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quinta-feira, 20 de setembro de 2012

É possível educar nossos filhos sem condicioná-los?


Pergunta: É possível educarmos os nossos filhos sem condicioná-los, e, se o é, de que maneira? Se não existe, uma coisa tal, como “condicionamento bom” e “condicionamento mau”? Tende a bondade de responder incondicionalmente (risos).

Krishnamurti: É possível educar as crianças, sem condicioná-las? Achais possível? Eu não acho. Tende a bondade de escutar; vamos investigar juntos. Antes, porém, liquidemos a última parte da pergunta — se há “bom condicionamento” e “mau condicionamento”. Por certo, há apenas condicionamento, sem que seja “bom” ou “mau”. Podeis achar que é um “bom condicionamento” crer em Deus, mas na Rússia comunista dir-se-á que é um “mau condicionamento”. O que chamais “bom condicionamento” outro poderá chamar de mau, o que é um fato muito óbvio. Esta questão, portanto, pode ser liquidada muito facilmente.

Resta a outra questão: Pode-se educar as crianças, sem condicioná-las, sem influenciá-las? Ora, tudo o que as cerca está a influenciá-las. O clima, a alimentação, as palavras, os gestos, as conversas, as reações inconscientes, as outras crianças, a sociedade, as escolas, os livros, as revistas, os cinemas — tudo está a influenciar a criança. E pode-se acabar com tal influência? Impossível, não achais? Podeis não desejar influenciar, condicionar, o vosso filho; mas, inconscientemente, o estais influenciando, não estais? Tendes as vossas crenças, vossos dogmas, vossos temores, vossos princípios morais, vossos planos, vossas ideias sobre o que é bom e o que é mau, e, assim, consciente ou inconscientemente, estais moldando a criança. E se vós não o fazeis, a escola o fará, com os seus livros de História, que falam dos heróis maravilhosos que nós temos e outros povos não têm, etc. etc. Tudo isso está a influenciar as crianças, e, portanto, precisamos, em primeiro lugar, reconhecer este fato evidentemente.

O problema, agora, é este: podemos ajudar a criança a desenvolver-se para investigar inteligentemente todas as influências? Estais compreendendo? Sabendo-se que a criança está influenciada por tudo o que a cerca, tanto no lar como na escola, pode-se-lhe prestar a necessária assistência, a fim de a capacitarmos a investigar todas as influências e nunca se deixar dominar por nenhuma delas? Se tendes realmente a intenção de ajudar o vosso filho a investigar todas as influências, a vossa tarefa será dificílima, não é verdade? Porque isso exige não só o exame de vossa própria autoridade, mas de todo o problema da autoridade, do nacionalismo, da crença, da guerra, do militarismo — um exame completo da coisa, o que significa: cultivar a inteligência. E quando existe essa inteligência e a mente já não aceita nenhuma autoridade nem se deixa ajustar, por medo, aos padrões vigentes — então, toda influência é devidamente examinada e posta a parte. Por conseguinte, a mente não fica condicionada. Ora, isto é possível, não? E a função da educação não consiste, justamente, em cultivar esta inteligência, que é capaz de examinar objetivamente qualquer influência, de investigar todo o “background” ¹, tanto nos níveis imediatos como nos mais profundos, de modo que a mente nunca esteja sujeita a condicionamento algum?

Afinal de contas, todos estamos condicionados pelo nosso “background”; nós somos esse “background”, constituído pela nossa tradição cristã, por essa extraordinária vigilância por parte da mente, não é exato? O homem religioso não é americano, nem inglês, nem hindu,  e sim um ente humano; não pertence a nenhum grupo, raça ou cultura, e por conseguinte é livre para descobrir o que é verdadeiro, o que é Deus. Cultura alguma pode ajudar o homem a descobrir o Verdadeiro. As culturas só criam organizações pata agrilhoar o homem. Importa, por conseguinte, investigar tudo isso, não só o condicionamento consciente, mas também — o que é muito mais importante — o condicionamento inconsciente da mente.

E o condicionamento inconsciente não pode ser examinado superficialmente pela mente consciente. Só quando a mente está de toda quieta, pode ser revelado o condicionamento inconsciente — não num dado momento, mas a qualquer hora: quando damos um passeio a pé, ou viajamos num ônibus, ou conversamos com um amigo. Havendo a intenção de descobrir, ver-se-á que o condicionamento inconsciente sairá aos jorros, e estarão assim abertas as portas para o descobrimento.

Krishnamurti — Realização sem esforço – pág. 70 à 73 — 20 de agosto de 1955  
     

Compreendendo a mediocridade de nossa mente


Um dos problemas graves, sobre que quase todos já devemos ter refletido, é o referente ao controle da mente; porque, pode-se ver que, sem um profundo, racional e equilibrado controle da mente, não pode haver a conservação da energia, essencial para se fazer qualquer coisa e, principalmente, quando se trata da chamada busca — busca da Verdade, da Realidade, de Deus, etc. É sabido, penso eu, que esta estabilidade da mente é necessária para se poder penetrar os problemas fundamentais que uma mente superficial é incapaz de atender. E, no entanto, a dificuldade está em como controlar a mente, não achais? Muitos sistemas de disciplina, várias seitas religiosas e comunidades monásticas sempre têm preconizado o controle absoluta da mente; e nesta tarde pretendo investigar se é possível tal coisa e como pode ser criada essa absoluta estabilidade mental. Estou empregando a palavra “absoluto” no sentido correto, no significado de controle completo, total, da mente. Como disse, é muito importante haver essa estabilidade, porque nesse estado não há conflito, não há dissipação, nem distração de espécie alguma; por conseguinte, ela gera uma energia extraordinária, e essa mente, achando-se perfeitamente equilibrada, é capaz de profunda e radical penetração.

Ora, pode uma mente medíocre, por mais que controle, que domine e discipline a si mesma, tornar-se estável? Em geral, a nossa mente é estreita, limitada, cheia de preconceitos, vulgar, e uma mente vulgar está sempre ocupada com coisas superficiais, com um serviço, com disputas, ressentimentos, cultivo de virtudes, tagarelices, sua própria evolução e seus próprios problemas. E pode essa mente, por mais que controle e discipline a si mesma, tornar-se livre para poder ser estável? Porque, sem liberdade, é bem de ver que a mente não pode ser estável.

Isto é, a mente que está a lutar por sucesso, por um resultado, a procurar no escuro uma coisa que não pode possuir, é essencialmente estreita, condicionada, limitada e, por causa desse próprio esforço, inferior; e, por mais que ela tente tornar-se estável pelo controle de si mesma, pode essa mente gerar aquela energia essencial oriunda de uma estabilidade profunda, fundamental, ou só criará mais uma série de limitações, mais mediocridade? Espero vos esteja mostrando com clareza o problema.

Se minha mente é nacionalista, se ela está acorrentada por inumeráveis crenças, superstições, temores, presa nas redes da inveja, de ressentimentos, da crueldade por palavras, por gestos ou pensamentos — essa mente, por mais que se esforce para pensar em algo além de si própria, permanecerá limitada. O problema, pois, é de como quebrar esse estado de mediocridade da mente, não achais? Esta é uma das questões fundamentais, e se ela está clara, agora, podemos continuar, para descobrir o que significa ter um controle completo da mente.

Para se descobrir o que é a Verdade, o que é Deus — ou o nome que quiserdes dar — necessita-se evidentemente de enorme energia, e, na busca dessa energia, praticamos toda a sorte de absurdos. Ou nos recolhemos aos mosteiros, ou nos tornamos maníacos de regimes alimentares ou procuramos controlar nossas paixões e apetites, esperando, desse modo, canalizar a energia e achar algo além da mente. Afinal, é isto que a maioria de nós está tentando fazer, de diferentes maneiras. Estamos procurando controlar nossos pensamentos, nossos desejos, cultivar virtudes, prestar atenção às nossas palavras, nossos atos, etc., com a intenção de nos tornarmos cidadãos bons, respeitáveis, ou com a esperança de canalizar toda essa extraordinária vitalidade do desejo, a fim de descobrirmos o que existe além. Mas, por mais que lutemos, não poderemos descobrir tal coisa, enquanto não compreendermos a mediocridade de nossa mente. Quando a mente medíocre busca a Deus, o seu Deus será também medíocre, é claro; sua virtude será mera respeitabilidade. Assim, é possível quebrar essa mediocridade? Está clara a questão? Bem, então continuemos.

Nossa mente é medíocre, invejosa, gananciosa, medrosa, quer o admitamos, quer não. Ora, que é que faz a mente medíocre? Sem dúvida, a mente é estreita, limitada, superficial, medíocre, enquanto é gananciosa. Poderá renunciar às coisas mundanas e se tornar gananciosa de sapiência, de sabedoria — mas continuará medíocre, porque no seu esforço aquisitivo ela desenvolve a vontade de conseguir, de ganhar, e essa própria vontade de conseguir constitui sua mediocridade.

Posso dizer agora alguma coisa a respeito da atenção? A atenção é muito importante, mas a atenção é de todo diferente da concentração ou absorção numa coisa. Uma criança se absorve num peão; o brinquedo a atrai, e ela lhe dá a sua mente. Isto é o que acontece, não é verdade? O objeto atrai a mente, absorve a mente, ou então, a mente absorve o objeto. Se estais interessado numa certa coisa, o objeto de vosso interesse é tão atraente, que vos absorve; ao passo que, se deliberadamente vos concentrais numa coisa, o que é outra forma de absorção, então sois vós que absorveis o objeto, não é exato?

Ora, eu estou falando de coisa completamente diferente. Refiro-me a uma atenção que não há objeto de espécie alguma, em que não há luta, nem conflito, uma atenção em que nem vos deixais absorver, nem procurais concentrar-vos em coisa alguma. Quando escutais o que se está falando aqui, estais procurando compreender e vosso escutar tem um objeto; por isso há esforço, tensão, e não uma atenção livre de toda tensão. Isto é um fato, não é? Se desejais escutar uma coisa, não deve haver tensão nenhuma, nenhum esforço, nenhum objeto que atraia a vossa atenção e vos absorva, porque, de outro modo, estais apenas sendo hipnotizados pelas palavras que estais ouvindo, por uma personalidade, uma estultícia qualquer. Se observardes atentamente esse processo de absorção, vereis que nele há sempre conflito, tensão, esforço para se alcançar alguma coisa; ao passo que, na atenção, não há nenhum objeto especial, estais apenas ouvindo, assim como se ouve uma música distante ou as notas de uma canção. Nesse estado estais completamente sem tensão, atento, não há esforço algum.

Assim, pois, se posso sugeri-lo, procurai estar atentos, enquanto aqui estais a escutar o que se está dizendo. O que estou dizendo poderá ser difícil e talvez novo, e portanto causar certa perturbação; mas se fordes capazes de escutar com aquela atenção livre de tensão, não ficareis mentalmente agitados, embora possais sentir-vos perturbados num sentido diferente, o que talvez seja bom. O que estou dizendo é uma coisa que muito importa compreender.: Estou dizendo que a mente deve ser completamente estável. Mas, essa estabilidade não pode efetivar-se quando a mente se esforça para se tornar estável, porque a mente, a promotora do esforço, é, por natureza, limitada, insignificante. Pode a mente possuir conhecimentos enciclopédicos, ser capaz de discussões sutis e possuir vasta acumulação de técnica, mas permanecerá essencialmente limitada enquanto tiver suas bases no senso de aquisição e, por conseguinte, no cultivo da vontade, isto é, enquanto existir nela o “eu”, a entidade que adquire, que faz esforço, que guarda e acumula. A mente poderá pensar em Deus, disciplinar a si mesma, tentar controlar os seus vários desejos, a fim de se tornar virtuosa, a fim de possuir mais energia para a busca da Verdade, etc.; mas, essa mente estreita, limitada, nunca poderá ser livre e, portanto, estável.

Nosso problema, por conseguinte, é de como quebrar essa limitação mental. Está clara a questão? Se está clara, o que vos cabe então fazer? Vê-se a necessidade de uma mente muito estável, profunda, tranquila, uma mente perfeitamente controlada — mas não controlada por uma entidade que diz “Preciso controla-la”. Compreendeis? Isto é, percebo a importância de se ter uma mente estável. Pois bem. Como criar essa estabilidade? Se outra parte da mente disser: “Preciso ter uma mente estável”, criará conflitos, lutas para controlar e subjugar, não é verdade? Uma parte da mente dita à outra parte, tentando impedi-la de divagar, controlando-a, moldando-a, disciplinando-a, reprimindo várias formas de desejo; e temos, assim, um conflito incessante, não é exato?

Ora, a mente que se acha em conflito, é, na sua própria essência, limitada, porque o seu desejo é adquirir alguma coisa. Desejando adquirir uma mente estável, dizeis: “Tenho de controlar a minha mente, moldá-la, repelir todos os desejos em conflito”; mas, enquanto existir em nosso pensar esse processo dual, tem de haver conflito, e esse próprio conflito denota limitação, porque é produto do desejo de ganhar alguma coisa. Assim, pode a mente obliterar, esquecer de todo o processo de aquisição, de adquirir uma mente estável, a fim de achar Deus ou o que quer que seja? Isto é, podeis enquanto estais ouvindo, perceber, imediatamente, a verdade do que se está dizendo? Estou dizendo que é necessária completa e absoluta estabilidade da mente, e que qualquer tentativa para se conquistar tal estado indica que a mente está dividida e está a dizer: “Ótimo! Preciso de estabilidade, deve ser uma coisa maravilhosa”; em vista disso, começa a esforçar-se para alcançar esse estado, recorrendo à disciplinas, controles, várias formas de sanção, etc. Mas, se a mente for capaz de escutar a verdade daquela asserção, perceber a verdade daquela asserção, perceber a absoluta necessidade de controle completo, vereis então que não há mais esforço algum para se alcançar um estado.

Isto é difícil demais? Receio que o seja, porque, em geral, nós pensamos em termos de esforço, havendo sempre uma entidade que faz esforço, visando a um resultado, e por esta razão há conflito. Ouvis a asserção de que a mente deve ser absolutamente estável, controlada ou lestes e refletistes sobre isto e dizeis: “Preciso alcançar esse estado”, e procurais então alcançá-lo por meio de controle, de disciplina, meditação, etc. Nesse processo há esforço, ajustamento, observância de padrão, criação da autoridade, e as muitas complicações daí resultantes. Ora, todo esforço para alcançar um resultado, todo desejo de adquirir um estado, torna a mente limitada, e essa mente nunca poderá ser livre, para ser estável. Se se perceber bem claramente a verdade a esse respeito, não existe então uma estabilidade absoluta da mente? Compreendeis?

Por outras palavras: Vê-se bem claro ser necessário energia para qualquer espécie de ação. Mesmo se desejais ser um homem rico, tendes de devotar a vossa vida a esse fim, nele concentrar toda a vossa energia. E para se achar aquilo que está além das atividades, dos movimentos da mente — o que implica extraordinária profundeza de autoconhecimento — a energia concentrada é uma necessidade essencial. Ora, como se pode gerar essa energia concentrada?  

Reconhecendo que temos necessidade dela, dizemos: “Tenho de controlar meu temperamento, tomar alimentos adequados, evitar os excessos sexuais, refrear minhas paixões, apetites, desejos” — isto é, estamos sempre a escapar por tangentes. Tudo isso são tangentes, porque no centro, somos muito pobres. Enquanto a mente está a pensar em termos de adquirir alguma coisa, alcançar resultados, é ambiciosa, e a mente ambiciosa tem de ser, por natureza, limitada e superficial. Essa mente, tal como a do homem mundano, ambicioso, tem, sem dúvida nenhuma, uma certa carga de energia; mas nós estamos interessados numa coisa que exige energia muito mais profunda, mais ilimitada, e uma total ausência de “ego”.

Temos sido condicionados, através de séculos — religiosa, social e moralmente — para controlar, moldar a nossa mente de acordo com um certo padrão, ou seguirmos certos ideais, a fim de conservarmos a nossa energia; e pode a mente libertar-se dessas coisas, sem esforço algum, e entrar no mesmo instante num estado de tranquilidade total, completa estabilidade? Tal estado não está sujeito a distração de espécie alguma. Só há distrações, quando queremos seguir uma certa direção. Quando uma pessoa diz: “Tenho de pensar nisto, e em nada mais” — então, tudo o mais constitui distração. Mas se estamos atentos, completamente, com aquela atenção que não se fixa em objeto algum — já que não existe mais processo de aquisição, exercício da vontade, visando a um resultado — então a mente se verá num estado de extraordinária estabilidade, tranquilidade interior; e só a mente tranquila é livre, para descobrir ou deixar manifestar-se a Realidade.

Krishnamurti – Realização sem esforço – pág. 62 à 68 – 20 de agosto de 1955       


Você não é argila e nem geleia para se ajustar a um molde


Pergunta: Posso saber por que não devemos nos ajustar aos planos de nossos pais, já que sempre desejam nosso bem?

Krishnamurti: Por que se ajustaria você aos planos de seus pais, por mais dignos e nobres que tais planos sejam? Você não é argila e nem geleia para se ajustar a um molde. E se realmente se ajustar, que é que lhe acontece? Você se torna o que se chama uma boa menina ou um bom menino, e daí? Sabem o que quer dizer ser bom? Não é simplesmente fazer o que a sociedade manda ou o que determinam os pais. Ser bom é algo inteiramente diferente, não é mesmo? Só se pode ser bom quando se é inteligente, quando se tem amor, quando não se tem medo. Você não pode ser bom se tiver medo. Pode tornar-se respeitável por fazer o que manda a sociedade — e então a sociedade lhe dará uma grinalda e dirá quão boa pessoa você é; mas ser meramente respeitável não é ser bom.

Vejam, quando somos jovens não queremos nos ajustar, e ao mesmo tempo queremos ser bons. Queremos ser bondosos, delicados, ter consideração e fazer coisas generosas; mas não sabemos o que isso tudo significa, e somos "bons" porque temos medo. Nossos pais dizem: "Sejam bons", e a maioria de nós o faz, mas essa "bondade" equivale simplesmente a viver de acordo com o plano deles a nosso respeito.
Krishnamurti - O verdadeiro objetivo da vida - pág. 163

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O sentimento é que produz a transformação fundamental do pensar


A virtude está no passado? Encontra-se a virtude em algum livro? Ela se torna existente ao seguirmos algum guia, alguma autoridade? E a presente degeneração, a atual corrupção e desintegração moral, não resulta de uma “virtude” baseada na autoridade alheia, na autoridade de um livro, na autoridade de vários líderes que vindes seguindo há séculos? De quem quer que se trate, seja de um guia político, seja de um santo consolador ou reformador religioso, o próprio fato de se seguir outra pessoa não é uma coisa desvirtuosa?

A virtude é algo que se possa armazenar, acumular e guardar em reserva para as ações que exijam uma reação virtuosa? Ou a virtude é coisa inteiramente diversa? Isso não quer dizer que perdemos a virtude, pois provavelmente nunca a tivemos, e por isso mesmo se observa a atual decadência. Não sei se tendes considerado seriamente esta matéria ou se a tendes considerado apenas pela rama, satisfazendo-vos com pequeninas coisas — um pouco de trabalho, um pouco de comida, um pouco de reflexão, uma pequena família — sem vos deixardes perturbar muito e consentindo que a deterioração prossiga levemente. Penso que alguns devem ter pensado seriamente na questão — mas não em termos de reforma, porque, como vereis, se observardes o que se passa ao redor de vós, tal reforma não produziu uma nova libertação das forças criadoras do homem. Pelo contrário, toda reforma religiosa, tal como toda revolução política, tem apenas criado um diferente grupo, preconizando um padrão diverso.

Vedo tudo isso, já devemos ter perguntado a nós mesmos como fazer nascer àquela retidão que não é apenas ação dos que sabem, ação da mente que acumulou ciência, moralidade, e que funciona pela rotina de uma dada virtude. Não chamo virtuosa uma mente dessas. Virtude não é apenas lembrança de coisas idas, ela não reside no passado de há dez mil anos ou de outem; ela é a capacidade de enfrentar cada desafio com um novo vigor mental, com amor, com brandura, com penetrante percebimento da totalidade de um acontecimento de qualquer natureza que seja.  A mente capaz de corresponder a pleno uma exigência é a única mente virtuosa, e não aquela que calcula, que está moldada por uma ideologia, em interesses depositados na conduta moral, na tradição, em valores que oferecem vantagens. A virtude é coisa bem diferente de tudo isso, como veremos à medida que, nesta tarde, formos prosseguindo.

A mente educada consoante um padrão de pensamento, que exige, o “como”, o método, desejosa de conhecer o caminho conducente à virtude, essa mente nunca será virtuosa, porquanto só lhe interessa o êxito, o chegar a alguma parte. Em vez de interessar-se por dinheiro, interessa-se pela chamada virtude. Os fins são essencialmente os mesmos, porque o desejo, em cada caso, é essencialmente o mesmo.

Assim, é possível operar, não uma mudança fragmentária, porém, uma transformação total, de modo que vossa mente, vosso coração, todo vosso ser se torne atento e sensível a tudo que vos cerca — à beleza de uma nuvem, à aragem entre as folhas, o aldeão, a mulher torturada pelo conceber filhos e mais filhos? O relevante, decerto, é estar cônscio de tudo isso e corresponder de maneira plena, e não em termos de uma certa moral social, que nenhuma moral é, porém, antes, simples questão de conveniência, de interesse egoísta. Moralidade é a capacidade de corresponder com nosso ser integral — e isso é o que realmente penso e não uma simples sentença retórica. As palavras em si pouco significam. O importante é transcender as palavras e ter sentimento, porque é o sentimento, porque é o sentimento que produz a totalidade da ação. Compreendeis, senhores? Ter sentimento não é um “processo” intelectual gerador de toda espécie de razões solertes sobre por que se deve ou não se deve ter sentimento.

(...) O sentimento, sem os acessórios do pensamento, é realmente uma coisa extraordinária. Não sei se já alguma vez tentastes sentir e vos deixardes levar por esse sentimento, sem controlá-lo, sem moldá-lo, sem chama-lo de bom ou mau, sem atribuir-lhe uma significação verbal. Vereis que isso é dificílimo, verdadeiramente árduo. Não é uma coisa que vem com facilidade, porque temos cultivado nossa mente. Para nós, o intelecto é de enorme importância; gostamos de argumentar, de ser capazes de jogar nossa opinião contra a opinião de outra pessoa muito erudita, bem-ilustrada, ou de citar algum livro antigo. Exercitamos nossa mente para alcançar um alto grau de eficiência, no interesse do “eu” e, assim, perdemos, ou nunca tivemos, aquele sentimento.

A objeção imediata a isso é: “Se temos um sentimento, não desejamos expressá-lo?” É verdade? Ou a mente, vestindo com palavras o sentimento, cria a sensação, a qual exige expressão? A mente olhando para além do sentimento, deseja expressá-lo, preenche-lo, ou deseja cerceá-lo, suprimi-lo, refreá-lo. O sentimento, pois, é a chama real; e se com efeito libertardes a mente das palavras, se não permitirdes que seja moldada pelos significados verbais, pelo maquinismo de nossos instintos religioso e morais, vereis que o sentimento não exige necessariamente isso a que chamais “preenchimento”. A mente é que o exige, a mente que tem uma ideia a respeito do sentimento.

Digamos que apanhais uma folha e a olhais. O sentimento que ela evoca é uma coisa, e outra coisa é vossa opinião sobre ela — “Como é bela!”, “Como é verde!”, “Como está murcha!” Mas a palavra se torna mais importante e o sentimento se esvai. Observai isso, fazei uma experiência com vós mesmos e logo o verificareis. Um tal sentimento não exige preenchimento. Pelo contrário, tem seu movimento próprio, não relacionado com o movimento verbal do pensamento, que exige ação.

É, pois, o sentimento que produz realmente a transformação fundamental de nosso pensar. E é necessária essa básica transformação de nosso pensar, porquanto não é a pressão externa do ambiente econômico que produz a transformação. A compulsão, de qualquer espécie, tem um certo efeito, porém, nunca opera a transformação radical; ela só ocasiona uma “perpetuação modificada” das coisas como sempre foram. O que se necessita é de mudança radical, não da superficial citação de palavras novas, da proclamação de novos slogans políticos, ou do seguimento de novos mestres, novos líderes. Tudo isso já experimentamos, e não suscitou um mundo diferente.

Assim, se deveras estais interessados — como o deve estar toda pessoa inteligente e irrefletida, ao ver tanta pobreza, tanta degradação e degeneração — em promover, não uma reforma, porém uma revolução fundamental, acho que então reconhecereis prontamente que essa revolução só é possível quando a mente, na realidade, é religiosa. Mas religião, o sentimento de religião, não é questão de frequentar um templo, de assistir a uma cerimônia, de recitar uma porção de palavras estúpidas, de tanger um sino ou de depositar flores aos pés de um ídolo feito pela mão ou pela mente. Tampouco é religião repetir o Gita do começo ao fim, ou citar outra qualquer escritura. Religião é o sentimento do sagrado; compreendeis? Não é vosso sentimento por vosso guru, pelos Mestres, que é apenas inveja, vantagem, interesse no que se obterá em troca; e não é, tampouco, seguir um dogma ou crença — outra forma de segurança, de interesse egoísta. Religião é o sentimento daquela imensidade que pode ser chamada sagrada, e que nenhuma relação tem com o Upanishads, o Guita ou a Bíblia, com símbolos, igrejas, Budas, Krishnas, nem com minha pessoa. Ela não está em relação com nada disso. É porque destes vosso coração e vossa mente às coisas desta espécie, que não possuís este sentimento do sagrado que a razão solerte não pode perverter, que nem a mente a mente mais sutil pode destruir. Esse sentimento é como o amor; tem sua ação própria. Mas a mente que pensa que deve aprender a amar cria uma ação que é perversão, e essa ação só traz mais complexidade, mais sofrimento, mais confusão.

A religião, pois, não pode ser encontrada em nenhum templo, nenhum livro; nada tem que ver com colocar cinza na testa, vestir vestes sagradas ou pertencer a determinada organização. Religião é algo completamente diferente. Existe positivamente um estado, não um estado fixo, porém um movimento superior às medidas da mente, e o experimentar desse estado de religião. Não o traduzais como o estado de Samadhi, ou outro qualquer disparate místico; e o real experimentar desse estado, que é criação, faz nascer um mundo novo, porque então vossa mente é purificada de todo o rebotalho dos séculos. Vossa mente é então “inocente”, nova, sensível, cônscia de cada problema e, portanto, capaz de resolvê-lo. Mas não é de fácil alcance esse estado mental. Impende compreender a vós mesmos o funcionamento do próprio pensar.

A revolução religiosa é o começo de uma nova religião — a qual não pode ser organizada, não pode ter um clero, ou um presidente e secretário, e propriedades. Isso não é religião. A religião a que me refiro é o sentimento é o sentimento do sagrado, que não é sentimentalidade. É uma coisa que vem mediante árduo trabalho, mediante o penetrar de todas as ilusões, das sombras que a mente criou. Eis porque importa não ter nenhuma espécie de autoridade, representada por Mestres, por um guru, por livros sagrados ou ideais e opiniões, vossas próprias ou alheias; porque só então sois um indivíduo, livre para descobrir. Enquanto dependeis de outrem para vos instruirdes estais perdido, porque vos enredais nessa instrução.

Quando a mente está toda despojada do passado, que é conhecimento, vê-se surgir um sentimento de qualidade bem diversa, e as pessoas com esse sentimento não pertencem a nenhuma organização religiosa, não têm pátria, não se aproximam dos políticos, pois não estão em busca de poder nem de posição, e tampouco tentam reformar o mundo. A mente interessada em reformas não é uma mente religiosa, nem bondosa, nem compassiva. Ela pode falar sobre a compaixão, a bondade, mas no próprio ato de reformar há destruição, sofrimento, porque qualquer reforma torna necessária nova reforma, inadequadas como são todas as reformas. Mister se faz uma ação total, mas a ação total não se produz pela reunião de pequenas partes. Surge só quando descobris por vós mesmos, como ente humano individual, isto é, quando reagis não como coletividade, mas como um indivíduo real que se libertou da sociedade e de sua avidez, inveja, ambição, etc. Só esse indivíduo conhecerá aquela experiência extraordinária de algo incomensurável. Não é uma experiência estática. Nem uma experiência para ser lembrada. O que é lembrado não é verdadeiro; já se juntou aos mortos de ontem. E, sem essa experiência da realidade, o que quer que façais, nunca tereis um mundo são, ordeiro, equilibrado, feliz. Mas não podeis buscar essa experiência; ela tem de vir a vós, e isso só poderá ocorrer quando já não estiverdes interessados em vós mesmos.

Krishnamurti – O Homem Livre – pág. 103 à 107 – 23 de dezembro de 1956

Como pode uma mente condicionada descondicionar-se?

Pergunta: Estou inteiramente de acordo convosco sobre a necessidade de descondicionar a mente. Mas como pode uma mente condicionada descondicionar-se?

Krishnamurti: O interrogante declara concordar comigo. Antes de entrarmos na questão do descondicionamento da mente, verifiquemos o que se entende por “estar de acordo”. Vós podeis concordar com uma opinião, uma ideia, mas não se pode concordar com um fato. Vós e eu podemos estar de acordo, no sentido de que temos uma opinião comum a respeito de determinado fato; mas uma opinião sustentada por muito não “faz” a verdade. Para compreender, necessita-se de vivo e vigoroso ceticismo, e não de concordância ou discordância. Se meramente concordais comigo, estais concordando com uma opinião que pensais que eu tenho. Eu não tenho opiniões, portanto, não estamos “de acordo”. Se nós dois vemos uma serpente venenosa, não há questão de concordar: ambos guardaremos distância dela. Ao dizer que concordamos, estamos intelectualmente de acordo sobre uma certa ideia; mas a investigação de como libertar a mente do condicionamento não requer concordância intelectual. Enquanto a mente está condicionada como hinduísta, comunista ou o que quer que seja, é incapaz de penar de maneira nova. Isto não é nenhuma questão de opinião. É um fato. Não tendes a necessidade de concordar.

A questão, pois, é: estando condicionada, como pode a mente descondicionar-se? Percebeis que vossa mente está condicionada como hinduísta, com as diversas crenças do hinduísmo, ou como comunista, ou cristão, ou muçulmana etc. Vossa mente, é óbvio, está condicionada. Credes em alguma coisa, no sobrenatural, em Deus, enquanto outro que foi educado num diferente meio social e psicológico diz que tal coisa não existe, que tudo isso são baboseiras. Ambos estais condicionados, e o vosso Deus não é mais real do que o “não-Deus” em que o outro crê.

Assim, quer vos agrade, quer não, vossa mente está condicionada, não parcialmente, porém de ponta a ponta. Não digais que o Atman não é condicionado. Disseram-nos que o Atman existe e, afora isso, nada sabeis a respeito dele; e quando pensais acerca do Atman, vosso pensamento está condicionando o Atman. Isso também é evidente. É o mesmo caso do homem que crê nos Mestres. Disseram-lhe que os Mestres existem e, em virtude de seu próprio desejo de segurança, ele anseia encontra-los; e, assim, tem visões, as quais psicologicamente, são muito simples e infantis.

Ora, a questão é esta: Eu sei que a minha mente está condicionada; e como poderei libertá-la do condicionamento se a entidade que procura libertá-la se acha condicionada? Compreendeis o problema? Quando uma mente condicionada compreende que está condicionada e deseja descondicionar-se, esse próprio desejo é também condicionado; assim, que pode a mente fazer?

Estais seguindo? Por favor, senhores, não vos limiteis a escutar minhas palavras, mas observai vossa própria mente em funcionamento. Este é um problema bem difícil de apreciar com um grupo tão numeroso, e, a menos que presteis real atenção, não encontrareis a solução. Eu não vou vos dar a solução e, portanto, tendes de observar vossa própria mente com toda atenção.

Sei que minha mente está condicionada como hinduísta, budista, ou o que quer que seja, e vejo que qualquer movimento mental para descondicionar-se é sempre condicionado. Ao procurar a mente descondicionar-se, a entidade que faz esse esforço está também condicionada, não é verdade? Espero que me esteja explicando bem.

Vossa mente está condicionada; não há uma só parte dela que não esteja condicionada. Isto é um fato, quer vos agrade, quer não. Podeis dizer que há uma parte de vós — o observador, a “superalma”, o Atman — que não é condicionada; mas, visto que pensais nessa coisa, ela está contida na esfera do pensamento e, portanto, condicionada. A tal respeito podem-se inventar dúzias de teorias, mas o fato é que vossa mente está condicionada, de ponta a ponta, tanto consciente como a inconsciente, e todo esforço que faça para libertar-se é por igual condicionada. Assim, que pode a mente fazer? Ou, melhor, qual é o estado da mente quando sabe que estar condicionada e reconhece que qualquer esforço que faça para descondicionar-se é também condicionado? Estou-me expressando claramente?

Agora, quando dizeis: “Sei que estou condicionado” — o sabeis realmente ou trata-se de uma mera declaração verbal? Vós o sabeis com a mesma intensidade com que vedes uma naja? Se vedes uma serpente e sabeis que é uma naja, há ação imediata, não premeditada; e quando dizeis “Sei que estou condicionado”, tem isso a mesma significação vital que tem a vossa percepção da naja? Ou trata-se apenas de um superficial reconhecimento do fato, e não da percepção real do fato? Quando percebo o fato de que estou condicionado, há ação imediata. Não preciso fazer nenhum esforço para me descondicionar. O próprio fato de estar condicionado, e a real percepção desse fato, produz imediato esclarecimento. A dificuldade está em que não percebeis realmente que estais condicionado — “não o percebeis”, no sentido de que não compreendeis todas as suas implicações, não vedes que todo pensamento, por mais sutil, por mais requintado, por mais filosófico que seja, é condicionado.

Todo pensar baseia-se evidentemente na memória — consciente ou inconsciente —, e quando o pensador diz: “Devo libertar-me do condicionamento”, este próprio pensador, sendo um resultado do pensamento, é condicionado, porque a entidade que forceja está também condicionada; por conseguinte, seu esforço produzirá mais condicionamento, apenas um padrão diferente. Percebendo isso por inteiro, a mente se acha num estado não-condicionado, porquanto percebeu a totalidade do condicionamento, sua verdade ou falsidade. Senhores, isso é como ver algo verdadeiro. O próprio percebimento do que é verdadeiro é o fator libertador. Mas esse percebimento requer completa atenção — não uma atenção forçada, não uma atenção calculista, lucrativa, ditada pelo medo ou desejo de ganho. Quando se percebe a verdade de que tudo o que faça a mente condicionada está também condicionado, cessam todos os esforços dessa ordem; e o percebimento do verdadeiro é que é o fator libertador.

Krishnamurti – O homem sem medo – pág. 63 à 66 — 31 de outubro de 1956

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Se vos ocupais com vosso trabalho, então não o amais


Pergunta: Dizeis que uma mente ocupada não pode receber aquilo que é a Verdade ou Deus. Mas, de jeito posso ganhar a vida, a menos que esteja ocupado com meu trabalho? E vós, não estais ocupado com estas palestras que são vosso particular meio de ganhar a vida?

KRISHNAMURTI: Deus me livre de estar ocupado com minhas palestras! Não estou. E elas não constituem meu meio de vida. Se eu estivesse ocupado, não existiria nenhum intervalo entre pensamentos, aquele silêncio que é essencial para se ver qualquer coisa nova. Em tal caso, o falar me seria a coisa mais aborrecida do mundo. Não quer me aborrecer com minhas palestras, e por esta razão não falo de memória. O que faço é uma coisa completamente diferente. Mas, isso não tem importância, e podemos conversar a seu respeito, noutra ocasião.

O interrogante pergunta como poderá ganhar o seu sustento, se não se ocupar com seu trabalho. Vós vos ocupais com vosso trabalho? Escutai bem isto: Se vos ocupais com vosso trabalho, então não amais o vosso trabalho. Compreendeis a diferença? Se amo o que estou fazendo, não estou ocupado com isso, meu trabalho não está separado de mim. Porém, neste país, somos exercitados — e infelizmente este mesmo hábito se está generalizando no mundo inteiro — para adquirirmos eficiência num trabalho que não amamos. Pode haver uns poucos cientistas, uns poucos técnicos especialistas, uns poucos engenheiros que realmente amam o que fazem, no sentido total da palavra, o que explicarei mais adiante. Mas, em geral, não gostamos do que estamos fazendo, e por esta razão é que andamos ocupados com nosso meio de vida. Acho que se pode perceber uma diferença entre as duas coisas, se se examinar bem isso. Como posso amar o que estou fazendo, se estou sendo impelido, a todas as horas, pela ambição, se quero, com meu trabalho, alcançar um fim, tornar-me pessoa importante, ter êxitos felizes? O artista que está interessado no seu nome, sua grandeza, na comparação, na realização, na realização de suas ambições, deixou de ser artista, sendo meramente um técnico como outro qualquer. E isso significa, realmente, que para se amar uma coisa, faz-se necessária a cessação completa de toda ambição, todo desejo de reconhecimento por parte da sociedade, que afinal está podre (risos). Senhores, por favor, não façais isso! Mas, nós não somos preparados para isso, não somos educados para isso; temos de adaptar-nos a uma certa rotina que a sociedade ou a família nos deu. Porque os meus antepassados foram médicos, advogados, ou engenheiros, tenho de ser médico, advogado ou engenheiro.  E, assim, perdemos o amor à coisa em si — se alguma vez o tivemos, do que duvido muito. E, quando amais uma coisa, não há nenhuma ocupação com ela. O espírito não está pretendendo alcançar alguma coisa ou procurando ser melhor do que outro; toda comparação, toda competição, todo desejo de sucesso, de preenchimento, desapareceu totalmente. É só a mente ambiciosa que anda ocupada.

De modo idêntico, a mente que está ocupada a respeito de Deus, da verdade, nunca o descobrirá, porque se a mente está ocupada com uma coisa, já a conhece. Se já conheceis o imensurável, o que conheceis é produto do passado, e, por conseguinte, não é o imensurável. A Realidade não pode ser medida, e por conseguinte não pode haver ocupação com ela; o que deve haver é só uma serenidade da mente, um vazio, , em que nenhum movimento existe, e é só então que pode despontar na existência o desconhecido.
 
Krishnamurti – Realização sem esforço – pág. 59 à 61 – 14 de agosto de 1955

Só na vigilância, com atenção total o condicionamento é transcendido

Pergunta: Que é o inconsciente, e está ele condicionado? Se está, de que maneira devemos começar, para ficarmos livres desse condicionamento?

KRISHNAMURTI: Em primeiro lugar, a nossa consciência que está desperta, não é condicionada? Compreendeis o que significa esta palavra "condicionado"? Sois educados de uma certa maneira. Aqui, neste país, sois condicionados apara serdes americanos — o que quer que isso signifique — sois criados na "maneira de vida" americana, e na Rússia se é educado na "maneira de vida" russa. Na Itália, os católicos educam as crianças para pensarem de certa maneira, o que é outra forma de condicionamento, enquanto na Índia, na Ásia, nos países budistas, elas são condicionadas de outras maneiras ainda.

Por todo o mundo se vê esse processo deliberado de condicionar a mente pela educação, pelo ambiente social, pelo medo, pela ocupação, pela família — enfim, por todas as maneiras de influenciar a mente superficial, a consciência desperta.

Depois, temos o inconsciente, isto é, aquela camada da mente que está abaixo da superficial, e o interrogante deseja saber se ela também está condicionada. Não está condicionada, condicionada por todos os pensamentos raciais, por "motivos" e desejos ocultos, reações instintivas de uma dada civilização? Suponha-se que sou hindu, nascido na Índia e educado no estrangeiro, etc. Enquanto eu não penetrar e compreender o meu inconsciente, continuarei a ser hindu, com todas as reações simbólicas, culturais, religiosas, supersticiosas, próprias do Bramanismo — todas elas estão, adormecidas, podendo ser despertadas a qualquer momento, e dando avisos e sugestões por meio de sonhos ou nos momentos em que a mente consciente não se acha completamente ocupada. O inconsciente, pois, é também condicionado.

É perfeitamente evidente, portanto, se examinardes bem isso, que a totalidade da nossa consciência está condicionada. Não há nenhuma parte de vós, nenhum "eu superior", em estado não condicionado. O vosso próprio pensar é produto da memória, consciente ou inconsciente, e, portanto, resultado de condicionamento. Vós pensais como comunista, socialista, capitalista, americano, hinduísta, católico, protestante ou seja o que for, porque estais assim condicionado. Estais condicionados para crerdes em Deus, se acreditais, e o comunista não está e se ri de vós, dizendo: "Estais condicionado"" — mas ele também está condicionado, porque foi educado pela sociedade, pelo partido a que pertence, pela sua literatura, para não crer. Assim, todo nós estamos condicionados, e nunca perguntamos: "É possível ficarmos totalmente livres de condicionamento?" O que conhecemos é só um processo de aperfeiçoamento no condicionamento, que é "aperfeiçoamento no sofrer".

Pois bem. Se percebo isso, não apenas verbalmente, mas com toda atenção, então não há mais conflito. Compreendeis o que quero dizer? Quando vos entregais a alguma coisa com todo o vosso ser, isto é, quando entregais completamente vossa mente à compreensão de alguma coisa, não existe conflito. Só aparece conflito quando estais em parte interessado e em parte com atenção noutra coisa; e quando desejais dominar esse conflito, começais a concentrar-vos, o que não é atenção. Na atenção não há divisão, não há distração e, por conseguinte, não há esforço nem conflito; e é só com esta atenção que pode vir o autoconhecimento, que não se faz por acumulações. Tende a bondade de prestar atenção. Autoconhecimento não é uma coisa que se acumula; tem de ser descoberto momento por momento, e no descobrir não pode haver acumulação, nem ponto de referência. Se acumulais autoconhecimento, então toda a compreensão futura será ditada por essa acumulação; por conseguinte, não haverá compreensão.

Assim, a mente só pode transcender todo condicionamento na vigilância, com atenção total. Nesta atenção total não há "modificador", censor, nenhuma entidade que diz: "Devo transformar-me", o que significa que deixa de existir, de todo, o "experimentador". Não há mais "experimentador", "acumulador". Vede, por favor, que é importante compreender isto. Porque, afinal de contas, quando experimentamos qualquer coisa bela — um pôr de sol, uma simples folha dançando ao vento, o luar espelhado nas águas, um sorriso, uma visão, ou o que quiserdes — a mente logo quer apoderar-se dessa experiência, guardá-la, adorá-la, e isso significa que deseja a repetição da experiência; e quando há desejo de repetição, tem de haver sofrimento.

É possível, pois, estar-se num "estado de experimentar" sem haver "experimentador"? Compreendeis? Pode a mente "experimentar" o feio, o belo, ou o que quer que seja, sem haver aquela entidade que diz: "experimentei"? Porque aquilo que é a Verdade, Deus, o Imensurável, nunca poderá ser "experimentado" enquanto existir um "experimentador". O "experimentador" é a entidade que reconhece; e se sou capaz de reconhecer a Verdade, então, já a experimentei antes, já a conheci antes, e nesse caso não é a Verdade. Esta é a beleza da Verdade. Ela permanece eternamente "desconhecida", e a mente, resultado do conhecido, nunca poderá apossar-se dela.

Krishnamurti - Realização sem esforço - pág. 55 à 57 - 14 de agosto de 1955

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Como pode a mente compreender a si mesma?


Seria desperdício de tempo e esta reunião de todo inútil se considerássemos o que se tem dito até agora, e o que se vai dizer, como mero entretenimento intelectual. Quando se necessita de qualquer espécie de estímulo, a mente se torna lerda, embotada, incapaz de pensar com rapidez, e se nos estamos servindo destas palestras apenas como uma nova espécie de estimulante, acho que seria preferível não realiza-las. Por outro lado, se somos capazes de examinar profundamente os movimentos de nosso pensar, na vida diária, e de como começar a compreender o “processo” de nossa própria mente, então, talvez, sejam realmente úteis estas reuniões.

Mesmo quando repetimos certas palavras de profunda significação; vivemos, em geral, bem rotineiramente; vivemos num mundo verbal, num mundo de ações e emoções superficiais. Nossa mente é sem profundidade, mesquinha, estreita, e um dos problemas mais importantes da vida é como tornar essa mente profunda, rica, cheia.  A mente “carregada” de conhecimentos não é uma mente rica; só o é a mente que penetrou fundo em si mesma e descobriu seus próprios e inumeráveis recessos, suas secretas ideias e motivos, e é capaz de penetrar e transcender o pensamento.

Estou empregando a apalavra “mente” não só para denotar a mente superficial que está ativa todos os dias, mas também a mente inconsciente, a mente que oculta tantas compulsões e “motivos”, aquela que busca o preenchimento de secretos desejos, que está cônscia de suas frustrações, suas aptidões, suas limitações, e sempre a buscar, sempre a sondar. Refiro-me à totalidade da mente, tanto à mente consciente como inconsciente. Pouco sabemos dessa totalidade, porque em maioria funcionamos nas camadas superficiais da consciência; estamos ocupados completamente a respeito de nosso emprego, da rotina de nossa vida, de crenças, dogmas e fácil recitação de orações — coisas a que a mente superficial se apega porque lhe são convenientes, proveitosas, e com isso nos damos por satisfeitos.

Agora, se pudermos aprofundar-nos no inteiro processo da mente, penetrar fundo no inconsciente, talvez então possamos descobrir por nós mesmos toda a extensão e limitação da faculdade de pensar. O inconsciente, por certo, não é um mistério, uma coisa que temos de aprender com os psicólogos ou com os que estudam filosofia. Ele é parte integrante de nossa existência diária e está constantemente a indicar algo, a fornecer sugestões, mas acontece que nossa mente superficial acha-se sempre tão ocupada, tão atarefada com seus problemas triviais, que não lhe sobra tempo ou atenção para receber essas sugestões; mas a mente oculta lá está. Ela não é mais sagrada nem mais divina do que a mente consciente, porquanto as duas fazem parte do processo total de nossa consciência, e, para podermos transcender as limitações dessa consciência, devemos compreender suas peculiaridades.

Em geral, julgamos ser necessário passarmos por essa luta e conflito, por pesares e frustrações diárias; que é preciso a mente disciplinar-se; que certas coisas devem ser superadas ou rejeitadas a fim de se alcançar um degrau transcendente à mente, mas não me parece possível transcendê-la dessa maneira. Para descobrir o que está além da mente, cumpre investiga-la em profundidade e compreender os seus movimentos; porque a mente que não compreendeu de todo a si própria projeta ideias, ilusões, que assumem uma falsa realidade. Enquanto eu não compreender as características de minha própria mente, as características do “eu”, todo impulso a buscar baseia-se nos desejos, nos “motivos” da mente. Dessa forma, se não compreenderem realmente as peculiaridades da mente, é impossível descobrir o verdadeiro. Eu posso dizer que existe um Atman, uma “superalma”, uma realidade atemporal, mas isso será uma mera repetição baseada em meu condicionamento, minha crença, e sem validade alguma. Enquanto eu não compreender toda a esfera de meu pensamento, todo conteúdo de minha mente, não é possível ir além; e nós temos de ir além, porquanto, se não descobrirmos algo totalmente novo, a vida se torna mecânica, superficial, estéril.

Assim, como pode a mente compreender a si mesma? Existe, dentro da esfera da mente, uma entidade superior à mente? Existe, dentro do processo do pensamento, uma entidade que está que está acima e além do pensamento e que, por conseguinte, é capaz de controlar o pensamento? Ou essa coisa a que chamamos Atman, o “sublime”, a “alma”, é uma mera invenção do pensamento e, consequentemente, está compreendida na esfera do pensamento? Considero importante compreender isso; porque, se existe uma superentidade, um agente exterior que transcende todo o processo de pensamento, então nada adianta pensarmos a respeito dele, porquanto não se acha em sua esfera. Só podemos pensar acerca de coisa que já conhecemos e que podemos reconhecer; mas, para se encontrar o que está além da mente, o pensamento terá que cessar.

A maioria de nós crê — não é verdade? — em algo existente além da mente, um observador que observa não só a mente, mas também as coisas da mente; que controla, molda, disciplina o pensamento. Enquanto não pusermos em dúvida a existência de tal entidade transcendente à mente, transcendente à esfera do pensamento, continuaremos a considerar essa entidade como o princípio que guia a nossa vida e molda a nossa conduta.

Ora, existe tal entidade — Atman, alma, ou o que quiserdes — a qual nos está moldando, dirigindo e ajudando a viver uma vida são e equilibrada? Ou essa entidade se encontra dentro da esfera de nosso próprio pensar, sendo uma invenção de nosso próprio pensamento e, por conseguinte, irreal? A mente é produto do tempo, de experiências inumeráveis, resultado de muitos condicionamentos. O comunista não crê em Atman, na alma, porque foi condicionado para crer diferentemente, assim como vós fostes condicionados para crer que existe uma alma, um Atman. Vós, tal como ele, partis de um postulado, uma asserção, resultantes ambos de uma mente condicionada. Enquanto não se perceber realmente esse fato e não ser profundamente compreendido o seu significado, a mente é incapaz de transcender a si própria; ou, expressando-o diferentemente, o pensamento nunca pode estar tranquilo, a mente nunca pode estar completamente quieta, porque existem sempre “observador” e “coisa observada”; há sempre o experimentador a desejar mais experiência, e assim se torna a nossa vida a infindável série de lutas que realmente é.

Ao terdes uma experiência aprazível, desejais repeti-la; e quando a experiência é dolorosa, vós, como “experimentador”, desejais afastar a dor. O pensador abre a porta ao prazer e repele a dor, e por isso trava-se uma perene batalha interior, a qual se torna bem óbvia quando examinais por vós mesmos. Entretanto, tendes a ideia de que o pensador, o observador, existe acima e além do pensar. Credes, porque o lestes em vossos livros religiosos que o Atman ou a alma existe e está observando o pensamento. Mas, se examinardes com atenção, vereis que quando não há pensar não há pensador; quando não há exigência de mais e mais experiência, nem acumulação de experiência, não há “experimentador”. Convencionou-se que existe uma entidade transcendente a tudo isso. Essa entidade, porém, ainda é resultado do pensar, e, por conseguinte, está compreendida na área do tempo; logo, ela não é atemporal, nem divina.

Afinal, que é a mente? Por favor, senhores, não vos limiteis a escutar minhas palavras, minhas explicações ou descrições, porém, observai vossa própria mente em funcionamento. Eu não vos estou dando instruções positivas, pois, como já expliquei, todo pensar positivo é, realmente, um estado “sem pensamento”. Já se puderdes pensar negativamente, ou seja, observar vossa mente sem a dirigirdes, sem lhe dizer o que fazer — porque o “dirigente”, a entidade que diz “isto é correto, aquilo é errado”, faz também parte da mente — se puderdes simplesmente observar a vossa mente, sem nada exigirdes, sem traduzirdes o que vedes, descobrireis então que essa própria observação é esclarecedora, porque a mente não está então buscando um resultado, nem se preocupa com recompensa ou punição; ela deseja apenas observar, saber o que é verdadeiro. E não se pode saber o que é verdadeiro se existe um “dirigente” já moldado pelo passado, por um certo condicionamento. Portanto, escutai, a fim de descobrir por vós mesmos; e só podereis fazê-lo ao observardes vossa mente, isto é, quando a mente observar a si própria.

Ora, que é a mente? Ela não é apenas uma série de reações aos vários desafios que estão sempre a assaltar-nos, mas também uma série de lembranças, conscientes e inconscientes, as quais estão constantemente moldando o presente em conformidade com o condicionamento do passado, para ajustá-lo a um padrão futuro. Observai a vós mesmos, senhores, não escuteis e não repitais apenas as minhas palavras. Observai-vos e vereis que vossa mente é uma série de desejos, mais o impulso de preenche-los — e isso envolve medo e frustração. Desejo uma coisa, não a consigo, sinto-me frustrado, desditoso. Vós me amais, eu não vos amo, por conseguinte me sinto frustrado, etc., etc.

A mente é também uma série de ideias relacionadas com o passado e com os nossos desejos; isto é, a mente pensa em termos de progresso. Sou isto, quero ser aquilo, e necessito de tempo para chegar . Se sou invejoso, digo que necessito de tempo para alcançar o estado de “não inveja” — e chamamos isso progresso, evolução. Mas o é, realmente? Tende a bondade de observar a vossa mente em funcionamento. Pode o pensamento “progredir” para a Verdade, a Realidade, Deus, ou só pode mover-se do “conhecido” para o “conhecido”? E o pensamento é independente da memória, ou, simplesmente, repetição desse fundo constituído pela memória?

Tudo isso constitui o conteúdo da mente, sendo a mente o consciente e o inconsciente. No inconsciente estão armazenadas as memórias raciais bem como as experiências individuais que não compreendi; e todas essas lembranças, coletivas e individuais, martelam a mente, nesse processo que chamamos pensar, não é exato? O desejo, o medo, a frustração, o desejo de agir, de melhorar, de procurar preencher-se em alguma ambição, o pensar que existe Atman, uma “superalma” ou que nada disso existe — eis o que constitui a mente.

Ora, se não compreendeis a totalidade do “eu”, isto é, se a mente não compreende a totalidade de si própria, sua atividade estará sempre restrita à esfera que ela própria criou. A menos que a mente se liberte de seu condicionamento, tanto consciente como inconsciente, não poderá haver investigação real, porque vossa busca será conforme o vosso condicionamento, e vossas experiências de acordo com vosso “fundo” (background). As experiências de um homem que tem visões do Cristo, de Krishna, disto ou daquilo, estão obviamente baseadas no seu “fundo”, sua tradição. Assim, a mente que está em busca do verdadeiro, que deseja descobrir se existe a Verdade, a Realidade, Deus, deve estar livre de seu “fundo”; e, se não descobrimos o que é verdadeiro, nossa vida se torna um padrão mecânico, porventura modificado por circunstâncias, porém, sempre um padrão mecânico, a que chamamos “progresso”, “evolução”.

Agora, tratemos de ir um pouco mais longe. Cônscia de sua própria totalidade, percebe a mente que todo esforço feito para alcançar a si própria faz parte ainda do mesmo padrão, embora modificado. Compreendeis? A mente que busca a liberdade, por exemplo, é uma mente que criou a ideia da liberdade e persegue essa ideia. Conhecendo apenas a escravidão, diz ela: “Devo ser livre” — e luta então pela liberdade. Deste modo, sempre pensamos que o esforço é necessário para se ser livre; mas, se compreendemos que o esforço só existe quando a mente separou a si própria como “entidade que forceja”, como “observador”, como “pensador”, separado da escravidão, vê-se então que o esforço é fútil. Exato, senhores?

Consideremos diferentemente. Se não há “observador” separado da “coisa observada”, como pode haver esforço? Só há esforço quando existe um observador tentando alterar a coisa observada. Mas, se compreenderdes que o observador é a coisa observada (e não se trata de uma fórmula intelectual, pois é uma extraordinária experiência constatar que não há observador separado do pensamento), vereis que não há esforço de espécie alguma. Verifica-se então um processo inteiramente diferente, uma maneira completamente diversa de observar o que chamamos inveja, ou o que quer que se observe. Enquanto houver observador fazendo esforço para alcançar um certo estado, tem de haver conflito, e não é por meio de conflito que nasce a compreensão.

Ora, esse processo total é a mente; e quando a mente compreende seu “processo” total, ela se torna quieta, extremamente tranquila, porque não há desejo de ser ou de não ser. Essa mente não é posta tranquila, ou induzida a ficar tranquila, mas se torna tranquila porque compreendeu o conteúdo de si própria. Só então é possível descobrirdes por vós mesmos se existe a Realidade ou não. Enquanto a vossa mente não houver alcançado este estado, vossas asserções de que existe ou não a Realidade, Deus, ou o Atman, nada significam. São puras repetições por parte de uma mente condicionada e que, como disco de gramofone, repete seguidamente a mesma frase.

O autoconhecimento, pois, é essencial, mas não pode ser encontrado nos livros; o autoconhecimento resulta de observarmos a nós mesmos no espelho das relações, o qual revela o funcionamento total da mente. Só depois de havermos compreendido a totalidade da mente, existe a tranquilidade.

Krishnamurti – O Homem Livre – pág. 38 à 43 – 24 de outubro de 1956

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Compreendendo a anatomia da fundamental transformação interior

Para a maioria de nós, se já temos refletido nestes assuntos, a idéia de transformação deve ser um tanto confusa; porque já vimos que as chamadas revoluções, embora tenham produzido certos efeitos externos, talvez benéficos, se tornaram, afinal, profundamente prejudiciais ao homem. É bem de ver que a transformação fundamental deve ser algo mais do que simples mudança de uma estreita esfera de pensamento para outra. Com as coisas correndo como estão, no mundo, pode-se perceber a necessidade de mudança radical de alguma espécie, não só nos níveis econômico e social, mas também profundamente, no íntimo de cada um de nós; e para os que pensam verdadeiramente, a sério nestas questões, o problema deve ser o de como produzir a transformação. A transformação operada mediante compulsão, em qualquer forma, não é, obviamente, transformação nenhuma. Se sou forçado ou influenciado a transformar-me, isso não é uma verdadeira transformação, porquanto estou apenas me ajustando a um padrão que me foi imposto de fora ou que eu próprio estabeleci. Tampouco a transformação consiste em adaptar-se a pessoa a um certo ambiente, pois isso é apenas ajustar-se a um modelo que se julga será benéfico ou um melhor método de vida.

Ora, se se percebe que o ajustamento, o conformismo, ou qualquer espécie de mudança operada pela compulsão o por determinada influência não é mudança nenhuma, como então promover a mudança? A transformação fundamental é evidentemente essencial, não só neste país mas no mundo inteiro; e como pode iniciar-se essa transformação não resultante de compulsão, conformismo ou ajustamento?

Pensamos em geral que o ajustamento, a adaptação, ou o sermos obrigados a agir num certo sentido, é um processo de transformação, e nunca tivemos dúvidas sobre se isso é realmente uma transformação revolucionária. Eu não acho que seja; porque, se observardes a vós mesmos quando vos estais adaptando, ajustando, quando vos deixais influenciar ou compelir, vereis que apenas vos encaixais num padrão de pensamento, antigo ou moderno, e que vossa essência íntima em nada mudou.

Portanto, o problema é: como podemos mudar radicalmente, essencialmente? Não sei se já tendes pensado bem nisso, pois em geral permitimos de bom grado que nos ajustem a um padrão; pensamos ser suficiente produzir uma transformação parcial no mundo, e com isso nos satisfazemos. Mas, se examinardes a questão com profundeza, tereis então de interrogar-vos como será possível transformar a totalidade de nosso ser, de nossa consciência, como se poderá operar uma revolução completa no pensar e na apreciação dos valores. Porque, evidentemente, só essa transformação revolucionária, profunda, interior, no âmago de nosso ser, pode efetivamente libertar a força criadora da realidade e criar um mundo de todo diferente. Se não houver essa fundamental transformação interior, o mero ajustamento externo, a aquisição de mais alguns conhecimentos, o estabelecimento de mais algumas reformas, etc., é realmente uma coisa muito superficial. É como vestir uma capa nova, enquanto por baixo continuam existentes as mesmas condições antigas. Assim, se a questão deveras vos interessa, como pode uma pessoa mudar inteiramente?

Permiti-me sugerir-vos escutardes o que estou dizendo sem emitir julgamento, sem dizer que é impossível. Por favor, não traduzais o que se está dizendo nos termos dos vossos próprios conhecimentos, nem o escuteis em atitude defensiva, comparando-o com o que outros vos disseram ou com o que lestes nos livros sagrados — que não são mais sagrados do que outro livro qualquer. Escutar é uma tarefa bem difícil; em geral, nunca prestamos ouvidos senão à voz de nosso próprio pensar, de modo que, na realidade, nada nos é comunicado. Escutar com julgamento, comparando o que se ouve com o que já se sabe ou leu, é uma forma de distração. Mas, se sois capaz de escutar sem comparação, com atenção natural, então o próprio ato de escutar é um ato de meditação que, indubitavelmente, gera profunda transformação. Tentai de quando em quando observar-vos, para ver se escutais realmente alguma coisa, o que vossos amigos dizem, o que diz vosso marido ou esposa, o que diz vosso patrão — e vereis que vossa mente está sempre totalmente ausente. Simulais estar escutando, mas só escutais pela metade; ou tendes medo, ou estais enfadado, ou simplesmente não desejais escutar e, portanto, não há comunicação direta. Como disse, o escutar, por si só, opera um extraordinário milagre. O próprio ato de escutar produz uma compreensão imensa, sem esforço algum de vossa parte; e, uma vez que vos achais aqui e eu vos estou falando, desejo sugerir, se permitis, que escuteis para descobrir o que estou tentando transmitir-vos.

A meu ver, uma transformação fundamental — não um "ressurgimento religioso" mas uma revolução religiosa —precisa ser efetuada, porquanto, sem ela, os nossos problemas se multiplicarão; embora tenhamos geladeiras e outras coisas mais, ir-nos-emos tornando cada vez mais superficiais e teremos tribulações maiores ainda. E para se operar essa transformação profunda, no íntimo de nosso ser, não há dúvida de que temos de investigar o problema da consciência e compreender a anatomia da transformação.   A maioria de nós procura transforma-se mediante esforço, não é verdade? Isto é, vemos que somos cruéis e dizemos: "Preciso transformar-me"; e, assim, empenhamo-nos em nos transformar, tentamos forçar-nos, pela disciplina, a não ser cruéis. Ora, examinemos o impulso que nos leva a desejar modificar-nos, porque, se não compreendemos esse impulso, se não compreendemos totalmente esse processo de consciência que diz: "Preciso modificar-me", não é possível nenhuma transformação básica, ainda que haja ajustamentos superficiais.

Por favor, não escuteis o que estou dizendo comparando-o com o que lestes acerca da consciência no Bagavagita ou noutro livro qualquer, porque o que estamos tentando fazer não é comunicar idéias, porém, antes, experimentar diretamente o que estamos escutando. A menos que experimentemos o que estamos escutando, estas palestras nenhum valor terão; serão apenas mais um conjunto de idéias, um processo de "mentalização", o qual, por mais interessante que pareça, nenhuma significação terá. Mas se, ao contrário, vós e eu estivermos realmente escutando o que se está dizendo — vós aí sentados e eu aqui a falar-vos —, se, através da descrição verbal, cada um de nós está observando o funcionamento de sua própria mente, então acho que estas palestras serão realmente úteis.

Estamos, pois, tentando descobrir como poderemos transformar-nos, não apenas superficialmente, mas no âmago de nosso ser, e isto significa que temos de investigar a questão da consciência. Quando pergunto a mim mesmo o que é a consciência, existe um interrogante separado da pergunta, não é verdade? Existe a entidade que fez a pergunta e está aguardando a resposta; e esse "processo" é o começo da consciência, não é? O interrogante diz: "Preciso saber como funciona a consciência" — e começa então a investigar; e tanto a investigação como a resposta dependem de como ele fez a pergunta.

Por outras palavras: Eu desejo saber o que é a consciência, e não se trata de uma pergunta vã ou simplesmente curiosa. Pergunto a mim mesmo o que é a consciência, porque vejo que preciso transformar-me fundamentalmente, que a totalidade de meu ser precisa passar por uma transformação completa. Ora, essa transformação revolucionária se efetua por meio de uma série de esforços por parte daquele que diz: "Preciso transformar-me"? Deve ele desenvolver a necessária qualidade de vontade, e transformar-se de acordo com essa vontade? Compreendeis?
Estou-me interrogando e espero estejais também perguntando a vós mesmos o que é esta consciência, este "eu" que diz "Preciso transformar-me". Qual a impulsão, a ação, a força do inquiridor que tenta modificar-se? Esse processo acha-se na esfera da consciência, na esfera do pensar, não é verdade? Estais seguindo? Isso não é muito complexo, porém, bem simples.

Quando desejo modificar-me, já tenho o modelo ou a idéia segundo a qual devo modificar-me. Isto é verdade, não? Ora, isso é realmente transformação ou é tão só um movimento do "conhecido" para outro "conhecido"? Compreendeis? Porque sou cruel, digo que devo ser bondoso. O "processo" de esforçar-me para ser bondoso é um movimento no sentido de uma coisa já conhecida; e isso é realmente transformação? Há transformação se me movimento para algo que conheço? Ora, por certo, só há transformação se a mente se move para o desconhecido. Quando ela persegue aquilo que já experimentou, seu movimento é meramente uma continuação do conhecido em forma modificada e, por conseguinte, não é transformação nenhuma.

Suponhamos que, sendo violento, tenho o ideal de "não-violência". O ideal já é conhecido. Imaginei o que não é ser violento e, portanto, o ideal nasceu de meu atual estado de violência, e quando me modifico no sentido desse ideal, estou-me movendo dentro da esfera do conhecido; por coseguinte, isso não é transformação. Esse é o "processo" inteiro da consciência, não? Senhores, não concordeis comigo, pois tendes de pensar nisso de maneira completa, senti-lo integralmente.

Forcejo para transformar-me em conformidade com o que chamo o ideal e que é o oposto daquilo que experimentei como "violência"; consequentemente, criei um conflito entre o que é  e o que deveria ser, e considero esse conflito necessário para se produzir a modificação. Tudo isso é "processo" da consciência, não? Quer consciente, quer inconsciente, esse "processo" é a consciência. Se vós mesmos o virdes claramente, descobrireis algo extraordinário.

Estou, pois, perguntando a mim próprio se há transformação ao esforçar-me para transformar-me. Quando me esforço para transformar-me, há transformação ou apenas o ajustamento a um padrão estabelecido por mim mesmo ou por algum agente externo? Isto é, qualquer espécie de transformação baseada na tradição ou na autoridade não é transformação nenhuma, porque então nos estamos apenas ajustando a uma idéia, e todas as idéias fazem parte do "conhecido", resultam do fundo (background) que as "projeta". Assim, qualquer mudança operada por meio do esforço em direção àquilo que chamamos "ideal" — que é o "conhecido" — não é transformação nenhuma. Quando se persegue o ideal da "não violência", por exemplo, deseja-se alcançar um certo estado por meio de compulsão, ajustamento a padrão — e isso é outra forma de violência.

A consciência é esse movimento do conhecido para o desconhecido, movimento de compulsão, de esforço. Ao dizer o comunista: "Eu tenho o correto padrão da existência", esse padrão origina-se daquilo que ele já conhece. Ele cria uma utopia consoante com seu conhecimento e interpretação da história e, se é um homem importante, leva a cabo o seu plano, enquanto nós, a massa do povo, nos submetemos. É isso o que tem acontecido, numa ou noutra forma, em todas as partes do mundo. Os Shankaras, os líderes, os instrutores têm idéias, nós as lemos e a elas nos ajustamos e pensamos que nos estamos transformando. Poderá ocorrer um ajustamento superficial, mas não há transformação nenhuma, no sentido a que me refiro, isto é, a transformação total do nosso ser, de forma que nossa maneira de pensar seja totalmente nova.

O que é novo não pode produzir-se mediante esforço, mediante movimentação do conhecido para o conhecido, ou seja, a perseguição do ideal. E, no entanto, é isso que estais fazendo em vossa vida de cada dia, não é verdade? Percebeis que sois ambicioso, ou cruel, ou invejoso, e dizeis: "Preciso transformar-me", e começais a ajustar-vos ao padrão de um ideal que vós ou outros estabeleceram, e pensais que essa é uma importantíssima transformação. Mas, se realmente o examinardes, se penetrardes todo o processo psicológico do pensar, vereis que enquanto a mente está pensando em termos de uma dualidade, tal seja a "violência" e "não violência", enquanto se empenha em ajustar-se ao oposto daquilo que ela é — o qual é meramente a projeção do conhecido e, portanto, uma continuação da mesma coisa em forma modificada — não pode haver transformação básica.

O importante, pois, é compreender, perceber ou experimentar realmente a falsidade de vosso esforço para vos transformardes. Os gurus, os mahatmans, os mestres e todos os livros religiosos vos mandam forcejar, controlar-vos, disciplinar-vos, e ao perceber que esse esforço é realmente falso significa que deveis ser capaz de olhá-lo sem a autoridade do líder, político ou religioso, inclusive eu próprio. Para "experimentardes" a verdade ou a falsidade do que vedes, não podeis interpretá-lo de acordo com outra pessoa, não importa quem seja ela. Se penetrardes essa questão a perceberdes claramente, por vós mesmo, que não pode haver transformação enquanto há ajustamento, isto é, enquanto vos estais obrigando a adaptar-vos a um padrão estabelecido por vós ou por outro — se perceberdes realmente a verdade ou a falsidade disso, vereis então que vossa mente se despojou de toda e qualquer autoridade; e não é esse o verdadeiro começo  de uma revolução fundamental?

parece-me haver necessidade — principalmente no tempo presente — de pessoas vivamente interessadas nessas coisas — mas não me refiro às que se dedicam seriamente ao Gita, ao comunismo, ou a outro padrão qualquer, porquanto elas são simplesmente "conformistas". Refiro-me às pessoas que séria e ardentemente desejam descobrir como efetuar em si mesmas uma revolução total. Apresenta-se, assim, a questão: Pode a mente libertar-se do conhecido? — pois só então há transformação fundamental.

Notai, por favor, senhores, que isto requer muita penetração, investigação. Não concordeis comigo, mas examinai, meditai, dissecai vossa mente, para descobrirdes a verdade ou a falsidade de tudo isso. Saber o que é o "conhecido" pode produzir transformação? Preciso ter conhecimentos para construir uma ponte; mas há necessidade de minha mente sabem em que vai transformar-se? Certo, se sei qual será o estado de minha mente depois de transformar-me, então já não há transformação. Esse conhecimento é prejudicial à transformação, porquanto se torna um meio de satisfação e, enquanto existir um centro em busca de satisfação, recompensa ou segurança, não há transformação nenhuma. E todos os nossos esforços baseiam-se nesse centro constituído pela idéia de recompensa, punição, êxito, ganho, não é verdade? Eis o que interessa à maioria de nós, e se ele nos ajuda a obter o que desejamos, mudaremos; mas essa mudança não é, de modo nenhum, a verdadeira transformação. Assim, a mente que deseja achar-se, fundamentalmente, profundamente, num estado de transformação, num estado de revolução, deve livrar-se do "conhecido". Ela então se torna sobremodo tranquila, e só nesse estado poderá experimentar a transformação radical indispensável.

Krishnamurti - O Homem Livre - Ed. Cultrix - pág. 29 à 34 
Nova Deli - 21 de outubro de 1956
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill