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segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Existe uma entidade espiritual separada do "eu"?

Podemos, vocês e eu, como indivíduos, penetrar até a raiz do processo do "eu", e compreendê-lo? Ora, qual é o elemento que o dissolve? Que é que causa a dissolução do "eu"? Grupos religiosos e outros têm explicado o meio de dissolver o "eu" pela identificação. Identifiquem-se com algo maior, e o "eu" desaparecerá — dizem eles. Nós, porém, dizemos que a identificação continua a ser um processo do "eu". Não sei se estão compreendendo isso. Todas as variadas formas de disciplina, de crenças e de conhecimentos, só servem para fortalecer o "eu". 

Pode-se achar um elemento capaz de dissolver o "eu"? Ou estará errada a pergunta? É isso o que desejamos, fundamentalmente. Desejamos encontrar alguma coisa que dissolva o "eu", não é assim? Pensamos que há vários modos de a encontrarmos, ou seja, a identificação, a crença, etc.; mas todos eles estão no mesmo nível: nenhum é superior aos outros, porque todos têm o mesmo poder de fortalecer o "eu". Pois bem, reconheço o "eu", onde quer que esteja operando, percebo sua energia e suas forças destruidoras. Qualquer que seja o seu nome, ele é uma força isolante, uma força destrutiva; e desejo encontrar um meio de dissolvê-lo. Vocês devem ter feito essa pergunta a si mesmos: "Vejo o eu operando a todas as horas, e produzindo sempre ansiedade, temor, frustração, desespero, sofrimento, não só a mim mesmo mas também a todos os que me cercam. É possível dissolver esse eu, não parcialmente, mas completamente?" — "Podemos penetrar até à sua raiz e dissolvê-lo?" — É essa a única maneira de agir, não acham? Não quero ser inteligente só parcialmente, quero sê-lo de maneira integral. A maioria de nós somos inteligentes em camadas, vocês provavelmente num sentido e eu noutro sentido diferente. Alguns de vocês são inteligentes no exercício de sua profissão, outros em suas atividades de escritório, etc. Os indivíduos são inteligentes em sentidos diferentes, nunca somos integralmente inteligentes. Ser integralmente inteligente, significa estar desacompanhado do "eu". E isso é possível? Se empreendo essa ação, qual a reação de vocês? Como não estamos numa reunião de discussão, não respondam, por favor; fiquem conscientes da ação. As coisas que ela implica, e que tenho tentado lhes mostrar, hão de produzir uma reação em vocês. Que reação é essa? 

É possível a completa ausência do "eu"? Sabem que é possível. Quais são, então, os ingredientes, os requisitos necessários? Qual o elemento que produz esse resultado? Posso descobri-lo? Estão seguindo o que estou dizendo, senhores? Quando falo a pergunta "posso descobri-lo?" estou naturalmente convencido de que é possível descobri-lo. Já criei uma experiência, no qual o "eu" irá fortalecer-se. Não é assim? A compreensão do "eu" requer grande soma de inteligência, vigilância, atenção, incessante observação, para o não deixarmos escapulir. Eu, que sinto sincero interesse, desejo dissolver o "eu". Quando assim falo, sei que é possível dissolver o "eu". Tenham paciência, por favor. No momento em que digo "Quero dissolver tal coisa" e no processo que sigo para dissolvê-la, há experiência por parte do "eu", e a mesma fortalece o "eu". Como é possível não deixar o "eu" experimentar? É bem evidente que o estado criador não é experiência do "eu". A criação ocorre quando o "eu" não está presente; porque a criação não é intelectual, não é produto da mente, não é auto-projeção, mas, sim, algo que está além de toda experiência, como sabemos. É possível ficar a mente tranquila de todo, num estado de não-reconhecimento, de não-experimentar, num estado em que a criação possa acontecer — isto é, num estado em que o "eu" não esteja presente, em que o "eu" esteja ausente? Estou-me fazendo claro ou não? Vejam, senhores, o problema é este, não é verdade? Todo movimento da mente, positivo ou negativo, representa uma experiência, que de fato fortalece o "eu". É possível para a mente não reconhecer? Só é possível quando há silêncio completo, não o silêncio que é experiência do "eu" e que, por conseguinte, fortalece o "eu". 

Existe uma entidade espiritual separada do "eu", que o observa e o dissolve? Estão compreendendo? Pensamos que existe, não é verdade? A maioria das pessoas religiosas pensam que existe esse elemento. O materialista diz: "É impossível destruir o "eu"; ele só pode ser condicionado e reprimido — política, econômica, socialmente, podemos prendê-lo firmemente dentro de um certo padrão, e subjuga-lo. Por conseguinte, é possível fazê-lo viver num alto nível, com moralidade, sem influir em coisa alguma, mas observando o padrão social e funcionando como simples máquina". Isso nós sabemos bem. Há outras pessoas, as chamadas religiosas — na realidade não são religiosas, embora assim as chamemos — que dizem: "Fundamentalmente, esse elemento existe. Se pudermos entrar em contato com o mesmo, ele dissolverá o "eu", à força, num canto". Se vocês se deixam colocar à força num canto, verão o que acontecerá. Gostaríamos que existisse um elemento atemporal, distinto do "eu" — e o denominamos Deus. Ora, existe tal elemento, concebível pela mente? Pode ser que exista ou pode ser que não exista; não estamos tratando disso. Quando a mente busca um estado espiritual independente do tempo, que se colocará em ação para destruir o "eu", não é essa uma outra forma de experiência que fortalece o "eu"? Quando vocês acreditam, não é isso, realmente, o que ocorre? Quando acreditam que existe a verdade, que existe Deus, um estado de eternidade, de imortalidade — não representa isso um processo de fortalecimento do "eu"? O "eu" projeta essa coisa que, segundo sentem e acreditam, há de vir, para destruir o "eu". E tendo projetado essa ideia de continuidade num estado atemporal, como entidade espiritual, estão prontos para experimentar esse estado, e toda experiência dessa espécie só servirá para fortalecer o "eu". Por conseguinte, o que fizeram? De fato, não destruíram o "eu", apenas lhe deram um nome diferente, uma qualidade diferente; o "eu" continua a existir, visto que o experimentaram. Nessas condições, a nossa ação, de princípio ao fim, é sempre a mesma; nós é que pensamos que ela evolui, se dissolve, se torna cada vez mais bela; mas, se observarem interiormente, é sempre a mesma ação que se verifica, sempre o mesmo "eu" funcionando em níveis diferentes, com rótulos diferentes, com nomes diferentes. 

O que acontece ao perceberem integralmente o processo do "eu", suas invenções astuciosas e extraordinárias, sua inteligência, como ele se cobre com a capa da identificação, da virtude, da experiência, da crença, do saber; ao reconhecerem que estão andando em círculos dentro de uma gaiola que ele fabricou? Ao perceberem esse fato, ao tomarem pleno conhecimento dele, não fica a mente de vocês extraordinariamente tranquila? — mas não em virtude de compulsão, de recompensa, de temor? Quando reconhecerem que todo movimento da mente é simples maneira de fortalecer o "eu", quando observarem, perceberam esse fato, quando ficarem plenamente cônscios do mesmo, na ação, quando chegarem a conhecer esse ponto — não ideologicamente, verbalmente, não por meio da experiência, mas, sim, porque vocês se acham de fato nesse estado — verão então que, em tal estado de completa tranquilidade, a mente não tem nenhum poder de criar. Tudo o que a mente cria está dentro de um círculo, está compreendido na esfera do "eu". Quando a mente é não-criadora, há criação, que não é um processo passível de reconhecimento. 

Não se pode reconhecer a realidade, a verdade. Para que a verdade se manifeste, devem desaparecer a crença, o conhecimento, a experiência, a virtude, o cultivo da virtude, — que é coisa diferente de "ser virtuoso". A pessoa "virtuosa", a pessoa que está cônscia de estar cultivando a virtude, nunca encontrará a realidade. Pode ser uma pessoa muito honrada, mas é inteiramente diferente do "homem da verdade", do homem que compreende. Para o "homem da verdade", a verdade surgiu na existência. O homem virtuoso é um homem direito, e um homem direito nunca poderá compreender o que é a verdade; porque, para ele, a virtude é uma capa do "eu", numa maneira de fortalecer o "eu"; pois ele cultiva a virtude. Quando diz: "devo ser um homem sem avidez", o estado em que é não-ávido, e no qual "experimenta", fortifica o "eu". Eis porque é importante ser pobre, não só de bens terrenos, mas também de crença e saber. O homem rico de bens terrenos, ou o homem rico de saber e de crenças, nunca conhecerá senão a escuridão, e será o centro de toda sorte de malefícios e sofrimentos. Mas se vocês e eu, como indivíduos, pudermos perceber todo esse funcionamento do "eu", saberemos então o que é o amor. Asseguro-lhes que essa é a única reforma capaz de transformar o mundo. O amor não é o "eu". O "eu" não pode reconhecer o amor. Vocês dizem "amo" e, então, justamente porque o dizem, não há amor. Mas quando conhecem o amor, não existe "eu". Quando há amor, não há "eu". 

Jiddu Krishnamurti — Quando o pesamento cessa

quinta-feira, 21 de março de 2013

Onde Deus está escondido

Pergunta a Osho:
Amado Osho, o que exatamente está me impedindo de ver o óbvio? Eu simplesmente não compreendo o que fazer ou o que não fazer. Quando é que eu serei capaz de ouvir o som do silêncio?
O que exatamente está obstruindo a minha visão de ver o óbvio? O simples desejo de vê-lo. O óbvio não pode ser desejado, o óbvio é!

Quando você deseja, você se afasta: você começa a buscar o óbvio. Nesse exato momento você o tomou distante, ele não é mais o óbvio, ele não mais está próximo; você o colocou bem distante. Como pode você buscar pelo óbvio? Se você compreende que é óbvio, como pode você buscá-lo? Ele está simplesmente aqui! Qual a necessidade de buscá-lo ou desejá-lo?

O óbvio é o divino, o mundano é o sublime e o trivial é profundo. Você está encontrando Deus a cada momento, nas suas atividades simples do dia-a-dia, porque não existe mais ninguém. Você não pode encontrar ninguém mais, é sempre Deus de mil e uma formas.

Deus é bem óbvio. Apenas Deus é! Mas você busca, você deseja... e você perde. Nesta sua mera busca você coloca Deus bem longe, muito distante. Isso é uma viagem do ego.

Tente compreender... o ego não está interessado no óbvio porque com o mesmo ele não pode existir. O ego não está de forma alguma interessado no que está próximo, ele está interessado no distante, lá longe. Pense bem: o homem alcançou a lua, mas ele ainda não alcançou o seu próprio coração.

O distante... o homem inventou viagens espaciais, mas ele ainda tem que desenvolver as viagens até a alma. Ele alcançou o Everest, mas ele não se interessa em ir para dentro do seu próprio ser.

Perde-se o que está próximo e busca-se o que está bem distante. Por quê? Porque o ego sente-se bem; se a jornada é difícil o ego sente-se bem, existe algo a ser provado. Se é difícil, existe algo a se provar. O ego se sente bem em ir até a lua, mas ir para dentro do seu próprio ser? Isso não seria muito pretensioso.

Existe uma velha história:

Deus criou o mundo. E então, ele costumava viver na terra. Você já pode imaginar... ele tinha tantos problemas, todos vinham reclamar, todos batiam à sua porta nas horas vagas. À noite pessoas vinham e diziam: “Isso está errado, hoje nós precisávamos de chuva e está tão quente”. E alguém vinha logo depois e dizia: “Não traga chuvas por enquanto — eu estou fazendo algo e a chuva estragaria tudo”.

E Deus estava a ponto de ficar louco... “O que fazer? Tantas pessoas, tantos desejos, e todos esperando e todos necessitando serem atendidos, e eram desejos tão contraditórios! O fazendeiro queria chuva e o ceramista não queria chuva alguma pois ele fazia vasos e a chuva podia destruí-los; ele necessitava de sol quente por alguns dias...” E assim em diante.

Então, Deus chamou os seus conselheiros e perguntou: “O que fazer? Eles irão me enlouquecer, e eu não posso satisfazer a todos. Ou eles irão me matar um dia destes! Eu gostaria de encontrar um lugar para me esconder”.

E os conselheiros sugeriram várias coisas. Um deles disse: isso não é problema, vá para o Everest. Ele é o pico mais elevado dos Himalaias, ninguém irá alcançá-lo”.

Deus disse: “Você nem imagina! Eles o alcançariam em poucos segundos”, para Deus isso seria apenas uns poucos segundos: “Edmund Hillary iria alcançá-lo com Tensing e então os problemas começariam. E uma vez que soubessem, então eles começariam a vir em helicópteros e ônibus, e tudo seria... Não, isso eu não vou fazer. Isso resolveria as coisas só por alguns minutos”.

Lembrem-se de que o tempo para Deus tem uma dimensão diferente. Na Índia diz-se que para Deus milhões de anos é um dia, alguns segundos então...

Daí alguém mais sugeriu: “E por que não ir para a lua?”

E Deus respondeu: “Lá também não é longe o bastante; mais uns poucos segundos e alguém iria alcançá-la”.

E os conselheiros sugeriram estrelas distantes, mas Deus falou: “Isto não resolveria o problema. Seria apenas uma espécie de adiamento. Eu quero uma solução permanente”.

Então, um velho ajudante de Deus aproximou-se dele e sussurrou algo em seu ouvido. E Deus disse: “Você está certo. Vou fazer isso mesmo!”.

O velho ajudante havia dito: “Só existe um lugar onde o homem nunca irá alcançar — esconda-se nele mesmo”. E esse é o lugar onde Deus está escondido desde então: no interior do próprio homem. E esse seria o último lugar no qual o homem pensaria encontrá-lo.

Perde-se o óbvio porque o ego não se interessa por ele. O ego está interessado em coisas duras, difíceis, árduas, porque aí existe um desafio. Quando você ganha, você pode clamar por vitória. Se o óbvio está aí e você ganha, que tipo de vitória é essa? Você não terá muito de um vencedor. É por isso que o homem segue perdendo o óbvio e buscando o distante. E como pode você buscar o distante quando você não pode nem mesmo buscar o óbvio?

“O que exatamente está obstruindo a minha visão de ver o óbvio?” O mero desejo está tomando-o distante. Abandone o desejo e você verá o óbvio.

“Eu simplesmente não compreendo o que fazer ou o que não fazer.” Você não tem que fazer nada. Você tem apenas que ser um observador de tudo que está acontecendo ao seu redor. O fazer é de novo uma viagem do ego. Fazendo, o ego se sente bem — algo está aí para ser feito. O fazer é um alimento para o ego, ele fortifica o ego. Não faça nada e o ego cai por terra; ele morre, ele não é mais nutrido.

Então, simplesmente seja um não fazedor. Não faça nada que diga respeito a busca por Deus, e pela verdade. Em primeiro lugar isso não é uma busca, assim você não pode fazer nada a respeito. Simplesmente seja.

Deixe-me dizer-lhe isso de uma outra forma: se você está em um estado puro de ser, Deus vem até você. O homem nunca poderá encontrá-lo; Deus encontra o homem.

Simplesmente esteja em um espaço silencioso — não fazendo nada, não indo a lugar algum, não sonhando — e nesse espaço de silêncio repentinamente você encontrará Deus. Porque ele sempre esteve presente! Simplesmente você não estava em silêncio para que pudesse vê-lo e você não pôde ouvir a sua voz, pequenina e quieta.

“Quando serei eu capaz de ouvir o som do silêncio?” Quando? Você faz a pergunta errada. É agora ou nunca! Escute-o agora, porque ele está aqui, a sua música está tocando, a sua música está em toda a parte. Você simplesmente precisa estar em silêncio para que possa ouvi-la.

Porém, nunca diga “quando”; “quando” significa que você está colocando no futuro; “quando” significa que você começou a esperar e sonhar; “quando” significa “não agora”. E sempre é no agora, sempre é no momento presente.

Para Deus existe apenas um tempo: o agora; e apenas um lugar: o aqui. “Lá”, “então” — abandone-os.


Osho, em "A Visão Tântrica: Discursos Sobre as Canções de Saraha"

Publicado no blog palavras de Osho

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

O termo Ego tem muitas definições


Na filosofia oriental o Ego são os defeitos psicológicos, ou ainda os nossos instintos primários de sobrevivência.

Quando eu uso o termo Ego é para classificar a estrutura mental como um todo, pois você não é a estrutura, a estrutura trabalha pra você, mas o jogo está invertido para maioria das pessoas.

Se iluminar não é deixar de ouvir o ego, você não deixa de ouvi-lo, apenas aprende a conviver e cria consciência dele, ISSO é criar consciência: Observar.

“A Iluminação é um processo destrutivo. Não tem relação com se tornar feliz ou melhor. Iluminação é a desconstrução da mentira. É ver através das pretensões. É a erradicação completa de tudo que se acredita ser verdade.”

— Adyashanti

Iluminar-se significa destruir todos os seus conceitos sobre o que é verdade pra sua mente, não é um processo agradável como muitos pensam, na verdade pode ser extremamente desconfortável e dolorido quebrar as ilusões que alimentamos por tanto tempo.

O Ego não é somente sombra, ele também é a luz, MAS uma luz fabricada, não é a luz real.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Que é o "eu"?

Sabemos o que se entende por "eu"? Por esse termo, entende-se a ideia, a memória, a conclusão, a experiência, as várias formas de intenções exprimíveis, o esforço consciente para ser ou não ser, a memória acumulada do inconsciente, da raça, do grupo, do indivíduo, do clã. Todo esse conjunto de coisas, quer projetado exteriormente como ação, quer espiritualmente projetado, como virtude, o esforço que visa a tudo isso é o "eu". Nessa luta se inclui a competição, o desejo de ser. Esse processo, na sua totalidade, é o "eu". Sabemos positivamente, quando o encaramos de frente, que ele é uma coisa má. Uso propositadamente a palavra "má", porque o "eu" é fator de separação. O "eu" é egotista, suas atividades, por mais nobres que sejam, são separativas e geram isolamento. Sabemos de tudo isso. Conhecemos também aqueles momentos extraordinários em que o "eu' é inexistente, em que não há tendência para esforço ou luta, e que ocorrem quando existe o amor.
Parece-me importante compreender como a experiência fortalece o "eu". Se sentimos verdadeiro interesse, deveríamos compreender esse problema da experiência. Ora, que se entende por "experiência"? Temos impressões a todas as horas, e traduzimos essas impressões e reagimos ou agimos em conformidade com elas; somos calculistas, astutos, etc. Há constante correlação entre o que vemos objetivamente e nossa maneira de reagir a isso, correlação entre o consciente e as memórias do inconsciente.

De acordo com minhas memórias, reajo a tudo o que vejo, a tudo o que sinto. Nesse processo de reação ao que vejo, ao que sinto, que sei, que creio, está ocorrendo experiência. A reação que se vê, é experiência. Quando vos vejo, reajo; dar nome a essa reação é experiência. Se não dou nome a essa reação, ela não constitui experiência. Observai vossas próprias reações e o que está ocorrendo em vós. Não há experiência, quando não há simultaneamente processo de dar nome. Se não vos reconheço, como posso ter a experiência do meu encontro convosco? Isso parece simples e exato, não é um fato? Isto é, se não reajo de conformidade com minhas memórias, meu condicionamento, meus preconceitos, como posso saber que tive uma experiência?

E há também a projeção de desejos vários. Desejo estar protegido, ter segurança interior, ou desejo ter um Mestre, um guru, um instrutor, um Deus. E experimento aquilo que projetei. Isto é, projetei um desejo, que tomou forma, a que dei nome; a esse nome eu reajo. Esse nome é uma "projeção" de mim mesmo. É produto meu. Esse desejo que me proporciona uma experiência, faz-me dizer: "Estou tendo uma experiência; encontrei-me com o Mestre; não me encontrei com o Mestre". Conheceis bem todo o processo de dar nome à experiência. É ao desejo que chamamos experiência, não é verdade?

Quando desejo o silêncio da mente, que ocorre? Que acontece? Reconheço a importância de ter a mente silenciosa, tranquila, por várias razões; porque os Upanichades assim falaram, porque assim o disseram as escrituras religiosas, assim o disseram os santos, e também porque, em certas ocasiões, eu próprio sinto como é bom estar tranquilo, já que minha mente tagarela tanto, o dia inteiro. Sinto por vezes, quanto é agradável, quanto é deleitável ter a mente tranquila, em silêncio. Meu desejo é "experimentar" o silêncio. Desejo ter a mente silenciosa, e por isso pergunto. "Como consegui-lo?" Sei o que disse este ou aquele livro acerca da meditação e das várias formas de disciplina. Nessa condições, procuro, através da disciplina, "experimentar" o silêncio. O "eu", o "ego", por conseguinte, fixou-se na experiência do silêncio.

Quero compreender o que é a verdade; esse é meu desejo, minha aspiração. Vem em seguida minha projeção daquilo que considero ser a verdade, pois li muito a seu respeito, ouvi muitas pessoas falarem dela, as escrituras religiosas a descreveram. Desejo-a, tal qual. Que acontece? O próprio desejo é "projetado", e tenho a experiência, porque reconheço esse estado "projetado". Se eu não reconhecesse, esse estado, não o chamaria "a verdade". Reconheço-o e o experimento e essa experiência reforça o "eu", o "ego", não é verdade? Desse modo, o "eu" se entrincheira na experiência, e dizeis, então: "Eu sei", "Existe o Mestre", "Existe Deus", ou, "Não existe Deus"; dizeis que determinado partido político tem razão e nenhum dos outros a tem.

A experiência, pois, está sempre reforçando o "eu". Quanto mais entrincheirados estamos em nossa experiência, tanto mais forte se torna o "eu". Como resultado disso, tendes certa força de caráter, certa força de conhecimento, de crença, e gostais de ostentar essa força diante daqueles que não são tão talentosos como vós, mostrar-lhes que tendes dotes literários ou oratórios e sois muito sagaz. Visto que o "eu" está ainda em ação, vossas crenças, vossos Mestres, vossas castas, vosso sistema econômico, tudo constitui um processo de isolamento e por conseguinte gera discórdia. Deveis, se tendes muito empenho e interesse, dissolver este centro completamente, em vez de justificá-lo. Essa a razão por que devemos compreender o processo da experiência.

É possível à mente, ao "eu", deixar de "projetar", de desejar, de experimentar? Vemos que todas as experiências do "eu" representam uma negação, uma destruição, e todavia chamamo-las ação positiva, não é assim? É a isso que chamamos a conduta positiva da vida. Desfazer todo esse processo significa, para vós, negação. Tendes razão? Podemos, vós e eu, como indivíduos, atingir a raiz do "eu" e compreender-lhe o processo? Ora, o que determina a dissolução do "eu"? Os grupos religiosos, bem como outros, têm oferecido a identificação, não é verdade? Identificai-vos com uma coisa superior, e o "eu" desaparecerá — dizem eles. Mas, positivamente, a identificação é ainda o processo do "eu", a coisa superior é, simplesmente, projeção do "eu", a qual experimento, e ela, por conseguinte, fortalece o "eu".

Não há dúvida de que todas as diferentes formas de disciplina, de crença e de conhecimento só tem o efeito de fortalecer o "eu". Pode-se achar um elemento capaz de dissolver o "eu"? Ou está errada esta pergunta? Basicamente, é isso que queremos. Queremos encontrar algo que dissolva o "eu", não é verdade? Pensamos que existem vários meios, tais sejam, a identificação, a crença, etc., mas todos eles estão situados no mesmo nível; nenhum é superior ao outro, porque todos são igualmente poderosos no fortalecer o "eu", o "ego". Posso, pois ver o "eu", em qualquer nível que esteja funcionando, e perceber sua força e sua energia destrutiva? Qualquer que seja o nome que lhe dê, ele é uma força que isola, uma força destrutiva, e desejo encontrar um modo de dissolvê-lo. Já vos deveis ter perguntado isto: Percebo o "eu" em função, a todas as horas, e sempre produzindo ansiedade, temor, frustração, desespero, amargura, não só em mim mas em todos os que me cercam. Pode esse "eu" ser dissolvido, não parcial, mas completamente? Podemos atingir-lhe a raiz, destruí-lo? Tal é a única maneira de funcionarmos verdadeiramente, não achais? Não desejo ser parcialmente inteligente, mas inteligente de maneira integral. Quase todos nós somos inteligentes "em camadas", vós provavelmente num sentido, eu em outro. Alguns de vós sois inteligentes nas atividades comerciais, outros nas atividades de escritório, etc. As pessoas são inteligentes de diferentes maneiras, mas não somos integralmente inteligentes. Ser integralmente inteligente significa existir sem o "eu". É possível tal estado?

Será possível o "eu" ficar de todo ausente, agora? Sabeis que é possível. Quais os ingredientes, os requisitos necessários? Qual o elemento que produz esse efeito? Posso encontrá-lo? Quando faço esta pergunta — "posso encontrá-lo"? — estou, sem dúvida, convencido de que é possível encontrá-lo; já criei, pois, uma experiência, na qual o "eu" vai se fortalecer, não é verdade? A compreensão do "eu" vai se fortalecer, não é verdade? A compreensão do "eu" requer grande soma de inteligência, grande soma de vigilância, de atenção, incessante observação, para que não nos escape. Eu, que sinto muito interesse, desejo dissolver o "eu". Quando digo "quero dissolver isto", esta é também experiência do "eu", que, desse modo, se fortalece. Como é possível o "eu" não experimentar? Pode-se ver que o "estado de criação" não é, em absoluto, experiência do "eu". Há criação quando o "eu" não está presente, porque a criação não é intelectual, não é autoprojeção, e sim uma coisa que transcende toda experiência. É possível, então, achar-se a mente de todo tranquila, num estado de não-reconhecimento, ou de não-experimentar, num estado em que possa se verificar a criação, isto é, um estado de inexistência, de ausência do "eu"? É este o problema, não achais? Todo movimento da mente, positivo ou negativo, é uma experiência, que, com efeito, fortalece o "eu". É possível a mente deixar de reconhecer? Isso só pode acontecer quando há silêncio completo, mas não o silêncio que é experiência do "eu" e que, por conseguinte, fortalece o "eu".

Existe uma entidade separada do "eu", que observa o "eu" e dissolve o "eu"? Existe uma entidade espiritual capaz de superar e de destruir o "eu"? Pensamos que existe, não é exato? A maioria das pessoas religiosas pensa que existe tal elemento. Mas o materialista diz: "É impossível destruir o "eu"; ele só pode ser condicionado, refreado, política, econômica, socialmente; podemos prendê-lo firmemente dentro de um certo , podemos dobrá-lo; e assim levá-lo a viver uma vida elevada, uma vida moral, sem interferir em coisa alguma, só seguindo o padrão social, funcionando qual uma máquina". Sabemos disso. Outras pessoas há, tidas como religiosas — religiosas não são realmente, embora assim as chamemos — que dizem: "Fundamentalmente, existe esse elemento. Se pudermos atingi-lo, ele dissolverá o eu".

Existe esse elemento capaz de dissolver o "eu"? Vede bem o que estamos fazendo. Estamos pondo o "eu", à força, em um canto. Se vis deixais empurrar para um canto, vereis o que acontece. Gostaríamos que existisse um elemento atemporal, independente do "eu", o qual, temos esperança, pudesse intervir e destruir o "eu", elemento a que chamamos "Deus". Ora, existe tal coisa, concebível pela mente? Pode ser que exista e pode ser que não. Não é disso que se trata. Mas quando a mente busca um estado espiritual, atemporal, que entrará em ação para destruir o "eu", não constitui isso uma outra forma de experiência, outra maneira de fortificar o "eu"? Quando credes, não é isso, com efeito, o que está acontecendo? Quando credes que há a Verdade, que há Deus, o estado atemporal, a imortalidade, não é este o processo que fortalece o "eu"? O "eu" projetou a coisa que sentis e credes que há de vir a destruir o "eu". Tendo projetado essa ideia de continuidade num estado atemporal, como entidade espiritual, tendes uma experiência e essa experiência só tem o efeito de fortalecer o "eu". Por conseguinte, que fizestes? Não destruístes verdadeiramente o "eu", e sim lhe destes apenas um nome diferente, uma qualidade diferente; o "eu" continua a existir, visto que tivestes aquela experiência. Assim, nossa ação, do começo ao fim, é a mesma ação, mas nós pensamos que ela está envolvendo, crescendo, tornando-se mais e mais bela. Se observardes interiormente, porém, vereis que é a mesma ação, o mesmo "eu" a funcionar, em diferentes níveis, com etiquetas diferentes, nomes diferentes.

Ao perceberdes o processo na sua inteireza, as invenções astuciosas e extraordinárias, a inteligência do "eu", como ele se protege por meio da identificação, da virtude, da experiência, da crença, do conhecimento; ao perceberdes como a mente se move em círculo, numa gaiola por ela mesma fabricada, que acontece? Percebendo esse fato, tomando pleno conhecimento dele, não ficais, então, extraordinariamente tranquilos — não em virtude de compulsão, de recompensa, de temor? Ao reconhecerdes que todo movimento da mente é simples maneira de fortalecer o "eu", ao observardes esse fato, ao vê-lo, tendo plena consciência dele, na ação — ao atingirdes esse ponto, não ideológica ou verbalmente, não pelo experimentar de projeções, mas achando-vos de verdade nesse estado, vereis então que a mente, de todo tranquila, não tem mais o poder de criar. Tudo o que a mente cria se acha dentro de um círculo, dentro da esfera do "eu". Quando a mente não cria, há criação, e esta não é um processo reconhecível.

A realidade, a verdade, não é reconhecível. Para que a verdade surja, a crença, o conhecimento, o experimentar, o cultivo da virtude — tudo isso tem de desaparecer. A pessoa virtuosa, que tem consciência de estar cultivando a virtude, nunca encontrará a realidade. Para o "homem da verdade", a verdade surgiu na existência. Um homem virtuoso é um homem muito austero, e um home austero não pode compreender o que é a verdade, porque, no seu caso, a virtude é um disfarce do "eu", um meio de fortalecer o "eu", já que ele está cultivando a virtude. Quando diz "não devo ter ganância", o estado de "não-ganância" que ele experimenta só tem o efeito de fortificar o "eu". Eis porque é tão importante ser pobre, não só das coisas do mundo, mas também da crença e do conhecimento. O homem cheio de riquezas mundanas, ou o homem rico de saber e de crença, jamais conhecerá nada, senão a escuridão, e será um foco de malefícios e tribulações. Mas se vós e eu, como indivíduos, pudermos perceber todo esse trabalho do "eu", saberemos então o que é o amor. Asseguro-vos que esta é a única reforma capaz de transformar o mundo. O amor não nasce do "eu". O "eu" não pode reconhecer o amor. Dizeis "amor"; mas no próprio fato de o dizerdes, no seu próprio experimentar, não há amor. Quando, porém, conheceis o amor, então o "eu" se tornou inexistente. Quando há amor, não há "eu".

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Ego, o falso centro



O primeiro ponto a ser compreendido é o ego.

Uma criança nasce sem qualquer conhecimento, sem qualquer consciência de seu próprio eu. E quando uma criança nasce, a primeira coisa da qual ela se torna consciente não é ela mesma; a primeira coisa da qual ela se torna consciente é o outro. Isso é natural, porque os olhos se abrem para fora, as mãos tocam os outros, os ouvidos escutam os outros, a língua saboreia a comida e o nariz cheira o exterior. Todos esses sentidos abrem-se para fora. O nascimento é isso.

Nascimento significa vir a esse mundo: o mundo exterior. Assim, quando uma criança nasce, ela nasce nesse mundo. Ela abre os olhos e vê os outros. O outro significa o tu.

Ela primeiro se torna consciente da mãe. Então, pouco a pouco, ela se torna consciente de seu próprio corpo. Esse também é o 'outro', também pertence ao mundo. Ela está com fome e passa a sentir o corpo; quando sua necessidade é satisfeita, ela esquece o corpo. É dessa maneira que a criança cresce.
Primeiro ela se torna consciente do você, do tu, do outro, e então, pouco a pouco, contrastando com você, com tu, ela se torna consciente de si mesma.

Essa consciência é uma consciência refletida. Ela não está consciente de quem ela é. Ela está simplesmente consciente da mãe e do que ela pensa a seu respeito. Se a mãe sorri, se a mãe aprecia a criança, se diz 'você é bonita', se ela a abraça e a beija, a criança sente-se bem a respeito de si mesma. Assim, um ego começa a nascer.

Através da apreciação, do amor, do cuidado, ela sente que é ela boa, ela sente que tem valor, ela sente que tem importância. Um centro está nascendo. Mas esse centro é um centro refletido. Ele não é o ser verdadeiro. A criança não sabe quem ela é; ela simplesmente sabe o que os outros pensa a seu respeito.

E esse é o ego: o reflexo, aquilo que os outros pensam. Se ninguém pensa que ela tem alguma utilidade, se ninguém a aprecia, se ninguém lhe sorri, então, também, um ego nasce - um ego doente, triste, rejeitado, como uma ferida, sentindo-se inferior, sem valor. Isso também é ego. Isso também é um reflexo.

Primeiro a mãe. A mãe, no início, significa o mundo. Depois os outros se juntarão à mãe, e o mundo irá crescendo. E quanto mais o mundo cresce, mais complexo o ego se torna, porque muitas opiniões dos outros são refletidas.

O ego é um fenômeno cumulativo, um subproduto do viver com os outros. Se uma criança vive totalmente sozinha, ela nunca chegará a desenvolver um ego. Mas isso não vai ajudar. Ela permanecerá como um animal. Isso não significa que ela virá a conhecer o seu verdadeiro eu, não.

O verdadeiro só pode ser conhecido através do falso, portanto, o ego é uma necessidade. Temos que passar por ele. Ele é uma disciplina. O verdadeiro só pode ser conhecido através da ilusão. Você não pode conhecer a verdade diretamente. Primeiro você tem que conhecer aquilo que não é verdadeiro. Primeiro você tem que encontrar o falso. Através desse encontro, você se torna capaz de conhecer a verdade. Se você conhece o falso como falso, a verdade nascerá em você.

O ego é uma necessidade; é uma necessidade social, é um subproduto social. A sociedade significa tudo o que está ao seu redor, não você, mas tudo aquilo que o rodeia. Tudo, menos você, é a sociedade. E todos refletem. Você irá à escola e o professor refletirá quem você é. Você fará amizade com as outras crianças e elas refletirão quem você é. Pouco a pouco, todos estarão adicionando algo ao seu ego, e todos estarão tentando modificá-lo, de modo que você não se torne um problema para a sociedade.

Eles não estão interessados em você. Eles estão interessados na sociedade. A sociedade está interessada nela mesma, e é assim que deveria ser. Eles não estão interessados no fato de que você deveria se tornar um conhecedor de si mesmo. Interessa-lhes que você se torne uma peça eficiente no mecanismo da sociedade. Você deveria ajustar-se ao padrão.

Assim, estão interessados em dar-lhe um ego que se ajuste à sociedade. Ensinam-lhe a moralidade. Moralidade significa dar-lhe um ego que se ajuste à sociedade. Se você for imoral, você será sempre um desajustado em um lugar ou outro...

Moralidade significa simplesmente que você deve se ajustar à sociedade. Se a sociedade estiver em guerra, a moralidade muda. Se a sociedade estiver em paz, existe uma moralidade diferente. A moralidade é uma política social. É diplomacia. E toda criança deve ser educada de tal forma que ela se ajuste à sociedade; e isso é tudo, porque a sociedade está interessada em membros eficientes. A sociedade não está interessada no fato de que você deveria chegar ao auto-conhecimento.

A sociedade cria um ego porque o ego pode ser controlado e manipulado. O eu nunca pode ser controlado e manipulado. Nunca se ouviu dizer que a sociedade estivesse controlando o eu - não é possível.

E a criança necessita de um centro; a criança está absolutamente inconsciente de seu próprio centro. A sociedade lhe dá um centro e a criança pouco a pouco fica convencida de que esse é o seu centro, o ego dado pela sociedade.

Uma criança volta para casa. Se ela foi o primeiro lugar de sua sala, a família inteira fica feliz. Você a abraça e beija; você a coloca sobre os ombros e começa a dançar e diz 'que linda criança! você é um motivo de orgulho para nós.' Você está dando um ego para ela, um ego sutil. E se a criança chega em casa abatida, fracassada, foi um fiasco na sala - ela não passou de ano ou tirou o último lugar, então ninguém a aprecia e a criança se sente rejeitada. Ela tentará com mais afinco na próxima vez, porque o centro se sente abalado.

O ego está sempre abalado, sempre à procura de alimento, de alguém que o aprecie. E é por isso que você está continuamente pedindo atenção.

Você obtém dos outros a idéia de quem você é. Não é uma experiência direta.

É dos outros que você obtém a idéia de quem você é. Eles modelam o seu centro. Mas esse centro é falso, enquanto que o centro verdadeiro está dentro de você. O centro verdadeiro não é da conta de ninguém. Ninguém o modela. Você vem com ele. Você nasce com ele.

Assim, você tem dois centros. Um centro com o qual você vem, que lhe é dado pela própria existência. Esse é o eu. E o outro centro, que é criado pela sociedade - o ego. Esse é algo falso - é um grande truque. Através do ego a sociedade está controlando você. Você tem que se comportar de uma certa maneira, porque somente assim a sociedade irá apreciá-lo. Você tem que caminhar de uma certa maneira; você tem que rir de uma certa maneira; você tem que seguir determinadas condutas, uma moralidade, um código. Somente assim a sociedade o apreciará, e se ela não o fizer, o seu ego ficará abalado. E quando o ego fica abalado, você já não sabe onde está, você já não sabe quem você é.

Os outros deram-lhe a idéia. E essa idéia é o ego. Tente entendê-lo o mais profundamente possível, porque ele tem que ser jogado fora. E a não ser que você o jogue fora, nunca será capaz de alcançar o eu. Por estar viciado no falso centro, você não pode se mover, e você não pode olhar para o eu. E lembre-se: vai haver um período intermediário, um intervalo, quando o ego estará se despedaçando, quando você não saberá quem você é, quando você não saberá para onde está indo; quando todos os limites se dissolverão. Você estará simplesmente confuso, um caos.

Devido a esse caos, você tem medo de perder o ego. Mas tem que ser assim. Temos que passar através do caos antes de atingir o centro verdadeiro. E se você for ousado, o período será curto. Se você for medroso e novamente cair no ego, e novamente começar a ajeitá-lo, então, o período pode ser muito, muito longo; muitas vidas podem ser desperdiçadas...

Até mesmo o fato de ser infeliz lhe dá a sensação de "eu sou". Afastando-se do que é conhecido, o medo toma conta; você começa sentir medo da escuridão e do caos - porque a sociedade conseguiu clarear uma pequena parte de seu ser... É o mesmo que penetrar numa floresta. Você faz uma pequena clareira, você limpa um pedaço de terra, você faz um cercado, você faz uma pequena cabana; você faz um pequeno jardim, um gramado, e você sente-se bem. Além de sua cerca - a floresta, a selva. Mas aqui dentro tudo está bem: você planejou tudo.

Foi assim que aconteceu. A sociedade abriu uma pequena clareira em sua consciência. Ela limpou apenas uma pequena parte completamente, e cercou-a. Tudo está bem ali. Todas as suas universidades estão fazendo isso. Toda a cultura e todo o condicionamento visam apenas limpar uma parte, para que ali você possa se sentir em casa.

E então você passa a sentir medo. Além da cerca existe perigo.

Além da cerca você é, tal como você é dentro da cerca - e sua mente consciente é apenas uma parte, um décimo de todo o seu ser. Nove décimos estão aguardando no escuro. E dentro desses nove décimos, em algum lugar, o seu centro verdadeiro está oculto.

Precisamos ser ousados, corajosos. Precisamos dar um passo para o desconhecido.
Por um certo tempo, todos os limite ficarão perdidos. Por um certo tempo, você vai se sentir atordoado. Por um certo tempo, você vai se sentir muito amedrontado e abalado, como se tivesse havido um terremoto.

Mas se você for corajoso e não voltar para trás, se você não voltar a cair no ego, mas for sempre em frente, existe um centro oculto dentro de você, um centro que você tem carregado por muitas vidas. Esse centro é a sua alma, o eu.

Uma vez que você se aproxime dele, tudo muda, tudo volta a se assentar novamente. Mas agora esse assentamento não é feito pela sociedade. Agora, tudo se torna um cosmos e não um caos, nasce uma nova ordem. Mas essa não é a ordem da sociedade - essa é a própria ordem da existência.

É o que Buda chama de Dhamma, Lao Tzu chama de Tao, Heráclito chama de Logos. Não é feita pelo homem. É a própria ordem da existência. Então, de repente tudo volta a ficar belo, e pela primeira vez, realmente belo, porque as coisas feitas pelo homem não podem ser belas. No máximo você pode esconder a feiúra delas, isso é tudo. Você pode enfeitá-las, mas elas nunca podem ser belas...

O ego tem uma certa qualidade: a de que ele está morto. Ele é de plástico. E é muito fácil obtê-lo, porque os outros o dão a você. Você não precisa procurar por ele; a busca não é necessária. Por isso, a menos que você se torne um buscador à procura do desconhecido, você ainda não terá se tornado um indivíduo. Você é simplesmente mais um na multidão. Você é apenas uma turba. Se você não tem um centro autêntico, como pode ser um indivíduo?

O ego não é individual. O ego é um fenômeno social - ele é a sociedade, não é você. Mas ele lhe dá um papel na sociedade, uma posição na sociedade. E se você ficar satisfeito com ele, você perderá toda a oportunidade de encontrar o eu. E por isso você é tão infeliz. Como você pode ser feliz com uma vida de plástico? Como você pode estar em êxtase ser bem-aventurado com uma vida falsa? E esse ego cria muitos tormentos. O ego é o inferno. Sempre que você estiver sofrendo, tente simplesmente observar e analisar, e você descobrirá que, em algum lugar, o ego é a causa do sofrimento. E o ego segue encontrando motivos para sofrer...

E assim as pessoas se tornam dependentes, umas das outras. É uma profunda escravidão. O ego tem que ser um escravo. Ele depende dos outros. E somente uma pessoa que não tenha ego é, pela primeira vez, um mestre; ele deixa de ser um escravo.

Tente entender isso. E comece a procurar o ego - não nos outros, isso não é da sua conta, mas em você. Toda vez que se sentir infeliz, imediatamente feche os olhos e tente descobrir de onde a infelicidade está vindo, e você sempre descobrirá que o falso centro entrou em choque com alguém.

Você esperava algo e isso não aconteceu. Você espera algo e justamente o contrário aconteceu - seu ego fica estremecido, você fica infeliz. Simplesmente olhe, sempre que estiver infeliz, tente descobrir a razão.

As causas não estão fora de você.

A causa básica está dentro de você - mas você sempre olha para fora, você sempre pergunta: 'Quem está me tornando infeliz?' 'Quem está causando a minha raiva?' 'Quem está causando a minha angústia?'
Se você olhar para fora, você não perceberá. Simplesmente feche os olhos e sempre olhe para dentro. A origem de toda a infelicidade, da raiva e da angústia, está oculta dentro de você, é o seu ego.

E se você encontrar a origem, será fácil ir além dela. Se você puder ver que é o seu próprio ego que lhe causa problemas, você vai preferir abandoná-lo - porque ninguém é capaz de carregar a origem da infelicidade, uma vez que a tenha entendido.

Mas lembre-se, não há necessidade de abandonar o ego. Você não o pode abandonar. E se você tentar abandoná-lo, simplesmente estará conseguindo um outro ego mais sutil, que diz: 'tornei-me humilde'...

Todo o caminho em direção ao divino, ao supremo, tem que passar através desse território do ego. O falso tem que ser entendido como falso. A origem da miséria tem que ser entendida como a origem da miséria - então ela simplesmente desaparece. Quando você sabe que ele é o veneno, ele desaparece. Quando você sabe que ele é o fogo, ele desaparece. Quando você sabe que esse é o inferno, ele desaparece.

E então você nunca diz: 'eu abandonei o ego'. Você simplesmente irá rir de toda essa história, dessa piada, pois você era o criador de toda essa infelicidade...

É difícil ver o próprio ego. É muito fácil ver o ego nos outros. Mas esse não é o ponto, você não os pode ajudar.

Tente ver o seu próprio ego. Simplesmente o observe.

Não tenha pressa em abandoná-lo, simplesmente o observe. Quanto mais você observa, mais capaz você se torna. De repente, um dia, você simplesmente percebe que ele desapareceu. E quando ele desaparece por si mesmo, somente então ele realmente desaparece. Porque não existe outra maneira. Você não pode abandoná-lo antes do tempo. Ele cai exatamente como uma folha seca.

Quando você tiver amadurecido através da compreensão, da consciência, e tiver sentido com totalidade que o ego é a causa de toda a sua infelicidade, um dia você simplesmente vê a folha seca caindo... e então o verdadeiro centro surge.

E esse centro verdadeiro é a alma, o eu, o deus, a verdade, ou como quiser chamá-lo. Você pode lhe dar qualquer nome, aquele que preferir."

OSHO, Além das Fronteiras da Mente.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Pode a mente ficar livre da atividade egocêntrica?

O que é ser egocêntrico? Quando é que você tem consciência de ser "eu"?
(...) Só estou cônscio das atividades do "eu" quando existe oposição, quando a consciência se vê contrariada, quando o "eu" está desejoso de alcançar resultado. O "eu" está ativo, ou tenho consciência daquele centro, quando o prazer termina e eu desejo mais desse prazer; há então resistência e um intencional ajustamento da mente a um determinado fim, o qual me proporcionará deleite, satisfação; estou consciente de mim mesmo e das minhas atividades quando estou cultivando a virtude conscientemente. É só isso o que sabemos. Um homem que cultiva a virtude conscientemente, não é virtuoso. A humildade não pode ser cultivada e nisso é que consiste a beleza da humanidade.
Nessas condições, enquanto existe esse centro de atividade, em qualquer direção, consciente ou inconsciente, há o motivo do tempo e estou consciente do passado e do presente em conjunção com o futuro. O centro dessa atividade, da atividade egocêntrica do "eu", é um processo de tempo. É isso o que você entende por tempo — refere-se, ao processo psicológico do tempo; é a memória que dá continuidade à atividade do centro, que é o "eu". Tenha a bondade de observar-se em funcionamento; não ouça apenas as minhas palavras, não fique hipnotizado pelas minhas palavras. Se você observar a si mesmo e tomar conhecimento desse centro de atividades, verá que ele é apenas o processo do tempo, da memória, do experimentar e traduzir cada experiência, segundo a memória; verá também que a atividade do "eu" é reconhecimento, sendo isso processo da mente.
Pois bem, pode a mente ficar livre da atividade egocêntrica? Talvez seja possível, em momentos raros; talvez possa acontecer à maioria de nós, quando praticamos um ato inconsciente, não intencional, não proposital. É possível a mente ficar livre da atividade egocêntrica? Eis uma pergunta muito importante, que, que deve se fazer em primeiro lugar, pois, precisamente no fazê-la encontrará a resposta. Isto é, se você está consciente do processo total dessa atividade egocêntrica, se está perfeitamente ciente de suas atividades em diversos níveis da sua consciência, então, de certo, tem de perguntar a si mesmo se é possível aquela atividade chegar a um fim; isto é, não pensar dentro dos limites do tempo, não pensar com referência ao que serei, ao que fui, ou ao que sou. Desse modo de pensar procede todo o processo da atividade egocêntrica; aí também tem começo a determinação de vir-a-ser, a determinação de escolher e de evitar, tudo isso processo de tempo. Notam-se, nesse processo, malefício sem fim, miséria, confusão, perversão, degeneração. Fique consciente disso, enquanto falo, nas suas relações, na sua mente.
Positivamente, o processo de tempo não é revolucionário. No processo do tempo não há transformação; só há uma continuidade e nunca um findar. No processo do tempo só existe reconhecimento. Só quando temos a cessação completa do processo do tempo, da atividade do "eu", há o novo, há revolução, há transformação. 
Uma vez consciente de todo esse processo do "eu", em sua atividade, que deve a mente fazer? Só com a renovação, só com a revolução — não pela evolução, não com o "eu" na atividade do vir-a-ser, mas sim pelo completo findar do "eu", há o novo. O processo do tempo não pode trazer o novo; o tempo não é o caminho da criação. 
Não sei se você já teve algum momento de criação — não "ação", não me refiro à execução de algum  ato — quero significar o momento de criação em que não há reconhecimento algum. Nesse momento se realiza aquele estado extraordinário em que o eu "como atividade de reconhecimento deixou de existir"... Se você está vigilante, verá que naquele estado não existe nenhum "experimentado" que lembra, traduz, reconhece, e depois identifica. Não há nenhum processo de pensamento, que é coisa do tempo. Naquele estado de criação, de ação criadora, naquele estado do novo, que é atemporal, não existe, absolutamente, nenhuma ação do "eu". 
Nossa questão, agora, é certamente esta: É possível à mente experimentar, conhecer aquele estado, não momentaneamente, não em instantes raros, mas — não quero usar a expressão "eternamente" ou "para sempre", que implica o tempo — conhecer aquele estado, achar-se naquele estado sem relação alguma com o tempo? Esta, sem dúvida, é uma descoberta muito importante, que cada um de nós deve fazer, porquanto é ela a porta do amor; todas as outras portas representam atividades do "eu". Onde há ação do "eu" não há amor. O amor não é do tempo. Você não pode praticar o amor, pois isso seria uma atividade consciente do "eu", que espera, por meio do amor, alcançar um resultado.
O amor, pois, não é coisa do tempo; você não pode chegar a ele por meio do esforço consciente, por meio de uma disciplina, por meio da identificação, porque tudo isso é processo do tempo. A mente que só conhece o processo do tempo é incapaz de reconhecer o amor. O amor é a única coisa que é nova, eternamente nova. Uma vez que os mais de nós temos cultivado a mente, que é um processo de tempo, resultado do tempo, não sabemos o que é o amor. Falamos a respeito do amor; dizemos que amamos pessoas, que amamos nossos filhos, nossas esposas, nosso próximo; que amamos a natureza; mas, no momento em que estou consciente de que amo, entrou em atividade o "eu" e, consequentemente, o amor deixou de existir. 
O processo total da mente só é compreensível no estado de relação — relação com a natureza, com as pessoas, com nossa própria "projeção", com tudo, enfim. Na realidade, a vida não é outra senão relações. Ainda que tentemos isolar-nos das nossas relações, não podemos existir sem elas; embora as relações sejam dolorosas e procuremos evitá-las pela fuga, recolhendo-nos ao isolamento, tornado-nos eremitas, etc., não o podemos fazer. Todos esse métodos constituem um indício de atividade do "eu". Ao perceber o quadro, em sua inteireza, ao perceber integralmente esse processo do tempo como consciência — perceber, sem que haja escolha, sem que haja nenhuma intenção determinada no sentido de um objetivo, sem desejo de resultado — você verá como esse processo do tempo chega a um fim, espontaneamente — um fim não provocado, um fim que não é resultado do desejo. Só quando cessa aquele processo existe o amor, que é eternamente novo.
Não temos de procurar a verdade. A verdade não é uma coisa que se acha longe de nós. A verdade habita a mente, está presente em suas atividades de cada instante. Ao perceber inteiramente esse processo do tempo, então, esse percebimento libera, descarrega aquela consciência ou energia que está toda aplicada a ser. Quando a mente se serve da consciência como atividade egocêntrica, entra em cena o tempo, com todas as suas misérias, todos os seus conflitos, todos os seus malefícios, todas as suas ilusões intencionais; e só quando a mente, compreendendo esse processo total, cessa, pode existir o amor. Podemos chamá-lo amor ou por outro nome qualquer; o nome que lhe damos não tem importância.
(...) O amor não é uma coisa da mente; o amor não é uma idéia. O amor só pode existir depois de extinta a atividade do "eu". Você, porém, chama essa atividade do "eu" positiva; esse ato "positivo" leva à destruição, à separação, à aflição, à confusão, coisas essas que você conhece muito bem e a fundo. E, toda via, todos nós falamos de cooperação, de fraternidade. Basicamente, o que desejamos é ficar apegados às nossas atividades egocêntrica.
(...) Quando você e eu não somos egocêntricos, amamo-nos um ao outro; então, você e eu estamos interessados na ação e não no resultado; não na idéia, mas no realizar da ação; você e eu temos amor um pelo outro. Quando a minha atividade egocêntrica entra em choque com a sua atividade egocêntrica, "projetamos", então, uma idéia, com relação à qual nós dois estamos em conflito; superficialmente, estamos cooperando, mas, em verdade, estamos continuamente em guerra.
(...) Se você e eu nos amássemos, acredita que existiriam as aldeias sórdidas e repugnantes? Nós agiríamos não ficaríamos a criar teorias e a falar de fraternidade. Evidentemente, não há calor, não há riqueza em nossos corações, e vivemos falando a respeito de tudo; temos métodos, sistemas, partidos, governos e leis. Não sabemos que não é com palavras que se conquista aquele estado de amor.
A palavra "amor" não é amor. A palavra "amor" é só um símbolo e nunca pode ser a realidade. Por isso, não fique hipnotizado pela palavra "amor". Ela não é nenhuma coisa nova. Esse estado só pode realizar-se depois de ter cessado a atividade do "eu"; e, em virtude dessa cessação do "eu", você está cooperando com o alvo de fazer o que é preciso e não com o alvo numa idéia. Você não sabe tudo isso, senhor? Não sabe que quando você e eu nos amamos, fazemos as coisas tão fácil e placidamente? Não falamos de cooperação, não falamos de nenhum sistema de como se faz uma coisa, ficando depois a batalhar por causa do sistema e inteiramente esquecidos da ação. Você sorri, e passa adiante... Envelhecemos em esperteza, mas não em sabedoria...  
Krishnamurti - Quando o pensamento cessa

sábado, 4 de agosto de 2012

Sobre o contemplar e a dissolução do Ego


Em última análise, a coisa que chamamos “eu”, o “ego”, é a entidade que está acumulando experiência. É essa a entidade que luta incessantemente? (…) Se você escutar devidamente, verá como, em presença da Verdade, acontece uma coisa extraordinária, a desintegração do “eu” e, em conseqüência, a possibilidade de uma mente nova, mente que estará de fato experimentando o que é verdadeiro, sendo ela própria, por conseguinte, a Verdade. (1)

A mente que compreende, que percebe a verdade relativa ao “vir-a-ser”, ao ser, a verdade relativa ao acumular - essa é uma mente tranqüila; e a mente tranqüila pode experimentar sem se corromper. E pode então, nessa tranqüilidade, penetrar mais fundo, (…) naquele estado maravilhoso que nenhuma mente consciente ou disciplinada (…) pode atingir. Deus, a Verdade, não pode ser acumulado - Ele é de momento a momento. (2)

(…) Todavia, esse “eu” está constantemente se afirmando, traduzindo toda experiência, (…) reação, (…) movimento do pensar em conformidade com seu próprio centro. O “eu”, o “ego” é fonte de conflito e dor, de luta perene por vir a ser, realizar, alcançar; e, enquanto não percebermos esse fato, a nossa mente, por mais hábil, sutil e ilustrada que seja, só haverá de criar mais problemas e (…) sofrimentos. Assim, pois, aqueles dentre nós que tiverem intenções realmente sérias, devem evidentemente orientar a sua indagação no sentido de descobrir se esse “eu” pode chegar a um fim. (3)

Uma vez cônscia da totalidade desse processo do “eu”, na sua atividade, que deve a mente fazer? Só com a renovação (…), a revolução - não pela evolução, ou pelo “vir-a-ser” do “eu”, mas pela completa extinção do “eu” - só assim o novo se apresenta. O processo do tempo não pode trazer-nos o novo, pois o tempo não é o caminho da criação. (4)

Porque, o que constitui o tempo é a ocupação da nossa mente com a memória, e a capacidade de distinguir diferentes lembranças. E é possível à mente permanecer fora do tempo, fora do conhecimento, que é memória, que é experiência, palavra, símbolo? Pode a mente estar livre de tudo isso e, por conseguinte, fora do tempo? Não há então, no centro, uma revolução, uma transformação fundamental? Porque então a mente já não está lutando por alcançar um resultado, acumular, chegar a um fim. Então não há mais temor. A mente, em si mesma, é o desconhecido; (…) é o novo, “o não-contaminado”. Por conseguinte, é o Real, o incorruptível independente do tempo. (5)

(…) Mas, por certo, o que muito nos interessa é descobrir a verdade acerca dessa coisa que chamamos de “eu”, desse centro que é a causa do conflito, bem como averiguar se existe a possibilidade de dissolver esse centro. (…) Mas podemos, de certo, averiguar se a mente pode ser livre, se pode achar-se naquele estado de “não saber”, em que não esteja preocupada com acumulações e “projeções” do seu próprio saber. (…) O que se precisa fazer é só vigiar a si mesmo, penetrar nos arcanos da mente, observar as tendências do “eu”, em sua atividade de acumulação e projeção. (6)

Pergunta: Como pode deter-se a ação do “eu”?

Krishnamurti: Só poderá deter-se se o virdes em atividade. Se o virdes em ação, ou seja, no estado de relação, esse ver será o fim do “eu”. Esse ver, não só é uma ação não condicionada, mas também atua no condicionamento. (7)

Como poderá o “eu”, o “ego” - que constitui todo o processo do nosso pensar - terminar, cessar? (…) Nessas condições, enquanto cada um de nós - pela compreensão do processo integral das relações, que nos são como um espelho - não descobrir a si mesmo (…); enquanto não estiver cônscio de todo o processo do “eu” - o que é autoconhecimento - tem muito pouca significação a nossa luta. (8)

(…) Devemos pôr de lado todas essas coisas e chegar-nos ao problema central, que é: “Como dissolver o “eu”, que nos prende ao tempo, e no qual não existe nem amor nem compaixão? Só é possível passarmos além, depois que a nossa mente não mais se dividir em pensador e pensamento. Quando pensador e pensamento são uma só unidade, só então há silêncio (…) em que não há fabricação de imagens, nem a expectativa de “mais” experiência. Nesse silêncio (…) há uma revolução psicológica criadora. (9)

Pode o “eu”, em algum tempo, libertar-se da auto-escravização e suas ilusões? Não deve o “eu” deixar de existir, para que tenha existência o “sem nome”? E esse lutar constante pelo alvo final não tem apenas o efeito de dar mais força ao “eu” (…)? Vós lutais pelo alvo final, outro anda atrás das coisas mundanas; (10)

(…) O homem que está observando o perpassar das suas experiências, lembranças, conhecimentos, sem a eles se prender, esse homem não aspira à virtude; não está acumulando. E quando a mente já não está acumulando, quando a mente está desperta para todo o processo da consciência, com todas as suas lembranças e seus motivos inconscientes, todos os impulsos de gerações, de séculos, deixando tudo isso passar por ela sem a prender - não se acha então a mente fora do tempo? A mente que, embora consciente das experiências, não se prende a nenhuma delas, já não está livre da rede do tempo? (11)

Nada dissolverá o “eu” enquanto a mente estiver diligenciando dissolvê-lo, uma vez que a mente é incapaz de arrasar as barreiras, as muralhas que ela própria criou. Mas, quando estou cônscio de toda essa complexa estrutura do “eu , que é o passado em cada movimento, através do presente, para o futuro; quando estou cônscio de tudo que se passa tanto interior como exteriormente, tanto oculta como abertamente - quando estou de todo cônscio de tudo isso, então, a mente, que criou as barreiras, no seu desejo de sentir-se segura, permanente, no seu desejo de continuidade, se torna extraordinariamente tranqüila, inativa; e só então apresenta-se a possibilidade de dissolução do “eu”. (12)

Assim, o que importa não é como ficar livre do orgulho, mas sim compreender o “eu”; e o “eu” é muito insidioso. (…) Portanto, enquanto existir esse centro do “eu”, o fato de uma pessoa ser orgulhosa ou reputadamente humilde será de pequeníssima significação. Serão apenas diferentes casacos para vestir. Quando um dado casaco me atrai, visto-o; e no ano seguinte, de acordo com minhas fantasias, desejos, visto outro. (13)

O que vocês têm de entender é como esse “eu” aparece. O “eu” surge por meio das várias formas da sensação de realização. Isso não quer dizer que vocês não devam agir; mas a sensação de que vocês estão agindo, (…) realizando, de que (…) precisam abandonar o orgulho, precisa ser entendida (14)

Vocês precisam compreender a estrutura do “eu”. Precisam tomar consciência de seu próprio pensar (…) observar como tratam o criado, os pais, o professor; (…) como consideram os que estão acima de vocês e os que estão abaixo de vocês, aqueles que vocês respeitam e aqueles que vocês desprezam. Tudo isso revela os processos do “eu”. Entendendo os processos do “eu”, há a libertação do “eu”. (…) (15)
(…) Mas será tão difícil assim o estudo do “eu”? Será necessária a ajuda de outra pessoa, por mais adiantado, elevado que seja o nível (…)? Ninguém, por certo, pode ensinar-nos a compreender o “eu”. Cabe-nos descobrir o processo total do “eu”; mas para isso requer-se espontaneidade. Não podemos impor-nos uma disciplina, um modo de operar; só podemos estar cônscios de instante a instante, de cada movimento do pensamento, de cada sentimento, na vida de relação (16) 

Enquanto houver um padrão de pensamento, a contradição continuará a existir; e, para eliminar o padrão e, assim, a contradição, torna-se necessário o autoconhecimento. (…) O “eu” precisa ser compreendido, na nossa linguagem diária, na maneira como pensamos e como consideramos o nosso semelhante. Se pudermos estar cônscios de cada pensamento, de cada sentimento, momento a momento, veremos que, na vida de relação, compreenderemos as peculiaridades e tendências do “eu”. Só então podemos ter aquela tranqüilidade da mente, (…) ver surgir a realidade final. (17)

Há compreensão do “eu”, e liberdade, só quando posso olhá-lo completa e integralmente, como um todo; e isso só posso fazer quando, sem justificar, sem condenar, sem reprimir, compreendo na íntegra o processo de toda a atividade do desejo, (…) porque o pensamento não é diferente do desejo. Se posso assim compreender, terei a possibilidade de transcender as restrições do “eu”.(18)

Assim sendo, o que me parece importante é essa investigação do “eu” de “mim”, para se conhecer o “eu” tal qual é, com suas ambições, invejas, exigências agressivas, falácias, divisão em “superior” e “inferior” - de tal maneira que não só seja revelada a mente consciente, mas também a inconsciente (…); o conhecimento da totalidade do “eu” significa o seu fim. (19)

Se houver correta compreensão do fato de que não pode existir verdadeiro discernimento enquanto persistir a vontade de desejo, essa mesma compreensão faz com que o processo do “eu” chegue a ser destruído. Não existe outro ou mais alto “eu” que destrua o processo do “eu”; nenhum ambiente e nenhuma divindade pode acabar com esse processo. Porém, a própria percepção do processo do “eu”, o discernimento de sua insensatez, de sua natureza transitória, é que o destrói. (20)

(…) Há uma atividade diferente que não procede do “ego” e que cumpre ser encontrada. Uma inteligência diferente é necessária para compreender o Atemporal, pois é só este que nos pode libertar de nossas lutas e sofrimentos (…) A inteligência que agora possuímos é produto do desejo de satisfação e segurança, material ou espiritual; é resultado da cupidez; (…) da auto-identificação. Tal inteligência é incapaz de compreender o Real. (21)

(…) Só depois de cessar a atividade do “ego”, da memória, apresenta-se uma consciência totalmente diferente, a respeito da qual toda especulação é somente estorvo. O esforço que visa à expansão é sempre atividade do “ego”, cuja consciência quer crescer, “vir a ser”. Essa consciência prende-se ao tempo e por isso não se encontra, nela, o Atemporal. (22)

O que podemos perceber é, somente, que estamos fechados, que a atividade da vontade é resistência e que o próprio desejo de alcançar vigilância passiva é um obstáculo a mais. (…) Estar atento para as atividades egocêntricas é anulá-las; (…) A vigilância passiva só nos vem quando tranqüila a mente-coração. Nessa tranqüilidade, vem o Real à existência. (23)

(…) O problema, pois, é este: pode a mente, que é resultado do tempo, a mente que é o “eu”, o “ego”, ainda que muito lhe agrade dividir-se em “eu” superior e “eu” inferior, observador e coisa observada - pode o “eu”, cuja consciência, no seu todo, é resultado da acumulação de experiência, de memória, de conhecimentos, findar sem o desejarmos? (24)

E pode essa mente, que pertence ao tempo e não tem relação nenhuma com a Verdade (…) deter-se instantaneamente, para que possa existir a outra mente, o outro “estado de ser”, a mente que experimenta a Realidade e é, por conseguinte, ela própria o Real? (25)

Em momentos de intensa criação, de grande beleza, há uma tranqüilidade absoluta; em tais momentos verifica-se uma ausência completa do “ego” e de todos os seus conflitos; é essa negação - a forma suprema do pensar-sentir - que é essencial para alcançarmos o estado de potência criadora. (26)

(1) O Problema da Revolução Total, pág. 120
(2) O Problema da Revolução Total, pág. 121
(3) Percepção Criadora, pág. 54
(4) A Primeira e Última Liberdade, 1ª ed., pág. 125
(5) Poder e Realização, pág. 73)
(6) A Renovação da Mente, pág. 25
(7) A Luz que não se Apaga, pág. 131
(8) O Problema da Revolução Total, pág. 25-26)
(9) Claridade na Ação, pág. 145
(10) Reflexões sobre a Vida, 1ª ed., pág. 128
(11) Poder e Realização, pág. 72
(12) Claridade na Ação, pág. 90-91
(13) O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 88
(14) O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 88
(15) O Verdadeiro Objetivo da Vida, pág. 88
(16) Viver sem Confusão, pág. 35-36
(17) Por que não te Satisfaz a Vida, pág. 40
(18) Quando o Pensamento Cessa, pág. 64-65
(19) Transformação Fundamental, p .60
(20) Palestras em Nova York, Eddington, Madras, 1936, pág. 56)
(21) O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 215-216)
(22) O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 200)
(23) O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 214
(24) Poder e Realização, pág. 71
(25) Poder e Realização, pág. 71
(26) (O Egoísmo e o Problema da Paz, pág. 88)

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Imagens Mentais Errôneas, de Si Próprio, dos Demais

Não só olhamos a natureza com olhos que acumularam conhecimentos a seu respeito (…), com uma imagem, mas também olhamos os outros entes humanos com nossas diferentes conclusões, opiniões, juízos e valores. Assim, quando você olha ou observa a si mesmo, a sua vida, está observando através da imagem e das conclusões que já formou. Você diz que isto é bom, aquilo é mau, ou que isto é certo e aquilo, errado.(1)

Assim agindo, você não está em relação direta com o que vê. Você olha com o conhecimento trazido do passado, (…) suas imagens, com a tradição, (…) as experiências humanas acumuladas; tudo isso lhe impede de ver. Este é um fato que precisa ser compreendido, ou seja, que, para observar realmente a vida, você deve olhá-la com olhos novos, isto é, (…) sem condenação, (…) ideal, (…) desejo de dominar ou alterar o que vê, em suma, observar.(2)

Todos nos colocamos em níveis diversos e estamos constantemente a cair dessas alturas. Dessas quedas nos envergonhamos. A auto-apreciação é a causa de nossa vergonha, (…) queda. Essa autoapreciação é que precisa ser compreendida, não a queda. Se não existe um pedestal, sobre o qual você coloca a si mesmo, como pode haver queda?(3)

Sem o dito pedestal, você será o que é. Se não mais existe o pedestal, do alto do qual você olha para baixo ou para cima, então você é aquilo de que sempre esteve fugindo. É essa fuga ao que é, ao que você é, que dá origem à confusão e ao antagonismo, à vergonha e ao ressentimento.(4)

Tanto a pobreza como a riqueza são escravidão. O desejo de prestígio, posição e poder - o poder que se conquista por arrogância, a humildade, o ascetismo, o saber, a exploração e abnegação - esse desejo é sutilmente persuasivo e quase instintivo. O sucesso (…) é poder, e o insucesso (…) a negação do sucesso.(5)

O sucesso neste mundo e o poder que trazem o controle e a negação de si mesmo, são coisas que devem ser evitadas, pois ambos deformam a compreensão. (…) O homem de sucesso é um homem endurecido, egocêntrico; está cheio de sua própria importância, suas responsabilidades, realizações, lembranças.(6)

O cérebro está sempre ativo, sonhando acordado, ocupando-se com uma ou outra coisa, ou criando quadros e idéias por meio da imaginação. Desde a infância, nós construímos gradualmente a estrutura de imagem que é “eu”. Cada um de nós está fazendo isso constantemente; é essa imagem, que é o “eu”, que se fere. Quando o “eu” é ferido, existe a resistência, a construção de um muro em volta de nós mesmos (…); e isso cria mais medo e isolamento.(7)

Cada um de nós tem uma imagem daquilo que “deveríamos ser”, uma idéia de que somos grandes ou muito insignificantes, estúpidos, medíocres, ou temos o sentimento de sermos extraordinariamente afetuosos, superiores, cheios de sabedoria, de conhecimentos. Essas imagens que temos de nós mesmos negam totalmente o percebimento do imediato, do que é.(8)

Existe um conflito entre a imagem e o que é, e, a meu ver, a madureza é um estado mental em que nenhuma imagem existe e só há o que é; nela não há conflito de espécie alguma. A mente que se acha em conflito não está amadurecida - conflito com a família, com nós mesmos, com nossos desejos, ambições, preenchimentos. Em qualquer nível que seja, o conflito denuncia sempre uma mente não amadurecida, não esclarecida.(9)

A mente está cheia de imagens, palavras, símbolos. Ela pensa,e, através de tudo isso, vê.(10)

Não. Eu tenho uma imagem de você, e olho através dessa imagem. Isso é distorção. A imagem é meu condicionamento.(11)

Seria produção psicológica de imagens o mecanismo do pensamento? Sabemos que o pensamento não está envolvido, talvez num alto grau, na reação física de autoproteção. Mas a produção psicológica de imagens é resultado da constante desatenção, que é a própria essência do pensamento. (…) A atenção não tem centro, (…) Quando há atenção total, não há movimento do pensamento. Só na mente desatenta é que surge o pensamento.(12)

O fato, não minha reação ao fato. Não teorias românticas e irreais (…) É um fato que, enquanto houver imagens, não haverá paz no mundo, nem (…) amor no mundo - veja a imagem de Cristo, (…) de Buda, ou a imagem dos muçulmanos - entendem?(13)

Pergunta: Eu tenho uma imagem de mim, e a tenho de você no sentido de como deveria ser sua relação comigo. E então essa imagem se vê frustrada e lastimada, e assim sucessivamente.(14)

Krishnamurti: Porém como hei de mudar essa imagem? Como hei de demoli-la? Vejo muito bem que tenho uma imagem e que esta há sido formada, construída através de gerações. Sou bastante inteligente, (…) consciente de mim mesmo e vejo que tenho essa imagem; como hei de demoli-la?(15)

Devo, pois, como ser humano comum, dar-me conta de que o mais importante é ter relação correta com tudo.

Interpelante: Seria conveniente se pudéssemos dizer o que ocorre quando não a temos.

Krishnamurti: Não só se desmorona tudo, senão que causo estragos a meu derredor. Posso, então, desprezar o fumar, o beber, a conversa interminável (…) - posso reunir essa energia? Concentrarei essa energia que me ajudará a enfrentar a imagem, a representação mental que tenho?(16)

A relação com minha esposa, com meu vizinho, no escritório (…) - e também com a natureza - não creio que estejamos compreendendo a importância de uma relação simples, tranqüila, plena, rica, feliz - a beleza disso, sua harmonia. Podemos então explicá-lo ao espectador comum (…) a grande importância que isso tem.(17)

Sim, senhor. (…) Sei que estou formando imagens todo o tempo. Sou bem consciente disso, porque o tenho discutido com você, tenho-o investigado. Desde o começo mesmo, me tenho dado conta (…) de que a relação é o mais importante que há na vida. Sem essa relação a vida é um caos.(18)

Isso há sido impulsionado dentro de mim. Vejo que cada lisonja e cada insulto se registram no cérebro, e que então o pensamento se apodera disso como uma recordação e cria uma imagem e a imagem fica ferida.(19)

Interpelante: A imagem é, portanto, ferida (…)

Krishnamurti: Por conseguinte, Dr. Bohm, que se há de fazer? Há duas coisas implicadas nisso - uma é evitar feridas ulteriores, e a outra é estar livre de todas as feridas que tenho tido.(20)

Senhor, sejamos agora bem simples. Dissemos que temos imagens; sei que tenho imagens e você me diz que as olhe, que esteja atento a elas, que perceba as imagens. É o que percebe diferente do percebido?(21)

Porque, se o que percebe é diferente, então todo o processo continuará indefinidamente - correto? Porém, se não há divisão, se o observador é o observado, então muda todo o problema.

De acordo? É, então, o observador diferente do observado? Obviamente, não o é. Posso, pois, olhar a imagem sem o observador? Porque o observador produz a imagem, ele é o movimento do pensar.(22)

Exatamente. Se não há um experimentador, há experiência? De modo que você me há pedido que olhe minhas imagens, o que é uma exigência mui séria e mui penetrante. Você diz: “Olhe-as sem o observador, porque o observador é o que fabrica as imagens, e, se não há um observador, (…) um pensador, não há pensamento, correto? Por conseguinte, não há imagem.”(23)

Digo, pois, que minha consciência é a consciência do mundo porque, essencialmente, está repleta das coisa do pensamento - pensar, medo, prazer, desespero, ansiedade, apego, esperança - é um torvelinho de confusão. Tudo isso produz um sentimento de profunda agonia. E nesse estado não posso ter relação alguma com nenhum ser humano.(24)

Então você me diz: “Ter a máxima e mais responsável das relações é não ter imagem alguma”. Você me há assinalado que, para estar livre de imagens, o fazedor das imagens deve achar-se ausente. O fazedor de imagem é o passado, é o observador que diz: “Gosto disto”, “Não gosto disto”; e também: “Minha mulher”, “meu marido”, “minha casa” - o “meu”, o “eu” é que é a essência da imagem.(25)

Agora, a pergunta seguinte é: Estão as imagens tão ocultas que eu não possa abordá-las, (…) pôr-me em contato com elas? Todos vocês, os especialistas, me hão dito que há dezenas de imagens ocultas, enterradas; e eu digo: “Por Deus! eles devem sabê-lo. (…) Porém, como hei de desenterrar essas imagens, como hei de expô-las?(26)

Assim é. Portanto, a consciência que eu conheço - na qual tenho vivido - tem experimentado uma tremenda transformação. Têm-na experimentado vocês? É assim com vocês? E se posso perguntar também ao Dr. Bohm - (…) a todos nós: ao dar-nos conta de que o observador é o observado e que, portanto, já não existe o fazedor de imagens e, por conseguinte, o conteúdo da consciência - que constitui a consciência - não é como o conhecemos, que se passa então?(27)

Formulo esta pergunta porque nela está incluída a meditação. Faço esta pergunta porque todas as pessoas religiosas, as pessoas realmente sérias que hão investigado esta questão, vêem que, enquanto continuamos vivendo nossas vidas diárias dentro da área desta consciência - com todas as imagens e com o fazedor das imagens, - qualquer coisa que façamos estará ainda nessa área. Correto? Um ano posso tornar-me um budista zen, e no outro ano posso seguir algum guru, e assim sucessivamente, porém isso se encontra sempre dentro dessa área.(28)

Que se passa, pois, quando não há movimento do pensar, o qual fabrica as imagens (…)? (…) Quando o tempo, que é o movimento do pensar, cessa, que é que há? Porque vocês me hão levado a este ponto. Eu o compreendo (…) Hei tentado a meditação zen, a meditação hindu, (…) toda sorte de outras práticas infelizes, e então ouço vocês e digo: “Por Deus! - é algo extraordinário o que essas pessoa estão dizendo.” Dizem que, no momento em que não existe o fazedor de imagem, o conteúdo da consciência experimenta uma transformação radical e cessa o pensamento (…) Chega ao fim o pensamento, o tempo se detém. Então, quê? É isso a morte?(29)

Interpelante: É a morte do “eu”

Krishnamurti: Não (…) Quando o pensamento se detém, quando não existe o fazedor de imagens, há uma completa transformação da consciência, porque não há medo, (…) ansiedade, (…) persecução do prazer, (…) nenhuma das coisas que criam divisão e conflito. Que é, então, o que surge? (…) Cabe averiguá-lo.(30) 

Isso tem sido minha vida. Tenho-me aferrado ao conhecido e, portanto, a morte é o desconhecido, de modo que dele tenho medo. E vêm vocês e dizem: “Olhe, a morte é em parte o fim da imagem e do fazedor de imagem, porém a morte tem uma significação muito maior (…)

Porque é o fim de tudo. A cessação da realidade e de todos os meus conceitos, minhas imagens - a cessação de todas as recordações.(31)

Não, não. (…) Escute a pergunta: “Pode cessar a produção de imagens?” Agora examinamos, analisamos todo esse processo que constitui a fabricação de imagens - o resultado disso é a infelicidade, a confusão, as coisas aterradoras que estão sucedendo. O árabe tem sua imagem, o mesmo que o judeu, o hindu, o muçulmano, o cristão, o comunista. Existe essa tremenda divisão das imagens, dos símbolos. Se isso não se detiver, vocês terão um mundo caótico (…) Entendem? Eu vejo isso, não como abstração, mas como realidade.(32)

Pois bem. Solidão e isolamento são dois estados diferentes. O isolamento resulta das atividades diárias, nas quais toda ação emana do centro ou imagem. A imagem é, essencialmente, em centro que se formou pela rejeição da dor e a não rejeição do prazer. Nossos valores estão baseados no que nos dá prazer, e não no fato, “no que é”.(33)

Assim, enquanto existir essa imagem, cujos valores se baseiam no prazer, haverá necessariamente isolamento do centro, pois este cria seu espaço próprio. O centro cria espaço ao redor de si em suas relações com pessoas, coisas, idéias, e esse centro (…) é o isolamento - um estado de que podemos estar conscientes ou não.(34)

A imagem é, essencialmente, um centro que se formou pela rejeição da dor e não rejeição do prazer. Nossos valores estão baseados no que nos dará prazer, e não no fato, no que é. (…) A mente (…) atingiu seu atual estado de desenvolvimento, tal como os animais, pelo cultivo dos valores baseados no prazer. (…) Deseja ela viver continuamente num estado de prazer e, por conseguinte, o próprio espaço que cria em torno de si constitui sua própria limitação.(35)

Pode-se viver a vida no mundo moderno sem uma só imagem? Quem lhes fala pode dizer que isso é possível. Porém requer muita energia para descobrir (…) e, além disso, se é possível viver uma vida na qual não haja nem uma só crença; porque são as crenças que dividem os seres humanos. Pode-se, pois, viver sem uma só crença e não ter jamais uma imagem de si mesmo? Essa é a verdadeira liberdade.(36)

Se um indivíduo tem uma imagem de si mesmo e o chamam de néscio (…) a reação se produz instantaneamente. (…) Ou seja (…) quando ele escuta com atenção completa, não há reação. É a falta de um escutar agudo e sensível que faz surgir a imagem e, portanto, a reação. (…) Quando há atenção total, não se forma um centro. É só a desatenção que cria o centro. (…) Quando há atenção total, a afirmação de que o indivíduo é néscio perde completamente toda significação. Porque, quando há atenção, não existe um centro que esteja reagindo.(37)

(1) O Novo Ente Humano, pág. 119
(2) O Novo Ente Humano, pág. 119
(3) Comentários sobre o Viver, pág. 143-144
(4) Comentários sobre o Viver, pág. 144
(5) Comentários sobre o Viver, pág. 75
(6) Comentários sobre o Viver, pág. 75
(7) A Rede do Pensamento, pág. 65
(8) Como Viver neste Mundo, pág. 70
(9) Como Viver neste Mundo, pág. 70
(10) Tradición y Revolución, pág. 49
(11) Tradición y Revolución, pág. 49
(12) Perguntas e Respostas, pág. 52
(13) La Totalidad de la Vida, pág. 94
(14) La Totalidad de la Vida, pág. 97
(15) La Totalidad de la Vida, pág. 97
(16) La Totalidad de la Vida, pág. 98
(17) La Totalidad de la Vida, pág. 99
(18) La Totalidad de la Vida, pág. 104
(19) La Totalidad de la Vida, pág. 104
(208) La Totalidad de la Vida, pág. 109
(21) La Totalidad de la Vida, pág. 110
(22) La Totalidad de la Vida, pág. 110
(23) La Totalidad de la Vida, pág. 110-111
(24) La Totalidad de la Vida, pág. 111
(25) La Totalidad de la Vida, pág. 111
(26) La Totalidad de la Vida, pág. 111
(27) La Totalidad de la Vida, pág. 112
(28) La Totalidad de la Vida, pág. 112
(29) La Totalidad de la Vida, pág. 112
(30) La Totalidad de la Vida, pág. 113
(31) La Totalidad de la Vida, pág. 118
(32) La Totalidad de la Vida, pág. 93
(33) O Descobrimento do Amor, pág. 129
(34) O Descobrimento do Amor, pág. 130
(35) O Descobrimento do Amor, 1ª ed., pág. 130
(36) La Llama de la Atención, pág. 110-111
(37) La Llama de la Atención, pág. 111
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill