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sexta-feira, 29 de maio de 2015

Um Buda sempre será incompreendido?

É absolutamente inevitável que um Buda seja sempre um incompreendido?

Prem Madira: Sim. É absolutamente inevitável. Não pode ser de outra maneira. Um Buda está destinado a ser incompreendido. Se um Buda não é incompreendido então ele não é um Buda de verdade.

Por que é assim? Porque o Buda vive em um estado além da mente, e nós vivemos na mente. Traduzir algo do além para a mente é a coisa mais impossível do mundo. Não pode ser feito, embora todo Buda tenha tentado fazê-lo. Isto também é inevitável. nenhum Buda pode evitá-lo. O Buda tem que dizer o que não se diz, ele tem que expressar o inexprimível, ele tem que definir o indefinível. Ele tem que fazer este ato absurdo, porque no momento que ele alcança o além da mente nasce uma grande compaixão. Ele pode ver pessoas tropeçando na escuridão, ele pode ver pessoas sofrendo sem necessidade - criando seus próprios pesadelos, criando seus próprios infernos e afundando-se em seus próprios infernos criados.

Como ele pode evitar não sentir compaixão? E no momento que nasce a compaixão ele quer comunicar-lhes que, "Isso é o seu próprio fazer." Que, "Você pode sair disso, há uma maneira fora disso, há um estado mais além disso; a vida não é o que você pensa que é." Seu pensamento sobre a vida é apenas o pensamento de um cego sobre a luz. O homem cego pode seguir pensando sobre a luz, mas ele nunca será capaz de chegar a uma conclusão verdadeira. Suas conclusões podem ser muito lógicas, mas ainda assim, elas perderão a experiência. A luz é uma experiência. Você não necessita lógica para isso, o que você necessita são olhos.

Buda tem olhos. E olhos são alcançados apenas quando você tiver ido além da mente, quando você se tornar uma testemunha da mente; quando você chegar a um estado mais além da psicologia: quando você souber que você não é os seus pensamentos, nem o seu corpo; quando souber que você é apenas o conhecer - a energia que reflete, a energia que é capaz de ver - que você é pura visão.

Uma vez Buda foi questionado, "Quem és tu?" Ele era um homem tão lindo e a irmandade de Buda estava reunida tão devotada a ele, que muitas vezes lhe era questionado, "Quem és tu?" Ele parecia um imperador ou um deus que veio dos céus, e ele viveu como um mendigo. Muitas e muitas vezes ele era questionado, "Quem és tu?" E o homem que estava perguntando era um grande erudito. Ele dizia, "És tu do mundo dos deuses? És tu um deus?" Buda disse, "Não." "Então és tu um gandharva?" Gandharvas eram os músicos dos deuses. Buda tinha uma tal música ao seu redor - a música do silêncio, o som do não som, o aplauso com uma só mão - que era natural perguntarem-lhe, "És tu um gandharva, um músico celestial?" Buda disse, "Não." E o homem continuava perguntando.

Há muitas categorias, na mitologia hindu, de deuses para os homens. Então finalmente ele pergunta, "És tu um grande rei, um chakravartin, aquele que comanda todo o mundo?" E Buda disse, "Não." Chateado, o erudito perguntou, "És tu um homem ou nem mesmo isso?" Buda disse: "Não fique chateado, mas o que eu posso fazer? Eu tenho que dizer a verdade tal como ela é. Eu não sou nem mesmo um homem." Agora o erudito está totalmente irado, furioso. Ele diz, "Então és tu um animal? " Buda disse, "Não - nem um animal, nem uma árvore, nem uma pedra." "Então quem és tu?" o homem perguntou. Buda disse, "Eu sou a consciência, apenas a pura consciência, apenas um espelho refletindo tudo aquilo que é."

Quando chega este momento ocorre uma grande compaixão. Buda disse que aqueles que sabem estão destinados a sentir compaixão por aqueles que não sabem. Eles começam tentando ajudar. E a primeira coisa que tem que ser feita é comunicar às pessoas que estão cegas que os olhos são possíveis, que elas não estão totalmente cegas, mas apenas estão mantendo seus olhos fechados. Você pode abrir seus olhos. Você não nasceu cego, apenas lhe foi ensinado a permanecer cego. A sua sociedade lhe ensina a ser cego. Sua sociedade lhe ensina a ser cego porque a sociedade precisa de pessoas cegas. Elas são bons escravos porque elas são sempre dependentes de seus líderes, políticos, pânditas, sacerdotes. Elas são pessoas muito convenientes, elas nunca criam qualquer problema. Elas nunca são rebeldes. Elas são obedientes, sempre prontas a se submeter a qualquer tipo de absurdo a qualquer político estúpido, a qualquer sacerdote estúpido. E, de fato, quem mais deseja ser um político além de pessoas estúpidas, e quem quer se tornar um sacerdote exceto pessoas estúpidas? Estas são as dimensões para o medíocre, para o inferior. Aqueles que estão sofrendo de um complexo de inferioridade, se tornam políticos - apenas para provar que eles não são inferiores, para o mundo e para eles mesmos.

A sociedade, o sistema, quer que você seja cego. Desde o começo ela ensina a cada criança: "Você é cega"; ela condiciona cada criança: "Você é cega." Todo o seu sistema educacional é nada mais do que um conspiração contra cada criança - para mantê-lo cego. Ela não lhe ensina meditação, porque meditação é a arte de abrir seus olhos. Quando alguém chega à consciência, ele naturalmente sente grande compaixão. Por toda volta, ele vê que as pessoas - que têm olhos, que têm capacidades internas de verem a verdade, que são desde o seu nascimento capazes de se tornarem Budas, seres iluminados, acordados - estão sofrendo. E todo o sofrimento é ridículo, não precisa existir. A compaixão acontece e a compaixão começa a se comunicar, mas a comunicação é difícil, impossível. Buda fala do pico e você vive nos vales escuros, aonde a luz nunca chega. Ele fala em palavras de luz; quando elas lhe alcançam seu significado muda. Quando sua mente as agarra ela as colore com sua própria cor. Não é assim apenas se tratando de Budas - mesmo a comunicação ordinária parece ser impossível. O marido não consegue se comunicar com a esposa, os pais não conseguem se comunicar com seus filhos, os professores não conseguem se comunicar com seus alunos. O que dizer a respeito de Budas? Mesmo as pessoas que vivem no mesmo nível não conseguem se comunicar, porque as palavras são coisas enganosas. Você diz uma coisa mas, no momento em que ela chega ao outro, aí está sob o poder dele como interpretá-la.

A rainha estava viajando pelo interior da Inglaterra quando ela viu um homem, sua mulher, e um bando de crianças. Impressionada, a rainha perguntou, "Estas crianças são todas suas? "Sim, vossa alteza, respondeu o homem. “Quantas crianças vocês têm?" perguntou a soberana inglesa. Dezesseis, foi a resposta. "Dezesseis crianças," repetiu Sua Majestade. "Nós deveríamos lhe dar um título de nobreza (de 'caráter')." "Ele tem um," disse a mulher, "mas ele não o usa."

Ou, se você não entendeu, outra história para você: Thor, o Deus germânico do trovão, estava se sentindo inquieto, então ele decidiu tirar uma folga no fim de semana. Levando um punhado de jóias do departamento de pequenas somas de Valhalla, ele desceu para a Terra, comprou um elegante "traje de discoteca" e algumas correntes de ouro e se dirigiu aos bares de dança de sábado a noite. Depois de uma longa noite na cidade ele finalmente levou para casa a mulher mais bonita que ele viu e passou o resto da noite e a manhã satisfazendo sua libido heroica. Quando ele saiu da cama e começou a se vestir ele percebeu que a garota exausta na cama não tinha notado o seu vigor sexual divino. Para explicar, ele inclinou-se na direção dela e sussurrou, "Querida, eu acho que você deveria saber - eu sou Thor." De olhos arregalados, a garota exclamou, "'Dor'? Seu grande filho da puta, eu não consigo nem me levantar!"

A comunicação ordinária, a comunicação essencialmente mundana, mesmo no mercado, é difícil. E um Buda quer lhe comunicar algo que ele encontrou em um estado de não-mente, que ele encontrou quando todos os pensamentos desapareceram, que ele descobriu quando mesmo ele não era mais - quando o ego evaporou, quando existe um profundo silêncio, paz absoluta, e o céu está sem nuvens. Agora, como trazer essa experiência infinita para palavras? Nenhuma palavra é suficientemente adequada - daí a má interpretação.

Sim, Madira, é absolutamente inevitável que um Buda seja sempre mal-interpretado. Apenas aquelas poucas pessoas podem entender um Buda, que são discípulos e devotos. Ser um discípulo significa ser aquele que colocou de lado todos os julgamentos antecipados, que colocou de lado todos os pensamentos, e que está pronto a ouvir - não a sua própria mente e suas interpretações mentais, mas as palavras do Buda; aquele que não está num estado de argumentar com o Buda, que não está interpretando internamente o que o Buda está dizendo que ouve um Buda como você ouve música clássica, que ouve um Buda como você ouve o som da água corrente, que ouve o Buda como você ouve o vento passando pelos pinheiros ou o pássaro chamando à distância. Este é o estado de um discípulo. Ou se você se elevar um pouco mais alto e se tornar um devoto... Um devoto é aquele que não apenas deixou sua mente cair mas que trouxe seu coração à tona, que ouve a partir do coração, não a partir da lógica, mas do amor. O discípulo está a caminho de se tornar um devoto. O discípulo está no início de se tornar um devoto, e o devoto é o preenchimento de ser um discípulo. Apenas essas poucas pessoas entendem um Buda. E ao entender um Buda elas são transformadas, transportadas para um outro mundo - o mundo da liberação, nirvana, luz, amor, benção.

Osho em, Esteja Quieto e Saiba


quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Níveis de transmissão da mensagem

Quanto mais sábio é o homem, mais ele vive em níveis diferentes de sabedoria simultaneamente. Ele tem de viver assim porque precisa falar de acordo com o nível das pessoas que encontra. Caso contrário, nada do que ele disser terá significado. Se Buda falar com você a partir do nível mais elevado dele, será inútil. Você o tomará por louco. Aconteceu muitas vezes de pessoas como ele serem consideradas loucas. A razão disso é que tudo o que diziam parecia ter sido dito por um louco. Portanto, se eles falarem a partir do nível deles, serão tachados de loucos. 

Se tiverem de falar no seu nível, terão de descer. Terão de descer ao nível onde você possa entendê-los. Então não parecerão loucos. Portanto, têm de falar a partir de quantos níveis existirem entre as pessoas que forem ouvi-los. 

(...) É por isso que as afirmações de pessoas como Budas são encontradas em muitos níveis diferentes. Às vezes, uma só afirmação contém muitos níveis. É porque quando alguém como Buda começa a falar, o faz a partir de seu próprio nível, e quando pára de falar, desceu ao nível em que você está. Muitas vezes, numa só frase, há uma longa jornada — porque ele começa a falar a partir do nível em que ele está. Começa com grandes expectativas em relação a você; aos poucos, vai reduzindo suas expectativas e, nas suas últimas afirmações, chega ao nível em que você está. 

O nível dele e o seu representam duas profundas divisões, mas isso não significa que estejam distantes, separados ou diferentes. São como o mar e a onda. Ás vezes o mar pode existir numa onda, mas a onda jamais poderá existir sem o mar. A Não-Forma pode existir sem forma, mas uma forma jamais existirá sem a Não-Forma. 

O S H O 

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Uma luz no buraco negro da euforia dos padrões obsessivos compulsivos

Agregarmo-nos a uma comunidade espiritual ou terapêutica não significa necessariamente que teremos de dedicar nossa vida a isso. Porém, se você encontra um mestre espiritual ou um terapeuta eficiente e descobre que ele está comprometido com determinado grupo, considere a hipótese de passar algum tempo com esse grupo.(...) É essencial que o grupo esteja informado sobre as experiências que você está tendo e que queira apoiá-lo e trabalhar com você, se necessário. Nesse ambiente há, mais provavelmente, aqueles que tiveram as mesmas experiências que você está tendo e podem ajudar a dar-lhe uma orientação. Esses também são lugares para se aprender os meios... que ajudarão a facilitar e a completar suas experiências.

(...) Um grupo de pessoas que passou por emergências espirituais poderia oferecer uma ajuda tremendamente significativa a alguém que estivesse no meio de um período crítico... Esses grupos são formados por pessoas leigas em diferentes fases da jornada interior e que compartilham de experiências e interpretações comuns. Para uma pessoa em crise, esses grupos fazem uma reunião para discutir problemas e sentimentos e promovem a empatia e a compreensão. Também podem ajudar você a desenvolver um senso de como e com quem falar sobre suas experiências. Há uma boa chance de que se sinta imensamente aliviado por estar na companhia de outras pessoas que o entendam a fundo e o ouçam sem censuras. Com elas, você poderá alcançar o sentido de comunidade e perder algumas das sensações de solidão e isolamento que poderiam levá-lo a acreditar que você seria a única pessoa que poderia ter esse tipo de experiências.

(...) Em geral, as pessoas saem da crise de transformação com a sensação de que o próximo passo é ajudar os que podem estar desnorteados, oprimidos, com medo, excitados e confusos, exatamente como eram antes. Se passaram pelos altos e baixos do seu próprio processo de emergência, adquiriram o ÚNICO TREINAMENTO EXPERIENCIAL que pode ser EXTREMAMENTE VÁLIDO na assistência a outra pessoas. Isso não significa expor suas revelações, introspecções ou ideologias de um modo messiânico, mas simplesmente ouvir e falar sobre a sua própria jornada sem exigir que outras pessoas reajam de maneira específica.

Uma experiência anterior também lhes possibilita apoiar facilmente o PROCESSO de uma ou outra pessoa em todo o seu drama e complexidade, já que conhecem esses territórios de " trás pra frente". Por terem estado lá, não fazem julgamentos nem se sentem superiores. Tendo vivenciado sua própria cura, têm confiança no POTENCIAL POSITIVO da situação. Esse conhecimento é muito diferente daquele obtido através das leituras a respeito dessas experiências; trata-se de uma sabedoria adquirida pela vivência. Assim como os viciados em drogas e alcoólatras recuperados que continuam a participar do seu próprio crescimento são alguns dos auxiliares mais eficientes no tratamento de outras pessoas com esses problemas, os que passaram por emergências espirituais e têm se integrado às experiências com sucesso são muito eficientes quando trabalham com os que estão na mesma jornada.

Stanislav Grof em, A tempestuosa busca do ser

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Debater é um ato de violência

Todas as discussões são tolas porque provocam um clima no qual qualquer entendimento entre duas pessoas se torna impossível; no qual qualquer coisa é sempre mal-interpretada.

Debater é um ato de violência. Através dele, a verdade pode ser assassinada, mas não ressuscitada. O debate é sempre violento. Nele, sua própria atitude é violenta.

Na realidade, você não está em busca da verdade, está em busca da vitória. Quando a vitória é a meta, a verdade é sacrificada. Quando a verdade é a meta, você pode sacrificar a vitória.

Apenas a verdade pode ser a meta; a vitória não. Quando a vitória é a meta, você se torna um político, não um homem religioso. Você fica agressivo, fica tentando vencer o outro. A verdade não pode ser uma vitória quando essa vitória significa derrotar alguém. A verdade traz humildade, modéstia. Não é uma "viagem" de ego como são todos os debates. O debate nunca conduz ao real; sempre caminha para o ilusório, para o não-verdadeiro porque a própria sensação de vitória é tão estúpida!

Verdade significa: nem "você" nem "eu". Na discussão, ou você vence ou eu venço; a verdade nunca é a vencedora.

Como você pode entender o outro se está contra ele? O entendimento é impossível. O entendimento necessita de simpatia, de participação. Entender significa ouvir o outro totalmente: apenas desse modo acontece o florescimento. Ao discutir, debater, argumentar, racionalizar, você não ouve o outro. Apenas finge ouvir e, interiormente, fica se preparando. Por dentro, você está sempre se preparando para a tacada seguinte, pronto para rebater quando o outro parar. Você fica se preparando para refutar. Não ouve. fica tramando como irá refutar o outro.

Na discussão, no debate, a verdade não é significativa. Por isso, num debate, a comunicação nunca acontece; é impossível atingir a comunhão. Você pode argumentar e quanto mais argumentar mais se separará do outro. Quanto mais argumentar, maior será a brecha - torna-se um abismo. Nenhum encontro poderá acontecer. É por isso que os filósofos nunca se encontram. O mesmo acontece com os eruditos. Eles são grandes polemistas - o abismo existe. Eles não podem se encontrar. É impossível.

Apenas os amantes se encontram, mas amantes não debatem, comunicam-se. Quando você argumenta a brecha se alarga. Se você estiver argumentando, não poderá haver uma ponte sobre o abismo. Verdade significa não argumentar.

Osho — Nem água, nem Lua

segunda-feira, 14 de abril de 2014

O mestre é necessário?

O que é que as tradições espirituais da humanidade nos dizem a esse respeito? Algumas tradições espirituais da humanidade nos dizem que o mestre é necessário, e outras dizem que não.

Eis algumas citações:
  • Não sigas pelo caminho sozinho, porque poderias perder-te.
  • Não conseguimos nos ver com os nossos próprios olhos. 
  • Tens necessidade de outro para te conheceres a ti próprio. 
  • Se não escolheres um mestre, é Satanás quem o será (Arabi)
Alguns dirão usando outras palavras: o ego será teu mestre. Fiar-se no seu próprio juízo é fiar-se no seu ego. Nesse caso corremos no risco de cair numa auto-ilusão. Podemos, por exemplo, ler os textos sagrados segundo as nossas interpretações. Há, portanto, certas tradições onde se insiste sobre esta necessidade de termos alguém que nos acompanhe no caminho, mas outras dirão que um mestre é necessário. 

O grande místico do islã, Rumi, disse uma vez, referindo-se ao seu mestre: "É ele a verdade, a essência de toda a verdade, é ele o mistério de todas as religiões, a boca de todas as certezas". 

Encontramos algo semelhante na Índia, na devoção prestada ao guru, porque é através dele que a verdade nos é transmitida. 

Todavia, o mesmo Rumi, diz em outra ocasião: "Purifica-te dos atributos do eu, de modo que possas contemplar tua própria essência na sua pureza, e contempla no teu coração todas as ciências dos profetas, sem livros, professores, sem mestre"

O objetivo é despertar em nós a essência da vida. O objetivo do mestre exterior é nos despertar para essa presença.
Na epístola de São João está escrito: "Não precisais mais que vos ensinem, o Espírito Santo é quem vos ensinará todas as coisas"

O mestre está no nosso interior e é a ele que devemos escutar, não uma lei exterior. 

Uma vez, um dos alunos de Santo Tomás de Aquino perguntou-lhe: "Se o papa me disser para fazer determinada coisa e minha consciência me disser para fazer outra coisa, a quem devo obedecer?"

Santo Tomás de Aquino, doutor da Igreja Romana, responde: "Escuta a voz da consciência e procura esclarecê-la e iluminá-la". Isto pode surpreender, mas são palavras cheias de bom-senso e de psicologia, porque, se ele tivesse dito para ouvir e obedecer ao papa, isso faria com que seu aluno se tornasse um pouco hipócrita ou adoecesse, quem sabe até de esquizofrenia. Ou seja, quando fazemos aquilo que a autoridade nos diz e no nosso interior pensamos outra coisa, cria-se uma divisão dentro de nós que está na origem do mal-estar e da doença. Mas São Tomás de Aquino diz: 
Escuta a voz da tua consciência. Não mintas a ti próprio, mas procura esclarecer-te, e é possível que, ao esclareceres a tua consciência, descubras que aquilo que o papa dizia não era completamente idiota. Mas isso virá de ti mesmo.
Isto é interessante para o nosso discernimento, pois no lugar do papa poderíamos ter qualquer outra autoridade, a quem atribuíssemos a sabedoria ou a verdade. Poderia ser um livro, os nossos pais ou alguém que conhecemos. Mas, em um determinado momento, deixamos de estar de acordo e, nessa ocasião, é importante escutar a voz da consciência. 

Podemos sempre nos enganar, mas em algum momento nas nossas vidas já não podemos mentir a nós mesmos. É nessa ocasião que desperta em nós o mestre interior. Posso me enganar e até cometer erros até o fim da minha vida, mas não posso mais mentir a mim mesmo, isso faria com que eu adoecesse. Esse é o sinal que estamos, de fato, conectados com o nosso mestre interior. 

Quem é o meu mestre interior, quem tem autoridade sobre mim? 

É importante sabermos que não devemos dar a nossa liberdade a qualquer pessoa, devemos dá-la apenas a quem nos torne mais livres, mais verdadeiros. 

Por isso algumas tradições nos dizem: "Melhor é seguir a sua própria lei, mesmo que imperfeitamente, do que a lei de um outro, mesmo que executada de modo perfeito" — essas são palavras do Bhagavad Gita

Diz-se também que um caminho espiritual não deve servir senão uma vez e para uma só alma — ninguém passará por ali mais uma vez, nas mesmas condições. 

Não se trata de uma religião individual, mas de maneiras individuais de chegar ao Absoluto. 

Um verdadeiro mestre espiritual nunca impõe a ninguém o seu modo de estabelecer uma relação com o Absoluto. Ele ajuda-nos a descobrir a nossa própria maneira de entrarmos em relação com o Absoluto. 

[...]Na tradição tibetana, mas também em outras tradições, o mestre pode ser, numa primeira fase, um professor... É uma relação de um aluno para com um professor, de alguém que aprende com alguém que sabe mais do que ele e que lhe transmite os seus conhecimentos. É um primeiro nível de relação. 

No segundo nível de relação, o mestre não é apenas um professor, mas um amigo. Aquele a quem se chama o amigo espiritual, que nos acompanha no caminho e que não nos transmite apenas conhecimentos, mas nos transmite também o seu coração, a sua afetividade. 

O meu mestre não é apenas um sábio, ele é alguém com quem tenho uma relação de intimidade, que me conhece e que vai adaptar o seu ensinamento à situação a que me encontro. 

E posso ter a certeza de que aquilo que ele procura não é apenas agradar-me, mas o meu despertar, a minha libertação. 

É por isso que esta amizade pode, por vezes, ser muito exigente. O amor não é complacência. Aquilo que queremos transmitir não é uma felicidade ou um prazer qualquer, mas a libertação interior, é participar na bem-aventurança. 

O terceiro nível de relação é aquele em que o mestre é considerado não apenas com um professor, ou como um amigo que nos acompanha no caminho, mas como alguém que nos transmite uma iniciação. Ele é um elo de uma linhagem iniciática que faz com que entremos numa cadeia. Em todas as grandes tradições espirituais, o mestre é aquele que transmite uma iniciação, que nos inscreve numa linhagem. Isso faz com que a minha prática não seja apenas a "minha" prática, mas a prática de todos aqueles que me precederam, a energia e a bênção de todos que me precederam e praticaram esse caminho estão presentes. Nessas circunstâncias poderíamos dizer que o mestre não transmite ensinamentos pessoais, mas é a tradição que é transmitida por seu intermédio, para além da sua individualidade. A sua pessoa apaga-se diante da sua função. [...]

Jean-Yves Leloup — O Anjo Como Mestre Interior

segunda-feira, 24 de março de 2014

Iniciação não é algo assim tão fácil


O ego está sempre procurando engrandecimento. Esta é a grande barreira. Por causa do ego, seu pote está de cabeça para baixo. A chuva está caindo e você continua vazio.

Iniciação não é algo assim tão fácil. Só se pode ser iniciado por alguém que já tenha atingido ao menos seu primeiro satori, o primeiro SAMADHI.

Existem três satoris. O primeiro significa que você vislumbrou algo distante — avistou os Himalaias ao longe, brilhando ao sol. Este é o primeiro satori. O segundo, é quando você alcança o pico — chegou lá. E o terceiro, é quando você e o pico se tornam um. Este é o último, o supremo, o samadhi.

Aquele que for iniciar você terá que ter atingido ao menos o primeiro, ou a iniciação será um equívoco. Esta é a parte que cabe ao Mestre: já deverá ter atingido ao menos o primeiro satori.

E muito mais é preciso no que diz respeito ao discípulo, porque, a menos que ele esteja pronto, através da meditação e da purificação pela catarse e limpeza profunda, não permitirá que seu pote seja virado para cima — mesmo que o Mestre esteja presente. O discípulo resiste, não se rende, não deixa acontecer. É preciso uma profunda confiança para que o Mestre possa fazer algo essencialmente profundo ao discípulo. É uma grande virada, uma conversão, e muita coisa é necessária no que diz respeito ao discípulo. Só então a iniciação é possível.

[...] O ego está sempre procurando engrandecimento. Esta é a grande barreira. Por causa do ego, seu pote está de cabeça para baixo. A chuva está caindo e você continua vazio.

Da parte do discípulo, a iniciação significa permitir que o Mestre faça O QUE QUISER — incondicionalmente. Da parte do Mestre, a iniciação só acontece quando ele tiver atingido ao menos o primeiro satori. Caso contrário, você poderá ser iniciado por mil mestres e não chegará a nada. Quando estas duas condições existirem, quando os dois requisitos estiverem preenchidos, acontecerá a comunhão entre Mestre e discípulo.

O S H O

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

O propagandista é um mero repetidor e não um arauto da verdade

Ser propagandista é ser mentiroso. (Risos) Não riam, Senhores. Porque propaganda é mera repetição, e a repetição de uma verdade é mentira. Quando repetem o que pensam ser a verdade, isso deixa de ser a verdade. Digamos, por exemplo, que repetem a verdade concernente à relação do homem com a propriedade, verdade que não descobriram por vocês mesmos; que valor ela tem? A repetição nenhum valor tem; ela só embrutece a mente, e só podem repetir uma mentira. Não podem repetir a verdade, porque a verdade não é constante. A verdade é um “estado de experimentar”, e o que se pode repetir é um estado estático; por conseguinte, não é a verdade. Vejam, por favor, a importância que isso tem. Estamos por demais acostumados a ser propagandistas, a ler jornais, a informar outros a respeito de tudo. O propagandista é um mero repetidor e não um arauto da verdade; por essa razão a propaganda causa imenso dano no mundo. O conferencista que sai a fazer propaganda de uma ideia, é em verdade um destruidor do pensamento, porque se limita a repetir a sua própria experiência ou a de outro. A verdade, porém, não pode ser repetida, a verdade tem de ser experimentada de momento a momento por cada um de nós. Agora, com essa compreensão, que podem fazer para auxiliar os meus ensinamentos, para divulgar os meus ensinamentos? O que podem fazer é, unicamente, vive-los; por pouco que compreendam, por mais insignificante que seja a parte que assimilem, vivam-na plenamente — não superficialmente, mas com profundeza, com plenitude, o mais vitalmente, o mais intrinsecamente, o mais entusiasticamente possível. Então, como uma flor num jardim, esse próprio viver espalha o seu perfume. Não precisam fazer propaganda para o jasmim. O jasmim faz a sua própria propaganda: sua beleza, seu perfume, sua delicadeza, dizem tudo. Quando vocês não têm essa delicadeza, essa beleza, então, fazem propaganda. Mas, logo que houverem compreendido um pouco, falaram a respeito dela, a pregarão, a proclamarão; em virtude da própria compreensão de vocês, ajudarão os outros a compreender, e assim a compreensão se propaga mais e mais e ganha terreno cada dia. Positivamente, esta é a única maneira de fazer o que chamam de “propaganda” — que é uma palavra feia. Senhores, como é que se dissemina um pensamento novo, um pensamento vivo, não um pensamento morto? Não é, por certo, por meio de propaganda. Os sistemas se disseminam pela propaganda, mas um pensamento vivo não. Um pensamento vivo é divulgado por um homem vivo, um homem que vive esse pensamento. Sem o viver, ninguém pode divulgar um pensamento vivo; vivam-no, e verão. É como as abelhas que procuram a flor. A flor não precisa fazer propaganda do seu mel. As abelhas a procuram porque sabem que nela há néctar. Fazer propaganda sem possuir esse néctar é enganar os outros, é explorá-los, é dividi-los, é criar inveja e antagonismo. Mas, se há o néctar da compreensão, por pouco que seja, ele se propaga como o fogo. Vocês sabem como se obtém o mel, quantas jornadas uma abelha faz da colmeia para a flor, e o pouquinho de mel que colhe de cada vez. De modo idêntico, se em nossos corações existe néctar, se neles existe beleza, isso, por si mesmo, operará o milagre de revolucionar o mundo pela maneira mais completa. A compreensão é instantânea, ela não virá amanhã, porque nunca há compreensão no amanhã; só existe compreensão hoje, agora. O amor não está no futuro; nunca dizemos “lhe amarei amanhã”. Ou amamos agora, ou nunca.

Jiddu Krishnamurti — Da insatisfação à felicidade    

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Que mensagem levar para aquele que sofre?

É possível a mente ser livre de condicionamentos? Esse estado tem de ser descoberto. Não se pode dizer que é possível ou impossível.(...) Vocês não precisam levar a minha mensagem; o que devem levar é a mensagem de vocês e não a minha.

O problema de vocês é esta existência de sofrimento e confusão. Se o compreenderem, se puderem compreender a experiência de uma mente condicionada, e passar além, serão vocês que ensinarão; não haverá então mestre, e não haverá discípulo. Mas, precisam compreender a si mesmos, e não de aprender a minha técnica ou levar a minha mensagem.(...) a maneira como pensamos é importante; e que o pensamento, que é sempre condicionado, não resolverá o nosso problema. O que resolverá o nosso problema é a compreensão das tendências do nosso pensar. No momento em que compreendermos a maneira como pensamos, dar-se-á uma radical transformação, interiormente; não seremos mais hinduistas, cristão, comunistas, socialistas ou capitalistas; seremos ENTES HUMANOS, entes humanos dotados de sentimentos, de amor, de consideração. Isso não resulta meramente de se aprender uma técnica ou de se levar a mensagem de outro homem.

Não se pode adquirir amor mediante o emprego de uma técnica. Por meio de uma técnica pode-se adquirir sensação; porém, essa coisa não á amor. O amor é algo que não se pode ensinar, que não se pode difundir por meio dos jornais, de técnicas, de propaganda. Ele tem de ser sentido e tem de ser compreendido. Mas se vocês repetem "amor, amor, amor", isso não tem sentido nenhum. Terão conhecimento desse amor, quando for tranquila a mente de vocês, quando estiver livre do seu condicionamento, das suas ansiedades, dos seus temores. E esse amor é que é a verdadeira revolução, a qual alterará todo o processo do nosso ser.

Jiddu Krishnamurti — Autoconhecimento — Base da Sabedoria


terça-feira, 14 de agosto de 2012

Relato de um derrame de lucidez em Krishnamurti

Surgindo por detrás das colinas, a lua rodeada por uma nuvem serpentina transformou-se em uma forma fantástica. Ela projetava uma claridade luminosa sobre as colinas, a terra e as pastagens verdejantes, desaparecendo imediatamente por entre espessas nuvens escuras que anunciavam chuva.
Durante o passeio, a meditação surgia em plena conversação e no meio da beleza noturna. De uma profundidade incrível, ela circulava interior e exteriormente; ela explodia em expansão.
Estávamos conscientes; aquilo chegava; não se pode dizer que estávamos fazendo a experiência, pois toda experiência é limitada; aquilo simplesmente surgia. Não havia nenhuma participação nisso; o pensamento não podia aí tomar parte, pois o pensamento é tão fútil e mecânico que a emoção não podia estar a isso associada; era verdadeiramente muito vivo e ao mesmo tempo perturbador para os dois. Aquilo surgiu de uma profundidade de tal modo desconhecida que não havia nenhum meio de medi-la. Mas havia um grande silêncio. Era absolutamente surpreendente e completamente incomum.
As folhas brilhavam intensamente sob a ação da lua que, em seu movimento em direção do oeste, inundava de luz o quarto. Até mesmo os latidos altos dos cães não perturbavam o silêncio absoluto da noite. Ao acordar, aquilo se encontrava lá, de uma maneira clara e precisa, e era o despertar que se revelava necessário e não o sono; estava bem decidido que era preciso estar consciente do que se passava, atento com plena consciência de todos os acontecimentos. Adormecido, poder-se-ia confundir tudo aquilo com um sonho, uma ilusão do inconsciente, um ardil do cérebro; mas completamente desperto, essa alteração estranha e desconhecida era uma realidade palpável, um fato e não uma ilusão ou um sonho. Aquilo tinha a qualidade, se é que podemos nos exprimir assim, de imponderabilidade e de força impenetrável.
E no repentino despertar, aquilo lá estava. E juntamente com aquilo surgiu um êxtase inesperado, uma alegria irracional; não havia nenhuma causa para isso, pois isso jamais fora objeto de uma pesquisa ou de uma busca. Aquele êxtase estava presente no novo despertar à hora habitual; ele estava lá e continuou durante um tempo bastante longo.

Krishnamurti’s Notebook, Victor Gollanez, Londres, 1976

(Embora seja originário da Índia, o caráter universal de seu ensinamento não permite classificá-lo em nenhuma das tradições espirituais, o que explica o porquê de o situarmos entre os ocidentais contemporâneos.)

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Relato de uma experiência culminante


Em algum lugar do passado...

A depressão iniciática havia atingido seu ponto culminante, fazendo com que a mente entrasse em total colapso. Não mais dispunha ela da energia pendular necessária para dar continuidade a sua tentativa de solucionar o conflito — por ela mesmo criado — de forma totalmente dual (faço, não faço... largo, não largo...). Já não havia mais energia para sustentar a resistência diante do forte impulso criado pela mente para a concretização da ideia de cometer suicídio. De repente, deu-se a instalação de um estado de total rendição, de total prostração e impotência diante do poderoso fluxo de conflituosos pensamentos. O corpo se encontrava curvado, quase que em posição fetal. Com o sentimento resultante da rendição, deu-se a constatação dos nervos do corpo se soltando, liberando assim, toda a tensão que causava a dispersão de energia vital. Deu-se a percepção de todo fluxo de energia, antes preso no processo de tensão, sendo direcionado de forma abrupta em direção ao centro da mente, ocasionando algo semelhante a uma explosão silenciosa, seguida de de uma impactante fala, surgida na parte posterior da caixa craniana, bem próximo das primeiras vértebras do pescoço. A impactante fala limitou-se à expressão: "Eu Sou O Que Sou". Instantaneamente, todo conflito, toda confusão, toda tensão, todo labirinto de questionamento, dissolveu-se de tal maneira, que só pode ser simbolizada com a palavra "milagrosa". Uma possante carga de energia apoderou-se do corpo, mente e coração, energia essa que tinha seu centro de origem na região superior do cérebro, dando a impressão de que a mesma partia de um local externo do corpo, algo como um palmo acima da cabeça. Essa energia era profundamente calorosa e o corpo parecia envolto por uma brisa benfazeja, algo como uma Presença Invisível, amorosamente acolhedora. Havia o sentimento de estar seguro sobre a ação dessa Presença. Não existia o sentido de tempo e espaço, observador e coisa observada; tudo parecia ser parte de "Algo" único, dotado de cores e formas, cuja intensidade, torna-se impossível a descrição. Era possível a percepção da energia, dos pensamentos e sentimentos que moviam os seres, bem como os ambientes. Uma capacidade de leitura vibratória, instalou-se juntamente com a potencialização da sensibilidade. Uma Realidade nunca antes imaginada tomou conta de todo o ser, na verdade, não havia separação entre o ser e a Realidade. Essa Realidade se expressa num ritmo próprio, dotado de profunda calma e compaixão. Aliás, o próprio ritmo da respiração podia ser sentido como a Pura Compaixão. Não havia qualquer manifestação de ansiedade, medo ou a necessidade de movimento, de ação por parte do corpo. Era um estado de contemplativa compaixão, o qual trazia consigo, uma percepção imediata, sem espaço para a medição da mente. Nesse estado, não havia passado, nem futuro e, em consequência, nenhum sentido de apego, inclusive no que se refere ao corpo. Havia uma tal clareza de percepção que a mesma chegava a causar dores no ser — mas que não tem nenhuma relação com as dores criadas pelo conteúdo da mente. Enquanto nesse estado, até o entendimento de línguas e símbolos que não faziam parte do conteúdo da mente, eram lidos de imediato, sem esforço, o que para a mente lógica, racional, cartesiana, soa como algo completamente destituído de sentido. Não se tratava de um processo alucinógeno, aliás, apesar da intensidade do processo depressivo, a mente e o corpo não se encontravam sobre a influência de nenhum tipo de droga receitada ou não. Uma intuição premonitória, elevada a níveis indizíveis, apontava a direção e trazia a ação imediata que não era resultante de um processo de ideação, ação imediata esta que causava conflito com outras mentes, que de forma codependente, se alimentavam do antigo estado de ser. Foi no choque com essa mentes controladoras e autocentradas que insistiam dizer que tudo aquilo não passava de um perigoso surto psicótico à ser imediatamente clinicado, que o medo encontrou espaço para a identificação e, por meio dela, deu-se a instalação do processo de "queda do paraíso". Esse estado de bem-estar e bem-aventurança deve ter levado algo próximo a sete dias; não há como precisar. No choque com a antiga realidade, instalou-se novamente um profundo quadro depressivo, no entanto, este já não apresentava mais o anterior impulso para o suicídio, mas sim, um forte impulso para a busca daquele estado de compaixão contemplativa, em cuja totalidade do ser, grafou como que com fogo, a pedra de seus mandamentos. À partir de então, toda relação que não apontasse para a potencialização do Ser e que, ao contrário, forçava ao ajustamento servil, por não servir de ponte, era deixada pelo caminho. Nenhuma verbalização tem o poder de alcançar e registrar o conteúdo do que aconteceu nesse processo iniciático de abertura e limpeza do coração. A tentativa de verbalização pela mente lógica, racional, tem tanta vida e frescor como folhas secas, soltas ao vento outonal.
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill