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quinta-feira, 27 de agosto de 2015

O "eu" nunca pode preencher-se

Pergunta: Como pode um homem preencher-se, se não tem ideais?

Krishnamurti: Existirá o preenchimento, — embora a maioria de nós esteja em busca do preenchimento? Queremos nos preencher, por meio da família, de nosso filho, nosso irmão, nossa esposa, por meio da propriedade, da identificação com uma nação ou um grupo, ou pelo cultivo de um ideal, ou pelo desejo e continuidade do "eu". Há formas variadas e diferentes de preenchimento, em diversos níveis da consciência. 

Mas existe de fato o preenchimento? Que é que se preenche? Que entidade é essa que busca existir dentro ou por meio de uma certa identificação? Quando é que vocês pensam em preenchimento? Quando é que procuram o preenchimento? 

Como já disse, não estou fazendo uma conferência no nível verbal. Se assim a consideram, será melhor que se retirem, porque perdem o tempo. Se, porém, desejam penetrar profundamente, então fiquem vigilantes e sigam-me; porque necessitamos de inteligência, e não de uma repetição morta, — repetição de frases, de palavras, de exemplos, dos quais já estamos fartos. 

O que necessitamos é de criação, criação inteligente, "integrada"; o que vale dizer, devem investigar, para descobrir o processo da mente pela própria compreensão de vocês. 

Assim, ao escutarem o que digo, o relacionem diretamente com vocês mesmos, "experimentem" o que estou falando. Não podem experimentá-lo através das minhas palavras. Só o experimentarão se tiverem verdadeiro empenho, se observarem o próprio pensar e o próprio sentir de vocês. 

Quando há de ser preenchido o desejo? Quando possuem consciência desse impulso a ser, a vir-a-ser, a se preencher? Por favor, se observem. Quando possuem consciência dele? Não estão conscientes dele quando ele é contrariado? Não estão conscientes dele quando sentem uma solidão extraordinária, quando possuem um sentimento de nulidade absoluta, o sentimento de não serem alguma coisa? Vocês só possuem percepção desse impulso para o preenchimento, quando sentem um vazio, uma solidão. E, então, procuram o preenchimento por inúmeras maneiras, por meio da seita, pela relação com a propriedade de vocês, as árvores, com todas as coisas, em diferentes níveis de consciência. O desejo de ser, de se identificar, de se preencher, só existe quando há consciência de que o "eu" está vazio, solitário. O desejo de preenchimento é uma fuga daquilo que chamamos solidão. Nosso problema, pois, não é como nos preenchermos, ou o que é o preenchimento; porque tal coisa — o preenchimento — não existe. O "eu" nunca pode preencher-se; ele é sempre vazio; vocês podem ter umas poucas sensações ao alcançarem um resultado; mas assim que se desvanecem as sensações, vocês se encontram de novo naquele estado de vazio. Por isso, começam a seguir o mesmo processo de antes. 

O "eu", pois, é o criador daquele vazio. O "eu" é o vazio; o "eu" é um processo egocêntrico, no qual estamos conscientes daquela extraordinária solidão. Assim, estando conscientes dela, tentamos a fuga, por meio de várias formas de identificação. A essas identificações chamamos preenchimento. Na realidade não existe preenchimento, porque a mente, o "eu", nunca pode preencher-se; pela própria natureza, o "eu" é egocêntrico. 

Nessas condições, que deve fazer a mente que está consciente daquele vazio? Nosso problema é esse, não é verdade? Para a maioria de nós, essa dor do vazio é extremamente forte. Fazemos qualquer coisa, para fugir a ela. Qualquer ilusão serve, e essa é a fonte da ilusão. A mente tem o poder de criar ilusões. E enquanto não compreendermos aquele vazio, aquele estado de vazio, que é egocêntrico, podemos fazer o que quisermos, podemos buscar qualquer espécie de preenchimento, mas haverá sempre aquela barreira que separa, que não conhece a plenitude. 

Nossa dificuldade, por conseguinte, consiste em estarmos conscientes desse vazio, desse isolamento. Nunca nos vemos frente a frente com ele. Não sabemos como ele é, quais são as suas qualidades; porque vivemos continuamente fugindo dele, nos retraindo, nos isolando, nos identificando. Nunca estamos na presença dele, diretamente, em comunhão com ele. Por isso, somos "observador" e a "coisa observada". Isto é, a mente, o "eu", observa o vazio; e, então, o "eu", o pensante, trata de livrar-se desse vazio, ou de fugir.

Esse vazio, esse isolamento, será diferente do observador? Ou será que o próprio observador é que está vazio, e não que está observando o vazio? Porque, se o observador não for capaz de reconhecer esse estado a que ele chama "vazio", não haverá experiência alguma. Ele está vazio; está vazio, não pode atuar sobre isso, nada pode fazer a respeito. Porque, se fizer alguma coisa, torna-se ele o observador a atuar sobre a coisa observada, o que é uma relação falsa. 

Assim, quando a mente reconhece, percebe, está consciente de que está vazia, e que não pode atuar sobre esse estado, então, esse vazio, do qual estamos conscientes, do exterior, tem um sentido diferente. Até agora, tínhamos nos ocupado com ele como "observador". Agora é o "observador" que é vazio, que está só, solitário. Pode ele fazer alguma coisa a respeito? Não pode, evidentemente. Sua relação com esse estado é, então, inteiramente diferente da relação de observador. Ele está só, acha-se naquele estado em que não há a verbalização "estou vazio". No momento em que o verbaliza, em que o exterioriza, é diferente dele. Assim, quando cessa a verbalização, quando cessa o "experimentador" que "experimenta" o vazio, quando deixa de fugir, vê-se ele, inteiramente solitário, sua relação, em si mesma, é isolamento; ele próprio é o isolamento; e ao perceber isso plenamente, com toda a certeza, deixa de existir o vazio, a solidão. 

Mas a solidão é coisa de todo diversa de "estar só". Essa solidão tem de ser transposta, para então "estarmos sós". A solidão não é comparável com o "estar só". O homem que conhece a solidão, nunca conhecerá o "estar só". Estão sós? Nossas mentes não estão integradas para estarmos sós. O próprio processo da mente é separativo. E quem separa, conhece a solidão. 

Mas o "estar só" não é separativo. É algo que não é a multiplicidade, que não é influenciado pela multiplicidade, pela multidão, que não é resultado da multidão, que não é composto de partes, como a mente. A mente é produto da multidão. A mente não é uma entidade que está só, porque foi montada, peça por peça, fabricada, através de séculos. A mente nunca pode estar só, nunca pode conhecer o "estar só". Mas, uma vez consciente do isolamento, ao passar por esse estado, vem ela a conhecer o "estar só". Então, e só então, pode existir aquilo que é imensurável. A maioria de nós, infelizmente, buscamos a dependência. Queremos companheiros, queremos amigos, queremos viver num estado de separação, num estado que produz conflito. O que está só nunca pode se achar em estado de conflito. A mente, porém, não pode perceber isso, não pode compreender isso; só pode conhecer a solidão.

Krishnamurti em, Quando o pensamento cessa

terça-feira, 24 de março de 2015

Sobre o natural estado de isolamento

O filósofo aceita seu isolamento predestinado não apenas porque essa deve ser a sua posição, mas também porque sua presença física desperta sentimentos negativos no coração das pessoas comuns, da mesma forma que desperta sentimentos positivos no coração de certos aspirantes. Os sentimentos negativos podem cobrir toda uma gama, desde confusão, desnorteamento e suspeita, até medo, oposição e inimizade direta. Os positivos podem ir desde a atração instintiva até a disposição de sacrificar a vida à sua defesa ou serviço. Todos esses sentimentos surgem de modo espontâneo, irracional e instintivo. E nada têm a ver com o fato de o filósofo ter ou não ter revelado sua verdadeira identidade pessoal. Isso ocorre porque esses sentimentos são a consequência do fato de sua aura impingir-se psiquicamente à dos outros. O contato é invisível e não se manifesta no mundo físico, mas é muito real no mundo mental-emocional. Trata-se realmente de uma experiência psíquica para ambos: clara, precisa e corretamente compreendida pelo filósofo; vaga, perturbadora e totalmente incompreendida pelas pessoas comuns e pelos pseudobuscadores. É uma experiência tanto psíquica quanto mística para os que genuinamente buscam, e com os quais o filósofo tenha alguma afinidade interior, o alegre reconhecimento de um Irmão Mais Velho muito venerado e há muito perdido. Infelizmente, a despeito da generosa compaixão e da enorme boa vontade que ele reserva dentro do coração por todos igualmente, são os contatos desagradáveis que somam o maior número, sempre que o filósofo desce ao mundo. Que não o culpem se ele prefere a solidão à sociedade, pois nada pode fazer a respeito disso. As pessoas são o que são. Na maioria das vezes, quando tenta ser-lhes agradável, como se ambos pertencessem ao mesmo nível espiritual, ele fracassa. Aprende, um tanto exaustivamente, a aceitar como inevitáveis o seu próprio isolamento e a limitação das pessoas, e, no atual estágio da evolução humana, inalteráveis. Aprende, também, que é fútil desejar que essas pessoas sejam diferentes. 

A paz da qual o filósofo se tornou herdeiro não é um descanso das outras atividades que abandonou, descanso no qual só pensa em si mesmo, mas um divino estado de alerta que subsiste sob as novas atividades que aceita.

Paul Brunton em, Ideias em perspectiva

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Por que insistimos em simular comum unidade e afinidade?

Pode haver relações enquanto há separação, divisão? Pode haver relações com outrem, quando não há contato, não apenas físico, mas também em todos os níveis de nosso ser? Podemos estar segurando a mão de uma pessoa e dela estar a mil léguas de distância, absortos em nossos pensamentos e problemas. Podemos achar-nos num grupo e ao mesmo tempo estar dolorosamente sós. Assim perguntamos: Pode haver alguma espécie de relação com a árvore, a flor, o ente humano, ou com o céu e o belo Pôr do Sol, quando a mente, com suas atividades, está a isolar-se a si própria? E pode em algum tempo haver contato com o que quer que seja, mesmo que a mente não esteja a isolar-se?

(...) Cada um vive dentro de sua própria teia, você na sua, a outra pessoa na dela. Haverá alguma possibilidade de nos libertarmos dessa teia? Essa teia, essa mortalha, esse invólucro é a palavra? Constitui-se esse invólucro de seu interesse em si mesmo e dos interesses da outra pessoa em si própria, de seus desejos, opostos aos dela? Essa cápsula é o passado? É tudo isso junto, não acha? Não é uma só coisa que a mente está levando, porém um feixe inteiro. Você leva sua própria carga, e o outro a sua. Podemos, em algum tempo, largar essas cargas, a fim de que a mente se encontre com a mente, o coração com o coração? Eis a questão, não acha?

(...) Você pode identificar-se com aquele aldeão ou aquela chamejante buganvília — sendo isso um truque mental para simular a unidade. A identificação com alguma coisa é um dos estados mais hipócritas que há. Identificar-se com uma nação, com uma crença e, contudo, continuar só, é uma das maneiras favoritas de enganar a solidão. Ou, tão completamente você se identifica com sua crença, que é a a crença; e este é um estado neurótico. Ora, ponhamos de parte esse impulso a identificar-nos com uma pessoa, ideia ou coisa. Assim, não há harmonia, unidade, amor. A outra questão, portanto, é esta: Você pode libertar-se do invólucro, de maneira que ele deixe de existir? Só então haveria possibilidade de contato total. Como podemos libertar-nos do invólucro? Esse "como" não significa método, porém antes uma indagação que poderá abrir-nos a porta. 

(...) Rasgamos o invólucro pedaço por pedaço ou o rompemos e dele saímos imediatamente? Se o rasgamos pedaço por pedaço — como certos analistas dizem fazer — esse trabalho nunca terá fim. Não é por meio do tempo que se pode destruir essa separação. 

(...) Não é você mesmo o invólucro?

(...) O próprio movimento para você penetrar no outro invólucro, ou estender-se para fora do seu, é determinado por seu próprio invólucro: você é o invólucro. Você é, portanto, o observador do invólucro e é também o próprio invólucro. Nesse caso, você é o observador e a coisa observada; o mesmo é ele — e nisso ficamos. E você tenta alcançá-lo e ele tenta alcançar-lhe. Isso é possível? Você é a ilha cercada pelo mar, e ele também é a ilha cercada pelo mar. Veja que você é tanto a ilha como o mar; não há separação entre ambos; você é a terra inteira com o mar. Por conseguinte, não há divisão em "ilha" e "o mar". A outra pessoa não vê isso. Ele é a ilha cercada pelo mar; tenta alcançar-lhe, ou você, se é bastante desajuízado, tenta alcançá-lo. Isso é possível? Como pode haver contato entre um homem livre e outro que está aprisionado? Visto que você é o observador e a coisa observada, você é o inteiro movimento da terra e do mar. Mas, a outra pessoa, que não compreende isso, continua a ser a ilha cercada de água. Ela tenta alcançar-lhe, mas nunca o consegue, porque mantém o seu estado ilhado. Só depois de deixá-lo e, com você, estar aberto ao movimento do céu, da terra e do mar, poderá haver contato. Aquele que vê que a barreira é ele próprio, não terá mais nenhuma barreira. Por conseguinte, ele, em si próprio, não é separado. O outro não percebeu que ele próprio é a barreira e, por isso, mantém a crença na sua separação. Como pode esse homem alcançar o outro? Impossível. 

(...) Há o espaço entre isso que a mente chama o invólucro por ela criado, e ela própria. Há espaço entre o ideal e a ação. Nesses diferentes fragmentos de espaço entre o observador e a coisa observada, ou entre as diferentes coisas que ele observa, acham-se todo o conflito e luta, e todos os problemas da vida. Há a separação entre o meu invólucro e o invólucro de outrem. Nesse espaço está toda a nossa existência, todas as nossas relações e nossa luta. 

(...) Que é esse espaço? Há espaço entre você e seu invólucro, espaço entre ele (o outro) e o seu invólucro, e há espaço entre os dois invólucros. Todos esses espaços se deparam ao observador. De que eles são feitos? Como se tornam existentes? Qual a qualidade e a natureza desses espaços divididos? Se pudéssemos remover esses espaços fragmentários, que aconteceria? 

(...) Quando esse espaço desaparece de fato — não verbal ou intelectualmente, porém desaparece realmente, há completa harmonia, união entre você e o outro. Nessa harmonia, você e ele deixam de existir e há apenas aquele vasto espaço que jamais pode ser fragmentado. A limitada estrutura da mente deixa de existir, porque a mente é fragmentação.

Krishnamurti em, A Luz Que Não Se Apaga

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Observando nossos variados meios de fuga da solidão

Questionador: Como vencer a solidão?

Krishnamurti: E você pode vencer a solidão? Tudo o que você conquista tem de ser conquistado repetidas vezes, não é? O que você compreende chega ao fim, mas o que você conquista nunca chega ao fim. O processo de luta apenas alimenta e fortalece aquilo que se combate.

Ora, o que é essa solidão de que a maioria de nós se dá conta? Nós a conhecemos e fugimos dela, não é? Fugimos dela em todo gênero de atividades. Somos vazios, solitários, e temos medo disso, e por esse motivo tentamos encobri-lo por meio de algo — a meditação, a busca de Deus, as atividades sociais, o rádio, a bebida ou qualquer outra coisa. Faríamos qualquer coisa para não ter de encará-la, estar com ela, compreendê-la. A fuga é a mesma, quer a empreendamos através da ideia de Deus ou do consumo de bebidas. Enquanto se está fugindo da solidão, não há diferença essencial entre prestar culto a Deus e ser viciado em álcool. Socialmente pode haver uma diferença; mas, psicologicamente, o homem foge de si mesmo, do seu próprio vazio, e cuja fuga é a busca de Deus, está no mesmo nível do alcoólatra.

O importante não é, pois, vencer a solidão, mas compreende-la, e não podemos compreender se não a encaramos, se não olhamos para ela diretamente, se ficamos fugindo continuamente dela. E toda a nossa vida é um processo de fuga da solidão, não é? No relacionamento, nosso acúmulo de experiência, tudo o que fazemos, é uma distração, uma fuga desse vazio. Portanto, evidentemente, é preciso colocar fim a essas distrações e fugas. Se queremos compreender algo, temos de dedicar-lhe total atenção. E como podemos dedicar total atenção à solidão se a tememos, se fugimos dela por meio de alguma distração? Logo, quando queremos compreender a solidão, quando a nossa intenção é a de mergulhar total e completamente nela, porque percebemos que não pode haver criatividade enquanto não compreendemos essa insuficiência interior que é a causa fundamental do medo — quando chegamos a esse ponto, cessa toda forma de distração, não é verdade? Muitos riem da solidão, dizendo: Ora, isso é só para os burgueses; pelo amor de Deus, ocupe-se com alguma coisa e esqueça”. Mas o vazio não pode ser esquecido, não pode ser deixado de lado.

Assim, para se compreender de fato essa coisa fundamental a que damos o nome de solidão, todas as fugas devem cessar; mas a fuga não cessa por intermédio da preocupação, da busca de um resultado ou alguma ação do desejo. É preciso ver que, se não compreendemos a solidão, toda forma de ação é uma distração, uma fuga, um processo de auto-isolamento que apenas gera mais conflito, mais angústia.  Dar-se conta desse fato é essencial, porque só assim podemos encarar a solidão.

Então, se formos ainda mais longe, surge o problema de saber se o que chamamos de solidão é uma realidade ou apenas uma palavra. A solidão é uma realidade ou não passa de uma palavra que encobre algo que pode não ser o que pensamos dela? Não é a solidão um pensamento, um resultado do pensar? Ou seja, o pensamento é verbalização baseada na memória; e estaremos nós, com essa verbalização, com esse pensamento, com essa lembrança, olhando o estado que caracterizamos como de solidão? Logo, o simples fato de atribuir um nome a esse estado pode ser a causa do medo que nos impede de observá-lo mais de perto; e se não lhe damos um nome, que é fabricado pela mente, será esse um estado de solidão?

Claro que há diferença entre solidão e estar só. A solidão é o estado último do processo de auto-isolamento. Quanto mais consciente de si, tanto mais isolado você é, e a autoconsciência é o processo de isolamento. Mas o estar só não é estar isolado. O estar só apenas existe quando a solidão desaparece. O estar só é um estado em que todas as influências cessaram por inteiro, tanto as que vêm de fora como a influência interior da memória; e só quando a mente se acha nessa condição de estar sozinha pode ela conhecer o incorruptível. Para chegar a isso, contudo, temos de compreender a solidão, esse processo de isolamento que é o eu e a sua atividade. Assim sendo, a compreensão do eu é o começo do fim do isolamento e, portanto, da solidão.

Jiddu Krishnamurti — Seattle, 9 de agosto de 1950

sábado, 29 de dezembro de 2012

Quando a pessoa se torna consciente, se torna só

Você não pode tornar outra pessoa responsável por sua evolução. Aceitar esta situação dá-lhe forças. Você está no seu caminho para crescer, para evoluir.

Nós criamos deuses, ou nos refugiamos nos gurus, de tal forma que não tenhamos responsabilidade por nossas próprias vidas, por nossa própria evolução. Nós tentamos colocar a responsabilidade em algum lugar distante de nós. Se nós não somos capazes de aceitar algum deus ou algum guru, nós tentamos então escapar da responsabilidade através de intixicantes, ou drogas, através de alguma coisa que nos torne inconscientes. Mas estes esforços para negar a responsabilidade são absurdos, juvenis, insfantis. Eles apenas postergam o problema; não são soluções. Você pode postergar até à morte, mas o problema ainda permanece, o seu novo nascimento continuará no mesmo caminho.

Uma vez que você começa a se tornar consciente de que somente você é responsável, não há escape através de nenhum tipo de insconsciênia. E você é tolo de tentar escapar, porque a responsabilidade é uma grande oportunidade para a evolução. Da luta que é criada, algo novo pode evoluir.

Tornar-se consciente significa saber que tudo depende de você. Mesmo seu deus depende de você, porque ele é criado por sua imaginação. Tudo no fundo é uma parte de você, e você é responsável por ela. Não há ninguém para ouvir suas desculpas, não há cortes-de-apelos. Toda responsabilidade é sua.

E você é sozinho, absolutamente sozinho. Isto precisa ser compreendido muito claramente. No momento em que uma pessoa se torna consciente, ela se torna só. Assim não fuja desse fato através da sociedade, dos amigos, das associações, das multidões. Não fuja dele! É um grande fenômeno; todo o processo da evolução trabalha em direção a isso. A consciência chega ao ponto agora onde você sabe que está só. E somente no estado de ser sozinho é que você pode atingir a iluminação.

Eu não estou falando de solidão. O sentimento de solidão é aquele que vem quando o indivíduo foge do estado de ser sozinho, quando o indivíduo não está pronto para aceitá-lo. Se você não aceitar o fato de ser sozinho, então você se sentirá solitário. Então você encontrará alguma multidão ou alguns meios de intoxicação nos quais esquecer-se a si mesmo. A solidão criará sua própria mágica do esquecimento.

Se você puder estar , mesmo que por um momento apenas, totalmente só, o ego morrerá; o “Eu” morrerá. Você explodirá, você não será mais. O ego não pode permanecer só. Ele só pode existir em relação a outros. Sempre que você está só, um milagre acontece. O ego torna-se fraco, agora ele não pode continuar a existir por muito tempo. Assim, se você pode ser corajoso o bastante para estar só, você gradualmente tornar-se-á sem ego.

Estar só é um ato muito consciente e deliberado, mais deliberado do que o suicídio, porque o ego não pode existir sozinho; mas ele pode existir no suicídio. As pessoas egoísticas são as mais propensas ao suicídio. O suicídio está sempre em relação a alguém. nunca é um ato de isolamento. No suicídio, o ego não sofrerá. Ao contrário, tornar-se-á mais expressivo. Entrará em um novo nascimento com força maior.

Através do isolamento interior o ego se desmancha. Não há nada com o que se relacionar, desta forma não pode existir. Assim, se você está pronto para estar só, não vacilantemente — nem retrocendendo nem fugindo, apenas aceitando o fato do isolamento tal como ele é —, tornar-se-á uma grande oportunidade. Então você é como uma semente que tem muito potencial nela. Mas lembre-se, a semente deve destruir-se a si mesma para a planta crescer. O ego é uma semente, uma potencialidade. Se ele é destruído, o divino nasce. O divino não é nem o “Eu” nem o “Vós”, é o um. Através do isolamento interior você chega a esta unicidade.

Você pode criar falsos substitutos para esta unicidade. Os hindus tornam-se um, os cristãos tornam-se um, os maometanos tornam-se um; a Índia é um, a China é um. Isto são apenas substitutos para a unicidade. A unicidade vem somente através do isolamento interior total.

Uma multidão pode chamar a si mesma de um, mas a unicidade está sempre em oposião a alguma outra coisa. Já que a multidão está com você, você se sente descontraído. Agora você já não é mais o responsável. Você não destruiria um templo sozinho, você não incendiaria uma mesquita sozinho, mas como parte de uma multidão você pode fazê-lo, porque agora você não individualmente responsável. Todos os outros são responsáveis, assim ninguém em particular é responsável. Não há consciência individual, somente consciência grupal. Você regride na multidão e se torna tal como um animal.

A multidão é um falso substituto para o sentimento de unicidade. Aquele que está consciente da situação, consciente da sua responsabilidade como um ser humano, consciente da dificuldade, da tarefa árdua que vem com o ser humano, não escolhe quaisquer substitutos falsos. Ele vive com os fatos como são; ele não cria qualquer ficção. Suas religiões, suas ideologias políticas, são apenas ficções, criando um sentimento ilusório de unicidade.

A unicidade vem somente quando você se torna ausente de ego, e o ego pode morrer somente quando você está totalmente só. Quando você está completamente só, você não é. Aquele exato momento é o momento da explosão. Você explode para dentro do infinito. Isto, e somente isto, é evolução. Eu a chamo revolução, porque não é inconsciente. Você pode tornar-se sem ego ou não. Depende de você.

Estar só é a única revolução real. Muita coragem é necessária. Somente um Buda está só, somente um Jesus ou um Mahavir está só. Não que eles tenham deixado suas famílias, abandonando o mundo. parece assim, mas não é assim. Eles não estiveram abandonando coisas negativamente. O ato era positivo; era um movimento em direção ao isolamento. Eles não estavam abandonando. Eles estavam em busca de encontrarem isolamento interior.

A busca toda é por aquele momento de explosão quando o indivíduo está isolado. No isolamento há regozijo. E apenas então a iluminação é obtida.

Nós não podemos estar isolados, os outros não podem tampouco estar isolados, assim nós criamos grupos, famílias, sociedades, nações. Todas as nações, todas as famílias, todos os grupos, são feitos de covardes, daqueles que não são corajosos o suficiente para esteram sós.

Coragem real é a coragem de estar só. Significa entendimento consciente do fato de que você é sozinhoe você não pode ser diferente. Você pode ou enganar-se a si mesmo, ou viver com este fato. Você pode continuar enganando-se a si mesmo por vidas e vidas, mas continuará simplesmente num círculo vicioso. Somente se você viver com este fato do isolamento, o círculo é quebrado e você pode vir ao centro. Aquele centro é o centro da divindade, do todo, do santo.

Osho — A Psicologia do Esotérico

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Isolamento e solidão


PERGUNTA: Todos temos tido a experiência do isolamento, conhecemos suas tristezas e percebemos suas causas, suas raízes. Mas que é "estar só"? É diferente do isolamento?

KRISHNAMURTI:   Isolamento é a dor, a agonia da solidão, o estado em que vós e eu, como entidades, não nos ajustamos a coisa alguma, - seja o grupo, a nação, a esposa, os filhos, o marido, vemo-nos segregados de todos os demais. Vós conheceis esse estado. Mas conheceis o "estar só"?  Presumis que estais sós, mas estais realmente sós?
O "estar só" é diferente do isolamento, mas não podeis compreendê-lo, se não compreenderdes o isolamento. Conheceis o estado de isolamento? Vós o tendes observado sub-repticiamente, o tendes olhado com aversão. Para o conhecerdes bem, precisais entrar na sua intimidade, sem barreira alguma de permeio, sem conclusão, sem preconceito ou especulação; deveis chegar-vos com liberdade e não com temor. Para compreender o isolamento precisamos ir ao seu encontro sem nenhum sentimento de temor. Se nos chegamos, dizendo que já lhe conhecemos as causas, as raízes, não podemos compreendê-lo. Conheceis as raízes do isolamento? Só as conheceis teoricamente, do exterior. Conheceis a essência íntima do isolamento? Fazeis, apenas, uma descrição dela, mas a palavra não é a coisa, não é o real. Para o compreenderdes, tendes de chegar-vos sem nenhuma intenção de fuga. A simples idéia de fugir ao isolamento é em si uma forma de insuficiência interior. A maioria de nossas atividades não são evasões? Quando vos sentis só, ligais o rádio, executais pujas, sais em busca de gurus, conversais com amigos, ides ao cinema, às corridas, etc. Vossa vida de cada dia é um fugir de vós mesmos, e por isso todos os meios de fuga se tornam importantíssimos e competis uns com os outros por causa deles - quer se trate da bebida ou de Deus. A fuga é que constitui o problema, embora tenhamos diferentes maneiras de fugir.  Podeis causar malefícios imensos, psicologicamente, com as vossas fugas respeitáveis, e eu sociologicamente, com minhas fugas mundanas; mas, para se compreender a solidão, todas as fugas devem cessar - não por meio de coerção, de compulsão, mas com o perceber a falsidade da fuga.  Estais então em confronto direto com o que é, e aí começa o verdadeiro problema.
Que é o isolamento? Para o compreenderdes, não lhe deveis dar nome. O simples dar nome, a simples associação do pensamento com outras lembranças dele, acentuam mais ainda o isolamento. Experimentai-o, e vereis. Quando tiverdes desistido de fugir, vereis que, enquanto não compreenderdes o que é o isolamento, tudo o que fizerdes por sua causa é sempre um modo de fugir a ele.  Só compreendendo o isolamento sois capaz de o transcender.
A questão do "estar só" é inteiramente diferente. Nunca estamos sós; estamos sempre em companhia de outras pessoas, a não ser, talvez, quando damos passeios solitários. Somos o resultado de um "processo" total, constituído de influências econômicas, sociais, climáticas, e outras; e enquanto vivermos sujeitos a tais influências, não estaremos sós.- Enquanto houver o "processo" da acumulação e da experiência, nunca será possível “estarmos sós”. Podeis imaginar que estais só, quando vos isolais por meio de estreitas atividades individuais e pessoais; mas isso não é “estar só”. Só é possível “estar só”, quando não existem influência alguma. “Estar só” é ação que não é o resultado de uma reação, que não é uma resposta a desafio ou estímulo. O isolamento é um processo de exclusão, e nós procuramos o isolamento em todas as nossas relações, sendo esta a verdadeira essência do “eu” –meu trabalho, minha natureza, meu dever, minha propriedade, minhas relações. O próprio processo do pensamento, que é o resultado de todos os pensamentos e influências do homem, conduz ao isolamento. Compreender o isolamento não é um ato burguês; não podeis compreendê-lo enquanto houver em vós a dor daquela insuficiência não revelada que acompanha o sentimento de vazio e frustração. “Estar só” não é isolamento, e nem tampouco, o seu oposto; é um “estado de ser” em que há completa ausência da experiência e do conhecimento.

Krishnamurti – Madrasta, 5 de fevereiro de 1950
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill