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quarta-feira, 11 de abril de 2018

O mecanismo da mediocridade


O mecanismo da mediocridade

[...] A mediocridade é própria da mente vulgar, da mente estreita, limitada. Em regra, a mente vulgar está interessada nas coisas imediatas; e as coisas imediatas podem ser projetadas para o futuro, mas continuam a ser “as coisas imediatas”. Os políticos, ainda que se interessem pelo futuro, estão realmente interessados no “imediato”, em relação com o futuro. A maioria de nós também está interessada nas coisas imediatas — a “perspectiva curta” em vez da “perspectiva longa” — nossa vida está circunscrita aos interesses imediatos. Isto não significa que o imediato não seja importante; mas se ele se torna de suma importância e nos esquecemos totalmente da “perspectiva longa”, então a imediata preocupação pelo pão de cada dia — a maneira de viver, o marido, a mulher, os pensamentos banais — esta “perspectiva curta”, limitada, estreita, conduz à aflição, conduz ao sofrimento e à luta. E a mente vulgar, medíocre, sempre se devota a um certo movimento, uma certa crença, um certo dogma. É da natureza da mente medíocre o pertencer a alguma coisa. É da natureza da mediocridade, hoje tão generalizada no mundo, o interessar-se exageradamente pela sociedade.

[...] Ao falarmos da mente medíocre, da mente superficial, não a estamos considerando como uma idéia — como coisa que devemos desfazer, que devemos substituir por uma mente bem inteligente, muito ativa, ampla e profunda. Estamos, apenas, mostrando que a mente medíocre é o solo em que medra o sofrimento. E, como a maioria de nós se encontra em sofrimento, desta ou daquela natureza, se não tratarmos de deitar abaixo os muros da mediocridade, o sofrimento invariavelmente continuará existente.

[...] O homem interessado nos fatos não tem ideais; e nós estamos interessados nos fatos. O fato é que há mediocridade, vulgaridade — e isto não significa que outro qualquer seja medíocre, mas, sim, que cada um de nós é medíocre. Assim, devemos estar apercebidos desse fato, devemos aplicá-lo a nós mesmos. A mais elevada forma da crítica é a autocrítica; mas não gostamos de criticar-nos: tratamos meramente de evitar o que vemos. Ao falarmos de mediocridade, vulgaridade, superficialidade, ficai apercebidos disso em vós mesmos. O percebê-lo apenas verbalmente nenhum valor tem. Essa percepção nenhuma modificação opera na mente medíocre.

A mente medíocre se dedica a uma dada ação — ação social, ação econômica, ação política, ou à aquisição de conhecimentos. A mente vulgar está sempre assumindo compromissos; ela sempre pertence a alguma coisa — e o desejo de pertencer é um fenômeno psicológico da mente intelectual. Hoje, ela pertence ao partido comunista e amanhã o rejeita; está entregue a uma certa atividade dogmático-religiosa, que mais tarde rejeita. Deveis observar, se tendes notado esse fato, que os chamados “intelectuais” aderem, coletiva ou individualmente, a uma dada teoria, uma dada utopia, um certo movimento religioso. O desejo de pertencer é desejo de permanência.

Segui o que estou dizendo, por favor, pois estamos investigando o processo da meditação, e isto faz parte da meditação. Todos vós pertenceis a alguma coisa. Não sois uma entidade individual, integrada. Sois agrupados pela sociedade, pelas influências ambientes, que vos impelem a pertencer. Sempre que uma pessoa se interessa em operar uma modificação no mundo, pertence a alguma coisa. Todos nós pertencemos a crenças de várias formas, dogmas e atividades várias, porque, no pertencer, nós não somente nos expandimos, mas também, identificando-nos com a coisa a que nos devotamos, temos o sentimento de atuar — intelectual, física, emocionalmente — como uma entidade total num mundo em desintegração. Se não se compreende o impulso e nos devotamos a determinada norma de ação — qualquer que seja ela, um certo pensamento, uma certa ideia, um certo aspecto do saber técnico — ou pertencemos a alguma coisa, isso por certo é um indício de mediocridade.

A mente medíocre quer então investigar a imensidade da vida. Tendo-se ligado a alguma coisa, quer então, em virtude dessa ligação, compreender o sentido de todas as coisas. Ora bem, cumpre-nos investigar o que é a meditação — algo verdadeiramente maravilhoso, que nada tem que ver com romantismos, com combinações de ideias, especulações, visões, ou sensações de toda ordem — pois tudo isso é completamente infantil. Assim, esse impulso a pertencer, a ligar-se a um método, um sistema, tem de ser compreendido.

A maioria de nós — se me permitis dizê-lo sem nenhum desrespeito — é medíocre; mesmo os mais talentosos são medíocres, porque seu talento é parcial, limitado, estreito. Nenhum dom vos deva acima da mediocridade. Pode um pintor pintar os mais belos quadros, mas é ainda uma pessoa medíocre se tem ânsia de fama, de reconhecimento pela sociedade. Ele quer tornar-se rico, conhecido, famoso e tudo isso é indicativo de uma mente pequenina, superficial, vulgar, embora dotada de talento. Em geral, infelizmente, não temos grandes talentos nem grande capacidade de pensamento. Talvez seja melhor assim, porquanto, quando desejamos ardentemente investigar, descobrir algo, o homem que se ligou a alguma coisa se recusa a investigar o que quer que seja a não ser pelas diretrizes que ele próprio escolheu.

Nessas condições, para descobrir o que é a mente meditativa não deve haver ligação nenhuma — e isso é dificílimo, visto que a pessoa pode estar inteiramente devotada à oração, à repetição de palavras, à meditação sobre uma dada coisa, ou devotada a um símbolo. A maior parte de nós estamos devotados a símbolos — e não à realidade, porque a realidade é perigosa demais, sobremodo destrutiva. A mente vulgar não pode conter a realidade; por consequência, procura símbolos, devotou-se aos símbolos — o símbolo da igreja, do cristianismo; o símbolo do hinduísmo; o símbolo do islamismo, etc. A mente medíocre se ligou ao símbolo, à palavra, à sombra, ao irreal; não ao fato, mas à imagem esculpida pela mente ou pela mão, no templo, ou na mesquita, ou na igreja. Observai isso, vede-o vós mesmo. Uma vez ligado a alguma coisa, tratais de meditar e precisais, então, de métodos, de sistemas, para alcançardes o que pensais ser o permanente, o que pensais ser Deus, o que pensais ser a mais maravilhosa das visões. O que pensais é condicionado por vosso passado, pela sociedade em que viveis. Naturalmente, se sois cristão, tendes visões extraordinárias do Cristo, e “projetais” essas visões. Se sois hinduísta, tendes vossas próprias imagens, vossas próprias visões. Toda visão, toda imagem, uma vez projetada, proporciona uma certa sensação; a isso chamais meditação. Mas, se o examinardes, vereis quanto é infantil, porque é vosso próprio desejo que está a buscar preenchimento numa irrealidade sem nenhuma base, a não ser vosso próprio pensamento; este se acha condicionado pelo passado, pela sociedade em que viveis, pela experiência que acumulastes em virtude dessa condição.

A meditação, pois, não é uma busca de visões, imersão na oração. A oração implica súplica, rogo. Quando pedis algo? Quando buscais? Quando achais? Fazeis tudo isso quando vos vedes perturbado, sofrendo, aflito, quando estais em conflito. E isso significa que desejais conforto — não o conforto do lar, porém conforto psicológico. Por isso, orais; e, infelizmente, vossa oração é ouvida, porque achais o desejado conforto. Esse conforto é provocado, formado, numa ideia que tendes projetado, numa ideia ou numa crença ou num dogma em que buscais abrigo, assim como quem busca abrigo numa tempestade — um abrigo feito de palavras, de ideias. Com o perseverar nessa prática, o devotar-se inteiramente a ela, a pessoa espera encontrar abrigo; mas esse abrigo consiste apenas em palavras, não é a realidade, algo substancial. E isso satisfaz à maioria de nós.

Meditação, pois, não é oração, não é o desejo de achar a Verdade. A mente vulgar que busca Deus encontrará o Deus de sua própria vulgaridade. Compreendeis, senhores? Se tenho uma mente comum, limitada, estreita, superficial, cheia de ambição e avidez, de inveja e ciúme de outrem — e começo a pensar em Deus, meu Deus é igualmente vulgar, estúpido; e essa estupidez me satisfaz.

Pois bem, estamos investigando o processo da meditação. Para investigar, deveis em primeiro lugar negar, deveis proceder negativamente — isto é, deveis estar apercebido de algo que nenhuma realidade tem, a não ser a realidade projetada de vosso próprio desejo, vossa própria fantasia; deveis repudiar o falso. Assim, pelo pensar negativo vamos descobrir alguma coisa positiva. Mas o pensar negativo é essencial, pois é a mais elevada forma de pensar e não o pensar positivo. Pensar positivo é mecanismo de imitação, movimento de conhecido para conhecido. Jamais descobriremos o desconhecido se nos movemos meramente do conhecido para o conhecido, que é o chamado processo positivo. Dessa maneira, jamais descobrireis por vós mesmo o que é a meditação real. As coisas que nos têm sido oferecidas como meditação são por demais elementares, completamente desprovidas de base psicológica. Assim, se tendes suficiente interesse, se desejais realmente examinar até o fim a questão da meditação — e não apenas vos entreterdes com ela — deveis meditar quando vos dirigis ao escritório, quando constituís família, quando gerais filhos. A meditação é necessária, porque destrói os muros da mediocridade, os muros da respeitabilidade e da imitação. Necessária é uma mente de todo livre exatamente no começo, e não no fim.

Estamos, pois, pensando negativamente para descobrir o que é a meditação. Meditação não é contemplação: contemplar é pensar numa ideia, concentrar-se numa certa coisa, geralmente um símbolo ou uma frase lida nos chamados “livros sagrados” — que em nada são sagrados, porém simples livros como outros quaisquer. Selecionais uma frase e nela começais a refletir; e chamais isso “contemplação”. Não cuidais de investigar a entidade que contempla. Essa entidade é condicionada; essa entidade é medíocre, estreita, ciumenta. E essa é a entidade que investiga, que se concentra na contemplação de uma certa coisa!

A meditação, pois, não é oração. Meditação não é contemplação. Meditação não é observância de um dado método ou sistema, O método ou sistema condiciona a mente. E, aquilo que o método ou o sistema oferece, obtereis; mas o que obtiverdes será uma coisa morta. É como ter uma mente embotada e estúpida que se disciplinou por um sistema e se recusa a pensar mais; essa mente perdeu toda a flexibilidade, toda a sensibilidade; já não é nova. Assim, a meditação não é um sistema para ser praticado. Não é, por igual, um processo de disciplinar a mente. Segui intelectualmente tudo isso que estou dizendo, se não puderdes fazê-lo realmente. Se na realidade o seguirdes, podereis ir muito longe. Nesta tarde, pretendo ir muito longe com aqueles que sejam capazes de acompanhar-me, sem bagagens, livres.

Consequentemente, a meditação não é nenhuma dessas coisas, nem tampouco é disciplina. Que significa disciplina? Disciplina significa obediência, imitação, ajustamento a um padrão, uma ideia, um ideal; por conseguinte, exprime “controle” que, por sua vez, implica repressão — mas isso não quer dizer que uma pessoa pode fazer o "'que entender. Estamos examinando todo o mecanismo da disciplina. Sempre que há repressão, há contradição; e sempre que há contradição, há conflito e esforço. A mente que forceja para alcançar algo — com exceção de coisas mecânicas — alcançar aquilo a que chama Deus, alcançar um alvo, um fim — é uma mente morta. Para a meditação necessita-se de uma mente sobremaneira flexível, altamente sensível. E ninguém pode ser sensível se está “comprometido”, se está preso a um sistema inventado pelo homem sob a compulsão do medo.

Nada disso, pois, é meditação. Mas é preciso preparar a base para a meditação. Não sendo ela nenhuma daquelas coisas, é de todo fútil pensar sequer nos óbvios artifícios psicológicos com que nos temos enganado através de séculos. É preciso lançar a base correta. A base correta da meditação é: não ser ambicioso, não ter inveja, não aceitar autoridade de espécie alguma. O lançamento da base é da mais alta importância, porquanto sem ela não podemos edificar. Não se pode construir uma casa sem alicerces; ela desaba. Ser sem ambição, sem autoridade, sem inveja, sem medo, sem ciúme, tem de ser uma coisa que deve ser vista imediatamente, e não cultivada como ideal; e aí é que está a dificuldade.

A importância de lançar a base da meditação tem de ser de pronto percebida. Se dizeis: “Eu lançarei a base”, estais introduzindo o fator tempo. Servindo-vos apenas de um tijolo — a inveja — para lançardes a base, podeis dizer: “Não serei invejoso”, por terdes percebido intelectualmente que não é vantajoso sê-lo, que a inveja implica tensão, luta, penas. Mas a mera aceitação intelectual não vos livra da inveja; tampouco vos libertará o dizerdes: “Usarei de um ideal, a fim de livrar-me da inveja; isto é, não serei invejoso” — porque esse “serei” supõe o tempo. Ao afirmardes “Não serei invejoso”, estais introduzindo o fator tempo; isto é, pensais que necessitareis de tempo para vos livrardes da inveja e dizeis que daqui a alguns anos ou em certa data futura estareis livre da inveja. E quando se introduz o tempo, a inveja perdura, sem solução de continuidade; vós não ficais livre dela; sois ainda invejoso quando dizeis:  “Não deve haver inveja”. Por favor, compreendei isto: a inveja tem de ser cortada imediatamente, e só poderá ser cortada imediatamente quando virdes a coisa, quando virdes a inveja.

Como já tive ocasião de dizer, nós não “vemos”, nem tampouco escutamos. Nunca vemos, porque temos opiniões a respeito daquilo que vemos. Quando sois invejoso e vos pondes a refletir sobre a inveja, vós a justificais, porque toda a estrutura social baseia-se na inveja e vós sois educado para serdes invejoso; e dizeis: “Como poderei viver neste mundo sem inveja?” Assim, considerais o fato, que é a inveja, com uma opinião preconcebida a respeito dele. A palavra “inveja” já é condenatória e, por isso, considerais a inveja com condenação. Por conseguinte, para verdes a inveja, tendes de estar livre da palavra.

O que estou dizendo não é complicado; é bem simples. Em verdade, é extraordinariamente simples, se escutais, se tentais, mesmo intelectualmente, escutar. A palavra não é a coisa. A palavra é o símbolo. Nós somos criados com símbolos e não com realidades, com aquilo que constitui o fato. A inveja não é coisa que se possa adiar. Ou sois invejoso, ou não sois invejoso. O homem que deseja meditar, que deseja investigar em profundidade a questão da meditação, não tem tempo para adiar a inveja. A inveja tem de cessar completamente, totalmente. Também a ambição tem de cessar por inteiro, porque o homem ambicioso não tem amor. Aqueles que, impelidos pela ambição, buscam posição, prestígio, poder, não têm amor, ainda que falem de paz e de fraternidade. Poderão ter compaixão, piedade, capacidade organizadora para a ação social; mas, amor não têm.

A pessoa invejosa, que compara, que deseja, que busca poder, posição, autoridade, não tem amor. Pode-se ler a respeito do amor no Gita, nos Upanishads e noutros livros; mas o amor não vem por meio dos livros. Só vem o amor se deixastes de ser invejoso, ambicioso, se já não buscais o poder, se já não sois escravo da moralidade social. À moralidade social só uma coisa interessa: o sexo. Não interessa à sociedade a compreensão da avidez, da ambição, da inveja, nem a razão por que seguimos isto ou aquilo.

Para meditardes, precisais lançar a base correta, não nos dias vindouros, porém imediatamente. Isso é dificílimo — é em verdade o ponto crucial da questão, pois nós queremos ser ambiciosos, queremos ser invejosos; e também falamos a respeito de Deus, da Verdade, etc. Nenhum valor têm vossos deuses e vossas verdades, enquanto não houver a base correta. Quando já não estais preso na engrenagem da sociedade e de sua moralidade, quer dizer, quando vossa mente está livre da ambição, da avidez, da inveja, do poder e de todas as coisas que o homem busca porque a isso a sociedade o estimulou desde a infância — então, há liberdade; não amanhã, não no fim de vossa vida, porém exatamente no começo — agora!

Esse é o início da meditação. Implica o conhecimento de si mesmo, e não o conhecimento do Ser Supremo. Não há Ser Supremo para a mente vulgar, a não ser aquilo que ela inventou e a que chama “Ser Supremo”. Assim, quando a mente é livre — não amanhã, porém realmente, imediata e instantaneamente — da inveja, da avidez, da ambição da busca de fama e de poder, então, começa a meditação. Para essa mente cessou o buscar. Ao dizerdes que estais “buscando”, que buscais? Estais buscando algo que já conheceis; do contrário, não “buscaríeis”. Não podeis buscar algo que desconheceis; podeis buscar algo que se pode reconhecer — e o reconhecimento vem do passado. O reconhecimento é parte essencial do conhecimento — isto é, do conhecido. Assim, quando, mediante o autoconhecimento, negais de todo a ambição, a avidez, a inveja, a autoridade, vos tornastes a luz de vós mesmo; a mente, estando então livre, não “comprometida”, já não busca, porque nada tem que buscar; ela está tranquila.

Como pode uma mente limitada buscar a Imensidade? Só será capaz de traduzir a Imensidade nos termos de sua própria vulgaridade e superficialidade. A mente, por conseguinte, deve ficar livre de todas essas coisas. Quando inteiramente livre de todas elas, a mente se torna tranquila; não tem então necessidade de buscar paz de espírito, pois isso seria absurdo, coisa semelhante a pregar contra a corrupção e ao mesmo tempo querer apoderar-se do dinheiro alheio. A pessoa precisa desligar-se completamente da sociedade.  Isso não significa abandonar a sociedade, retirar-se para uma floresta, tornar-se eremita — o que é uma mera troca de roupas, mudança de habitação. Vós tendes de desligar-vos da sociedade, para ficardes só; vossa mente já não estará, então, influenciada pela sociedade.

Quando a mente deixa de sofrer a influência social, ela se torna capaz de ficar só. Começa, então, a meditação. Notareis, assim, que o cérebro — que é resultado do tempo; o resultado de todos os instintos animais, biológicos; o resultado do conhecimento acumulado pela sociedade, pela nação, pela raça, pela família — notareis então que o cérebro se torna sobremodo quieto, porque já não está buscando. O cérebro já não está assustado; já não está a perseguir uma ideia; já não está a ansiar por conforto, segurança, permanência. Por isso, ele se torna extraordinariamente quieto; e ele precisa estar quieto, porque todo movimento do cérebro, que é impulsionado pelo passado, tende a “projetar-se” e criar ilusões. Por conseguinte, o cérebro deve estar completamente sereno.

A serenidade do cérebro não é adquirível. Não se pode adquirir quietude; não se pode praticar a tranquilidade, porque o cérebro que a pratica é um cérebro morto. Como é possível forçar o cérebro, em extremo ativo e, necessariamente, sensível — a ficar quieto? Podeis destruí-lo — e de fato o destruís — renunciando ao mundo e fugindo para uma espécie de “outro mundo”, destruindo a beleza e pensando que Deus é diferente dela. A mente sensível não pode ser destruída; ela tem de permanecer sensível. Se compreenderdes o inteiro significado da disciplina, vereis que há uma extraordinária disciplina, resultante da liberdade, livre de controle. Ao praticardes uma disciplina, a praticais por medo ao castigo ou por desejo de recompensa, ou para ganhardes algo que cobiçais. Essa espécie de disciplina torna o cérebro embotado, insensível.

A vida não pertence ao eremita, nem ao sannyasi, nem ao político, ainda que virtuoso. A vida é algo extraordinariamente vasto, imensurável. A mente medíocre não tem possibilidade de compreendê-la. Ela é essencialmente uma mente ambiciosa, ávida, aquisitiva. E no momento em que deixais de ser ambicioso, sob qualquer aspecto — mesmo que se trate da ambição de descobrir Deus — ao abandonardes a ambição, vosso cérebro se torna singularmente quieto. Está então sem nenhum movimento de desejo, porque o desejo foi compreendido. Se um homem compreendeu as visões da imaginação, se compreendeu o significado do pertencer a isto ou àquilo, e tudo isso foi posto de parte, esquecido, esse homem já não é, então, prisioneiro do conhecido. Em geral nos movemos do conhecido para o conhecido; esta é nossa atividade diária. Toda a vossa vida se consome num escritório ou num trabalho técnico, num constante movimento do conhecido para o conhecido. Vossa mente pensa em termos do “conhecido” e, por conseguinte, nunca está livre do conhecido.

A mente meditativa é livre do conhecido — isto é, livre da palavra, do símbolo, da ideia, da crença, do dogma, das projeções do passado. Quando o cérebro está livre do passado, ou, antes, quando o cérebro está quieto, a consciência se torna completamente tranquila — a totalidade da consciência, e não apenas uma parte dela — porque está, então, de todo sã, livre de influências. Já não pertence a nenhuma sociedade, nenhum grupo, nenhuma casta, nenhuma religião, nenhum dogma; para ela tudo isso se acaba. Portanto, há tranquilidade completa na mente; e nessa quietude não existe observador nem coisa observada — porque o observador, conforme já expliquei, resulta da reação do pensamento; o observador, o pensador, é reação do pensamento. Podeis pensar nisso de maneira completa, mais tarde, se vos interessa.

Não há, pois, “estado de experimentar”; é muito importante compreender isso. A experiência — rápida e concisamente definida — é aquele estado em que há reação a um desafio. Toda reação a desafio produz uma experiência, e essa experiência promana de vosso condicionamento. Se sois hinduísta, com esse fundo é que reagis aos desafios, por insignificantes que eles sejam. Mesmo a um “desafio” insignificante, “reagis” com o fundo de vosso hinduísmo, de vosso condicionamento, e essa reação é experiência. Assim, a mente que está experimentando está reagindo e, por conseguinte, não é uma mente livre.

A mente tranquila nunca está em busca de experiência, de qualquer espécie que seja. E, se não está buscando e, por conseguinte, está perfeitamente serena, sem nenhum movimento do passado e, portanto, do conhecido, podereis ver, então, que há um movimento do Desconhecido, o qual não é reconhecível, nem traduzível, nem exprimível por palavras; podereis ver, então, que há um movimento que é o movimento da Imensidade. Esse movimento é o movimento do Atemporal, porque, nele, o tempo não existe, nada existe para experimentar, nada para ganhar, alcançar. A mente conhece, então, a criação — não a criação do pintor, do poeta, do discursador, porém aquela criação que não tem “motivo”, que não tem expressão. Essa criação é amor e morte.

Tudo isso, do começo ao fim, é o caminho que a meditação percorre. O homem que deseja meditar deve compreender a si próprio. Se não conheceis a vós mesmo, não podeis ir longe. Por mais que tenteis ir longe, nunca ultrapassareis vossa própria “projeção”; e vossa própria “projeção” está muito perto, e a parte alguma vos leva. Meditação é aquele processo de lançar imediatamente a base e de fazer nascer — naturalmente, sem esforço algum — aquele estado de tranquilidade. Só então existe uma mente fora do tempo, fora da experiência e fora do conhecimento.

Krishnamurti, Nova Déli, 7 de fevereiro de 1962, A mutação Interior


segunda-feira, 9 de abril de 2018

A mente em conflito é uma mente medíocre


A mente em conflito é uma mente medíocre

Estivemos falando sobre a necessidade de termos uma mente nova, fresca. Em toda parte aonde vamos encontramos tremenda desordem, sofrimento em grande escala, físico e moral, infinita confusão. E, parece-me, em vez de tratarmos de resolver o problema do sofrimento e da confusão, estamos mais interessados em fugir dele — em busca da Lua, de entretenimentos, de ilusões várias. Mas, o que quer que façamos, continuam existentes o sofrimento e a confusão e, para livrar-nos dessas condições, é-nos necessário, penso eu, uma mente nova, viçosa. Desejo, pois, continuar do ponto em que paramos e considerar se é possível vivermos neste mundo sem conflito. Porque, quer-me parecer, uma mente invadida pelo conflito está embotada, é medíocre. Todos nos achamos em conflito, desta ou daquela natureza, em níveis diferentes e de diferentes formas. E, ou nós nos conformamos com ele, ou tratamos ansiosamente de refugiar-nos em entretenimentos, reformas sociais e nas coisas que as igrejas e as religiões oferecem, com seus rituais, suas misteriosas palavras, suas crenças e dogmas — românticas formas de consolação. E, à medida que vamos envelhecendo e as fugas se tornando cada vez mais habituais e constantes, nossa mente se torna mais e mais embotada, lerda, estúpida. Isso é um fato ocorrente com a maioria de nós. Poderá haver momentos em que, apesar de todos os sofrimentos causados pelo conflito, as nuvens se abrem, deixando-nos ver algo, muito claramente, que nos desperta um sentimento de tranquilidade, profundeza; mas raramente isso acontece.

Acho que precisamos investigar esta questão profundamente — tarefa bem difícil. Não se trata apenas de examinar umas poucas ideias; trata-se, antes, de penetrarmos mui profundamente em nós mesmos, para vermos se é possível extirpar o conflito em todas as suas formas. Requer-se uma mente ardorosa, penetrante, mente que não se deixe prender na rede das palavras. Infelizmente, tendemos a prestar atenção apenas a certas palavras, frases e ideias; limitamo-nos a deslizar sobre a superfície das coisas. E, provavelmente, tal é a razão por que vimos assistir a estas conferências, ano por ano, e o resultado final se torna um tanto estúpido; porque ficamos apenas a trocar ideias sem jamais penetrarmos a matéria profunda e diretamente, para extirparmos deveras o conflito.

Penso, portanto, que devemos restringir-nos nesta manhã a ver se é verdadeiramente possível — não teórica ou verbalmente — compreender deveras a natureza do conflito e, dessa investigação, sairmos renovados, rejuvenescidos, purificados. A mente purificada, “inocente”, nunca se acha em conflito; está num estado de ação. Uma mente em ação, em movimento, sempre a renovar-se, nunca se achará em conflito. Só aquela que encerra contradição está perpetuamente em luta.

Por favor, enquanto falo, não vos limiteis a ouvir minhas palavras, porquanto as palavras só têm significado superficial. Pois estou certo de que, se examinardes a vós mesmos, encontrareis muitas contradições. Assim, tende a bondade de acompanhar-me atentamente, “experimentando” durante o percurso, porque, então, ao concluirmos o nosso exame, talvez alcanceis um sentimento de clareza, um sentimento de libertação da terrível opressão do conflito.

Vimos aceitando o conflito desde a infância. No setor educativo, todas as escolas do mundo estão criando bases de conflito e há a luta constante para emularmos com os que são mais talentosos que nós. E ao nos tornarmos mais velhos começamos a seguir o exemplo, o líder, a autoridade, o ideal; e surge, assim, a separação entre o que deveria ser e o que realmente é, e, daí, a contradição. Temos não apenas o conflito exterior, mundano, a competição, os ideais, a ambição, o perpétuo impulso, na moderna vida social, a nos tornarmos inteligentes, mais belos; imitação não só de nossos semelhantes, mas também de Jesus, de Deus; imitação não só da moda, mas também da virtude. De tudo isso resultam, exteriormente, guerras entre os povos, as raças, as nações e os estadistas. E se um homem repudia tudo isso, por demasiado estúpido, volta-se para o seu interior, onde novo problema se apresenta — o de alcançar a paz, a tranquilidade, a felicidade, Deus, o amor, o céu. A busca interior é uma reação à busca exterior, sendo, por conseguinte, o mesmo movimento — movimento semelhante ao vaivém das marés. São estes óbvios fatos psicológicos; e se nos tornamos apercebidos de tudo isso, não há mais discutir a seu respeito: é o fato. Poder-se-á argumentar sobre a possibilidade de transcender tudo isso; mas o fato real é que existe conflito interior e exteriormente, de onde se origina um espírito de espantosa brutalidade, uma eficiência cruel. O movimento exterior poderá produzir um certo progresso, prosperidade, mas pode-se ver o que está acontecendo no mundo: tanta prosperidade e menos, cada vez menos, liberdade. Isso se pode observar muito claramente na América: lá existe esta grande prosperidade, mas o espírito pioneiro, o espírito de liberdade vai desaparecendo gradualmente. Interiormente, também, quanto mais intenso o conflito, tanto maior o impulso para a atividade; e surgem assim os ‘‘beneméritos”, os reformadores, os chamados “ santos” e os intelectuais, autores de livros e mais livros, etc. etc. Quanto maior a tensão do conflito, tanto mais ela se expressa por meio da capacidade.

Sabemos de tudo isso, todos sentimos o “puxão” em diferentes direções. Conhecemos o impulso da ambição. E onde há ambição, não há amor em forma nenhuma, não há compaixão, piedade ou afeição. E a fuga ao conflito, seja conflito entre duas pessoas, seja entre nações — e não importa se nosso refúgio é Deus, a bebida, o nacionalismo, a conta bancária — a fuga nos afunda mais e mais no ilusório sentimento de segurança. Nossa mente se nutre de mitos, especulações.

Cresce, assim, o conflito e desse estado resulta ação que, por sua vez, produz mais contradição ainda. E ficamos a debater-nos nesse torvelinho de luta. Estou apenas expressando em palavras o que realmente está acontecendo. Tal é a sina de todos. Podemos ver diretamente que a mente está sempre tentando fugir, por meio da repressão, da disciplina — sempre advogada pelos santos, em todo o mundo e, de feito, tudo submetendo a seu controle. E, se não é a disciplina o nosso meio de fuga, é então uma certa atividade: reforma social, reforma política, estudo de cursos especiais, fomento da fraternidade — conheceis todas essas atividades, essa agitação, esse impulso para fazer algo em relação com alguma coisa. O que sabemos é apenas que nossa ação cria mais misérias, mais perversão, mais ilusão e sofrimento, interior e exteriormente. Todo estado de relação, no começo tão novo, tão original, degenera em algo feio, estúpido ou venenoso. Todos, sem dúvida, conhecemos esse processo dual de amor e de ódio. E rogamos aos deuses os meios de ocultá-lo... e, infelizmente, os deuses nos atendem, pois não faltam meios de fuga.

Eis o quadro que se nos depara: uma ideia, um ideal, e a ação resultante, visando a concretizar essa ideia. A mente cria a ideia e em seguida procura agir, a fim de realizá-la. Está assim criado um intervalo, sobre o qual procuramos tenazmente lançar uma ponte. E nunca o conseguimos, porquanto a ideia é estática, criamo-la firme, fixa; a ação, entretanto, tem de ser necessariamente variada, mutável, em constante movimento, conforme as exigências da vida. Por isso, há conflito perene.

E embora apercebidos de todas essas tremendas tensões e violentas exigências, nunca perguntamos a nós mesmos se é possível viver neste mundo sem conflito. É possível? No meu sentir, só é criadora a mente em que não existe um só movimento de conflito. Não me refiro à ação criadora dos poetas, dos pintores, dos arquitetos etc. Estes poderão possuir certos dons, certas capacidades; poderão ocasionalmente vislumbrar algo, num rápido clarão, e expressá-lo no mármore, num poema, num monumento arquitetônico; mas não são verdadeiramente criadores, porque continuam em guerra, com si mesmos e com o mundo; são impulsionados por suas ambições, seus ciúmes, suas irritações e rancores, tal como nós outros. Mas, para encontrar Deus — ou o nome que preferirdes — para descobrir realmente se tal entidade existe, a mente deve estar de todo livre de conflito. Isso exige enorme esforço; e, talvez, os mais velhos dentre nós já estão acabados, fora de combate. Podemos estar assim, ou talvez não.

Não sei se já vistes as pinturas das cavernas de Dordogne, velhas de dezessete mil anos. As cores são muito vivas, porque os ventos e as chuvas nunca as atingiram. Representam essas figuras o homem em luta com animais, cavalos, touros de graciosos chifres; e são representações cheias de extraordinário movimento. Mas... a mesma luta, sempre.

A questão, pois, é: Que devemos fazer em relação a tudo isso? E tendes de resolver este problema, porque sois vós quem sofre, quem está em conflito. Não podeis ficar a esperar descansadamente que outra pessoa o resolva. E isso, afinal, nada tem que ver com a idade, não depende de se a pessoa é velha ou nova.

Enunciando diferentemente o problema: viver é agir. Não se pode viver sem ação. Cada gesto, cada ideia, cada onda de pensamento é ação; e toda ação dá origem a uma reação, e dessa reação resulta mais ação. Assim, todas as nossas ações são reações; e estamos aprisionados nisso. Ora, é possível vivermos com ação em extraordinária abundância e sem raízes nenhumas no conflito? Eis a questão, que espero vos esteja clara.

APARTE: Suponho que isso acontece ocasionalmente a cada um de nós; vem e vai independentemente de nossa vontade, como o vento entre as árvores ou as folhas mortas levadas pelo vento.

KRISHNAMURTI: Quer dizer, isso acontece casualmente e fica-nos sua lembrança, despertando o desejo de repetição — e temos assim, de novo, conflito. Percebeis? Tenho uma experiência que me deleita: contemplando uma bela nuvem, um rosto bonito, um doce sorriso; e essa experiência deixa-me uma impressão de prazer, de alegria — êxtase. Desejo vê-la repetir-se, e começa o conflito. Tende a bondade de seguir isso, completamente, e vereis algo por vós mesmo.

APARTE: O conflito começa com o desejar.

KRISHNAMURTI: De fato? Que mal há em desejar algo belo?

APARTE: Desejar a repetição, quero dizer.

KRISHNAMURTI: Um momento, senhor. Todo desejo é de repetição. Não haveria desejo de uma coisa, se não a tivéssemos provado antes, sem uma lembrança prévia. Todo desejar representa reconhecimento de uma coisa antes conhecida.

APARTE: E se se trata de desejar Deus?

KRISHNAMURTI: É a mesma coisa, não? Desejar uma mulher, um filho, apreciar um belo poente, ou desejar Deus, e desejar a repetição da experiência — tudo é a mesma coisa, não? Parece que não estais percebendo o aspecto mais importante da questão.

APARTE: É a resistência ao desejar que cria a contradição.

KRISHNAMURTI: O desejar gera conflito, e qualquer espécie de resistência gera conflito; mas é este o problema? O perpétuo clamor do artista provém de ter ele conhecido esse ocasional vislumbre da beleza e desejar segurá-lo; e, assim, ele luta, entrega-se às mulheres, à bebida etc. E nós fazemos a mesma coisa; vivemos no passado, nos “dias felizes que se foram”, os rostos lembrados, nossas memórias, e todas as coisas que desejamos recordar. Há o desejo, e a resistência a esse desejo; mas é este o problema? Todos os santos disseram: “Eliminai o desejo”; mandam-nos voltar-lhe as costas, asfixiá-lo, controlá-lo, não nos deixarmos apaixonar. Mas é este o problema que nos interessa?

APARTE: Acho que não compreendo o desejo.

KRISHNAMURTI: É esse o problema? Vede, senhores, quando tendes uma experiência e desejais repeti-la, continuá-la, não criastes um problema? Quer resistais, quer cedais, não criastes um problema? Criamos o problema de como manter um determinado estado, não é certo? Ora, que é um problema? Problema, por certo, é tudo aquilo que eu não compreendi. Compreendida uma coisa, o problema deixou de existir. Para um mecânico, um desarranjo num motor não constitui problema real: ele sabe o que deve fazer. Nós aqui não sabemos o que devemos fazer, e esse “não saber” é um problema. Não podemos destruir o desejo, pois isso seria terrível, estúpido; seria assumir a vulgaridade do santo — perdoai-me, se vos choco. E a resistência é uma forma de repressão. Certo?

E que há para compreender no desejo? Não muita coisa. Sabeis o que são desejos e como eles nascem; e conheceis também a resistência, e como nasce: de nossa educação, nossas tradições, nosso conteúdo mental (background), a atitude do dizer “isto é certo e aquilo errado”, o sentimento de que devo ser respeitável a todo custo e que minha respeitabilidade deve ser reconhecida pela sociedade. Conheceis tudo isso.

Podemos agora passar adiante? Que é um problema, que é que cria o problema?

APARTE: A lembrança da experiência.

KRISHNAMURTI: Não se pode eliminar a experiência, pode-se? Isso significaria morrer, fechar os olhos à vida, tornar-se insensível. Viver é experiência. Mas a experiência deixa-nos o seu resíduo, como memória — a cicatriz da memória. Estais-me seguindo? O problema, pois, é a memória e não o desejo ou a resistência. Pode, então, a mente viver num “estado de experimentar”, sem que fique resíduo, isto é, memória?

Podeis compreender isso verbalmente, mas trata-se de coisa realmente extraordinária e que deve ser investigada; mas para tanto requer-se excepcional vitalidade e energia. Não pode a mente fugir à experiência, entretanto todos tentamos furtar-nos a uma experiência vital; reforçamos as paredes da crença; recusamo-nos a ver que o mundo é uma unidade, que a Terra é vossa e minha; dividimo-la em britânica, europeia, indiana, russa; e quedamo-nos, paralisados, no interior dessas muralhas. Repelimos, com efeito, a experiência porque não desejamos mudanças; cultivamos a memória, adicionando-lhe em vez de subtrair-lhe.

O problema, portanto, é este: Pode a mente receber uma coisa sem que esta deixe marca? Não podeis dizer que isso é possível ou impossível. Pensai, por favor. Porque só a mente que experimenta, vê, olha, vibra, está viva. Não está viva a mente que leva a carga de memórias seculares, a que chamamos conhecimento, tradições. Entretanto, não podemos suprimir o conhecimento; ele precisa existir, senão não saberemos voltar para casa. Mas pode-se viver sem a interferência do passado?

APARTE: O problema é que, para impedirmos a memória de deixar-nos marca na mente, precisamos possuir extraordinário interesse em cada uma de nossas experiências.

KRISHNAMURTI: Por favor, senhor, atentai no que acabais de dizer: “precisamos”. Esse “precisamos” já lançou na mente o germe do conflito, não?

APARTE: Talvez eu devesse perguntar: Como criar esse interesse?

KRISHNAMURTI: Para termos uma resposta correta, temos de fazer uma pergunta correta. Esta pergunta é correta?

APARTE: Seria mais correto perguntar: Por que não estou interessado?

KRISHNAMURTI: Ora, isto é como tirar o tom correto de um violino. Só se pode tirar o tom correto quando a corda está na tensão correta. Estais fazendo esta pergunta com a tensão correta? Tensão correta; não, estado de conflito. Se considerarmos bem, encontrareis em vós mesmo a resposta. Talvez a própria pergunta que estais fazendo vos esteja impedindo de descobrir diretamente. Percebeis? Vou expressá-lo de maneira diferente.

Percebo realmente, visualmente, o conflito existente no mundo e em mim mesmo. Há contradição interna e externa. E o esforço para fazer alguma coisa a esse respeito: tornar-me pacífico, evitar todo sofrimento — implica conflito. Isso, fora de qualquer dúvida, é o fato. Estais percebendo? E o desejar fazer alguma coisa contra o fato é a reação de procurar fugir-lhe, repudiá-lo, resistir-lhe, transcendê-lo. Correto? Portanto, o desejo, a ânsia, o impulso para fazer alguma coisa em relação ao fato é que é o problema. Mas, se o fato existe e percebeis que nada podeis fazer contra ele, o próprio fato vos dá então a resposta. Existe, então, problema?

Krishnamurti, Londres, 07 de maio de 1961, O Passo Decisivo

quarta-feira, 4 de abril de 2018

É possível quebrar a mediocridade da mente?


É possível quebrar a mediocridade da mente?

Um dos problemas graves, sobre que quase todos já devemos ter refletido, é o referente ao controle da mente; porque, pode-se ver que, sem um profundo, racional e equilibrado controle da mente, não pode haver a conservação da energia, essencial para se fazer qualquer coisa e, principalmente, quando se trata da chamada busca — busca da Verdade, da Realidade, de Deus, etc. É sabido, penso eu, que esta estabilidade da mente é necessária para se poder penetrar os problemas fundamentais que uma mente superficial é incapaz de atender. E, no entanto, a dificuldade está em como controlar a mente, não achais? Muitos sistemas de disciplina, várias seitas, religiosas e comunidades monásticas sempre têm preconizado o controle absoluto da mente; e nesta tarde pretendo investigar se é possível tal coisa e como pode ser criada essa absoluta estabilidade mental. Estou empregando a palavra “absoluto” no sentido correto, no significado de controle completo, total, da mente. Como disse, é muito importante haver essa estabilidade, porque nesse estado não há conflito, não há dissipação nem distração de espécie alguma; por conseguinte, ela gera uma energia extraordinária, e essa mente, achando-se perfeitamente equilibrada, é capaz de profunda e radical penetração.

Ora, pode uma mente medíocre, por mais que controle, que domine e discipline a si mesma, tornar-se estável? Em geral, a nossa mente é estreita, limitada, cheia de preconceitos, vulgar, e uma mente vulgar está sempre ocupada com coisas muito superficiais, com um serviço, com disputas, ressentimentos, cultivo de virtudes, tagarelices, sua própria evolução e seus próprios problemas. E pode essa mente, por mais que controle e discipline a si mesma, tornar-se livre para poder ser estável? Porque, sem liberdade, é bem de ver que a mente não pode ser estável.

Isto é, a mente que está a lutar pelo sucesso, por um resultado, a procurar no escuro uma coisa que não pode possuir, é essencialmente estreita, condicionada, limitada e, por causa desse próprio esforço, inferior; e, por mais que ela tente torna-se estável pelo controle de si mesma, pode essa mente gerar aquela energia essencial oriunda de uma estabilidade profunda, fundamental, ou só criará mais uma série de limitações, mais mediocridade? Espero vos esteja mostrando com clareza o problema.

Se minha mente é nacionalista, se está acorrentada por inumeráveis crenças, superstições, temores, presa nas redes da inveja, de ressentimentos, da crueldade por palavras, por gestos ou pensamentos — essa mente, por mais que se esforce para pensar em algo além de si própria, permanecerá limitada. O problema, pois, é de como quebrar esse estado de mediocridade da mente, não achais? Esta é uma das questões fundamentais, e se ela está clara, agora, podemos então continuar, para descobrir o que significa ter um controle completo da mente.

Para se descobrir o que é a Verdade, o que é Deus — ou o nome que quiserdes dar — necessita-se evidentemente de enorme energia, e, na busca dessa energia, praticamos toda a sorte de absurdos. Ou nos recolhemos aos mosteiros, ou nos tornamos maníacos de regimes alimentares, ou procuramos controlar nossas paixões e apetites, esperando, desse modo, canalizar a energia e achar algo além da mente. Afinal, é isto o que a maioria de nós está tentando fazer, de diferentes maneiras. Estamos procurando controlar nossos: pensamentos, nossos desejos, cultivar virtudes, prestar atenção às nossas palavras, nossos atos, etc., com a intenção de nos tornarmos cidadãos bons, respeitáveis, ou com a esperança de canalizar toda essa extraordinária vitalidade do desejo, a fim de descobrirmos o que existe além. Mas, por mais que lutemos, não poderemos descobrir tal coisa, enquanto não compreendermos a mediocridade da nossa mente. Quando a mente medíocre busca a Deus, o seu Deus será também medíocre, é claro; sua virtude será mera respeitabilidade. Assim, é possível quebrar essa mediocridade? Está clara a questão? Bem, então continuemos.

Nossa mente é medíocre, invejosa, gananciosa, medrosa, quer o admitamos, quer não. Ora, que é que faz a mente ser medíocre? Sem dúvida, a mente é estreita, limitada, superficial, medíocre, enquanto é gananciosa. Poderá renunciar às coisas mundanas e se tornar gananciosa de sapiência, de sabedoria — mas continuará medíocre, porque no seu esforço aquisitivo ela desenvolve a vontade de conseguir, de ganhar, e essa própria vontade de conseguir constitui a sua mediocridade. ­

Posso dizer agora alguma coisa a respeito da atenção? A atenção é muito importante, mas a atenção é de todo diferente da concentração ou absorção numa coisa. Uma criança se absorve num pião; o brinquedo a atrai, e ela lhe dá a sua mente. Isto é o que acontece, não é verdade? O objeto atrai a mente, absorve a mente, ou, então, a mente absorve o objeto. Se estais interessados numa certa coisa, o objeto de vosso interesse é tão atraente, que vos absorve; ao passo que, se deliberadamente vos concentrais numa coisa, o que é outra forma de absorção, então sois vós que absorveis o objeto, não é exato?

Ora, eu estou falando de coisa completamente diferente. Refiro-me a uma atenção em que não há objeto de espécie alguma, em que não há luta, nem conflito, uma atenção em que nem vos deixais absorver, nem procurais concentrar-vos em coisa alguma. Quando escutais o que se está falando aqui, estais procurando compreender e vosso escutar tem um objeto; por isso há esforço, tensão, e não uma atenção livre de toda tensão. Isto é um fato, não é? Se desejais escutar uma coisa, não deve haver tensão nenhuma, nenhum, esforço, nenhum objeto que atraia a vossa atenção e vos absorva, porque, de outro modo, estais apenas sendo hipnotizados pelas palavras que estais ouvindo, por uma personalidade, uma estultícia qualquer. Se observardes atentamente esse processo de absorção, vereis que nele há sempre conflito, tensão, esforço para se alcançar alguma coisa; ao passo que, na atenção, não há nenhum objeto especial, estais apenas ouvindo, assim como se ouve uma música distante ou as notas de uma canção. Nesse estado estais completamente sem tensão, atento, não há esforço algum.

Assim, pois, se posso sugeri-lo, procurai estar atentos, enquanto aqui estais a escutar o que se está dizendo. O que estou dizendo poderá ser difícil e talvez novo, e portanto causar certa perturbação; mas se fordes capazes de escutar com aquela atenção livre de tensão, não ficareis mentalmente agitados, embora possais sentir-vos perturbados num sentido diferente, o que talvez seja bom. O que estou dizendo é uma coisa que muito importa compreender: Estou dizendo que a mente deve ser completamente estável. Mas, essa estabilidade não pode efetivar-se quando a mente se esforça para se tornar estável, porque a mente, a promotora do esforço, é, por natureza, limitada, insignificante. Pode a mente possuir conhecimentos enciclopédicos, ser capaz de discussões, sutis e possuir vasta acumulação de técnica, mas permanecerá essencialmente limitada enquanto tiver suas bases no senso de aquisição e, por conseguinte, no cultivo da vontade, isto é, enquanto existir nela o “eu”, a entidade que adquire, que faz esforço, que guarda e acumula. A mente poderá pensar em Deus, disciplinar a si mesma, tentar controlar os seus vários desejos, a fim de se tornar virtuosa, a fim de possuir mais energia para a busca da Verdade, etc.; mas, essa mente estreita, limitada, nunca poderá ser livre e, portanto, estável.

Nosso problema, por conseguinte, é de como quebrar essa limitação mental. Está clara a questão? Se está clara, que vos cabe então fazer? Vê-se a necessidade de uma mente muito estável, profunda, tranquila, uma mente perfeitamente controlada — mas não controlada por uma entidade que diz “Preciso controlá-la”. Compreendeis? Isto é, percebo a importância de se ter uma mente está­ vel. Pois bem. Como criar essa estabilidade? Se outra parte da mente disser: “Preciso ter uma mente estável”, criará conflitos, lutas para controlar e subjugar, não é verdade? Uma parte da mente dita à outra parte, tentando impedi-la de divagar, controlando-a, moldando-a, disciplinando-a, reprimindo várias formas de desejo; e temos, assim, um conflito incessante, não é exato?

Ora, a mente que se acha em conflito, é, na sua própria essência, limitada, porque o seu desejo é adquirir alguma coisa. Desejando adquirir uma mente estável, dizeis: “Tenho de controlar a minha mente, moldá-la, repelir todos os desejos em conflito”; mas, enquanto existir em nosso pensar esse processo dual, tem de haver conflito, e esse próprio conflito denota limitação, porque produto do desejo de ganhar alguma coisa. Assim, pode a mente obliterar, esquecer de todo o processo de aquisição, de adquirir uma mente estável, a fim de achar Deus ou o que quer que seja? Isto é, podeis, enquanto estais ouvindo, perceber, imediatamente, a verdade do que se está dizendo? Estou dizendo que é necessária completa e absoluta estabilidade da mente, e que qualquer tentativa para se conquistar tal estado indica que a mente está dividida e está a dizer: “ótimo! preciso de estabilidade, deve ser uma coisa maravilhosa”; em vista disso, começa a esforçar-se para alcançar esse estado, recorrendo a disciplinas, controles, várias formas de sanção, etc. Mas, se a mente for capaz de escutar a verdade daquela asserção, perceber a verdade daquela asserção, perceber a absoluta necessidade de controle completo, vereis então que não há mais esforço algum para se alcançar um estado.

Isto é difícil demais? Receio que o seja, porque, em geral, nós pensamos em termos, de esforço, havendo sempre uma entidade que faz esforço, visando a um resultado, e por esta razão há conflito. Ouvis a asserção de que a mente deve ser absolutamente estável, controlada, ou lestes e refletistes sobre isto, e dizeis “Preciso alcançar esse estado”, e procurais então alcançá-lo por meio de controle, de disciplina, meditação, etc. Nesse processo há esforço, ajustamento, observância de padrão, criação da autoridade, e as muitas complicações daí resultantes. Ora, todo esforço para se alcançar um resultado, todo- desejo de adquirir um estado, torna a mente limitada, e essa mente nunca poderá ser livre, para ser estável. Se se perceber bem claramente a verdade a esse respeito, não existe então uma estabilidade absoluta da mente? Compreendeis?

Por outras palavras: Vê-se bem claro ser necessário energia para qualquer espécie de ação. Mesmo se desejais ser um homem rico, tendes de devotar a vossa vida a esse fim, nele concentrar toda a vossa energia. E para se achar aquilo que está além das atividades, dos movimentos da mente — o que implica extraordinária profundeza de autoconhecimento — a energia concentrada é uma necessidade essencial. Ora, como se pode gerar essa energia concentrada?

Reconhecendo que temos necessidade dela, dizemos: “Tenho de controlar meu temperamento, tomar alimentos adequados, evitar os excessos sexuais, refrear minhas paixões, apetites, desejos” — isto é, estamos sempre a escapar por tangentes. Tudo isso são tangentes, porque, no centro, somos muito pobres. Enquanto a mente está a pensar em termos de adquirir alguma coisa, alcançar resultados, é ambiciosa, e a mente ambiciosa tem de ser, por natureza, limitada, superficial. Essa mente, tal como a do homem mundano ambicioso, tem, sem dúvida nenhuma, uma certa carga de energia; mas nós estamos interessados numa coisa que exige energia muito mais profunda, mais ilimitada, e uma total ausência do “ego”.

Temos sido condicionados, através de séculos — religiosa, social e moralmente — para controlar, moldar a nossa mente de acordo com um certo padrão, ou seguirmos certos ideais, a fim de conservarmos a nossa energia; e pode a mente libertar-se dessas coisas, sem esforço algum, e entrar no mesmo instante num estado de tranquilidade total, completa estabilidade? Tal estado não está sujeito a distração de espécie alguma. Só há distrações, quando queremos seguir numa certa direção. Quando uma pessoa diz: “Tenho de pensar nisto, e em nada mais” — então, tudo o mais constitui distração. Mas se estamos atentos, completamente, com aquela atenção que se não fixa em objeto algum — já que não existe mais processo de aquisição, exercício da vontade, visando a um resultado — então a mente se verá num estado de extraordinária estabilidade, tranquilidade interior; e só a mente tranquila é livre, para descobrir ou deixar manifestar-se a Realidade. 
Krishnamurti, 20 de agosto de 1955
Realização sem esforço
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sábado, 13 de dezembro de 2014

Do surgimento de um estado de ausência de ego

A mente medíocre está interessada no exterior. O exterior é intrigante, maravilhoso, digno de ser explorado. Assim, o exploramos para o dinheiro, para o prestígio e outras coisas, e então um dia, quando estivermos saturados com as chamadas coisas mundanas e começarmos a procurar novamente por um Mestre, por Buda, por Cristo... ainda no exterior! Começamos a procurar pelo caminho, mas ainda fora. E o Buda e o caminho não são encontrados do lado de fora.

Procurar na parte externa é se afastar mais e mais do caminho, pois o caminho está dentro de nós, o Buda está no interior. 

(...) Se você puder descobrir somente uma coisa dentre todos os tipos de frustrações — que não há nada a ser encontrado no exterior, absolutamente nada — e ao perceber e se dar conta disso você se voltar para dentro, então sua própria mente é toda a coisa, então dentro de você está tudo: E, buscando, você entrará em sua própria mente.

Logo, à medida que você for mais fundo em sua própria mente, você penetrará da mente para a não-mente. A camada superficial é da mente, mas o conteúdo interior é da não-mente. A camada superficial é do ego, o conteúdo interior é a ausência de ego. Se você entrar, primeiro você deparará com a mente, com os pensamentos, desejos, fantasias, imaginações, memórias, sonhos e todas essas coisas. Porém, se você continuar a penetrar, logo chegará a espaços silenciosos, sem pensamento. Logo você começará a chegar mais e mais perto do âmago do seu ser, o qual é atemporal e está em lugar nenhum, o qual não tem tempo nem espaço. 

Quando você alcançar um ponto em que não se pode perceber nenhum tempo ou espaço, você chegou. Contudo esta chegada é voltar à sua própria natureza. Você não chegou a algo novo, mas àquilo que já foi dado e sempre foi seu. 

(...) E quando você atingir este ponto poderá entender que não há necessidade de fazer coisa alguma — tudo está acontecendo —, que nunca houve necessidade de fazer coisa alguma, que tudo já estava acontecendo. Você estava desnecessariamente preocupado e carregava todos aqueles pesos, porque você era ignorante. Quanto ao mais, as coisas estavam acontecendo. 

O mundo está girando muito suave, bela e perfeitamente; todavia, porque pensamos que estamos separados dele, surge o problema: "Como levar nossas vidas?" Se você sabe que é parte dele, não há necessidade de se preocupar. Este cosmo, um cosmo tão infinito, funcionando tão perfeitamente bem — você não pode permanecer nele sem nenhuma preocupação?  Porém a separação está presente.

Você tomou uma coisa como certa: que você está separado. Ao penetrar fundo no interior, essa separação desaparece. 

Este é o significado quando digo: "Surge o estado de ausência de ego". Ego significa separação, significa: "Estou separado do todo". Ego significa que a parte está reivindicando ser o todo por conta própria: "Tenho meu próprio centro e tenho de sobreviver, lutar e batalhar por mim mesmo. Se eu não lutar por mim mesmo, quem irá lutar? Se eu não tentar sobreviver, serei assassinado". 

A insegurança surge devido ao ego. Quando o ego se vai, existe simplesmente segurança. Na verdade, não existe insegurança ou segurança; todas as dualidades desaparecem. Viver nisso é viver nirvana, é viver iluminação.

(...) Olhe para dentro! Você já olhou para fora o bastante, já procurou fora o bastante. (...) é hora, é a hora certa de olhar para dentro.  Você se tornou muito artificial, muito antinatural.

Deixe-me apresentá-lo a você mesmo... torne-se novamente familiarizado com quem você é. E um único vislumbre transforma, e transforma para sempre.

E de novo eu gostaria de repetir: esta transformação não é algo especial — ela é muito normal, pois é apenas a sua natureza. Bata e a porta lhe será aberta, peça e lhe será dado, procure e encontrará...

O S H O 

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

O que colocará fim na superficialidade de nossa vida?

O homem, evidentemente, sempre buscou uma certa coisa fora de si mesmo, além de sua diária rotina de tédio, desespero, ansiedade; uma certa coisa que lhe proporcione plena satisfação e dê significado à sua vida aflita, caótica, superficial. Procuramos alguma coisa fora de nós, porque vivemos uma vida superficial, muito pouco expressiva, mecânica, rotineira. Aspiramos a uma certa coisa misteriosa, de natureza diferente. Estamos perenemente buscando, seja através dos livros, seja seguindo alguém, criando ideologias, crenças, dogmas, sempre na esperança de alcançar, realizar, ganhar alguma coisa não construída pelo pensamento, alguma coisa de profunda significação na vida. Porque, em nós mesmos, somos superficiais, vazios, insuficientes, estendemos a mão, estendemos a mente para além dos limites do pensar, ou tratamos de fugir desta profunda e vasta solidão, deste estado de isolamento. Queremos fugir de nós mesmos, porque vemos como somos pequenos e vulgares e nossa vida é de muito pouca significação. 

(...) Se penetramos fundo em nós mesmos, vemos o que é isso o que somos quase todos nós. Se somos religiosos, pertencentes a uma dada seita, ou se acalentamos uma dada idiossincrasia que nos proporciona uma experiência que sobremodo nos satisfaz, queremos dilatar essa experiência, aprofundá-la, torná-la mais real. A maioria de nós está sempre a buscar, ou porque queremos fugir de nossa diária rotina e tédio, de nossa insuficiência e vazio, de nosso isolamento; ou porque queremos mais alguma coisa, alguma coisa que não possuímos e que dará riqueza, plenitude, suficiência, à nossa vida. Se examinarmos nosso próprio comportamento, nosso próprio pensar, decerto descobriremos que todos nós desejamos alguma cosia. Quanto mais misteriosa essa coisa, quanto mais oferece de místico e de secreto, tanto mais a buscamos. Precisamos de uma certa autoridade que nos guie para aquelas esferas inexploradas, e por isso aceitamos com tanta facilidade a autoridade — que seguimos cegamente ou racionalmente, dando várias explicações do porque a seguimos. Estamos constantemente buscando, exigindo experiências sempre mais vastas e profundas, porque as experiências que conhecemos são muito pouco significativas. Sabemos que são sensuais, agradáveis, bastante vazias e superficiais e, por conseguinte, escutamos sofregamente a todo aquele que nos oferece alguma coisa fora dessa esfera. Estamos prontos a aceitar suas palavras, suas instruções, suas asserções. Sempre seguindo, sempre a dizer "sim" a tudo que nos é oferecido. Não sabemos dizer "não".

(...) No fundo, a nossa vida é confusão, desordem, aflição, agonia. Quanto mais sensíveis somos, tanto maior o nosso desespero e ansiedade, nosso "sentimento de culpa"; e dessa vida desejamos naturalmente fugir, porque nela não encontramos nenhuma solução; não sabemos de que maneira sair de nossa confusão. Desejamos fugir para um outro mundo, uma outra dimensão. Fugimos por meio da música, da arte, da literatura; mas, trata-se sempre de fuga e a coisa para que fugimos é sem realidade, em comparação com aquilo que estamos buscando. Todas as fugas são iguais, não importa se fugimos pela porta de uma igreja, em busca de um Deus ou de um Salvador, ou pela porta da bebida ou de diferentes drogas. Não só temos que compreender o que e o porque estamos buscando, mas também temos de compreender essa necessidade de experiências profundas e duradouras, porque só a mente que nada busca, que não exige experiências de nenhuma forma, poderá ingressar numa esfera ou dimensão inteiramente nova. 

(...) Nossa vida, em si mesma, é superficial, insuficiente, e desejamos uma outra coisa, uma experiência mais sublime, mais profunda. também, vivemos num inaudito isolamento. Todas as nossas atividades e pensamentos e maneiras de comportar-nos levam-nos a esse isolamento, a essa solidão a que desejamos fugir. Se não compreendermos esse isolamento, não intelectual, verbal ou racionalmente, porém entrando diretamente em contato com o que realmente estamos buscando, entrando em contato com o estado de solidão; se não compreendermos e dissolvermos, completamente, aquele isolamento, toda meditação, toda busca, toda atividade espiritual ou religiosa (assim chamada) será inteiramente fútil, porquanto representará uma fuga ao que somos. É o mesmo que uma mente superficial, embotada, mesquinha, pensar em Deus. Se existe essa coisa em que ela pensa, aquela mente e seu Deus permanecerão muito insignificantes. 

A questão consiste em saber se é possível à mente que está fortemente condicionada, toda enredada nas aflições e conflitos da vida de cada dia, se é possível a essa mente manter-se desperta, tão ampla e profundamente desperta que não haja busca nenhuma, nenhum desejo de experiência. Quando um indivíduo está desperto, quando em si próprio há luz, não há busca e nenhum desejo de mais experiências. Só o homem que está na escuridão vivem em busca de luz. É possível um indivíduo manter-se tão intensamente desperto, tão altamente sensível, física, intelectualmente e a todos os respeitos, que não haja uma única sombra em sua mente? Só então não há mais busca; só então não há mais ânsia de novas experiências. 

É possível isso?

Krishnamurti em, Encontro com o Eterno

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Compreendendo a mediocridade de nossa mente


Um dos problemas graves, sobre que quase todos já devemos ter refletido, é o referente ao controle da mente; porque, pode-se ver que, sem um profundo, racional e equilibrado controle da mente, não pode haver a conservação da energia, essencial para se fazer qualquer coisa e, principalmente, quando se trata da chamada busca — busca da Verdade, da Realidade, de Deus, etc. É sabido, penso eu, que esta estabilidade da mente é necessária para se poder penetrar os problemas fundamentais que uma mente superficial é incapaz de atender. E, no entanto, a dificuldade está em como controlar a mente, não achais? Muitos sistemas de disciplina, várias seitas religiosas e comunidades monásticas sempre têm preconizado o controle absoluta da mente; e nesta tarde pretendo investigar se é possível tal coisa e como pode ser criada essa absoluta estabilidade mental. Estou empregando a palavra “absoluto” no sentido correto, no significado de controle completo, total, da mente. Como disse, é muito importante haver essa estabilidade, porque nesse estado não há conflito, não há dissipação, nem distração de espécie alguma; por conseguinte, ela gera uma energia extraordinária, e essa mente, achando-se perfeitamente equilibrada, é capaz de profunda e radical penetração.

Ora, pode uma mente medíocre, por mais que controle, que domine e discipline a si mesma, tornar-se estável? Em geral, a nossa mente é estreita, limitada, cheia de preconceitos, vulgar, e uma mente vulgar está sempre ocupada com coisas superficiais, com um serviço, com disputas, ressentimentos, cultivo de virtudes, tagarelices, sua própria evolução e seus próprios problemas. E pode essa mente, por mais que controle e discipline a si mesma, tornar-se livre para poder ser estável? Porque, sem liberdade, é bem de ver que a mente não pode ser estável.

Isto é, a mente que está a lutar por sucesso, por um resultado, a procurar no escuro uma coisa que não pode possuir, é essencialmente estreita, condicionada, limitada e, por causa desse próprio esforço, inferior; e, por mais que ela tente tornar-se estável pelo controle de si mesma, pode essa mente gerar aquela energia essencial oriunda de uma estabilidade profunda, fundamental, ou só criará mais uma série de limitações, mais mediocridade? Espero vos esteja mostrando com clareza o problema.

Se minha mente é nacionalista, se ela está acorrentada por inumeráveis crenças, superstições, temores, presa nas redes da inveja, de ressentimentos, da crueldade por palavras, por gestos ou pensamentos — essa mente, por mais que se esforce para pensar em algo além de si própria, permanecerá limitada. O problema, pois, é de como quebrar esse estado de mediocridade da mente, não achais? Esta é uma das questões fundamentais, e se ela está clara, agora, podemos continuar, para descobrir o que significa ter um controle completo da mente.

Para se descobrir o que é a Verdade, o que é Deus — ou o nome que quiserdes dar — necessita-se evidentemente de enorme energia, e, na busca dessa energia, praticamos toda a sorte de absurdos. Ou nos recolhemos aos mosteiros, ou nos tornamos maníacos de regimes alimentares ou procuramos controlar nossas paixões e apetites, esperando, desse modo, canalizar a energia e achar algo além da mente. Afinal, é isto que a maioria de nós está tentando fazer, de diferentes maneiras. Estamos procurando controlar nossos pensamentos, nossos desejos, cultivar virtudes, prestar atenção às nossas palavras, nossos atos, etc., com a intenção de nos tornarmos cidadãos bons, respeitáveis, ou com a esperança de canalizar toda essa extraordinária vitalidade do desejo, a fim de descobrirmos o que existe além. Mas, por mais que lutemos, não poderemos descobrir tal coisa, enquanto não compreendermos a mediocridade de nossa mente. Quando a mente medíocre busca a Deus, o seu Deus será também medíocre, é claro; sua virtude será mera respeitabilidade. Assim, é possível quebrar essa mediocridade? Está clara a questão? Bem, então continuemos.

Nossa mente é medíocre, invejosa, gananciosa, medrosa, quer o admitamos, quer não. Ora, que é que faz a mente medíocre? Sem dúvida, a mente é estreita, limitada, superficial, medíocre, enquanto é gananciosa. Poderá renunciar às coisas mundanas e se tornar gananciosa de sapiência, de sabedoria — mas continuará medíocre, porque no seu esforço aquisitivo ela desenvolve a vontade de conseguir, de ganhar, e essa própria vontade de conseguir constitui sua mediocridade.

Posso dizer agora alguma coisa a respeito da atenção? A atenção é muito importante, mas a atenção é de todo diferente da concentração ou absorção numa coisa. Uma criança se absorve num peão; o brinquedo a atrai, e ela lhe dá a sua mente. Isto é o que acontece, não é verdade? O objeto atrai a mente, absorve a mente, ou então, a mente absorve o objeto. Se estais interessado numa certa coisa, o objeto de vosso interesse é tão atraente, que vos absorve; ao passo que, se deliberadamente vos concentrais numa coisa, o que é outra forma de absorção, então sois vós que absorveis o objeto, não é exato?

Ora, eu estou falando de coisa completamente diferente. Refiro-me a uma atenção que não há objeto de espécie alguma, em que não há luta, nem conflito, uma atenção em que nem vos deixais absorver, nem procurais concentrar-vos em coisa alguma. Quando escutais o que se está falando aqui, estais procurando compreender e vosso escutar tem um objeto; por isso há esforço, tensão, e não uma atenção livre de toda tensão. Isto é um fato, não é? Se desejais escutar uma coisa, não deve haver tensão nenhuma, nenhum esforço, nenhum objeto que atraia a vossa atenção e vos absorva, porque, de outro modo, estais apenas sendo hipnotizados pelas palavras que estais ouvindo, por uma personalidade, uma estultícia qualquer. Se observardes atentamente esse processo de absorção, vereis que nele há sempre conflito, tensão, esforço para se alcançar alguma coisa; ao passo que, na atenção, não há nenhum objeto especial, estais apenas ouvindo, assim como se ouve uma música distante ou as notas de uma canção. Nesse estado estais completamente sem tensão, atento, não há esforço algum.

Assim, pois, se posso sugeri-lo, procurai estar atentos, enquanto aqui estais a escutar o que se está dizendo. O que estou dizendo poderá ser difícil e talvez novo, e portanto causar certa perturbação; mas se fordes capazes de escutar com aquela atenção livre de tensão, não ficareis mentalmente agitados, embora possais sentir-vos perturbados num sentido diferente, o que talvez seja bom. O que estou dizendo é uma coisa que muito importa compreender.: Estou dizendo que a mente deve ser completamente estável. Mas, essa estabilidade não pode efetivar-se quando a mente se esforça para se tornar estável, porque a mente, a promotora do esforço, é, por natureza, limitada, insignificante. Pode a mente possuir conhecimentos enciclopédicos, ser capaz de discussões sutis e possuir vasta acumulação de técnica, mas permanecerá essencialmente limitada enquanto tiver suas bases no senso de aquisição e, por conseguinte, no cultivo da vontade, isto é, enquanto existir nela o “eu”, a entidade que adquire, que faz esforço, que guarda e acumula. A mente poderá pensar em Deus, disciplinar a si mesma, tentar controlar os seus vários desejos, a fim de se tornar virtuosa, a fim de possuir mais energia para a busca da Verdade, etc.; mas, essa mente estreita, limitada, nunca poderá ser livre e, portanto, estável.

Nosso problema, por conseguinte, é de como quebrar essa limitação mental. Está clara a questão? Se está clara, o que vos cabe então fazer? Vê-se a necessidade de uma mente muito estável, profunda, tranquila, uma mente perfeitamente controlada — mas não controlada por uma entidade que diz “Preciso controla-la”. Compreendeis? Isto é, percebo a importância de se ter uma mente estável. Pois bem. Como criar essa estabilidade? Se outra parte da mente disser: “Preciso ter uma mente estável”, criará conflitos, lutas para controlar e subjugar, não é verdade? Uma parte da mente dita à outra parte, tentando impedi-la de divagar, controlando-a, moldando-a, disciplinando-a, reprimindo várias formas de desejo; e temos, assim, um conflito incessante, não é exato?

Ora, a mente que se acha em conflito, é, na sua própria essência, limitada, porque o seu desejo é adquirir alguma coisa. Desejando adquirir uma mente estável, dizeis: “Tenho de controlar a minha mente, moldá-la, repelir todos os desejos em conflito”; mas, enquanto existir em nosso pensar esse processo dual, tem de haver conflito, e esse próprio conflito denota limitação, porque é produto do desejo de ganhar alguma coisa. Assim, pode a mente obliterar, esquecer de todo o processo de aquisição, de adquirir uma mente estável, a fim de achar Deus ou o que quer que seja? Isto é, podeis enquanto estais ouvindo, perceber, imediatamente, a verdade do que se está dizendo? Estou dizendo que é necessária completa e absoluta estabilidade da mente, e que qualquer tentativa para se conquistar tal estado indica que a mente está dividida e está a dizer: “Ótimo! Preciso de estabilidade, deve ser uma coisa maravilhosa”; em vista disso, começa a esforçar-se para alcançar esse estado, recorrendo à disciplinas, controles, várias formas de sanção, etc. Mas, se a mente for capaz de escutar a verdade daquela asserção, perceber a verdade daquela asserção, perceber a absoluta necessidade de controle completo, vereis então que não há mais esforço algum para se alcançar um estado.

Isto é difícil demais? Receio que o seja, porque, em geral, nós pensamos em termos de esforço, havendo sempre uma entidade que faz esforço, visando a um resultado, e por esta razão há conflito. Ouvis a asserção de que a mente deve ser absolutamente estável, controlada ou lestes e refletistes sobre isto e dizeis: “Preciso alcançar esse estado”, e procurais então alcançá-lo por meio de controle, de disciplina, meditação, etc. Nesse processo há esforço, ajustamento, observância de padrão, criação da autoridade, e as muitas complicações daí resultantes. Ora, todo esforço para alcançar um resultado, todo desejo de adquirir um estado, torna a mente limitada, e essa mente nunca poderá ser livre, para ser estável. Se se perceber bem claramente a verdade a esse respeito, não existe então uma estabilidade absoluta da mente? Compreendeis?

Por outras palavras: Vê-se bem claro ser necessário energia para qualquer espécie de ação. Mesmo se desejais ser um homem rico, tendes de devotar a vossa vida a esse fim, nele concentrar toda a vossa energia. E para se achar aquilo que está além das atividades, dos movimentos da mente — o que implica extraordinária profundeza de autoconhecimento — a energia concentrada é uma necessidade essencial. Ora, como se pode gerar essa energia concentrada?  

Reconhecendo que temos necessidade dela, dizemos: “Tenho de controlar meu temperamento, tomar alimentos adequados, evitar os excessos sexuais, refrear minhas paixões, apetites, desejos” — isto é, estamos sempre a escapar por tangentes. Tudo isso são tangentes, porque no centro, somos muito pobres. Enquanto a mente está a pensar em termos de adquirir alguma coisa, alcançar resultados, é ambiciosa, e a mente ambiciosa tem de ser, por natureza, limitada e superficial. Essa mente, tal como a do homem mundano, ambicioso, tem, sem dúvida nenhuma, uma certa carga de energia; mas nós estamos interessados numa coisa que exige energia muito mais profunda, mais ilimitada, e uma total ausência de “ego”.

Temos sido condicionados, através de séculos — religiosa, social e moralmente — para controlar, moldar a nossa mente de acordo com um certo padrão, ou seguirmos certos ideais, a fim de conservarmos a nossa energia; e pode a mente libertar-se dessas coisas, sem esforço algum, e entrar no mesmo instante num estado de tranquilidade total, completa estabilidade? Tal estado não está sujeito a distração de espécie alguma. Só há distrações, quando queremos seguir uma certa direção. Quando uma pessoa diz: “Tenho de pensar nisto, e em nada mais” — então, tudo o mais constitui distração. Mas se estamos atentos, completamente, com aquela atenção que não se fixa em objeto algum — já que não existe mais processo de aquisição, exercício da vontade, visando a um resultado — então a mente se verá num estado de extraordinária estabilidade, tranquilidade interior; e só a mente tranquila é livre, para descobrir ou deixar manifestar-se a Realidade.

Krishnamurti – Realização sem esforço – pág. 62 à 68 – 20 de agosto de 1955       


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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill