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terça-feira, 12 de agosto de 2014

Não compreendemos a enorme significação do viver e do morrer

(...) Nesta tarde vamos conversar sobre a questão da morte. Porque é a morte o que mais tememos, a maioria de nós; tratamos de evitá-la, não queremos pensar nela, consideramo-la um assunto desagradável, que devemos afastar de nós, colocar à margem. Porque a morte nos aterroriza, temos uma crença — crença na ressurreição, numa continuidade, na imortalidade, na reencarnação. Mas, essa crença não resolve o problema do medo. Estão dizendo os cientistas que o homem pode viver indefinidamente. provavelmente encontrarão meios e modos de prolongar a vida humana. Mas, esse prolongamento não resolverá o problema do temor. 

E a sociedade, o ente humano que não resolveu esse problema da morte, tem uma existência muito superficial. Porque se há morte, aniquilamento, destruição, o fim de tudo, o indivíduo atravessa então como pode sua existência de aflições e ansiedades, e a vida, por conseguinte, se torna inteiramente sem significação; é isso o que está sucedendo no mundo moderno. Muitas civilizações já tentaram resolver o problema da morte. 

E por não sermos capazes de compreendê-la, tratamos de inventar teorias que nos pareçam satisfatórias e nos proporcionem conforto e consolação... Todo ente humano, não importa quanto tempo viva, existe sempre a questão da morte. A menos que ele a compreenda, que entre em contato direto com essa questão, esse problema, sua vida será e permanecerá sempre muito superficial. E a mente superficial procura dar significação ao viver por meio de seu condicionamento, de seu ambiente, da sociedade em que se desenvolveu...

Há, pois, a questão do medo da morte. Ora, para compreendê-la, o indivíduo tem de estar livre de todas as crenças, de todas as ideias de reencarnação ou ressurreição ou imortalidade pessoal. Nada se sabe a esse respeito. Se alguma coisa sabeis, trata-se de uma tradição, de um condicionamento verbal. Nunca entrastes diretamente em contato com a morte ou o medo relativo a esse fato. E, como disse, urge que o ente humano que vive neste mundo medonho, brutal, aterrador, com as suas guerras e antagonismos, urge que ele compreenda esse fato. Do contrário, a vida não terá nenhum significado. Frequentar um escritório diariamente, nos próximos vinte, trinta, quarenta anos, fazer repetidamente a mesma coisa desinteressadamente, gerar uns poucos filhos e viver perpetuamente em conflito consigo mesmo — isso nada significa. Quanto mais intelectual o indivíduo, quanto mais conhecedor do mundo, dos fatos que estão ocorrendo, tanto mais procura ele fugir da superficialidade mediante a bebida, divertimentos variados, o inventar uma filosofia, ou reverter à filosofia de um certo livro. É necessário, pois — se desejais tornar a vida uma coisa significativa, se desejais dar a vida significação, riqueza, plenitude, fazê-la completa —é necessário que compreendais esta questão do medo e da morte. 

(...) Assim, para se compreender esta questão da morte, devemos libertar-nos do medo, que inventa várias teorias sobre vida futura, imortalidade, reencarnação. Os que vivemos no Oriente dizemos que há reencarnação, que há renascimento, uma renovação constante, infinita, que existe o que se denomina "alma". Agora, escutai com atenção. 

Existe essa coisa? Gostamos de pensar que existe, dá-nos prazer de pensá-lo, pois trata-se de uma coisa que colocamos além do pensamento, além das palavras, além de tudo; uma coisa eterna, espiritual, imperecível; a ela, naturalmente, se apega o pensamento. Mas, existe essa coisa, essa alma, essa entidade, além do pensamento, entidade não inventada pelo homem, não formada por sua mente sutil? Porque a mente percebe que há enorme incerteza, confusão, e nada de permanente na vida, nada, absolutamente nada. Vossas relações, vossa esposa, vosso marido, vosso emprego — nada de permanente! Assim sendo, ela precisou inventar uma certa coisa permanente, a que chamou "alma". Mas, visto que a mente pode conceber essa coisa, também pode fazê-lo o pensamento; e já que o pensamento pode concebê-la, ela se acha na esfera do tempo, naturalmente. Se posso conceber uma coisa, essa coisa faz parte do pensamento. E meu pensamento resulta do tempo, da experiência, do conhecimento. A alma, portanto, está na esfera do tempo. Correto? Vede, por favor, não estamos aceitando nem rejeitando. Não estou fazendo propaganda de uma certa teoria, pois isso seria falta de madureza, infantilidade. estamos fazendo uma viagem de exploração. E essa exploração, se seguirdes passo a passo e penetrardes muito profundamente, poderá colocar-vos em contato com algo que vos fará medo. 

Assim, a ideia da continuidade de uma alma que renascerá vezes sobre vezes, infinitamente, não tem significação nenhuma, porque é invenção da mente que sente medo, da mente que deseja duração, permanência, que deseja certeza, esperança. Assim, o homem se apega a àquela ideia e, portanto, irá ter muitas vidas e trabalhos sem fim. Mas isso significa, se credes na reencarnação, que é muito importante que vos comporteis bem nesta vida, porque na próxima tereis de responder pelo que fizestes. — Mas a quase ninguém interessa o "comportar-se bem" — que significa "atuar virtuosamente". Se crêsseis realmente na reencarnação, vossos atos, vossa maneira de pensar, de viver, vossa dureza e indiferença para com todos, desapareceriam, porque teríeis de pagar por tudo isso na próxima vida, teríeis de sofrer. Mas, em nada disso acreditais. Com efeito, não credes. Trata-se de uma simples ideia, uma ideia que pensais ser muito espiritual, mas que é puro contra-senso. Entretanto, permanece o fato que é o medo da morte, o qual no Ocidente inventou uma diferente forma de ressurreição, de continuidade, numa diferente esfera de renovação. 

Há, pois, a questão do medo de uma coisa que desconhecemos e chamada "morte". Portanto, separamos a vida, o viver, da morte. E, assim, não compreendemos nem a vida nem a morte. Porque compreender a vida significa entranhar-se na vida, entrar em contato com a vida, que é avidez, inveja, brutalidade, ódio, guerras, fugas, bestialidade, ânsia de poder e de posição. É isso o que chamamos "vida". É essa a vida que viveis todos os dias, se sois sanyasi, se sois negociante, se sois artista. Há, internamente, uma certa coisa em efervescência. É essa coisa que chamamos "vida". Ainda não a compreendemos, ainda não nos livramos dela; não estamos livres de nossas ansiedades, de nosso "sentimento de culpa", de nossas agonias, e tampouco compreendemos essa imensidade que se chama "a morte". Não compreendemos o viver, nem compreendemos a enorme significação do morrer. 

Ora, tendes de compreender o viver — o viver que não é batalhar, que não é estar em conflito, que não é deixar-se torturar ou torturar a si próprio a fim de achar Deus. O ser humano que se tortura para encontrar Deus não é digno de achá-Lo. Nunca achará Deus! Pela deformação, não se encontra a Verdade. necessitamos de uma mente lúcida, sã, racional, vigorosa, e não uma mente torturada, deformada. 

Deveis, pois, ser livre, livrar-vos do medo à própria vida, livrar-vos de vossas ansiedades, de vossos conflitos, de vossa avareza, avidez, inveja, quer por causa de dinheiro, quer por causa de Deus. Se tudo isso deveis livrar-vos, para entrardes em contato direto com a vida; então, o viver está relacionado com o morrer. Peço-vos seguir o que vou dizer. Sem dúvida, o homem que não tem amor vive sempre no desespero; anda em contínua busca de autoridade, de posição, de prestígio; é invejoso, duro; esse homem não está vivendo. Não sabe o que é a vida. Só conhece sua mente insignificante — de político, de sanyasi, de negociante, de artista — essa mente pequenina, trivial, e suas tribulações. Nada mais conhece. Só quando estiver livre de sua mesquinhez, de seus temores, saberá ele o que é o viver. E quando souber o que é viver, saberá também o que é morrer. Pois nós separamos o viver do morrer, que, para nós, é chegar ao fim, psicológica e fisiologicamente. Pensamos estar vivendo. Nosso viver é penar. E se não findar nosso sofrimento, não haverá compreensão da morte. 

temos, pois, de investigar por nós mesmos, e não porque outro nos diz que o devemos fazer. tendes sido nutrido e continuais a ser nutrido dos descobrimentos feitos por outros; estais escravizados pela tradição, pela autoridade, pelo medo; e não descobristes ainda, como ente humano, vivente neste mundo de torturas e sofrimento, não descobristes ainda o meio de colocar fim ao sofrimento. Dele só sabemos fugir — por meio da bebida, dos divertimentos, do sexo, do templo, da leitura — temos dúzias de vias de fuga. Mas, cumpre, entrar em contato com o sofrimento, e extingui-lo. Só a mente que coloca termo ao sofrimento pode ter sabedoria. E só quem está livre do sofrimento pode saber o que significa amar. 

Nossa questão, pois, é esta: É possível vivermos neste mundo — agora, hoje, e não num futuro distante — livres do sofrimento e em contato com essa coisa que desconhecemos e que chamamos "morte"? O que tememos não é o desconhecido, porém perder o conhecido. Não achais? Não tendes medo da morte, do fim, mas temeis perder o que possuís, o que conheceis, vossa experiência, vossa família, vossos pequenos prazeres, vosso saber, vossa tecnologia, enfim, as coisas conhecidas. Dizeis: "Ora, aprendi tantas coisas, sei tantas coisas, e vem a morte e arrebata-me tudo". — Disso é que tendes medo, e não da morte, de sua sublime natureza. E que é isso a que estais apegado? O conhecido. E que é o conhecido? Vossa família, vossa casa, as ruas sujas e sem beleza; esforços, rivalidades, ansiedades; a rotina do escritório e a inevitável presença do "chefe". É só isso que conheceis e tendes medo de perder! Ora, soltar das mãos tudo isso, alegre e facilmente, com graça e beleza, significa "morrer para o conhecido". Sabereis então o que é morrer, conhecereis então o desconhecido. 

(...) Morrer, pois, é morrer para as coisas que conhecemos, não apenas as desagradáveis, mas também as agradáveis. Bem que gostaríeis de afastar de vós, de morrer para a lembrança das dores e mágoas que sofrestes; mas gostaríeis de conservar a lembrança das coisas agradáveis, proporcionadoras de satisfação. Mas, colocar termo, morrer tanto para o prazer como para a dor, isso só será possível se aplicardes toda a vossa atenção a cada pensamento, cada sentimento. Atenção, e não contradição; não é citar aquilo de que "gosto" e aquilo de que "não gosto" — porém, tão-só, prestar atenção. 

(...) Se a mente compreendeu a natureza do medo, a natureza da morte, e essa coisa extraordinária chamada "amor", se de fato compreendeu, o que não é verbalizar nem pensar a seu respeito, mas tê-las vivido, então, dessa compreensão, surge uma mente nova, uma mente ativa e ao mesmo tempo inteiramente silenciosa. Esse "processo" da compreensão da vida, da libertação de todas as nossas lutas, não futuramente, porém imediatamente, essa aplicação total da atenção — eis o que é meditação. Meditação não é ficar sentado a um canto, pegando no nariz e repetindo palavras estúpidas; isso não é meditação, absolutamente; é auto-hipnotismo. Mas a compreensão da vida, a libertação do sofrimento — de fato, e não verbal ou teoricamente: realmente — a libertação do medo e da morte exige silêncio da mente. Isso é meditação. 

Krishnamurti — 18 de novembro de 1965
A Suprema Realização

Entrando em contato com essa coisa extraordinária chamada "morte"

Todos sabeis que a morte é inevitável — inevitável, por ação da senilidade, da velhice, de doença, de acidente. Embora os cientistas estejam tentando prolongar a vida humana por mais cinquenta anos ou além, a morte é inevitável. Porque querem prolongar esta existência de agonias, só Deus sabe!Mas é o que queremos. E, para compreendermos a morte, temos de entrar em contato com ela; isso requer uma mente que não tenha medo, que não esteja pensando em termos de tempo, vivendo na dimensão do tempo. Viver com a morte — vou considerar este ponto. 

Pusemos a morte no fim da vida; ela está em alguma parte, ao longe. Queremos afastá-la de nós o mais possível, colocá-la o mais longe possível. Sabemos que há a morte. Por isso, inventamos a vida futura. Dizemos: "Vivi, formei meu caráter, fiz coisas. Tudo isso irá acabar-se com a morte? Tem de haver uma vida futura". O futuro, a próxima vida, a reencarnação — tudo são fugas ao fato de hoje, fugas ao contato com a morte. 

Pensai em vossa vida; o que ela é?  Olhai essa vida, que tanto desejais prolongar! O que é a vossa vida? Batalha incessante, constante confusão, fugazes lampejos de alegria, tédio, medo, agonia, desespero, ciúme, inveja, ambição — eis a vossa vida real, com seus males e sua insignificância. E desejais prolongar essa vida, após a morte! 

E, se credes em reencarnação — como de vós se espera, já que vossas escrituras falam sobre ela — se acreditais na reencarnação, então o que tem a verdadeira importância é o que sois agora. Porque o que sois agora irá condicionar o vosso futuro. Assim, o que sois, o que fazeis, o que pensais, o que sentis, como viveis — tudo isso é de infinita relevância. Se não credes na reencarnação, então, só há esta vida — e, portanto, é sobremodo importante o que fazeis, o que pensais, o que sentis, se explorais os outros ou não, se amais, se tendes sentimentos, se sois sensíveis, se há beleza. Mas, para viverdes dessa maneira, deveis compreender a morte, em vez de relegá-la para o fim de vossa vida — que é uma vida de sofrimento, de medo, de desespero, uma vida de incerteza. Consequentemente, tendes de trazer a morte para bem perto de vós; isto é; tendes de morrer

Sabeis o que significa "morrer"? Já tendes visto o bastante da morte. Já vistes um homem morto ser levado para o crematório, para ser destruído. Tendes visto a morte. A maioria das pessoas a teme. A morte é assim como o perecer daquela flor, daquela trepadeira, com toda a sua glória. Com sua beleza, sua delicadeza, ela morre sem pesares, sem "discussão"; chega a seu fim. Mas, nós fugimos da morte por meio do tempo — quer dizer, colocamo-la "lá longe". Digo: "tenho poucos anos de vida, e renascerei para outra vida"; ou: "Esta é a única vida e, portanto, quero tirar dela o melhor proveiro, gozá-la o mais possível, fazer dela um "espetáculo". Dessa forma, nunca entramos em contato com essa coisa extraordinária chamada "a morte". A  morte é: morrer para todas as coisas do passado, morrer para os vossos prazeres. 

Alguma vez já experimentastes morrer para um prazer — sem "discussão", sem persuasão, sem compulsão, sem pressão? Vós tendes de morrer, inevitavelmente. Mas, já experimentastes morrer hoje, de maneira fácil e feliz, para vossos prazeres, vossas lembranças, vossos rancores, vossa ânsia de juntar dinheiro? Tudo o que quereis da vida é dinheiro, posição, poder, e ser invejado por outros. Podeis morrer para essas coisas, podeis morrer para as coisas que conheceis, de maneira fácil, sem "discussão", sem explicações? Tende em mente, por favor, que não estais ouvindo umas poucas palavras e ideias, porém, realmente entrando em contato com o prazer — vosso prazer sexual, por exemplo — e para ele morrendo. Isso de qualquer maneira terá de acontecer, pois tendes de morrer, para tudo o que sabeis, para o vosso corpo, vossa mente, tudo o que edificastes. Mas, direis: "É só isso que ofereceis? Toda a minha vida tem de terminar na morte?" — Tudo aquilo que fizestes, os serviços que prestastes, os livros que lestes, o conhecimento e as experiências que adquiristes, os prazeres, a afeição, a família — tudo termina na morte, que tendes à vossa frente. Ou morreis para tudo isso agora, ou inevitavelmente morrereis quando chegar a hora. Só um homem inteligente que compreender todo esse "processo", só ele é um homem religioso. 

O homem que coloca vestes de sanyasi, cria barbas, vai para o templo e foge da vida — não é um homem religioso. O homem religioso é aquele que morre todos os dias e renasce todos os dias. Sua mente é sempre nova, inocente, vigorosa.  Morrer para vossos sofrimentos, morrer para os vossos prazeres, morrer para as coisas que abrigais secretamente no coração — fazei-o! Dessa maneira, vereis que não estareis desperdiçando a vossa vida! Descobrireis algo de incrível, algo que nenhum homem jamais viu! Isso não é uma recompensa. Não há recompensa. Ou morreis voluntariamente, ou morreis inevitavelmente. Tendes de morrer todos os dias, naturalmente, assim como morre a flor para a sua beleza e seu esplendor; morrer todos os dias, para o vosso amor, vossa experiência e saber, para diariamente renascerdes com uma mente nova.

Necessitais de uma  mente nova; do contrário, não conhecereis o amor. Se não morreis, vosso amor é simples memória; e está todo embebido de inveja e ciúme. Tendes de morrer, todos os dias, para tudo o que sabeis e conheceis, para vossos ódios, vossos insultos, vossas lisonjas. Morrei para tudo isso! vereis então que o tempo nada significa: não há amanhã, porém somente agora, acima do ontem, do hoje e do amanhã. Só agora existe amor. 

O ser humano que não conhece o amor não pode conhecer a Verdade. Se não há amor, podeis fazer o que quiserdes — praticar todos os sacrifícios, e votos de celibato, e trabalhos sociais, e explorações — nada tem valor algum.  — E não podeis amar, se não morreis todos os dias para vossa memória. Porque o amor não pertence à memória: é uma coisa viva. Uma coisa viva é um movimento; e esse movimento não pode ser engaiolado em palavras, nem em pensamentos, nem numa mente que só busca seus próprios interesses. Só a mente que compreendeu o tempo, que colocou fim ao sofrimento, que não conhece o medo — só essa mente sabe o que é a morte; por conseguinte, essa mente conhece a VIDA. 

Krishnamurti — 24 de fevereiro de 1965
A Suprema Realização

terça-feira, 15 de abril de 2014

Morrer deve ser a mais maravilhosa das experiências!

Que é a morte? Que significa isto — morrer? Morrer deve ser a mais maravilhosa das experiências! Deve significar que uma coisa chegou completamente a seu fim. O movimento que fora desencadeado — conflito, luta, confusão, desesperos e frustrações — cessou subitamente. A atividade do homem que quer tornar-se famoso, que é arrogante, violento, brutal — essa atividade é interrompida. Já notaram que tudo o que tem continuidade psicológica se torna mecânico, "repetitivo"? Só quando cessa a continuidade psicológica, surge alguma coisa totalmente nova; isso podem observar em si mesmos. Criação não é a continuidade do que É ou do que FOI, mas o findar dessa continuidade. 

Ora, pode-se morrer psicologicamente? Entendem essa pergunta? Podem morrer para o conhecido, morrer para o que FOI — não com o fim de se tronarem outra coisa — sendo esse morrer o fim do conhecido, a libertação do conhecido? Afinal de contas, a morte é isso. 

O organismo físico, naturalmente, morrerá; dele se abusou, foi submetido a maltratos e frustrações; comeu e bebeu coisas de toda espécie. Vocês sabem de que maneira vivem, e pelo mesmo caminho continuam até ele (o organismo físico) perecer. O corpo, por motivo de acidente, de velhice, de doença, da tensão da constante batalha emocional, no interior e no exterior, se deforma, torna-se feio, e morre. Nesse morrer há autocompaixão, e ela existe também quando outra pessoa morre. Quando morre alguém que pensamos amar, não há em nossa tristeza uma grande porção de medo? Porque nos vemos sós, abertos a nós mesmos, sem ninguém para nos amparar, nos dar conforto. Nossa tristeza é toda mesclada dessa autocompaixão e desse medo e, naturalmente, nessa incerteza, aceitamos qualquer espécie de crença. 

A Ásia inteira crê na reencarnação, no renascer em outra vida. Se indagamos o que é que vai renascer na próxima vida, nos deparamos com dificuldades. Que é que vai renascer? Sua pessoa? Que é você? — um monte de palavras, de opiniões, apegos as suas posses, aos seus móveis, seu condicionamento. Esse monte de coisas, que chamam de sua alma, vai renascer na próxima vida? Reencarnação implica que o que hoje são determina o que serão na próxima vida. Portanto, comportem-se bem! — não amanhã, mas hoje, porque pelo que hoje fazem irão pagar na próxima vida. Os que creem na reencarnação pouco se importam com o seu comportamento; trata-se de uma mera crença, sem nenhum valor. Reencarnem-se hoje, renovem-se hoje, e não na próxima vida! Mudem completamente ESTA VIDA, agora; mudem-na com uma grande paixão, façam a mente despojar-se de todas as coisas, de todos os condicionamentos, de todos os conhecimentos, de tudo o que pensar ser "correto"; esvaziem-na. Saberão então o que significa morrer; saberão então o que é o amor. Porque o amor não pertence ao passado, ao pensamento, à cultura; não é, tampouco, prazer. A mente que compreendeu o inteiro movimento do pensamento se torna sobremaneira quieta, absolutamente silenciosa. Esse silêncio é o começo do novo.

Krishnamurti — A questão do impossível

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Por que existe o temor da morte?

Ora bem, por que existe o temor da morte? O temor da morte existe porque estamos apegados à continuidade. Estou escrevendo um livro, e pode acontecer que eu morra amanhã, antes de concluí-lo; estou juntando dinheiro, e posso morrer sem realizar o meu propósito; desejo ardentemente ser alguma coisa e não sou. Temos, assim, o temor da morte. Haverá temor da morte, enquanto houver o desejo de continuidade — continuidade de ação, continuidade de caráter, continuidade de realização, continuidade de faculdade, continuidade de uma conta bancária, de um nome, de uma família. Enquanto houver o agente, que é a ação em busca de um resultado, há de haver continuidade, e, portanto, o temor da descontinuidade; porque a morte pode não me deixar acabar o livro, colocar fim à minha conta no banco, às qualidades, às características que tenho cultivado. Tudo isso tem de acabar, e por isso existe o temor. Por conseguinte, haverá medo da morte, enquanto houver continuidade.

Que acontece quando há esse senso de continuidade? Não estamos discutindo se há continuidade ou não, mas sim a ação que exerce na mente a ideia da continuidade. Já notaram o que acontece a uma coisa que continua? Tudo o que continua está em estado de contínua desintegração, não é verdade? Se vocês têm um problema que continua através de um período de anos, causando-lhes constante preocupação, há desintegração, não é verdade? Qualquer forma de continuidade, quer ignóbil, quer nobre, é um processo de desintegração. Se percebemos essa verdade — que qualquer forma de continuidade é um processo de desintegração — percebemos também a verdade acerca do falso. Temos, portanto, a libertação do falso, o que significa viver constantemente no presente, e não em continuidade; e cessa, por conseguinte, o temor da morte. É só quando a mente está presa na rede da continuidade que há o temor da morte; e só quando a mente reconhece que tudo o que continua nunca se renova, há isenção do medo da morte. Como pode haver renovação enquanto há continuidade? Só pode haver renovação quando há um findar, isto é, quando há morte. Não sei se já notaram que quando liquidamos um problema, dá-se uma renovação; mas enquanto o problema persiste, há decomposição. Não é possível viver cada dia, cada minuto, acompanhando cada pensamento até à sua conclusão, para que ele não seja continuado? Quer dizer, não é possível viver com a morte, morrendo momento por momento? Só então se dá a renovação; porque só no terminar há renovação, não na continuidade. A renovação e a continuidade são contraditórias. Na continuidade, não há renascimento, não há renovação, nem criação, mas só no findar. Quando um problema termina, um novo problema pode manifestar-se; mas no intervalo entre dois problemas, há sempre renovação. E por conseguinte, não há temor da morte.

Expressando-o diferentemente: a morte é o estado de não continuidade, que é o estado de renascimento. A morte é o desconhecido, porque é um findar, no qual há renovação. Mas uma mente que é contínua não pode conhecer o desconhecido; só pode conhecer o conhecido, porque só pode agir e mover-se no conhecido, que é o contínuo. Por conseguinte, o conhecido, o contínuo, está sempre cheio de temor do desconhecido, da morte, na qual, tão só, temos a renovação. No findar há renovação, e não na continuidade. Por essa razão, o desconhecido nunca pode ser conhecido por intermédio do contínuo. Por conseguinte, a morte permanece um mistério, porque nós sempre procuramos conhece-la através do conhecido, através do contínuo. Se puderem colocar fim a essa continuidade, dia a dia, momento por momento, verão que há renovação; há morte, na qual há renovação. A morte, por conseguinte, não é temível; porque no findar há renascimento, e na continuidade há decomposição, desintegração. Pensem nisso a fundo, Senhores, e perceberão a sua beleza, a sua verdade. Não é teoria, é um fato. O que tem fim tem renascimento; o que é contínuo nunca conhecerá renovação. A morte é o desconhecido, e o que é contínuo é o conhecido. O contínuo nunca pode conhecer o desconhecido e por isso teme o desconhecido, perturba-se diante dele. A imortalidade não é o “eu” continuado. O “eu” pertence ao tempo, é resultado do tempo. O que é imortal está fora do tempo. Por conseguinte, não há relação entre o “eu” e o atemporal. Gostamos de pensar assim, mas esse é outra emboscada que a mente nos prega. O que é imortal não pode ser encaixado no mortal, não pode ser colhido na rede do tempo. Só quando o “eu”, que é continuidade, que é tempo, chega ao fim, alcançamos aquele estado que é imperecível, imortal. Afinal de contas, temos terror à morte por força do hábito, porque o desejo busca a continuidade no preenchimento. O preenchimento, porém, não tem fim, está sempre buscando outras fontes de satisfação. O desejo busca constantemente novos objetos de preenchimento, fazendo assim nascer a continuidade, que é o tempo. Mas se cada desejo for compreendido ao surgir, ele se extinguirá e haverá então renovação. Essa renovação pode constar de um novo desejo, não importa: continuem até o fim, fazendo cada desejo extinguir-se e, desse terminar de momento em momento, verão surgir uma renovação, que não é a renovação do desejo, mas a renovação que a verdade nos dá. E a verdade não é contínua; a verdade é um “estado de ser” atemporal. Esse estado só pode experimentar-se quando cada desejo, que dá nascimento à continuidade, é compreendido e, assim, extinto. O conhecido não pode conhecer o desconhecido. A mente, que é o resultado do conhecido, do passado, não pode conhecer o imensurável, o atemporal. A mente, o processo de pensamento, precisa terminar; então, o incognoscível, o imensurável, o eterno vem à existência.


Jiddu Krishnamurti — Da insatisfação à felicidade     

sábado, 14 de setembro de 2013

Por que temos medo de morrer?

Todos nós, velhos e moços, tememos a morte. Assim, racionalizamo-la, aceitamo-la como coisa inevitável, conformando-nos com ela, ou esquecemo-la; porém, ela está sempre presente. Ou, ainda, criamos crenças, a fim de fugir ao fato, crença na reencarnação, na ressurreição, etc. O pensamento, a seu turno, teme o fim que a morte lhe dará. Não só o organismo, mas toda a estrutura psicológica criada pelo pensamento está fadada a acabar não preenchida e a desejar mais alguns anos de vida para fazer isto ou aquilo, para corrigir o que foi e transformá-lo no que “deveria ser”.

Consciente ou inconscientemente sabemos que a morte significa a cessação do pensamento, ou disso que pensamos ser “pensamento”; a cessação do EU, embora este esteja sempre a inventar estruturas e esperanças. Morremos por doença, velhice, acidente, ou deliberadamente pomos fim à nossa vida, vendo que é tão fútil e tediosa, com sua insuportável rotina. Não vemos na vida, nenhum significado, nenhuma felicidade. Com efeito, se o observarmos bem, mal podemos descobrir em nosso viver alguma significação. Seguimos vivendo, dia por dia, com nossa rotina, nosso tédio, a repetição de nossos prazeres e dores e tudo o mais que constitui a nossa existência sem sensibilidade e sem significação. Ao percebermos isso, procuramos dar significado à vida  inventamos uma significação: Deus, atividades elevadoras, preenchimento, escrever livros, fazer isto e mais aquilo — a atividade incessante desse macaco que é o EU.

Temos medo de morrer. Para pormos fim ao medo da morte, temos de entrar em contato com a morte, não com a imagem que o pensamento criou a respeito da morte, porém devemos sentir realmente aquele estado. De outro modo, o medo não tem fim, porque a palavra “morte” gera medo e não gostamos de pronunciá-la. Podemos, como entes equilibrados, normais, capazes de raciocinar claramente, de pensar e observar objetivamente, entrar totalmente em contato com o fato? O organismo, pelo constante desgaste, ou por doença, terá de, afinal, morrer. Se somos pessoas equilibradas, desejamos descobrir o que significa a morte. Não é esse um desejo mórbido, porquanto é bem possível que, pelo morrer, compreendamos o viver. Nosso viver atual é tortura, infinita agitação, contradição e, por conseguinte, conflito, aflição e confusão. Ir todos os dias para o trabalho, a repetição de prazeres e concomitantes dores, o tatear, as incertezas — isso é o que chamamos “viver”. Já nos habituamos a essa espécie de vida. Aceitamo-la, com ela envelhecemos e morremos.

Para descobrirmos o que é viver, e também descobrir o que é morrer, precisamos entrar em contato com a morte, isto é, temos de finalizar, todos os dias, tudo o que conhecemos. Temos de destruir a imagem que formamos a respeito de nós mesmos, de nossa família, de nossos conhecidos, a imagem que formamos por meio do prazer, por meio de nossas relações com a sociedade; temos de destruir tudo. É isso o que de fato vai suceder quando a morte chegar. Saberemos então o que significa morrer e, também, o que significa viver, porque morreremos então para todas as aflições, todos os conflitos, todas as lutas. Só no morrer há uma coisa nova. Nunca haverá nada novo enquanto o tempo existir. O novo só pode vir quando o tempo finda, o tempo, que é duração. O tempo, tal como o conhecemos, é ontem, hoje e amanhã. Nessa corrente do tempo estamos a debater-nos, tentando, dentro dela, resolver os nossos problemas.

O problema só poderá ser resolvido quando o tempo terminar — o tempo como ontem, hoje e amanhã. Temos de morrer para a memória, para as ofensas, para todas as imagens que formamos com o presente — imagens relativas a nós mesmos, aos outros, ou ao mundo. Entra-se então em direto contato com a realidade, a qual tanto é o viver como o morrer e na qual não existe medo nenhum. Essa realidade só pode verificar-se na total inação — na inação em que o pensamento, tendo compreendido o lugar que lhe compete, nenhuma existência tem numa diferente dimensão.

Jiddu Krishnamurti — Encontro com o eterno

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Existe separação entre o viver e o morrer?

É verdadeiramente interessante observar o funcionamento de nosso próprio pensar, observar essa reação que chamamos pensar. De onde ela nasce? Obviamente da memória. Existe um começo do pensamento?... "Posso descobrir o começo do pensamento, isto é, o começo da memória?" — pois se vocês não tivessem memória não teriam o pensamento. Qual é o começo do pensamento, e tem ele alguma importância? O pensamento tem para nós extraordinária importância. Quanto mais inteligente, e sagaz, e sutil, tanto melhor sabemos expressá-lo. Vocês sabem quantas ideias, racionais ou não, enchem os livros dos intelectuais, teólogos ou não teólogos — de Santo Tomás, ou de Sankara, ou dos intelectuais do Extremo Oriente. Quer no campo sectário, religioso, quer no campo não religioso, encheram-se milhares de livros de ideias e nós veneramos esses livros e essas ideias, que são para nós de tremenda importância. Estamos fortemente condicionados. E, aqui, quando falamos sobre ideias, as estamos atacando nas próprias raízes, e não simplesmente umas poucas ideias insignificantes; estamos atacando todas as formulações de ideias.

Para nós, o pensar — ideias, ideais — o analisar, o apresentar dialeticamente opiniões, etc. se tornou extraordinariamente importante. E, aqui, estamos questionando todo esse edifício — inclusive o edifício da Igreja, com todos os seus dogmas e crenças, suas fórmulas de Deus, da Virgem Maria e do salvador. O mundo cristão e o mundo asiático têm, cada um deles, sua estrutura própria, seu próprio edifício, seus próprios andaimes para alcançar os Deuses, e quando falamos sobre o pensamento como ideia e tempo, estamos questionando tudo isso.

Como entes humanos que têm de viver nesta sociedade monstruosa e horrível, com suas brutalidades, seus "pecados" e ansiedades, seus temores e guerras e desesperos — estamos nos interrogando: "Pode isso acabar?" — não como esperança, porém como fato? Pode a mente tornar-se vigorosa, nova e inocente, para que possa olhar esta existência e criar um mundo totalmente diferente?

Como vemos, separamos a ação da ideia e, para nós, as ideias se tornam muito mais importantes do que a ação. Mas, as ideias estão sempre no passado e a ação sempre no presente. Como esse presente vivo nos assusta, o passado e as ideias se tornam importantíssimos, e por isso há a morte.

Um dos fatores da vida é a morte. Temos medo do viver, da velhice, da doença, da dor e do sofrimento, que conhecemos desde o momento de nascermos até o momento de morrermos. Isto é o que chamamos viver. E temos medo também de algo que desconhecemos, e que chamamos morte. Esse campo, todo inteiro, é nossa vida.

Vê-se como o pensamento cria o medo... Temos, pois, medo da vida e medo da morte, do conhecido e do desconhecido, e esse medo é gerado pelo pensamento. Acumulei experiência, alcancei um certo posto, uma certa posição, adquiri um certo saber que me dá vitalidade, energia, impulso. Esse ímpeto (momentum) do pensamento me sustenta e tenho medo de perdê-lo. A todo aquele que ameaça meu triunfo, meu êxito, meu pedestal, eu detesto, odeio, sou seu inimigo. Ora isso é bem óbvio. Vocês não sabem, quando em seus negócios, ou em suas atividades de instrutor, alguém lhes supera, não sabem como sentem medo, hostilidade? Continuam a falar em Deus, em vida espiritual, etc., mas no coração de vocês há veneno. Vocês têm medo de perder suas posições, e também sentem medo de outra coisa muito mais temível que há de vir  a morte. Pensam, pois, na morte e, nela pensando, estão criando aquele intervalo entre o viver e aquilo que chamam "morte". Isso é bastante simples. As coisas que sabem, os prazeres, as alegrias, os divertimentos, o conhecimento, a experiência, os triunfos, os desesperos, os conflitos, os domínios, suas casas, suas famílias, suas insignificantes nações — a tudo isso estão ferozmente apegados, porque é só o que possuem. Pelo pensar nessas coisas, criam um intervalo entre o que pensam, como ideia, ser duradouro, e o fato real.

O pensamento gera, por meio do tempo, não só o medo de viver, senão também o medo da morte, e porque a morte é algo que desconhecem, o pensamento diz: "Adiemo-la, evitemo-la, mantenhamo-la o mais distante possível, não pensemos nela". Mas vocês pensam nela, Quando dizem "não quero pensar nela", nela já pensaram. Vocês têm idealizado maneiras de fugirem dela e sabem evitá-la por vários meios — igrejas, deuses, salvadores, a ressurreição e a ideia de que existe um EU permanente, eterno, que a Índia, que a Ásia inventou. Isto é, o pensamento afirmou-nos muito sutilmente que, em vocês, em mim, existe uma realidade que existirá eternamente — mas isso, uma vez que é "coisa pensada", não é o real. O pensamento criou a ideia de um EU eterno — alma, Atman, — a fim de encontrar a segurança, a esperança, mas toda coisa criada pelo pensamento já é de "segunda mão", porque o pensamento é sempre velho. Tememos a morte, porque a temos adiado. Assim, deparamo-nos com o problema de como transcender essa coisa chamada viver e a coisa chamada morte. Existe real separação entre as duas? Compreendem? Viver intensamente significa, decerto, morrer para todas as coisas de ontem — todos os prazeres, conhecimentos, opiniões, juízos, nossos estúpidos e insignificantes sucessos; morrer para tudo isso; morrer para a família, para as nossas conquistas, que só tem produzido caos no mundo e tamanho conflito em nós mesmos. Pois esse morrer cria uma intensidade, um estado mental em que o passado deixou de existir, e o futuro, na figura da morte, extinguiu-se. Assim, viver é morrer; não podem viver se não há morrer. Mas, a maioria de nós sente medo porque deseja segurança, deseja a continuidade da aflição que conhecemos, da doença, da dor, do prazer, da ansiedade. Porque evitamos e repelimos a morte (o pensamento repele a morte), há o medo ao conhecido e o medo ao desconhecido. Quando não existe intervalo entre a morte e o viver, sabe-se então o que significa o morrer, morrer para tudo o que temos. Torna-se então a mente sobremodo juvenil e ardorosa, vigilante e inocente. Quando morremos para os milhares de dias passados — então viver é morrer. Só nesse estado o tempo cessa, e o pensamento só funciona onde dele necessitamos e em nenhum outro nível, em nenhum outro caso, em nenhuma outra de nossas pretensões.

Jiddu krishnamurti — Como viver neste mundo


segunda-feira, 19 de agosto de 2013

A verdadeira reencarnação

Cabe-lhe também descobrir o que é a morte — não no último minuto, prostrado pela doença, inconsciente, sem lucidez; a isso todos estamos sujeitos: velhice, doença e morte. Impende-nos descobrir o que é a morte enquanto está novo, vigoroso, ativo, frequentando diariamente seu escritório e de lá voltando para casa — sua “prisão particular”.

O organismo pode durar mais, conforme a espécie de vida que levamos. Se nossa vida, do nascimento à morte, é uma batalha, o corpo se desgasta mais rapidamente. O coração está sujeito a constante tensão. Isso é um fato incontestável. Para se descobrir o que é a morte, não deve haver medo; e a maioria de nós teme a morte, deixar nossas famílias, largar as coisas que acumulamos, ou nossos conhecimentos e nossos livros. Não sabendo o que acontece ao morrermos, a mente — isto é, o pensamento — diz que deve haver outra espécie de vida. A vida deve continuar de alguma maneira, nossa vida individual. Eis aí toda a estrutura da crença — da sua crença na reencarnação. O que é que renascerá na próxima vida: sua acumulação de conhecimentos, seus pensamentos e atividades, as ações belas ou feias que praticou? Se você acredita realmente em karma, então, o que importa é o que agora, nesta vida, você faz, como agora se comporta, porque na próxima vida pagará suas culpas.

Assim, se realmente você se acha enredado nessa crença, deve prestar toda a atenção a sua vida de agora. Cabe-lhe descobrir o que significa morrer — não fisicamente, que é inevitável — morrer para tudo o que conhece, para sua família, seus apegos, para todas as coisas que você acumulou, para seus acostumados prazeres e temores, morrer a cada minuto, para você ter sempre uma mente nova, pura e, por conseguinte, “inocente”. Haverá, assim, “encarnação” em cada novo dia. Encarnar todos os dias é muito mais importante do que encarnar na vida futura. Essa “encarnação” lhe dará uma mente sobremodo “inocente”. A mente “inocente” nunca pode ferir-se. Por conseguinte, a mente que se fere deve morrer, cada dia, para seus ferimentos, para que possa, em cada manhã, achar-se renovada, lúcida, sem máculas nem cicatrizes. Eis a verdadeira maneira de viver.

Jiddu Krishnamurti — 31 de janeiro de 1971


sexta-feira, 19 de julho de 2013

Estamos morrendo, não estamos vivendo

Pergunta: O que é que nos faz temer a morte?

Krishnamurti: Você pensa que uma folha que cai ao chão tem medo da morte? Pensa que um pássaro vive com medo de morrer? Ele se encontra com a morte, quando ela vem; mas a morte não lhe dá cuidados, pois está todo ocupado com o viver, com apanhar insetos, construir seu ninho, cantar seus cantos, voar pela simples alegria de voar. Você já observou os pássaros a voar muito alto, sem um bater de asas, deixando-se levar pelo vento? Como parecem se deliciar! Não têm preocupações sobre a morte. Quando a morte chegar, muito bem, acabou-se tudo. Mas, não lhe dá cuidados o que irá acontecer; eles vivem momento por momento, não é verdade? Só nós, entes humanos, estamos sempre preocupados com a morte — porque não estamos vivendo. Esta é que é a desgraça: estamos morrendo, não estamos vivendo. Os velhos estão se aproximando da sepultura, e os mais novos não lhe ficam muito atrás.

Veja, existe esta preocupação com a morte, porque tememos perder o “conhecido”, as coisas que temos acumulado. Temos medo de perder a mulher ou o marido, um filho ou um amigo; temos medo de perder o que aprendemos, acumulamos. Se pudéssemos levar conosco tudo o que acumulamos — nossos amigos, nossos bens, nossas virtudes, nosso caráter — não temeríamos a morte, não é verdade? É por isso que inventamos teorias a respeito da morte e da vida futura. Mas o fato é que a morte é um findar, e a maioria de nós não tem vontade de enfrentar este fato. Não queremos nos separar do conhecido; portanto, é nosso apego ao conhecido que cria em nós o medo, e não o desconhecido. O desconhecido não pode ser percebido pelo conhecido. Mas a mente, constituída que é do conhecido, diz: “Eu acabarei” — e, por conseguinte, tem medo.


Ora, se você puder viver a cada momento sem preocupações sobre o futuro; se puder viver sem a ideia de “amanhã” (o que, entretanto, não implica a superficialidade de ocupar-se meramente com o dia de hoje); se, cônscio do inteiro “processo” do conhecido, você puder abandonar o conhecido, soltá-lo completamente, verá então ocorrer uma coisa estupenda. Experimentará isso um dia; coloque para o lado tudo o que você conhece, esqueça-o, para ver o que acontece. Não transporte suas tribulações de dia para dia, de hora para hora, de momento para momento; “solte-as” todas, e você verá como, dessa liberdade, surge uma vida maravilhosa, que incluirá tanto o viver como o morrer. A morte significa apenas o fim de uma coisa — e nesse próprio findar há renovação.  

Krishnamurti — A cultura e o problema humano

Por que temos medo de morrer?

Você sabe o que significa busca a permanência? Significa desejar que as coisas agradáveis durem eternamente, e as desagradáveis terminem o mais rápido possível Desejamos que nosso nome se torne famoso e tenha continuidade em nossa família e em nossos bens materiais; queremos o sentimento de permanência em nossas relações e atividades; e tudo isso significa que desejamos uma existência duradoura, contínua, em nosso fosso estagnado; lá, não queremos verdadeiras mudanças e, assim, edificamos uma sociedade que nos garante a permanência de nossos bens, nosso nome, nossa fama.

Mas, veja, a vida de modo algum é assim; a vida não é permanente. Como as folhas que caem da árvore, todas as coisas são impermanentes, nada perdura; há sempre mutação e morte. Você já observou uma árvore nua, desenhada contra o céu? Em seus galhos bem delineados, em sua nudez, há um poema, uma canção. Foram-se todas as suas folhas, e ela aguarda a primavera. Com a vinda da primavera, de novo se enche a árvore com a música de suas folhas que, na estação própria, caem e são levadas pelo vento. Assim também é a vida.

Mas nós não a queremos assim. Apegamos-nos aos nossos filhos, nossas tradições, nossa sociedade e nossas insignificantes virtudes, porque desejamos permanência; por isso é que temos medo de morrer. Tememos perder as coisas que conhecemos. Mas a vida não é como desejamos; a vida em coisa nenhuma é permanente. Os pássaros morem, a neve derrete, as árvores são abatidas pelo homem ou destruídas pelas tempestades, e assim por diante. Mas, queremos que perdure a nossa posição, a autoridade que sobre outros exercemos. Recusamo-nos a aceitar a vida como efetivamente é.

O fato é que a vida é como o rio: eternamente em movimento, perenemente buscando, explorando, impelindo, transbordando, penetrando todas as frestas com sua água. Mas, veja, a mente não quer que assim aconteça. Percebe que é perigoso, arriscado, viver num estado de impermanência, de insegurança e, por conseguinte, constrói uma muralha em torno de si própria: a muralha da tradição, da religião organizada, das teorias políticas e sociais. Família, nome, bens materiais — tudo isso se encontra atrás das muralhas, separado da vida. A vida, que é movimento, impermanência, procura incessantemente penetrar, demolir essas muralhas, atrás das quais só há confusão e angústia. Os deuses que moram atrás das muralhas são falsos deuses, e suas escrituras e filosofias são sem significação, porque a vida as excede.

Ora, para a mente que não tem muralhas, que não está pejada de aquisições, acumulações, conhecimentos, para a mente que vive fora do tempo, na insegurança, para essa mente a vida é uma coisa maravilhosa. Essa mente é a própria vida, porque a vida não tem pouso. Mas, quase todos nós queremos um pouso, uma pequena casa, um nome, uma posição, e consideramos essas coisas muito importantes. Exigimos permanência, e criamos uma “cultura” baseada nessa permanência, inventamos deuses que não são deuses, mas, tão só, “projeções” de nossos próprios desejos.

A mente que busca a permanência depressa se estagna; como a vala ao lado do rio, depressa se enche de corrupção, deterioração. Só a mente que não tem muralhas, que não tem ponto de apoio, não tem barreira, não tem pouso, que se move, toda inteira, com a vida, eternamente ousando, explorando, “explodindo” — só essa mente pode ser feliz, eternamente nova, porque ela é essencialmente criadora.
Entende o que estou dizendo? Você deve compreendê-lo, porque faz parte da verdadeira educação e, quando o compreender, sua vida será completamente transformada, suas relações com o mundo, com o próximo, com seu cônjuge, terão significado de todo diferente. Você já não tentará, então, preencher-se com coisa alguma, porque perceberá que a busca de preenchimento só atrai sofrimento e confusão. Por essa razão, você deve perguntar aos seus mestres sobre tudo isso, e discuti-lo também entre vocês. Se você o compreende, terá começado a compreender essa verdade extraordinária que é a vida, e nessa compreensão encontra-se grande beleza e amor, o florescimento da bondade. Mas, os esforços da mente que busca um fosso de segurança, de permanência, só podem conduzir à treva e à corrupção. Uma vez instalada naquele fosso, a mente teme aventurar-se fora dele, para buscar, explorar; mas a Verdade, Deus, a Realidade — ou o nome que você quiser — encontra-se além dos limites do fosso.

Você sabe o que é religião? Não é o cântico, não é a execução de rituais, não é a adoração de deuses de lata ou imagens de pedra; ela não se encontra nos templos e igrejas, nem na leitura da Bíblia ou do Gita; não é a repetição de um nome sagrado ou o seguir de qualquer outra superstição inventada pelos homens. Nada disso é religião.

Religião é o sentimento da bondade, daquele amor semelhante ao rio — que é um movimento vivo, eterno. Naquele estado, você verá chegar um momento em que não haverá busca de espécie alguma; e esse findar da busca é o começo de algo totalmente novo. A busca de Deus, da Verdade, o sentimento de se ser integralmente bom (não o cultivo da bondade, da humildade, porém o buscar, além das invenções e dos artifícios da mente, uma certa coisa — e isso significa ser sensível a essa coisa, viver nela, sê-la) isso que é a verdadeira religião. Mas nada disso lhe será possível se você não abandonar o fosso que você cavou para si mesmo, e entrar no rio da vida. A vida cuidará então de você, de uma maneira surpreendente, pois, de sua parte, nada haverá para cuidar. A vida, então, lhe levará aonde lhe aprouver, porque você será uma parte dela; não haverá mais problemas concernentes à segurança ou ao que “os outros” digam ou não digam. E esta é que é a beleza da vida.  

Krishnamurti — A cultura e o problema humano

sábado, 6 de abril de 2013

Meditando sobre o tenebroso medo da morte

Por que vocês se preocupam com o além? Porque o viver neste mundo perdeu o seu significado; não há amor perdurável, há apenas conflito e tristeza.

Vocês esperam, assim, por um outro mundo, o do além, no qual possam viver felizes e com plenitude. Não havendo tido uma oportunidade de preenchimento neste mundo, esperam em outra vida, poderem realizá-lo. Ou então, desejam novamente encontrar aqueles a quem, pela morte, perderam, coisa que é apenas indício da vacuidade de vocês. Se eu disser que existe vida no além e outra pessoa lhes disser que não existe, escolherão a hipótese que lhes dá maior satisfação, e por esse modo, tornam-se escravos da autoridade. Portanto, o problema não se resume em saber se existe o além, o que importa é compreender, neste mundo, a plenitude da vida, que é eterna; desimpedir a ação e não criar limitação.

Para o homem que atingiu o preenchimento, que não se separa do movimento da realidade, não há morte.

Como o indivíduo há de viver, de modo que a ação seja preenchimento? Como o indivíduo pode enamorar-se da vida? Para enamorar-se da vida, para obter o preenchimento, é preciso ter a mente livre, mediante a compreensão profunda das limitações que a deturpam e frustram.

Vocês tem que se tornarem apercebidos, conscientes de todos os obstáculos localizados no fundo da mente.

Existe dentro de cada um de nós, o inconsciente que, continuamente, embaraça, perverte a inteligência. Esse inconsciente torna a vida incompleta.

Vocês necessitam drenar, por meio da ação, por meio do viver, por meio do sofrimento, todas essas coisas que estão ocultas, escondidas em vocês.

Quando a mente não se preocupar com o medo, com o além, e estiver plenamente consciente, apercebida do presente, e de seu profundo significado, então existirá o movimento da realidade, da vida, que não é de vocês, nem minha.
(...)
Para aquele que está constantemente se preenchendo, não há medo da morte. Se formos realmente completos em cada momento, em cada dia, então desconheceremos o temor do amanhã. Mas, as nossas mentes criam a falta de plenitude da ação, e assim, o temor do amanhã. Fomos adestrados pela religião, pela sociedade, na falta de plenitude, no adiamento, e isto nos serve como fuga do medo, porque temos o amanhã para completar o que não podemos preencher hoje.

Mas, um momento por favor. Desejaria que olhassem esse problema, sem o fundo das tradições de vocês, modernas ou antigas, sem a crença de vocês na reencarnação, porém, muito simplesmente. Então, compreenderão a verdade, que lhes libertará completamente do medo. Para mim, a ideia de reencarnação é simples adiamento. Muito embora vocês possam acreditar profundamente na reencarnação, mesmo assim, quando morre alguém, vocês ainda têm medo e tristeza, ou o medo da própria morte. Vocês podem dizer: "Viverei do outro lado; serei muito mais feliz, e farei melhor trabalho ali do que posso fazer aqui". Mas as palavras de vocês são apenas palavras. Elas não podem tranquilizar o medo inquietante que sempre está no coração de vocês. Assim, tratemos desse problema do medo, de preferência à questão da reencarnação.

Quando houverem compreendido o que é o medo, verão a não importância da reencarnação. Então, nem mesmo precisaremos de discuti-la. Não me perguntem o que acontece ao aleijado, depois da morte, ao que é cego nesta vida: se compreenderem o ponto central, consideraram tais questões inteligentemente.

Vocês temem a morte, porque os seus dias são incompletos, porque nunca existe preenchimento em suas ações. Quando a mente de vocês está presa numa crença, crença no passado ou no futuro, não podem compreender plenamente a experiência. Quando a nossa mente está presa ao preconceito, não pode haver entendimento completo da experiência na ação. Daí vocês dizerem que devem ter um amanhã, no qual completarão a ação e vocês tem medo de que não venha esse amanhã. Mas, se puderem completar no presente a ação de vocês, então o infinito está diante de vocês. O que lhes impede de viver integralmente? Por favor, não me perguntem como completar a ação, pois é a maneira negativa de olhar a vida.

Se eu lhes disser como, então tornarão a ação de vocês meramente imitativa, e nisso não há plenitude. O que vocês tem de fazer é descobrir o que lhes impede de viver plena, infinitamente; e descobrirão que é esta ilusão de um fim, de uma certeza, a que a mente de vocês está presa, esta ilusão de atingir um objetivo.

Se estiverem constantemente aguardando o futuro, no qual esperam triunfar, lucrar, ter sucesso, conquistar, a ação de vocês no presente tem de ser limitada, incompleta. Quando a ação de vocês está baseada na fé, tal ação não é preenchimento; é meramente o resultado da fé.

Desse modo, existem na mente de vocês muitos empecilhos; há o instinto de posse cultivado pela sociedade, e o instinto da renúncia, também cultivado pela sociedade. Quando há conformidade e imitação, quando a mente está limitada pela autoridade, não pode existir preenchimento, e disso surge o medo da morte, e muitos outros temores que fazem ocultos no subconsciente.
(...)
Não há remédio nem substituição para o medo, exceto no entender a causa do próprio medo. A mente está, continuamente limitada pelas recordações do passado, e essas lembranças embaraçam-lhe o preenchimento da ação no presente. Por isso não há plenitude da ação no presente, o que cria o temor da morte.
(...)
Quando a mente perde a sua limitação egoísta, dá-se, então, o movimento da vida, um perpétuo vir-a-ser, em que não existe a sombra da morte.
(...)
O tenebroso medo da morte arrebata a viva joia dos olhos de vocês.

Krishnamurti — O medo — 1946 — ICK

sexta-feira, 5 de abril de 2013

O homem que fala sobre o além, já está morto.

A vida enche o mundo.
(...)
A vida não tem morte, nem o isolamento vácuo das sombras do tempo.
(...)
A morte é nada mais que a consciência da própria solidão, vacuidade e isolamento de vocês, e somente quando estiverem completamente livres, é que não mais existirá morte; então, não há nem unidade nem separação.
(...)
Livre é o homem que vive no eterno, pois a vida é, porque é.
(...)
A vida é completa; não conhece separação; não brota da tristeza, da dor, do medo dos opostos.
(...)
É pelo conservar o eterno, dentro do coração de vocês, que o presente se torna como perfume de uma rosa.
(...)
A morte não é nem um começo nem um fim. A Verdade, a inteireza, é sempre existente, acha-se para além do tempo e, na sua realização, encontra-se a imortalidade.
(...)
Na morte há tristeza, há dor, há solidão aflitiva, há o desejo de estar junto do ser que se perdeu, o desejo de ter simpatia e amor.

É esta uma das mais comuns experiências da vida. Todos a realizam. Em lugar de colher-se o significado dela, a plena lição que ela tem para lhes dar, vocês buscam por consolo.

Buscam os guias para o plano astral, desejam estar ali juntos dos seres amados. Vocês têm esperanças do seu renascimento.

Tudo isto não é mais do que o adiamento de seus esforços no sentido de libertar o eu-consciência.

A batalha para ajustar a solidão e o amor não se ganha, por nos lançarmos para o além, para outros reinos, e sim pelo constante apercebimento de si próprio.

Assim, pois, uma experiência pode lhes abrir o integral significado da plenitude.
(...)
Penso que se teme a morte, porque existe o sentimento de não se ter vivido. Se vocês são um artista, podem ter medo de que a morte lhes leve antes de terem terminado o trabalho de vocês; vocês tem medo, porque nada realizaram. Ou, se são um home da vida comum, sem capacidades especiais, vocês têm medo, porque tão pouco não realizaram coisa alguma. Dizem: "Se eu for impedido de minha realização, o que é que acontece? Como não entendo esta confusão, esta labuta, esta incessante escolha e conflito, há ainda oportunidade para mim?" Vocês têm medo da morte, quando não se preencheram na ação, isto é, temem a morte, quando não experimentaram a vida total, completamente, com plenitude da mente e coração de vocês. Por conseguinte, a questão não é saber porque vocês temem a morte, mas, antes, conhecer o que os impede de experimentar a vida plenamente. Tudo deve morrer, tudo passa. Mas, se possuem a compreensão que os habilita a experimentarem a vida plenamente, então há vida eterna, imortalidade, sem começo nem fim, e não há temor da morte.

Ainda, a questão não é como libertar a mente do temor da morte, mas como experimentar a vida plenamente, como experimentar a vida de modo que haja preenchimento.

Para experimentar a vida plenamente, precisa-se estar livre de todos os valores defensivos. Mas a nossa mente e o nosso coração estão sufocados com tais valores, que tornam a nossa ação incompleta, e daí o medo da morte. Para acharem os verdadeiros valores, para estarem livres desse constante temor da morte e do problema do além, precisam conhecer a verdadeira função do indivíduo, tanto a particular como a coletiva. O que há além da morte? Há um além? Sabem por que uma pessoa faz usualmente tais perguntas, por que deseja saber o que há do outro lado? Ela pergunta, porque não sabe como viver no presente; está mais morta do que viva. Diz: "Deixe-me descobrir o que ocorre, após a morte", porque não tem a capacidade de entender o eterno presente. Para mim, o presente é a eternidade; a eternidade reside no presente, não no futuro. Mas, para a maioria das pessoas, a vida tem sido toda uma série de experiências sem preenchimento, sem compreensão, sem sabedoria. Consequentemente, para elas, o além é mais sedutor do que o presente, e daí as inumeráveis perguntas relacionadas com o que se acha no além. O homem que investiga o além, já está morto. Se vocês vivem no eterno presente, o além no existe; então a vida não é dividida em passado, presente e futuro. Então há plenitude, e nela o êxtase da vida.
(...)
Vocês estão continuamente encarando o presente, através do lastro do passado e, por isso, não compreendem o presente. Há um processo contínuo de incompreensão, que cria memória; e, portanto, existe o acúmulo, a acentuação desta memória e, consequentemente, o desejo de saberem se voltarão a viver uma outra vida. Ao passo que, se tivessem a capacidade para experimentar tudo como se fosse novo, com a mente não contaminada, não sobrecarregada com o instinto de posse provindo do passado ou com o pensamento no futuro, então verificariam que não existe coisa que seja a morte; verificariam que não existe medo. Então, a vida se tornaria um contínuo êxtase, não uma luta terrível, horrorosa; isto exige, porém, grande vigilância, apercebimento de pensamento, de mente e coração no presente.
(...)
Krishnamurti — O medo — 1946 — ICK 

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill