outra ação ou forma de viver que não seja fragmentada, separada como o mundo e eu, ou eu e o mundo): existe esse estado do cérebro, ou esse estado do não cérebro, que seja totalmente holístico, completo?

Se são sérios, se são livres, o descobrirão. Têm que se libertar de tudo o que têm acumulado, mas não fisicamente (por favor, não cancelem sua conta bancária, ainda que de todos os modos não o farão), senão tratem de eliminar toda acumulação psicológica. Isto se mostra muito difícil; significa que devem ser livres. Como sabem, etimologicamente a palavra liberdade também significa “amor”. Quando há liberdade, nenhuma limitação e essa enorme profundidade, também há amor. Para descobri-lo, e para que apareça essa forma de vida holística, livre de interesse próprio, você deve estar livre de atrito e conflito na relação.

Vivemos em relação. Podemos viver no Himalaia, num mosteiro, numa pequena cabana ou num palácio, mas não é possível viver sem se relacionar. Relacionar-se significar “estar relacionado”, “estar em contato com”, não só física e sexualmente, senão também estar em total contato com o outro. Não obstante, nunca estamos deste modo com o outro. Inclusive na relação mais íntima, home-mulher, cada um persegue suas ambições pessoais, suas próprias realizações, sua forma de viver oposta à do outro, do mesmo modo que duas linhas paralelas que nunca se encontram. Nesse tipo de relação, sempre existe algum conflito. Enfrentem esse fato.

Mas, o que é que cria o conflito entre dois seres humanos? Em sua relação com sua esposa, com seu esposo ou com seus filhos (que é a relação mais íntima), o que é que cria o conflito? Façam-se essa pergunta, senhores. Não se deve ao fato de terem uma imagem de sua esposa e ela ter uma imagem de você? Essa imagem que se construiu com muito, muito cuidado, seja num período curto ou muito longo, esse registrar constante no cérebro da relação com o outro, cria a imagem de sua esposa ou esposo; e essa imagem é a que divide. Em especial, quando se vive na mesma casa com todo esse caos, então foge-se tornando-se monge ou o que quer que seja. Mas ali também tem seus próprios problemas, seus próprios desejos, suas próprias buscas, que novamente se convertem em conflito.

Podemos viver sem nenhuma imagem do outro, realmente sem nenhuma imagem? Alguma vez já tentaram isso? Observem a lógica, o sentido comum: enquanto funciona o maquinário que cria as imagens, que registra insultos ou elogios, isso cria uma imagem do outro, e a imagem é o fator que cria divisão. Logo, é possível viver sem nenhuma imagem? Nesse momento descobrirá o que é a verdadeira relação, porque não haverá nenhum conflito nela, o que é totalmente necessário se se quer compreender a limitação do pensamento e investigar uma holística maneira de viver, livre de qualquer fragmentação.

Outro fator se deve a que, desde a infância, temos sido educados para que tenhamos problemas em nossas vidas. Quando somos enviados à escola, temos que aprender a ler, a escrever, etc. Aprender a escrever constitui um problema para o menino. Por favor, sigam isto com determinação. A matemática, a história, a química se convertem num problema, de modo que, desde a infância, se educa ao menino para que viva com problemas, seja o problema de Deus, ou muitíssimo mais. Por isso, nossos cérebros estão condicionados, educados, acostumados a viver com problemas, pois que desde a infância o fazemos. O que ocorre quando educamos o cérebro com problemas? Nunca os resolve, só gera outros. Quando um cérebro está treinado para ter problemas, para viver com eles, ao tratar de solucioná-los, nesse mesmo ato de solucioná-los, cria outro problema. Desde a infância temos sido treinados e educados para viver com problemas, portanto, ao estar assentados neles, nunca os solucionamos totalmente. Só um cérebro livre, que não está condicionado para ter problemas, pode solucioná-los. Ter problemas continuamente é uma de nossas marcas porque, em consequência, nossos cérebros nunca estão calmos, livres para observar, para olhar.

Por esta razão, perguntamos: é possível não ter nenhum problema e enfrentá-los? Sem dúvida, para compreendê-los e resolvê-los completamente, o cérebro deve estar livre. Observe a lógica. A lógica, junto com a razão, são necessárias. Só então se pode ir mais além da lógica e da razão. Mas se você não é lógico, se não avança passo a passo, sempre se enganará e terminará vivendo em algum tipo de ilusão. Descobrir uma maneira de viver que permita enfrentar os problemas, resolvê-los e não cair preso neles, requer uma enorme observação e atenção, perceber-se e assegurar-se de que nunca, nem por um segundo, se engana a si mesmo.

Primeiro deve haver ordem. E esta só surge quando não há problemas, quando há liberdade, mas não a liberdade para fazer o que se quer, porque isso não é liberdade em absoluto. Escolher este guru ou aquele outro, este livro ou aquele, não é mais que outra forma de confusão. Onde há escolha, não há liberdade. Você só escolhe quando o cérebro está confuso. Quando o cérebro tem clareza, então não há lugar para escolha, já que só existe percepção direta e ação correta.

Krishnamurti, 2 de fevereiro de 1985
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill