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sexta-feira, 27 de março de 2015

Por que o paradigma holotrópico trabalha com vários mestres?

Dê às boas vindas à verdade em qualquer horizonte em que ele apareça, procure-a nas quatro direções, sem deixar de ir a nenhuma. Em suma, não se torne fanático e de mente estreita. 

Em qualquer lugar onde você encontrar a verdade, seja qual for o nome com que seja rotulada, aceite-a. 

Em seus esforços por uma vida melhor, aceite de boa vontade a ajuda que lhe vem de qualquer forma correta. 

Seja sempre receptivo às ideias e práticas que possam enriquecer as que já conhece. 

Nenhum caminho único leva, por si só, à verdade total. 

Não existe um grupo que tenha o monopólio da verdade, pois seu reconhecimento é uma experiência universal. Recusemo-nos a ouvir os que insistem em viajar por um único caminho, e apenas por ele. 

A verdade não está confinada a nenhuma seita, mas seus fragmentos podem ser encontrados espalhados por aqui e ali. 

Podemos aprender de tudo e de todos, de todos os acontecimentos e ocorrências, algo novo ou uma confirmação do que é velho, algo afirmativo ou algo negativo. 

Quando o instrutor de um ensinamento, um livro ou um exercício é usado como expressão indireta do movimento do próprio Eu Superior para libertar a graça, então é uma completa cegueira condená-lo como falso. 

Por que limitar a ajuda que você está querendo receber a uma única direção? Todos os homens são seus instrutores. A verdade, sendo infinita, possui um infinito número de aspectos. Cada guia espiritual tem a tendência de enfatizar apenas alguns e a negligenciar os outros. 

A inspiração manifestou-se em muitas terras e em diferentes formas, através de séculos distantes e de vários tipos de canais. Por que limitar a cultura a uma contribuição, uma terra, uma forma, um século ou a um só canal? Isso se aplica não só à cultura intelectual e artística, mas também ao seu aspecto religioso. Podemos ir ainda mais adiante nessa questão, e aplicar a mesma ideia aos gurus. Devemos ficar sempre atracados a um único guru? Não podemos, também, respeitar, apreciar, honrar, venerar outros gurus, e deles receber luz? 

"Estude tudo, mas não se vincule a nada", é o melhor conselho. Mas que pena! Os entusiastas ingênuos raramente o ouvem. 

Guarde com teimosia seu território e empunhe a bandeira da independência na busca da verdade, do não-compromisso no relacionamento com os instrutores da verdade. Humilde e alegremente, aceite todo o bem que possa encontrar em seus ensinamentos, mas não faça isso sob um contrato ou voto que o obrigue a tornar-se discípulo. Nesse assunto seja cético, pegando o melhor de cada fonte disponível e não excluindo nenhuma que tenha algo de útil a oferecer.

Aprenda algumas das verdades básicas que cada sistema contém sem se identificar com o próprio sistema. Mantenha a mente aberta e livre para adquirir ideias e práticas valiosas de outras culturas, e evite a atitude fechada, sectária. 

Libertar-se da estreiteza autoritária, convencional e sectária é olhar cada livro inspirado como uma bíblia. 

Essa posição isolada, fora de grupos e rótulos, oferece esta vantagem: o indivíduo é capaz de aproveitar de tudo, aceitar e reconciliar fragmentos de ensinamentos radicalmente diferentes e aparentemente contraditórios. 

Aceite, de todos os ensinamentos, tudo o que tenha valor para você pessoalmente, em seu atual estado mental, e descarte o resto. Esse é o caminho eclético, melhor que o caminho mais comum, que é entrar numa prisão doutrinária única e permanecer nela. Hesite muito antes de se comprometer e ingressar nesta ou naquela organização. Lembre-se de que existem vários aspectos da verdade, e de que pode valer a pena manter-se livre para aprender alguma coisa desses outros aspectos. 

Recomendo sempre àqueles que se sentem fortes o bastante para isso, que evitem entrar em alguma organização, que mantenha sua liberdade, enquanto ao mesmo tempo estudem as doutrinas de quaisquer que sejam as organizações que lhes interessem, de quaisquer que sejam as religiões que lhes chamem a atenção. Essa liberdade torna-os capazes de ter vista para todos os lugares, de estudar de tudo, de questionar corajosamente, de manter a amplitude de visão, a profundeza de pensamento. 

Só essa independência pode alcançar o novo sem perder o que tem valor no velho; todos os outros caminhos são comprometidos, limitados, cativos. 

Permanecendo abertos às verdades de diferentes fontes e juntando-as como mosaicos, chegamos, ao final, a algum tipo de padrão.

Paul Brunton em, A Busca

domingo, 2 de novembro de 2014

Quebrando o preconceito com o conceito de magia

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Todo defunto pensa que sabe o que a vida é

Os Mestres não falam a verdade. Mesmo se eles quiserem eles não podem, é impossível. Então, qual a função deles? O que eles continuam fazendo? Eles não podem dizer a verdade, mas eles podem provocar a verdade que está profundamente adormecida em você. Elas podem provocá-la, desejá-la. Eles podem lhe sacudir, eles podem lhe acordar. Eles não podem lhe dar Deus, verdade, nirvana, porque em primeiro lugar você já tem tudo isso em você. Você nasce com isto. É inato, intrínseco. É a sua própria natureza. Então qualquer pessoa que finja lhe dar a verdade está simplesmente explorando sua estupidez, sua credulidade. Ele é esperto — esperto e completamente ignorante também. Ele não sabe nada, nem mesmo um vislumbre da Verdade aconteceu a ele. Ele é um pseudoMestre. 

A verdade não pode ser dada; ela já está em você. Ela pode ser suscitada, ela pode ser provocada. Um contexto pode ser criado, um certo espaço pode ser criado no qual ela surja em você e não esteja mais adormecida, torne-se desperta. 

A função do mestre é bem mais complexa do que você pensa. Ela teria sido bem mais fácil, bem mais simples, se a verdade pudesse ser transmitida. Ela não pode ser transmitida; logo, é preciso usar meios e caminhos indiretos

No novo testamento há a bela história de Lázaro. Os cristãos perderam todo sentido dela. Jesus é tão infeliz — ele esteve na companhia de pessoas erradas. Nem mesmo um único teólogo cristão foi capaz de descobrir o significado da história de Lázaro, sua morte e sua ressurreição... Se Lázaro estava morto ou não, não é o que importa. Envolver-se nessas questões estúpidas é um absurdo. Somente eruditos podem ser tão bobos...

Vocês estão todos mortos. Vocês estão todos na mesma situação de Lázaro. Vocês estão todos em suas grutas escuras. Vocês estão todos fedendo e deteriorando... porque a morte não é uma coisa que vem um dia de repente — vocês estão morrendo todos os dias. Desde o dia de seu nascimento você está morrendo. É um longo processo; leva-se setenta, oitenta, noventa anos para completá-la. A cada momento alguma coisa de você morre, alguma coisa em você morre, mas você está absolutamente inconsciente da situação toda. Você continua como se estivesse vivo; você continua como se soubesse o que a vida é.

A função do Mestre é chamar: "Lázaro, saia da gruta! Saia do seu túmulo! Saia da morte!"

O Mestre não pode lhe dar a verdade, mas ele pode provocá-la. Ele pode mexer algo em você. Ele pode dar início a um processo em você, que vai inflamar um fogo, uma chama

A verdade já é você — simplesmente juntou muita poeira ao seu redor. A função do Mestre é negativa: ele tem que lhe dar um banho, uma chuveirada, então a poeira desaparece. 

Este é exatamente o significado do batismo cristão. Isto é o que João Batista estava fazendo no rio Jordão. Mas as pessoas continuam entendendo errado. Hoje o batismo acontece nas igrejas; ele é sem sentido. 

João Batista estava preparando as pessoas para um banho interno. Quando elas estivessem prontas ele as levaria simbolicamente para dentro do rio Jordão. Aquilo era somente simbólico... simbolizando que o Mestre pode lhe dar um banho. Ele pode tirar a poeira, a poeira de séculos para fora de você. E de repente tudo está límpido, tudo é claridade. Essa claridade é iluminação. 

(...) Os Mestres não ensinam a verdade, não há como ensiná-la. É uma transmissão além das escrituras, além das palavras. É uma transmissão. É energia provocando energia em você. É um tipo de sincronicidade... Começou um processo em você que lhe revela a verdade do seu ser. Você se vê face a face com você. Deus não está em algum outro lugar: ele está aqui, agora.

OSHO  

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

A divisão entre mestre e discípulo é anti-espiritual

Senhor, não siga autoridade alguma. Toda autoridade é perniciosa. A autoridade destrói, a autoridade perverte, a autoridade corrompe; e o homem que segue a autoridade está destruindo a si próprio e destruindo igualmente aquilo que se fez de autoridade. O seguidor destrói o mestre, assim como o mestre destrói o seguidor. O guru destrói o discípulo, assim como o discípulo destrói o guru. Através da autoridade você nunca descobrirá coisa alguma. É preciso que você esteja livre da autoridade, para achar a realidade. É uma das coisas mais difíceis ficar-se livre da autoridade, tanto exterior como interior. A autoridade interior é a consciência da experiência, a consciência do conhecimento. E a autoridade exterior é o Estado, o partido, o grupo, a comunidade. O homem que deseja encontrar a realidade deve evitar toda autoridade, seja externa ou interna. Não deixe, pois, que lhe digam o que deve pensar. Essa é a maldição da leitura: a palavra de outro se torna de máxima importância.

O autor da pergunta começa dizendo "Disseram-nos". Quem é que pode dizer-lhe alguma coisa? Não vê, senhor, que os guias e os santos e os grandes instrutores falharam, porque você é o que é? Deixe-os, pois, sossegados. Você os fez mal-sucedidos, porque você não está à procura da Verdade; você quer satisfação. Não siga pessoa alguma, nem a mim próprio. Não faça de outra pessoa sua autoridade. Você mesmo tem de ser mestre e discípulo. No momento em que você reconhece outro como seu mestre, e a si mesmo como seu discípulo, você está negando a Verdade. Na busca da Verdade, não há mestre nem discípulo. A busca da Verdade é que é importante, e não você ou o mestre que se propõe a ajudar-lhe a achá-la. Evidentemente, a educação moderna, bem como a antiga, tem-lhe ensinado O QUE PENSAR e não A PENSAR. Puseram-lhe num molde, e esse molde lhe destruiu; porque você só procura um guru, um instrutor, um guia, seja político ou de outra espécie, somente quando você se acha confuso. Do contrário, nunca segue pessoa alguma. Se você está esclarecido, se, interiormente, você é uma luz para si mesmo, não seguirá ninguém. Mas como não o é, você segue, segue por causa da sua confusão; e aquilo, que você segue fica também, necessariamente, confuso. Seus guias, assim como você mesmo, estão confusos, política ou religiosamente. Por conseguinte, trate em primeiro lugar de dissipar a sua própria confusão, tornando-se uma luz para si mesmo, e então desaparecerá o problema. A divisão entre mestre e discípulo é anti-espiritual.

Krishnamurti em, O Que Te Fará Feliz?

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Você vive como um leão ou como uma ovelha?

O pensar não pode decidir nada, porque algo pode ser bom em uma situação e a mesma coisa pode ser má numa situação diferente. Às vezes mesmo um veneno pode ser remédio e outras, um remédio pode ser veneno — você tem que compreender o fluxo mutável da vida.

Assim sendo, você não pode decidir pensando. Não é uma questão de decidir por meio de uma conclusão lógica; é uma questão de consciência sem escolhas. Você precisa de uma mente sem pensamentos. Em outras palavras, você precisa de uma não-mente, apenas um puro silêncio, para examinar as coisas diretamente. E dessa clareza, a escolha surgirá por si mesma; você não está escolhendo. Você agirá exatamente como um Buda age. Sua ação terá beleza, terá verdade, terá a fragância do divino. Não há necessidade de escolha. 

Você tem que procurar orientação, porque não sabe que seu guia interior está escondido dentro de você. Você tem que encontrar o guia interior, e isso é o que chamo de sua testemunha, seu dharma, seu Buda intrínseco. Você tem que despertar aquele Buda, e sua vida será uma abundância de bênçãos e graças. Sua vida ficará radiante com tanto bem e religiosidade, mais do que você possa sequer conceber. 

É quase como a luz. Seu aposento está escuro, acenda a luz. Até uma pequena vela vai funcionar e toda escuridão desaparecerá. E uma vez que você tenha uma vela, saberá onde está a porta. Você não tem que pensar: "Onde fica a porta?" Só as pessoas cegas pensam a respeito de onde fica a porta. As pessoas que têm olhos e luz disponível não pensam. Você já pensou: "Onde está a porta?" Você simplesmente se levanta e sai. Você nunca tem um único pensamento sobre onde está a porta. Você não começa a tatear procurando a porta ou vai batendo com sua cabeça contra a parede. Você simplesmente a vê, sem nem mesmo uma centelha de pensamento. Você apenas sai. 

Quando você está além da mente, a situação é exatamente a mesma. Quando não existem nuvens e o Sol brilha no céu, você não tem que pensar" Onde está o Sol?" Quando existem nuvens encobrindo o Sol, tem que pensar.

Seu próprio ser está encoberto com pensamentos, emoções, sentimentos e todos são produtos da mente. Basta colocá-los de lado e então, o que quer que você faça, será bom — não que você siga certas escrituras, mandamentos ou certos líderes espirituais. Você é, por seu próprio direito, o guia de sua vida. E essa é a dignidade do homem; ser o guia de sua própria vida. Isso transforma o homem num leão, não numa ovelha, que está sempre procurando alguém que a defenda. 

Mas esse não é um problema só seu, é o problema de quase toda a humanidade. Você tem sido programado por outros sobre o que é certo e o que é errado.

O S H O

segunda-feira, 14 de abril de 2014

O mestre é necessário?

O que é que as tradições espirituais da humanidade nos dizem a esse respeito? Algumas tradições espirituais da humanidade nos dizem que o mestre é necessário, e outras dizem que não.

Eis algumas citações:
  • Não sigas pelo caminho sozinho, porque poderias perder-te.
  • Não conseguimos nos ver com os nossos próprios olhos. 
  • Tens necessidade de outro para te conheceres a ti próprio. 
  • Se não escolheres um mestre, é Satanás quem o será (Arabi)
Alguns dirão usando outras palavras: o ego será teu mestre. Fiar-se no seu próprio juízo é fiar-se no seu ego. Nesse caso corremos no risco de cair numa auto-ilusão. Podemos, por exemplo, ler os textos sagrados segundo as nossas interpretações. Há, portanto, certas tradições onde se insiste sobre esta necessidade de termos alguém que nos acompanhe no caminho, mas outras dirão que um mestre é necessário. 

O grande místico do islã, Rumi, disse uma vez, referindo-se ao seu mestre: "É ele a verdade, a essência de toda a verdade, é ele o mistério de todas as religiões, a boca de todas as certezas". 

Encontramos algo semelhante na Índia, na devoção prestada ao guru, porque é através dele que a verdade nos é transmitida. 

Todavia, o mesmo Rumi, diz em outra ocasião: "Purifica-te dos atributos do eu, de modo que possas contemplar tua própria essência na sua pureza, e contempla no teu coração todas as ciências dos profetas, sem livros, professores, sem mestre"

O objetivo é despertar em nós a essência da vida. O objetivo do mestre exterior é nos despertar para essa presença.
Na epístola de São João está escrito: "Não precisais mais que vos ensinem, o Espírito Santo é quem vos ensinará todas as coisas"

O mestre está no nosso interior e é a ele que devemos escutar, não uma lei exterior. 

Uma vez, um dos alunos de Santo Tomás de Aquino perguntou-lhe: "Se o papa me disser para fazer determinada coisa e minha consciência me disser para fazer outra coisa, a quem devo obedecer?"

Santo Tomás de Aquino, doutor da Igreja Romana, responde: "Escuta a voz da consciência e procura esclarecê-la e iluminá-la". Isto pode surpreender, mas são palavras cheias de bom-senso e de psicologia, porque, se ele tivesse dito para ouvir e obedecer ao papa, isso faria com que seu aluno se tornasse um pouco hipócrita ou adoecesse, quem sabe até de esquizofrenia. Ou seja, quando fazemos aquilo que a autoridade nos diz e no nosso interior pensamos outra coisa, cria-se uma divisão dentro de nós que está na origem do mal-estar e da doença. Mas São Tomás de Aquino diz: 
Escuta a voz da tua consciência. Não mintas a ti próprio, mas procura esclarecer-te, e é possível que, ao esclareceres a tua consciência, descubras que aquilo que o papa dizia não era completamente idiota. Mas isso virá de ti mesmo.
Isto é interessante para o nosso discernimento, pois no lugar do papa poderíamos ter qualquer outra autoridade, a quem atribuíssemos a sabedoria ou a verdade. Poderia ser um livro, os nossos pais ou alguém que conhecemos. Mas, em um determinado momento, deixamos de estar de acordo e, nessa ocasião, é importante escutar a voz da consciência. 

Podemos sempre nos enganar, mas em algum momento nas nossas vidas já não podemos mentir a nós mesmos. É nessa ocasião que desperta em nós o mestre interior. Posso me enganar e até cometer erros até o fim da minha vida, mas não posso mais mentir a mim mesmo, isso faria com que eu adoecesse. Esse é o sinal que estamos, de fato, conectados com o nosso mestre interior. 

Quem é o meu mestre interior, quem tem autoridade sobre mim? 

É importante sabermos que não devemos dar a nossa liberdade a qualquer pessoa, devemos dá-la apenas a quem nos torne mais livres, mais verdadeiros. 

Por isso algumas tradições nos dizem: "Melhor é seguir a sua própria lei, mesmo que imperfeitamente, do que a lei de um outro, mesmo que executada de modo perfeito" — essas são palavras do Bhagavad Gita

Diz-se também que um caminho espiritual não deve servir senão uma vez e para uma só alma — ninguém passará por ali mais uma vez, nas mesmas condições. 

Não se trata de uma religião individual, mas de maneiras individuais de chegar ao Absoluto. 

Um verdadeiro mestre espiritual nunca impõe a ninguém o seu modo de estabelecer uma relação com o Absoluto. Ele ajuda-nos a descobrir a nossa própria maneira de entrarmos em relação com o Absoluto. 

[...]Na tradição tibetana, mas também em outras tradições, o mestre pode ser, numa primeira fase, um professor... É uma relação de um aluno para com um professor, de alguém que aprende com alguém que sabe mais do que ele e que lhe transmite os seus conhecimentos. É um primeiro nível de relação. 

No segundo nível de relação, o mestre não é apenas um professor, mas um amigo. Aquele a quem se chama o amigo espiritual, que nos acompanha no caminho e que não nos transmite apenas conhecimentos, mas nos transmite também o seu coração, a sua afetividade. 

O meu mestre não é apenas um sábio, ele é alguém com quem tenho uma relação de intimidade, que me conhece e que vai adaptar o seu ensinamento à situação a que me encontro. 

E posso ter a certeza de que aquilo que ele procura não é apenas agradar-me, mas o meu despertar, a minha libertação. 

É por isso que esta amizade pode, por vezes, ser muito exigente. O amor não é complacência. Aquilo que queremos transmitir não é uma felicidade ou um prazer qualquer, mas a libertação interior, é participar na bem-aventurança. 

O terceiro nível de relação é aquele em que o mestre é considerado não apenas com um professor, ou como um amigo que nos acompanha no caminho, mas como alguém que nos transmite uma iniciação. Ele é um elo de uma linhagem iniciática que faz com que entremos numa cadeia. Em todas as grandes tradições espirituais, o mestre é aquele que transmite uma iniciação, que nos inscreve numa linhagem. Isso faz com que a minha prática não seja apenas a "minha" prática, mas a prática de todos aqueles que me precederam, a energia e a bênção de todos que me precederam e praticaram esse caminho estão presentes. Nessas circunstâncias poderíamos dizer que o mestre não transmite ensinamentos pessoais, mas é a tradição que é transmitida por seu intermédio, para além da sua individualidade. A sua pessoa apaga-se diante da sua função. [...]

Jean-Yves Leloup — O Anjo Como Mestre Interior

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

O amigo espiritual

Ao chegarmos ao estudo da espiritualidade nos deparamos com o problema do relacionamento com um mestre, lama, guru, ou como quer que nós chamamos a pessoa que, supomos, nos dará compreensão espiritual. Essas palavras, sobretudo o termo "guru", adquiriram no Ocidente significados e associações enganosos e que, geralmente, aumentam a confusão em torno da questão de saber o que significa estudar com um mestre espiritual. Isso não quer dizer que as pessoas no Oriente saibam como devem relacionar-se com guru, enquanto os ocidentais não o saibam; o problema é universal. As pessoas chegam sempre ao estudo da espiritualidade com algumas ideias já fixas a respeito do que vão conseguir e como lidar com a pessoa da qual presumem que vão conseguir. Até a noção de conseguir alguma coisa de um guru  — felicidade, paz de espírito, sabedoria, seja o que for que procuremos — é um dos preceitos mais difíceis de todos. Desse modo, penso que seria proveitoso examinar o modo com que alguns discípulos famosos lidaram com os problemas de como relacionar-se com a espiritualidade e com um mestre espiritual. É bem possível que esses exemplos tenham alguma relevância para a nossa própria busca.

(...) O processo de receber ensino depende do aluno dar alguma coisa em troca; é necessário uma espécie de entrega psicológica, algum presente dessa natureza. Por isso precisamos distinguir a entrega, a abertura, a renúncia das expectativas, antes de podermos falar sobre o relacionamento mestre e aluno. É fundamental que você se entregue, que se abra, que se apresente tal como é ao guru, em vez de tentar apresentar-se como um aluno meritório. Pouco importa o quanto esteja disposto a pagar, o decoro do seu comportamento, a inteligência que demonstra ao dizer a coisa certa ao seu mestre. Não é como realizar uma entrevista para conseguir emprego nem como comprar um carro novo. A questão de obter ou não o emprego depende de suas credenciais, do bom aspecto do seu traje, do bonito lustro que deu aos sapatos, do seu modo correto de falar, das suas boas maneiras. Se você estiver comprando um carro, tudo dependerá da quantia de dinheiro que tenha e do seu crédito na praça.

Em se tratando, porém, de espiritualidade, requer-se algo mais. Já não é uma questão de solicitar um emprego, de vestir-se bem a fim de impressionar o possível empregador. Esse tipo de engano não se aplica a uma entrevista com um guru, que enxerga as nossas imperfeições. Ele achará engraçado que você se vista especialmente para falar com ele. Não se fazem gestos cativantes nessa situação; na verdade, isso é fútil. Precisamos assumir um compromisso verdadeiro de abrir-nos perante o mestre; precisamos estar dispostos a desistir de todas as nossas ideias preconcebidas.

(...) Receio que a palavra "guru" seja usada em demasia no Ocidente. Teria sido melhor se falássemos em "amigo espiritual", uma vez que os ensinamentos enfatizam um encontro recíproco entre duas mentes. É mais uma questão de comunicação mútua do que uma relação de amo e criado entre um ser altamente desenvolvido e um ser miserável e confuso. No relacionamento de amor e criado, o ser altamente desenvolvido pode dar a impressão de não estar sequer sentado na sua poltrona, mas parecerá flutuar, levitar, olhando de cima para todos nós. Sua voz, penetrante, difunde-se pelo espaço. Cada palavra, cada tosse, cada movimento que faz é um gesto de sabedoria. Mas isto é um sonho. O guru há de ser um amigo que nos comunica e oferece suas qualidades.

(...) Tampouco vale a pena escolher alguém como guru simplesmente por ser famoso, ser renomado por ter publicado montes de livros e convertido milhares ou milhões de pessoas. O critério, nesse caso, seria se você pode, de fato, comunicar-se com a pessoa, direta e completamente. Até que ponto você se ilude a si mesmo? Se você abrir-se realmente com o seu AMIGO ESPIRITUAL, vocês com certeza trabalharão JUNTOS. Você é capaz de falar com ele plena e devidamente? Ele sabe alguma coisa a seu respeito? E, a propósito, ele sabe alguma coisa a respeito de si próprio? O guru é, de fato, capaz de enxergar através das suas máscaras, de comunicar-se com você adequada e diretamente? Na procura do mestre, estas parecem ser as indicações, muito mais do que a fama e a sabedoria.

(...) Se você for fazer amizade com um mestre espiritual, terá de agir com simplicidade, abertamente, de modo que a comunicação se estabeleça entre iguais, em lugar de tentar conquistar-lhe a simpatia.

Para poder ser aceito pelo guru como amigo, você terá de abrir-se completamente com ele. E para poder abrir-se, terá provavelmente de sujeitar-se a provas que lhe serão dadas pelo seu amigo espiritual e pelas situações da vida em geral, e todas elas assumirão a forma de desapontamento. Em alguma fase do processo você DUVIDARÁ de que o amigo espiritual tenha qualquer sentimento, qualquer emoção em relação a você. Isso é lidar com a própria hipocrisia. A hipocrisia, o fingimento e a deformação básica do ego é extremamente dura; tem uma pele muito grossa. Tendemos a usar armaduras, uma em cima da outra. Essa hipocrisia é tão densa e multinivelada que, assim que retiramos uma camada da armadura, encontramos outra debaixo dela. Esperamos que não sejamos obrigados a despir-nos completamente. Esperamos que o simples despojar de algumas camadas nos faça apresentáveis. Em seguida, aparecemos envergando a nova couraça com um rosto insinuante, mas o nosso amigo espiritual não usa nenhum tipo de armadura; é uma pessoa nua. Em comparação com a sua nudez, estamos vestidos de cimento. A nossa armadura é tão grossa que o nosso amigo NÃO CONSEGUE SENTIR A TEXTURA DE NOSSA PELE, DE NOSSOS CORPOS. Não pode sequer ver direito o nosso rosto.

(...) Já houve quem dissesse que a primeira fase do encontro com um AMIGO ESPIRITUAL é como a ida a um supermercado. Você está emocionado e sonha com todas as coisas diferentes que irá comprar: a riqueza do amigo espiritual e as coloridas qualidades da sua personalidade. A segunda fase do relacionamento é como o comparecimento a um tribunal, como se você fosse um criminoso. Incapaz de satisfazer às exigências do seu amigo, você começa a sentir-se constrangido, porque não ignora que ele sabe tanto quanto você a respeito de você mesmo, o que é sumamente embaraçoso. A terceira faze, quando você vai ver o amigo espiritual, é como estar vendo uma vaca que pasta feliz, num campo. Você apenas lhe admira o sossego e a paisagem, e continua andando. Finalmente, a quarta fase é como passar por uma pedra na estrada. Você nem sequer percebe, passa por ela e segue em frente.

No princípio, ocorre uma espécie de namoro com o guru, um caso de amor. Até que ponto você é capaz de obter as boas graças dessa pessoa? Há uma tendência para querer estar mais perto do AMIGO ESPIRITUAL, porque deseja REALMENTE aprender. Sente grande admiração por ele. Ao mesmo tempo, porém, ELE O ASSUSTA, o perturba. Ou a situação não corresponde às suas expectativas, ou há um sentimento embaraçoso que o leva a pensar: "Talvez eu não seja capaz de abrir-me total e completamente". Surge, então, um relacionamento de amor e ódio, como um processo de entrega e fuga. Em outras palavras, começamos a jogar um jogo: o jogo de queremos nos abrir, de queremos nos envolver num caso de amor com o guru e, logo fugir. Se chegarmos demasiado peto do amigo espiritual, começaremos a nos sentir subjugados por ele. Como diz o provérbio tibetano: "O guru é como o fogo. Se você se aproximar demais, se queimará; mas, se permanecer demasiado longe, não receberá calor suficiente." Esse gênero de namoro acontece da parte do aluno, que tende a chegar perto demais do mestre, mas, ao fazê-lo, queima-se. Então deseja fugir de uma vez por todas.

Por fim, o relacionamento começa a tornar-se muito efetivo e sólido. Você começa a compreender que o desejo de estar perto e o desejo de estar longe do guru é simplesmente um jogo seu. Não relação alguma com a situação real, pois é apenas uma alucinação sua. O guru ou amigo espiritual está sempre lá, ardendo, sempre como um fogo de vida. Você pode entreter-se com ele, ou não, como bem entender.

A seguir, o relacionamento com o seu AMIGO ESPIRITUAL começa a ficar muito criativo. Você aceita as situações de ser engolfado ou ser excluído por ele. Se ele decidir representar o pale da água gelada, você o aceita. Se ele decidir representar o papel do fogo, você o aceita. Nada o consegue abalar e você se reconcilia com ele.

A fase seguinte é aquela em que, tendo aceito tudo o que o amigo espiritual pode fazer, você começa a perder a própria inspiração porque se entregou completamente, desistiu completamente. Sente-se reduzido a um grãozinho de pó. É insignificante. Começa a achar que o único mundo que existe é o do seu amigo espiritual, o guru. Como se estivesse assistindo um filme fascinante, tão emocionante que você passa a fazer parte dele. Já não há você, nem sala de cinema, nem poltronas, nem expectadores, nem amigos sentados ao seu lado. O filme é tudo o que existe. Este é o período chamado "período de lua-de-mel", em que se veem todas as coisas como parte do ser central, o guru. Você não passa de uma pessoa inútil, insignificante, continuamente alimentada pelo grande e fascinante ser central. Toda vez que se sente fraco, cansado ou entendiado, senta-se na sala do cinema e é entretido, enaltecido, rejuvenescido. Nesse ponto, destaca-se o fenômeno do culto a personalidade. O guru é a única pessoa do mundo que existe, viva e vibrante. O próprio significado da sua vida depende dele. Se você morrer,morrerá por ele. Se viver, sobreviverá por ele e é insignificante.

Esse caso de amor com o amigo espiritual, todavia, não dura para sempre. Mais cedo ou mais tarde diminuirá a intensidade e você terá de enfrentar sua própria situação de vida e sua própria psicologia. É como se houvesse casado e se acabasse a lua-de-mel. Você não só toma consciência da pessoa amada como foco central de sua atenção, mas também começa a perceber-lhe o estilo de vida. Começa reparando no que faz dessa pessoa um mestre, para além dos limites da individualidade e da personalidade. Dessa forma, o princípio da "universalidade do guru" entra igualmente em cena. cada problema com que você se depara na vida é parte do seu casamento. Sempre que você vivencia dificuldades, ouve as palavras do guru. Este é o ponto em que começa a conquistar a independência do guru como amante, porque cada situação passa a ser uma expressão dos ensinamentos. primeiro você se entregou ao amigo espiritual. Depois se comunicou e entreteve-se com ele. E agora chegou ao estado de abertura completa, em consequência do qual começa a ver a qualidade de guru em cada situação da vida, e a perceber que todas as situações da vida lhe oferecem a oportunidade de ser tão aberto quando você é com o guru, de modo que todas as coisas podem transformar-se no guru.

(...) O amigo espiritual passa a fazer parte de nós, ao mesmo tempo que continua a ser um indivíduo, uma pessoa externa. Como tal, o guru, tanto interno como externo, desempenha um papel muito importante na penetração e exposição das nossas hipocrisias. O guri pode ser uma pessoa que age como um espelho, refletindo-nos, ou a nossa própria inteligência básica assume a forma do amigo espiritual. Quando o guru interno começa a funcionar, não se pode mais fugir da exigência de abrir-se. A inteligência básica nos segue a toda a parte; não se pode escapar da própria sombra. "O Grande Irmão está nos vigiando". Embora não sejam entidades externas que nos observam e assediam, nós nos assediamos. Nossa própria sombra nos assedia.

Podemos olhar isso de duas maneiras diferentes. Podemos ver o guru como um fantasma, que nos assombra e zomba da nossa hipocrisia. Pode haver uma qualidade demoníaca na compreensão do que somos. De outro lado, há sempre a qualidade criativa do amigo espiritual que também se torna parte de nós. A inteligência básica, continuamente presente nas situações da vida, é tão aguda e penetrante que, em determinada fase, não conseguimos livrar-nos dela, ainda que o desejemos. às vezes, ela assume uma expressão severa, outros um sorriso inspirador. Segundo a tradição tântrica, não vemos o rosto do guru, apenas a sua expressão durante o tempo todo, sorrindo, sardônico, ou fechando a cara, colérico. Sua expressão faz parte de cada situação de vida. A inteligência básica, natureza de Buda, está sempre presente em toda experiência que a vida nos traz. Não há como escapar-lhe. Diz-se também nos ensinamentos: "è melhor não começar. Mas se você começar, é melhor terminar." Por isso é melhor que você só ponha os pés no caminho espiritual, se precisar fazê-lo. Mas, depois que tiver posto os pés no caminho, depois que o tiver realmente feito. não pode voltar atrás. Não há jeito de escapar.

Chögyam Trungpa - Além do materialismo espiritual

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Só a verdade liberta, e não pagas promessas de liberdade

Ela era uma escritora e seus livros tinham uma circulação bem ampla. Contou que só conseguira vir à Índia depois de muitos anos. Quando começou, não tinha a ideia de onde iria parar; mas agora, depois desse tempo todo, seu destino tornara-se claro. O marido e a família toda estavam interessados em assuntos religiosos, não de forma superficial, mas muito seriamente; entretanto, ela tomara a decisão de deixar a todos e viera na esperança de encontrar alguma paz de espírito. Ela não conhecia ninguém neste país quando chegou, e foi muito difícil no primeiro ano. Ela veio, primeiro, para determinado ashram, ou retiro, sobre o qual havia lido. O guru de lá era um velho tranquilo que tivera certas experiências religiosas das quais ele agora vivia, e que constantemente repetia algum ditado sânscrito que seus discípulos entendiam. Ela foi bem recebida nesse retiro e achou fácil ajustar-se às regras. Ficou lá por vários meses, mas não encontrou a paz, então, um dia, anunciou sua partida. Os discípulos ficaram horrorizados que ela pudesse sequer pensar em deixar tal mestre de sabedoria; mas ela foi embora. Então, foi para um ashram no meio das montanhas e ficou lá por algum tempo, feliz no início, pois era lindo, com árvores, riachos e vida selvagem. A disciplina era bastante rigorosa, o que não a incomodava; mas novamente os vivos eram os mortos. Os discípulos estavam venerando conhecimento morto, tradição morta, um mestre morto. Quando ela foi embora, eles também ficaram chocados, e a ameaçaram com trevas espirituais. Ela, então, foi para um retiro bem conhecido, onde se repetia várias afirmações religiosas e se praticava meditações com regularidade, mas gradualmente descobriu que estava entrando numa armadilha e sendo destruída. Nem o mestre nem os discípulos queriam liberdade, embora falassem sobre ela. Estavam todos preocupados em manter o centro, em manter os discípulos em nome do guru. De novo ela fugiu, e foi para outro lugar, sempre a mesma história, com um padrão religioso diferente.

“Eu lhe garanto, estive na maioria dos ashram sérios, e eles todos querem controlar as pessoas, enfraquece-las para se encaixarem no padrão do pensamento que eles denominam a verdade. Por que todos eles querem que as pessoas se conformem a uma disciplina específica, ao modo de vida estabelecido pelo mestre? Por que eles apenas prometem liberdade mas nunca a oferecem?”

A conformidade é gratificante; ela garante a segurança do discípulo, e dá poder tanto ao discípulo quanto ao mestre. Pela conformidade, há o fortalecimento da autoridade, secular ou religiosa;  e a conformidade gera entorpecimento, que eles chamam de paz. Se alguém deseja evitar o sofrimento através de alguma forma de resistência, por que não buscar esse caminho, embora ele envolva uma determinada quantidade de dor? A conformidade anestesia a mente para o conflito. Queremos que nos deixem entorpecidos, insensíveis; tentamos barrar o feio e, desse modo, também nos tornamos entorpecidos ao bonito. A conformidade à autoridade dos mortos ou dos vivos dá uma profunda satisfação. O mestre sabe e você não sabe. Seria tolo você tentar descobrir qualquer coisa por si mesmo quando seu mestre confortador já sabe; então você se torna escravo dele, e escravidão é melhor que confusão. O mestre e o discípulo ganham força na exploração mútua. Você realmente não vai para um ashram por liberdade, não é? Você vai para ser confortada, para ter uma vida de disciplina e crenças fechadas, para venerar e, por sua vez, ser venerada — tudo isso é chamado de busca da verdade. Eles não podem lhe oferecer liberdade, pois isso seria a própria destruição. A liberdade não pode ser encontrada em qualquer retiro, em qualquer sistema ou crença, nem pela conformidade nem pelo medo denominados disciplina. As disciplinas não podem oferecer liberdade; elas podem prometer, mas esperança não é liberdade. A imitação como meio para a liberdade é a própria negação da liberdade, pois o meio é o fim; a cópia gera mais cópias, não liberdade. Mas gostamos de nos enganar, e é por isso que a compulsão ou a promessa de recompensa existem em formas sutis e diferentes. A esperança é a negação da vida.

“Agora estou evitando todos os ashram, como a peste. Fui até eles por paz e recebi compulsões, doutrinas autoritárias e promessas vãs. Com que ansiedade aceitamos a promessa do guru! Como somos cegos! Finalmente, depois desses anos todos, estou totalmente desprovida de qualquer desejo de buscar suas recompensas prometidas. Fisicamente, estou exausta, como você pode ver; pois, muito insensatamente, eu de fato provei suas formulas. Em um desses lugares, onde o mestre está em ascensão e é muito popular, quando disse a eles que estava vindo vê-lo, eles aceitaram a derrota, e alguns tinham lágrimas nos olhos. Essa foi a gota d’água! Eu vim aqui por que quero falar sobre algo que está apertando meu coração. Indiquei isso a um dos meus mestres e sua resposta foi que eu precisava controlar meu pensamento. É isso. A dor da solidão é mais do que posso suportar; não a solidão física, que é benvinda, mas a profunda dor interior de estar sozinha. O que posso fazer a respeito? Como devo considerar esse vazio?”

Quando você pergunta o caminho, torna-se um seguidor. Como há essa dor da solidão, você quer ajuda, e a própria solicitação por orientação abre a porta para a compulsão, a imitação e o medo. O “como” não é absolutamente importante, então vamos entender a natureza dessa dor, em vez de tentar superá-la, evita-la ou ir para longe dela. Até que haja total entendimento dessa dor da solidão, não haverá paz, nem quietude, mas somente luta incessante; e, quer estejamos conscientes disso ou não, a maioria de nós está tentando fugir desse medo, seja de forma violenta ou sutil. Essa dor só existe em relação ao passado, e não em relação ao que é. O que é tem de ser descoberto, não verbal ou teoricamente, mas diretamente experienciado. Como pode haver descoberta do que realmente é se você abordar isso com um sentido de dor ou de medo? Para entender isso você não precisa abordá-lo livremente, despojada de conhecimento passado em relação a isso? Você não precisa chegar a uma mente nova, limpa de lembranças, das respostas habituais? Não pergunte como a mente pode libertar-se para ver o novo, mas ouça a verdade disso. Só a verdade liberta, e não seu desejo de ser livre . O próprio desejo e esforço de ser livre é um estorvo para a libertação.

Para entender o novo, a mente não precisa, com todas as suas conclusões e garantias, cessar suas atividades? Ela não precisa estar silenciosa, sem buscar um modo de fugir dessa solidão, um remédio para isso? A dor da solidão não precisa ser observada, com seu movimento de desespero e esperança? Não é esse mesmo movimento que produz a solidão e seu medo? Não é a própria atividade da mente um processo de isolamento, de resistência? Não é toda a forma de relacionamento da mente um modo de separação, de recolhimento? Não é a própria experiência um processo de autoisolamento? Então o problema não é a dor da solidão, mas a mente que projeta o problema. O entendimento da mente é o início da liberdade. A liberdade não é algo no futuro, é o próprio primeiro passo. A atividade da mente só pode ser entendida no processo de resposta de cada tipo de estímulo. Estímulo e resposta formam um relacionamento em todos os níveis. O acúmulo em qualquer forma, como conhecimento, experiência ou crença, impede a liberdade; e é somente quando há liberdade que a verdade pode existir.

“Mas o esforço não é necessário, o esforço para entender?”

Nós entendemos alguma coisa por meio da luta, por meio do conflito? O entendimento não vem quando a mente está totalmente silenciosa, quando a ação do esforço cessou? A mente que é silenciada não é uma mente tranquila; ela é uma mente morta, insensível. Quando o desejo existe, a beleza do silêncio não existe. 

Krishnamurti

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Você tem que ser o seu próprio mestre

O orador não é de todo importante; o que é importante é que você descubra essas coisas por você mesmo, para que seja um ser humano livre e não de segunda-mão. Você tem que olhar para descobrir, descobrir se é ou não é possível para a mente ficar completa e totalmente livre dessa violência, orgulho e arrogância, e assim se deparar com um estado completamente diferente. E para descobrir, você tem que olhar muito intimamente e descobrir por si mesmo; então isso é seu, não de outra pessoa, não algo que lhe disseram, pois não há nenhum mestre e nenhum seguidor. Infelizmente a palavra “guru” tem sido recentemente difundida neste país; a palavra em sânscrito significa “aquele que aponta”, como uma placa na beira da estrada. No entanto, você não adora essa placa, não pendura guirlandas em torno dela, nem a segue e realiza todas as misteriosas ordens que um guru supostamente dá; ele é somente uma placa de sinalização na beira da estrada, você a lê e passa por ela.

Portanto você tem que ser o seu próprio mestre e seu próprio discípulo, e lá fora não existe nenhum instrutor, nenhum salvador, nenhum mestre; você mesmo tem que mudar, e por isso tem que aprender a observar para se conhecer. Este aprendizado sobre si mesmo é um assunto fascinante e alegre.…

Krishnamurti. Talks with American Students, p 98

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Você tem que ser o seu próprio mestre

O orador não é de todo importante; o que é importante é que você descubra essas coisas por você mesmo, para que seja um ser humano livre e não de segunda-mão. Você tem que olhar para descobrir, descobrir se é ou não é possível para a mente ficar completa e totalmente livre dessa violência, orgulho e arrogância, e assim se deparar com um estado completamente diferente. E para descobrir, você tem que olhar muito intimamente e descobrir por si mesmo; então isso é seu, não de outra pessoa, não algo que lhe disseram, pois não há nenhum mestre e nenhum seguidor. Infelizmente a palavra “guru” tem sido recentemente difundida neste país; a palavra em sânscrito significa “aquele que aponta”, como uma placa na beira da estrada. No entanto, você não adora essa placa, não pendura guirlandas em torno dela, nem a segue e realiza todas as misteriosas ordens que um guru supostamente dá; ele é somente uma placa de sinalização na beira da estrada, você a lê e passa por ela.

Portanto você tem que ser o seu próprio mestre e seu próprio discípulo, e lá fora não existe nenhum instrutor, nenhum salvador, nenhum mestre; você mesmo tem que mudar, e por isso tem que aprender a observar para se conhecer. Este aprendizado sobre si mesmo é um assunto fascinante e alegre.…

Krishnamurti. Talks with American Students, p 98

domingo, 25 de novembro de 2012

Não vá a nenhum mestre, vá a si mesmo!

A iluminação é sempre repentina. Não existe nenhum processo gradual que possa alcançá-la, porque todas as graduações pertencem à mente, e a iluminação não é mental. Todos os degraus pertencem à mente; e a iluminação está além da mente. Assim é impossível crescer em direção à iluminação; pode-se apenas saltar para dentro dela. É impossível mover-se passo a passo; não existe nenhum passo. A iluminação é como um abismo: ou você salta ou não salta.

É impossível iluminar-se aos poucos, parcialmente. A iluminação é uma totalidade — ou você está ou não está. Não acontece em progressões graduais. Lembre-se disto como algo básico: acontece sem fragmentos, completa, total. E justamente por ser um todo é que a mente não pode compreendê-la. A mente só entende o que pode ser dividido, o que pode ser alcançado por etapas porque é analítica, divisória, fragmentária. A mente pode entender as partes, mas o todo sempre a ilude. Por isso, se ouvir a mente, você nunca chegará à iluminação.

(…) O que é iluminar-se? É tornar-se consciente de si mesmo. Não é nada que diga respeito ao mundo exterior. Não é nada que se possa fazer com o que os outros dizem. O que os outros dizem é irrelevante. Você está aqui! Para que ir consultar a Bíblia, o Alcorão, o Gita? Feche seus olhos — e eis você em sua infinita glória. Feche seus olhos e as portas se abrem. Você está aqui, não precisa ir perguntar a ninguém. Se perguntar, não compreenderá. O próprio perguntar demonstra que você pensa que está em algum outro lugar. O próprio perguntar demonstra que você está pedindo por um mapa. Para o mundo interior não existe nenhum mapa; não há necessidade, porque você não está caminhando para um destino desconhecido.

Na realidade, você não está caminhando.

Você está aqui. Você é a meta. Não é o caminhante, é o iluminado. O que é estar iluminado? Um estado: quando você procura no exterior, não está iluminado; quando procura no interior, está. A única diferença está no enfoque. Ao enfocar fora, não está iluminado; ao enfocar dentro, está. Assim, tudo depende de uma mudança de direção.

A palavra cristã “conversão” é bela. Mas os cristãos a têm usado de um modo horrível. Conversão não significa fazer de um hindu um cristão ou tornar um cristão hindu. Conversão significa retorno. Conversão significa retornar à fonte, voltar para o interior. Só quando isto acontece, você está convertido. Sua consciência pode fluir em duas direções: para fora ou para dentro. Estes são os dois leitos pelos quais a torrente da sua consciência pode fluir. Para fora, pode fluir por muitas e muitas vidas, sem nunca encontrar a meta, pois a meta está na fonte. O objetivo não está na frente, está atrás. O objetivo não está em algum lugar ao qual você possa chegar. Está em algum ponto que você já deixou. A meta é a fonte. Isto tem de ser compreendido profundamente. Se você puder retornar ao primeiro ponto do seu ser, terá encontrado o alvo.

Iluminar-se significa retornar á fonte e a fonte está em seu interior: a vida está fluindo aí, fluindo, palpitando, continuamente batendo. Por que perguntar aos outros? Estudar significa perguntar aos outros. Perguntar sobre si mesmo aos outros?

isto é uma tolice por excelência. Isto é um absurdo total — perguntar sobre si mesmo aos outros. O significado do estudo é este: procurar pela resposta. Mas você é a resposta!

(…) Outro ponto a ser lembrado: seu ser é vida e nenhuma escritura pode estar viva. As escrituras estão fadadas a morrer. As escrituras são cadáveres. E você pergunta à morte sobre a vida. Não é possível! Krishna não será de muita ajuda, nem Jesus — a menos que você se torne Krishna ou Jesus. A vida não pode ser respondida pela morte. E se você pensar que encontrará a resposta, ficará cada vez mais limitado pelas respostas, e a resposta permanecerá desconhecida. Isso é o que acontece a um homem que estuda, que pensa, que filosofa. Fica cada vez mais limitado pelos seus próprios esforços — palavras, palavras, palavras — e se perde. Mas a resposta sempre esteve nele. Apenas um retorno é necessário.

Não, ninguém pode responder. Não vá a nenhuma pessoa, vá a si mesmo! Quando você encontra um Mestre, tudo o que ele pode fazer é auxiliá-lo a encontrar a si mesmo; só isso. Nenhum mestre pode lhe dar a resposta. Nenhum mestre pode lhe dar a chave. O mestre só pode auxiliá-lo a olhar para o seu interior. Apenas isto. A chave está aí, o tesouro está ai, tudo está aí.

OSHO        

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill