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quarta-feira, 29 de abril de 2015

Breve definição de iluminação

Iluminação é uma simples realização de que tudo é como deve ser. Essa é a definição de iluminação: tudo é como deve ser, tudo está inteiramente perfeito assim como é. Esse sentimento… e você está subitamente em casa. Nada está faltando. Você é parte, uma parte orgânica desse tremendo e belo todo. Você está relaxado nele, rendido nele. Você não existe separadamente – toda separação desapareceu. Um grande regozijo acontece, pois com o desaparecimento do ego não resta nenhuma preocupação, com o desaparecimento do ego não sobra nenhuma angústia, com o desaparecimento do ego não há mais qualquer possibilidade de morte. Isso é o que iluminação é.

É o entendimento de que tudo é bom, que tudo é belo – e isso é lindo assim como é. Tudo está em tremenda harmonia, de acordo.

(Osho)

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Corpo e mente: nossa ignorância dual

Dizem-nos os Sábios que deixaremos de identificar-nos com o nosso corpo — e assim nos libertaremos de uma vez por todas dos sofrimentos que surgem por intermédio dele — apenas quando alcançarmos a experiência direta do Ser real. Assim como agora temos a experiência direta do corpo, devemos ter a experiência direta desse Ser como ele realmente é. Essa ignorância, que nos leva a identificar-nos  com o corpo, é um hábito mental arraigado, engendrado na mente durante longo tempo de ações e pensamentos errôneos. Deles surgiram os vários apegos às coisas. Tais hábitos mentais formam a própria estrutura da mente; e a simples introdução de um pensamento contrário — que é muito fraco, igual a um recém-nascido — fará pouca diferença. A mente fluirá pelos mesmos canais habituais. Continuará sujeita às mesmas atrações e repulsões. E isso acontecerá porque enquanto é possível ao filósofo livresco sentir às vezes que ele não é o seu corpo, não pode, com a mesma facilidade, chegar a sentir que não é a mente. E esta dupla ignorância só terá o fim quando conhecermos o Ser — não teórica mas praticamente, isto é, pela experiência real do Ser. 

Até surgir essa compreensão, não se pode dizer que o filósofo tenha se descartado de sua ignorância. Ela sobrevive com todo rigor. Seu conhecimento filosófico não faz qualquer diferença em seu caráter. De fato, como assinala Ramana Maharshi, o filósofo livresco está até mesmo em piores condições do que os outros homens. Seu coração é assediado por novos apegos — dos quais o iletrado está livre — que não lhe dão tempo para dedicar-se à tarefa de descobrir o Ser real. Muitas vezes não tem nem mesmo consciência da presente necessidade de se prepararem para tal empresa, harmonizando o conteúdo de sua mente e dirigindo suas energias para o Ser, e não para o mundo. Infere-se daí que, quem conhece o Ser apenas por intermédio de livros, não conhece mais do que a gente simples. Por essa razão o Sábio compara o filósofo livresco ao gramofone. Não é melhor do que ninguém pela sua erudição, assim como o gramofone não é melhor pelas coisas que repete. 

os livros, devemos lembrar, não passam de sinais indicadores na estrada para a sabedoria, que nos liberta; logo, essa sabedoria não pode ser encontrada nos livros. O Ser que precisamos conhecer está no INTERIOR e não no exterior. Caso a sabedoria desperte, nessa oportunidade, o Ser, refulgindo em todo o seu esplendor, mostrar-se-á diretamente, sem qualquer agente intermediário. O estudo dos livros porém engendra a ideia de que o Ser é algo externo, que se precise conhecer como um objeto, por intermédio da mente. 

A vasta confusão que reina nas especulações filosóficas e teológicas é devida, diz Ramana Maharshi, a essa ignorância. Todos estão totalmente convencidos de que as questões abstrusas, referente ao mundo, à alma e a Deus, podem ser resolvidas, final e satisfatoriamente, pelas especulações intelectuais sustentadas por argumentos tirados da experiência humana COMUM, a qual é o que é, devido a essa ignorância. Filósofos e teólogos desde o início da criação — se é que houve criação — sobre a causa primeira, o modo da criação, a natureza do tempo e do espaço, a realidade ou irrealidade do mundo, a discordância entre o determinismo e o livre-arbítrio, o estado de libertação, e assim por diante, numa sucessão infinita. E NÃO CHEGAM A NENHUMA CONCLUSÃO. Ramana Maharshi explica-nos que não pode haver conclusão final — uma conclusão que não possa ser derrubada por argumentos novos, ou aparentemente novos, enunciados por outros comentadores, a menos que o Ser real SEJA ALCANÇADO. Para aquele que atingiu o Ser real, estas controvérsias chegaram ao fim. Mas para os outros, elas devem continuar, a menos que ouçam o conselho de Ramana Maharshi, cuja finalidade é fazer com que deixem de lado TODAS ESSAS QUESTÕES e se dediquem de coração a busca do Ser. Ou aceitamos o ensino dos Sábios sobre essas ESPECULAÇÕES, pelo menos à título de hipótese, DE MODO A NÃO SERMOS DESVIADOS, por elas, da nossa busca, ou reconhecemos a profunda verdade de que esses assuntos NÃO TÊM A MENOR IMPORTÂNCIA E NÃO PRECISAM DE RESPOSTAS — que a única coisa necessária é encontrar o Ser. Essas questões surgem, se é isso que acontece, apenas para aqueles que consideram a mente e o corpo como o Ser. 

Compreendemos assim, que todos os nosso sofrimentos são devidos à nossa ignorância sobre o Ser real. Devemos vencê-las se quisermos gozar a VERDADEIRA FELICIDADE, pois, a remoção da causa é a única forma de cura radical que existe. O mais é TRATAMENTO PALIATIVO, que pode até mesmo, no final de contas, SER MALÉFICO, agravando, na verdade, a doença. E só poderemos ficar livres dessa ignorância, por meio da experiência com o Ser. 

MAHA YOGA

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Características do "Estado Místico"

O estado místico, quer espontâneo quer induzido mediante a meditação e outras práticas, produz a liberação de ENERGIA do inconsciente que permite a realização das POTENCIALIDADES mais elevadas do ser humano. Parece conveniente, portanto, que o estado místico seja estudado pela ciência sem preconceitos, num esforço para descobrir se ele pode, de fato, fornecer a chave que leve o indivíduo e a sociedade à vida saudável.
RENÚNCIA VOLUNTÁRIA - Outra característica que Prince considera comum ao esquizofrênico e ao místico é a renúncia aos apegos mundanos. Contudo, o esquizofrênico abandona o trabalho e a família não por escolha, mas por estar muito doente para assumir responsabilidades ou enfrentar a vida. O místico, por outro lado, de modo VOLUNTÁRIO E COM PLENA CONSCIÊNCIA, renuncia aos prazeres e às recompensas da vida mundana para ir em busca daquilo que considera o bem supremo. Desse modo, Buda abandonou sua herança régia a fim de descobrir as causas do sofrimento humano e os modos de mitigá-lo.

Um exemplo recente de renúncia às coisas deste mundo pode ser encontrado na vida de Albert Schweitzer, que abandonou uma carreira auspiciosa na Europa para fundar um hospital no coração da selva africana. Ele declarou que a base de sua filosofia, a "reverência pela vida", foi-lhe revelada através de um súbito vislumbre místico. Um ato semelhante de RENÚNCIA VOLUNTÁRIA pode ser visto na decisão de Thoreau de abandonar a oportunidade de fazer riqueza com sua descoberta de um novo método para a fabricação de grafita a fim de procurar a autocompreensão nos bosques de Walden.

A relação daqueles que, conscientemente, rejeitam os valores e confortos materiais para perseguir um ideal, não se limita àqueles indivíduos de orientação religiosa. O momento transcendente que transforma as atitudes e os hábitos da vida não conhece limites espaciais ou temporais; ele pode atingir tanto o homem ativo no mundo quanto o filosófico. A história preservou-nos os nomes de incontáveis pessoas que abandonaram a segurança, o amor e a riqueza pessoais a fim de devotarem-se ao serviço de outras, o que não traz nenhum rendimento a não ser sua própria recompensa.

A vida de uma pessoa mentalmente doente, mergulhada há anos num estupor catatônico, fora do alcance de qualquer contato humano, constitui uma trágica perda. Como é possível comparar tal retraimento em relação ao mundo com vidas plenas e gratificantes que resultaram da RENÚNCIA CONSCIENTE das satisfações pessoais — vidas que amiúde tanto beneficiaram a humanidade? — (Claire Myres Owens)

ÊXTASE - Um resultado universalmente comprovado da experiência mística é o êxtase, a felicidade ou o júbilo. Na opinião de Prince, trata-se apenas de uma regressão à experiência bem-aventurada da amamentação ou de um estado semelhante à falsa elação dos estados psicóticos. Aqui, mais uma vez, sua limitada compreensão é transmitida aos seus leitores através de uma citação enganosa de Francisco de Sales, colocada fora de contexto: " Nesse estado [a oração da quietude], a alma assemelha-se a uma criancinha ainda no seio da mãe".

A simplificação demasiada de Prince é resultado da confiança atual depositada nas técnicas freudianas, nas quais as configurações simbólicas perdem uma parte de seu significado. O conhecimento profundo da literatura do misticismo, por outro lado, revela o grau em que aqueles que experimentaram o estado de consciência expandida são obrigados a confiar no símbolo, na parábola, na imagem e na analogia em seus esforços para comunicar na linguagem formal a qualidade essencial de uma realidade informe.

O tema da criança constitui uma dessas tentativas de exprimir a natureza da experiência mística em termos que possam ser compreendidos pela maioria dos homens; possui um efeito redentor. A imagem da inocência e da pureza, não contaminada pelo interesse mundano ou egoísta, que vai ao encontro da realidade com uma visão pura, espontânea e serena, tem sido repetidamente evocado para exprimir o estado mental e interior NECESSÁRIO àquele que aspira ao conhecimento espiritual. Assim disse Jesus: "A menos que vos torneis semelhantes a uma criança, não podereis entrar no reino do céu."

Levando em consideração essa prática, de Sales talvez estivesse querendo dizer que os místico, do mesmo modo que o lactente, tem a sensação de estar retornando à sua fonte — cósmica, não maternal; que ele também está se entregando, com segurança, a um poder infinitamente mais forte que ele próprio — um poder universal e não-pessoal; que ele está participando de uma nutrição primária, elementar, natural ao homem e superior a todas as outras — alimento para a mente e para o espírito, e não para o corpo; e que seu êxtase o purifica de modo a sentir-se, mais uma vez, puro e inocente como um bebê.

O êxtase do místico tem sido uma fonte de poder redentor, que o purga da dúvida a respeito de si mesmo e da vacilação. A experiência de Moisés diante da sarça ardente deu-lhe força e coragem para libertar os israelitas do cativeiro. A visão de Pascal de uma enorme fogueira e de uma cruz em chamas alterou sua filosofia e sua vida. Ainda que reconheçamos que essas visões simbólicas sejam projeções psicológicas, não podemos desprezar o testemunho histórico de seu poder transformador.

O psicótico pode ter sensações momentâneas de êxtase ou excitação e acreditar que descobriu os segredos do universo, mas suas fantasias não geram nenhuma compreensão da verdade ou da realidade. O esquizofrênico pode manifestar distorções e exageros dos padrões básicos do inconsciente coletivo que ele compartilha com todos os homens; mas essas distorções, por si só, não determinam o caráter essencial do inconsciente.


Mais interessante é a alegação de Prince de que não s de que não só a elação mas também a condição depressiva, que o místico chama de "a noite escura da alma", são comuns aos estados místicos e maníacos. É verdade que muitos místicos testemunharam essa condição de esterilidade espiritual. Prosseguindo a comparação de Prince, parece-me que o psicótico perde contato com a assim chamada realidade (talvez um termo melhor seja atualidade) do mundo. O místico, contudo, em sua "noite escura", perde contato com a realidade suprema que ele conheceu. Tudo o que lhe resta, nesse PERÍODO DE ARIDEZ, é o mundo dos fenômenos que, como contraste, é insípido, limitado e desinteressante. A porta de seu inconsciente mais profundo, que dá acesso ao princípio integrador universal, está fechada para ele; ele se sente excluído e o resultado pode ser uma profunda depressão. Afinal de contas, os místicos são seres humanos com fraquezas humanas. Depois de um despertar espontâneo de certa duração, eles podem ingressar num período natural de reação, resultado do fluxo e refluxo da vida psíquica, tão mal compreendido. É interessante notar que aqueles que escreveram com uma tristeza exaltada acerca da "noite escura" geralmente são aqueles que passaram por súbitas e espontâneas experiências, em relação às quais estavam DESPREPARADOS. As alusões a essa condição, na literatura hinduísta e budista, ocorrem num contexto tão sistematizado, devido a seus métodos de preparação à descoberta de si mesmo, que são aceitas como parte do processo de crescimento.

MORTIFICAÇÃO - Depois das experiências místicas desse nível mais profundo de consciência, ele descobre que seus padrões de vida anteriores NÃO MAIS SÃO SATISFATÓRIOS. Sente que devem ser DEPURADOS ou MORTIFICADOS, o que Underhill interpreta como "A Purificação do Eu". Na linguagem da dicotomia dos níveis de consciência de Willian James, a nova consciência subliminal, com a qual o indivíduo acabou de entrar em contato, é acentuadamente diferente da consciência diária no mundo social, já não são se aplicam a essa experiência mais pessoal e, portanto, DEVEM SER DESCARTADOS.

As práticas ascéticas extremas de muitos místicos, que ocorrem durante este estágio, destinam-se a DEPURAR o indivíduo de sua necessidade de antigas relações que ele mantinha com a realidade social. Assim que isto for concluído, o processo de depuração ou mortificação termina. Como assinala Underhill, a despeito de sua etimologia, o objetivo da mortificação, para o místico, é a vida, mas essa vida só pode surgir através da "morte" do antigo "eu".

ILUMINAÇÃO DO EU - Depois que o indivíduo DEPUROU-SE do seu interesse anterior e de seu envolvimento com o mundo social, ele entra no terceiro estágio ou no que Underhill chama de "A Iluminação do Eu". Aqui, ele experimenta de modo mais pleno aquilo que se encontra além dos limites de seus sentidos imediatos. A principal característica atribuída a este estágio consiste na apreensão jubilosa daquilo que o místico experimenta ser o Absoluto, o que inclui extravasamentos refulgentes de êxtase e arroubo nos quais o indivíduo exulta de seu relacionamento com o Absoluto. Aquilo que distingue este estágio dos estágios posteriores, contudo, é o fato de que o indivíduo ainda experimenta a si próprio como uma entidade separada, ainda não unificada com o que ele considera ser o Supremo. Ainda persiste uma SENSAÇÃO do estado-do-eu, do ego, de si mesmo.

NOTE ESCURA DA ALMA - talvez este seja o estágio mais notável do processo místico. Embora possa ser encontrado em todas as experiências místicas, sua expressão emocional só aparece na tradição ocidental, onde recebeu seu nome a partir da frase evocativa de São João da Cruz: "A Moite escura da Alma". Há, aqui, a total negação e rejeição do júbilo do estágio precedente. O indivíduo sente-se TOTALMENTE AFASTADO e DISTANTE de suas experiências anteriores, bem como EXTREMAMENTE SOZINHO e DEPRIMIDO. É como se tivesse sido atirado para o meio de uma região devastada ou de um IMENSO DESERTO, sem nenhuma esperança de sobrevivência.

Durante o período purificador, o indivíduo deve depurar-se de seus APEGOS ANTERIORES AO MUNDO SOCIAL. Agora, ele deve depurar-se de sua EXPERIÊNCIA DO EU. Sua própria vontade deve tornar-se totalmente SUBMERSA pela "força" desconhecida que ele experimenta ESTAR DENTRO DELE. Enquanto afirma sua própria vontade ou individualidade, ele mantém distância ou separação daquilo que sente ser o Supremo.

A VIDA UNITIVA - este estágio, embora não seja o estágio final, constitui o ponto culminante da busca do místico: a completa e total absorção no mundo pessoal, insocial, que tem sido chamado de "A Vida Unitiva". Ele consiste na obliteração dos sentidos e até mesmo da sensação do eu, resultado na experiência da unidade com o universo. Este estágio tem sido descrito como um estado de CONSCIÊNCIA PURA, no qual o indivíduo não experimenta nada — nenhuma coisa. O indivíduo APARENTEMENTE fez contato com as regiões mais profundas de sua consciência e experimenta o processo como tendo sido concluído. Emocionalmente, o indivíduo sente-se totalmente tranquilo e em paz.

RETORNO DO MÍSTICO - Embora não mencionado como um estágio independente pelos comentadores, o retorno do místico, da experiência de unicidade com o universo, para as exigências da vida social constitui a parte MAIS IMPORTANTE de seu caminho. Em muitos místicos, pode-se observar que eles renovam seu envolvimento prático nas situações sociais com uma vitalidade e forças novas. Como observou santa Tereza: "marta e Maria devem trabalhar em conjunto quando oferecem pousada ao Senhor", dando a entender que o envolvimento material e espiritual são igualmente importantes. As vidas de santa Tereza, de são Francisco de Assis e de santo Inácio, para citar apenas três, dão testemunho do importante PAPEL PRÁTICO que os místicos têm exercido no mundo. Na tradição clássica oriental, encontra-se a mesma ênfase dada ao retorno ao mundo. O exemplo principal é Buda, que retornou de seu êxtase sob a árvore BO ao mundo social do qual ele "fugira".

O místico agora não mais considera detestável seu envolvimento com o mundo mas, na verdade, parece ACOLHER COM ALEGRIA a oportunidade de entrar no mundo social que ele abandonara. Este paradoxo aparente torna-se compreensível quando se considera que não foi ao mundo que o místico esteve renunciando mas, meramente, A SEUS APEGOS e NECESSIDADES em relação a ele, que impossibilitavam o desenvolvimento de sua experiência pessoal, insocial. Depois que se tornou capaz de abandonar essas necessidades sociais, condicionadas, e sentiu-se livre da atração exercida pelo mundo social, ele experimentou a liberdade de viver no interior da sociedade conjuntamente com seus esforços interiores, deixando de ver os costumes e as instituições sociais como obstáculos à sua auto-realização.

Jonh White — O Mais Elevado Estado de Consciência

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Um novo modo de autoconhecimento

Esse modo de autoconhecimento pode ocorrer de maneira dramática, como se deu com São Paulo na estrada de Damasco, ou pode manifestar-se sem nenhum sinal exterior de drama interior. A experiência resultante, contudo, tem-se revelado semelhante por todo o mundo e através da História. Por intermédio de seus próprios testemunhos, os "iluminados" — indivíduos que vivenciaram o estado supremo de consciência — sentiram uma sensação profunda de paz em relação aos outros e de harmonia com o mundo. Eles compreendem que o universo, tal como Dante escreveu no final de A DIVINA COMÉDIA, está se movendo segundo a força do Amor. Eles percebem um plano cósmico, uma ordem moral, em relação ao caos e ao acaso aparentes do gás estelar e da poeira intergaláctica. Eles vêem, com Hamlet, "uma divindade que molda nossos propósitos". Tal é o "deus" (ou Buda, Tao, Brahma) de incontáveis religiões e filosofias. Em todos os casos, a percepção auto-envolvente de que "eu" e o "outro" estamos unidos cria homens novos ou renascidos. Ela transforma a noção desolada e desesperançada da vida em uma noção na qual todas as coisas ganham um sentido deleitável. Ela transforma a configuração absurda da existência em uma visão do mundo que dá lugar à exuberância inevitavelmente esperançosa, uma vez que o sujeito descobre o desígnio fundamental onde, anteriormente, havia apenas percepções e experiências desconexas e confusas. 

No mesmo grau de importância do autotestemunho encontram-se as observações de outros indivíduos acerca dos iluminados. Quase sem exceção, têm sido considerados santos, visionários e profetas: Jesus, Buda, Lao Tsé, Jacob Boehme, Ramakrishna, Walt Whitman, Aldous Huxley. Socialmente venerados, revelaram uma coragem, uma amabilidade, uma compaixão, uma integridade e uma santidade excepcionais. Embora tenham conservado as características do ser humano, foi-lhes reservado um lugar particularmente distinto e tornaram-se identificáveis através de uma aura — às vezes literalmente visível sob a forma de uma luz intensa — que exerce uma poderosa influência sobre os outros homens. Além disso, nunca deixam de recomendar aos demais seres humanos que se preparassem, através da oração, das boas ações, do estudo e da meditação, para receberem a benção que não pode ser imposta ou prevista; quando ocorre, ela é sempre uma surpresa. Apesar disso, sustentam que ela deve ser buscada, segundo as palavras do mandamento de Jesus: "Com todo o teu coração e com toda a tua alma e com toda a tua força e com toda a tua mente".

John White em, O mais elevado estado de consciência

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Sobre o despertar da Inteligência

Amigos, nesta breve conversa introdutória, antes de responder a algumas das perguntas que me foram colocadas, quero expressar algumas ideias sobre as quais se deveria refletir com inteligência crítica. Não quero entrar em pormenores, mas quando refletirem sobre o que eu digo e o transportarem para a ação, verão a sua importância prática neste mundo de cruel e terrível caos.

A primeira coisa que temos que compreender é que enquanto houver distinção entre o indivíduo e o grupo tem que haver conflito, tem que haver exploração, tem que haver sofrimento. O conflito no mundo é na realidade entre o indivíduo que procura realização, e o grupo. Na expressão da sua força única como indivíduo, ele tem inevitavelmente que entrar em conflito com a multidão, e este conflito só aumenta a divisão entre os dois. A mera imposição superficial de um sobre o outro ou a exterminação de um pelo outro, não pode livrar o mundo da exploração e das crueldades repressivas.

Enquanto não compreendermos a verdadeira relação entre o indivíduo e o grupo, e a verdadeira função do indivíduo entre o grupo, haverá um contínuo estado de guerra. Para mim, esta distinção entre o indivíduo e o grupo é artificial e não verdadeira, embora tenha assumido uma realidade. Enquanto não compreendermos verdadeiramente como nasceu a consciência de grupo e o que é o indivíduo e qual é a sua função, tem que existir um atrito contínuo.

Antes de responder às questões esta noite, quero tentar explicar o que quero dizer com indivíduo. A consciência de grupo não é senão a expansão da do indivíduo, portanto vamos interessar-nos com o pensamento e a ação do indivíduo. Embora o que eu digo possa parecer-lhes novo, por favor examinem-no sem preconceito.

O indivíduo é o resultado do passado, expressando-se através do meio presente; o passado sendo o herdado, o incompleto, e o presente, aquilo que é criado pela incompletude. O passado nada mais é que o pensamento, emoção e ação incompletos; isto é, pensamento, emoção e ação condicionados e limitados pela ignorância.

Expondo-o de maneira diferente, se uma pessoa desenvolveu um certo background através de tradições, através de um meio econômico, através de hereditariedade, através da formação religiosa, e está a tentar expressar-se através da limitação desse background, então naturalmente as suas ações, pensamentos e sentimentos têm que ser limitados, condicionados. Isto é, a sua mente está pervertida, distorcida pelo seu passado, e é com essa limitação que ele tenta enfrentar a vida e compreender as suas experiências. Portanto a ignorância é a acumulação dos resultados da ação através dos muitos impedimentos cujo significado o indivíduo não compreendeu integralmente. Estes impedimentos foram edificados pela mente para sua auto-proteção.

Cada um constantemente procura e cria segurança para ele próprio, e por isso toda a sua reação à vida é de contínua auto-defesa. Enquanto a mente e o coração estiverem à procura de medidas para se protegerem através de ideais e valores defensivos, tem que existir ignorância, que impede a mente de agir plenamente, completamente, e portanto ela desenvolve a sua própria particularidade a que chamamos individualidade, e que inevitavelmente entra em conflito com as muitas outras individualidades. Esta é a causa fundamental do sofrimento.

Ora, para mim, o verdadeiro significado da individualidade consiste em libertar a mente do passado, da sua ignorância para com o seu meio limitado. Neste processo de libertação, nasce a verdadeira inteligência, a única que libertará o homem do sofrimento, das crueldades e da exploração.

Assim, quando a mente está liberta do hábito e da tradição de procurar e criar valores para sua auto-proteção, através da acumulação, que é ignorância, e enfrenta a vida completamente, absolutamente despida, só então existe o duradouro discernimento daquilo que é verdadeiro.

Pergunta: É possível viver sem exploração, individual e comercial?

Krishnamurti: A maior parte de nós é levada pela mera sensação de posse. Desejamos adquirir, e por isso começamos a acumular cada vez mais, pensando que através da acumulação encontraremos felicidade, segurança. Enquanto houver desejo acumulativo e aquisitivo, tem que existir exploração; e só podemos libertar-nos dessa exploração quando começarmos a despertar a inteligência através da destruição dos valores auto-protetores. Mas se simplesmente tentarmos descobrir quais são as nossas necessidades e nos limitarmos a essas necessidades, então a nossa vida tornar-se-á pequena, tacanha e mesquinha. Ao passo que, se vivêssemos inteligentemente, sem acumulações auto-protetoras, não haveria exploração, com as suas muitas crueldades. Tentar resolver este problema unicamente controlando as condições econômicas do homem ou pela mera renúncia, parece-me uma abordagem errada a este complicado problema. É somente através da compreensão voluntária e inteligente da inutilidade e ignorância da auto-proteção, que pode chegar a ausência de exploração.

Despertar a inteligência é descobrir, através da dúvida e do questionamento, o verdadeiro significado dos valores que adquirimos, das tradições, sejam religiosas, sociais ou econômicas, que herdamos ou conscientemente edificamos. Em tal questionamento, se for real e vital, há a descoberta inteligente das necessidades. Esta inteligência é a certeza de felicidade.

Pergunta: Deveríamos transformar as nossas espadas em arados, mesmo embora o nosso país seja atacado por um inimigo? Não é o nosso dever moral defender o nosso país?

Krishnamurti: Para mim a guerra é radicalmente errada, seja defensiva ou ofensiva. O sistema de aquisitividade em que se baseia toda esta civilização tem naturalmente que criar distinções de classe, distinções raciais e nacionais, conduzindo inevitavelmente à guerra, a que podem chamar ofensiva ou defensiva de acordo com os ditames dos líderes comerciais ou políticos. Enquanto existir este sistema econômico explorador, tem que haver guerra; e o indivíduo que é confrontado com o problema de se deveria lutar ou não, decidirá de acordo com a sua aquisitividade, a que ele por vezes chama patriotismo, ideais, etc. Ou, compreendendo que todo este sistema inevitavelmente conduz à guerra, como indivíduo, começará a libertar-se inteligentemente deste sistema. E esta é para mim a única verdadeira solução.

Pela nossa aquisitividade construímos através de muitos séculos este esmagador sistema de exploração que está a destruir todas as nossas sensibilidades, o nosso amor pelo outro. E quando perguntamos, “Não deveríamos lutar pelo nosso país, não é o nosso dever moral?” há algo inerentemente errado, algo essencialmente cruel na própria questão. Para se libertar desta extrema estupidez, o homem da guerra tem que reaprender a pensar mesmo do princípio. Enquanto a humanidade estiver dividida pela religião, pelas seitas, pelos credos, pelas classes, pelas nacionalidades, tem que haver guerra, tem que haver exploração, tem que haver sofrimento. Só quando a mente se começa a libertar destas limitações, só quando a mente se derrama no coração, é que há a verdadeira inteligência, que é a única solução duradoura para as crueldades bárbaras desta civilização.

Pergunta: Como é que podemos ajudar melhor a humanidade a compreender e a viver os seus ensinamentos?

Krishnamurti: É muito simples: vivendo-os vocês mesmos. O que é que estou a ensinar? Não lhes estou a dar um novo sistema, ou um novo conjunto de crenças; mas digo, prestem atenção à causa que gerou esta exploração, a falta de amor, o medo, as guerras contínuas, o ódio, as diferenças de classes, a divisão do homem contra o homem. A causa é, fundamentalmente, o desejo da parte de cada um de nós de se proteger através da aquisitividade, através do poder. Todos desejamos ajudar o mundo, mas nunca começamos por nós próprios. Queremos reformar o mundo, mas a mudança fundamental tem que ter lugar primeiro dentro de nós próprios. Portanto, comecem a libertar a mente e o coração deste sentido de possessividade. Isto exige, não mera renúncia, mas discernimento, inteligência.

Pergunta: Qual é a sua atitude relativamente ao problema do sexo, que representa um papel tão predominante na nossa vida quotidiana?

Krishnamurti: Tornou-se um problema porque não há amor. Não é assim? Quando realmente amamos, não há problema, há ajustamento, há compreensão. Só quando perdemos o sentido da verdadeira afeição, desse profundo amor em que não há sentimento de possessividade, é que surge o problema do sexo. Só quando nos submetemos completamente à mera sensação, é que há muitos problemas relativos ao sexo. Como a maioria das pessoas perdeu a alegria do pensar criativo, naturalmente voltam-se para a mera sensação do sexo, que se torna um problema desgastando as suas mentes e corações. Enquanto não começarem a questionar e a compreender o significado do meio, dos muitos valores que edificaram em vosso redor para vossa auto-proteção e que estão a esmagar o pensar fundamental, criativo, têm naturalmente que recorrer às muitas formas de estimulação. Daqui surgem inumeráveis problemas para os quais não há solução excepto a compreensão fundamental e inteligente da própria vida.

Por favor experimentem com o que eu estou a dizer. Comecem por descobrir o verdadeiro significado da religião, do hábito, da tradição, de todo este sistema de moralidade que está constantemente a forçá-los, a instá-los numa determinada direção: comecem a questionar todo o seu significado sem ideias preconcebidas. Despertarão então esse pensamento criativo que dissolve os muitos problemas nascidos da ignorância.

Pergunta: Acredita na reencarnação? É um fato? Pode dar-nos provas da sua experiência pessoal?

Krishnamurti: A ideia da reencarnação é tão velha como as colinas; é a ideia de que o homem, através de muitos renascimentos, passando através de inúmeras experiências, chegará finalmente à perfeição, à verdade, a Deus. Ora bem, o que é que renasce, o que é que continua? Para mim, essa coisa que se supõe continuar nada mais é que uma série de camadas de memória, de determinadas qualidades, de determinadas ações incompletas que foram condicionadas, impedidas pelo medo nascido da auto-proteção. Ora essa consciência incompleta é o que nós chamamos o ego, o “eu”. Conforme expliquei no início da minha breve conversa introdutória, a individualidade é a acumulação dos resultados de várias ações que foram impedidas, entravadas por determinados valores herdados e adquiridos, pelas limitações. Espero não estar a tornar isto muito complicado e filosófico. Tentarei torná-lo simples.

Quando falam do “eu”, querem dizer com isso um nome, uma forma, determinadas ideias, certos preconceitos, determinadas distinções de classe, qualidades, preconceitos religiosos, etc., que foram desenvolvidos através do desejo de auto-proteção, de segurança, de conforto. Portanto, para mim, o “eu”, baseado numa ilusão, não tem realidade. Por isso a questão não é saber se existe a reencarnação, se há uma possibilidade de um crescimento futuro, mas se a mente e o coração se podem libertar desta limitação do “eu”, do “meu”.

Perguntam-me se eu acredito ou não na reencarnação porque esperam que através da minha certeza possam adiar a compreensão e a ação no presente, e que eventualmente chegarão a realizar o êxtase da vida ou a imortalidade. Querem saber se, sendo forçados a viver num meio condicionado com oportunidades limitadas, chegarão alguma vez através da infelicidade e do conflito a compreender esse êxtase da vida, a imortalidade. Como se está a fazer tarde tenho que expor o assunto brevemente, e espero que reflitam sobre ele.

Ora eu digo que a imortalidade existe, para mim é uma experiência pessoal; mas ela só pode ser compreendida quando a mente não estiver a contar com um futuro no qual viva com mais perfeição, mais completamente, mais ricamente. A imortalidade é o presente infinito. Para compreender o presente com o seu significado pleno, rico, a mente tem que estar livre do hábito da aquisição auto-protetora; quando estiver totalmente despida, só então há imortalidade.

Pergunta: Para podermos alcançar a verdade, devemos trabalhar sozinhos ou coletivamente?

Krishnamurti: Se é que o posso sugerir, deixem a questão da verdade de lado; vamos antes considerar se é inteligente trabalhar para a obtenção pessoal ou para o coletivo. Durante séculos cada um procurou a sua própria segurança, e foi portanto implacável, agressivo, explorador, gerando assim a confusão e o caos. Considerando tudo isto, vocês, o indivíduo, começarão a trabalhar voluntariamente para o bem-estar do todo. Neste ato voluntário, o indivíduo nunca se tornará mecânico, automático, um mero instrumento nas mãos do grupo; por conseguinte, nunca poderá haver um conflito entre o grupo e o indivíduo. A questão da expressão criativa do indivíduo em oposição e em conflito com o grupo só desaparecerá quando cada um agir integralmente na plenitude da compreensão. Só isto originará a cooperação inteligente na qual a compulsão, seja através do medo ou da ganância, não tem lugar. Não esperem a ser levados a agir coletivamente, mas comecem a despertar essa inteligência, desnudando todas as estupidezes aquisitivas, e então haverá a alegria do trabalho coletivo.

Krishnamurti, Rio de Janeiro, 2ª Palestra – 17 de Abril de 1935.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

A ideia de que alguém pode lhe despertar, não tem validade alguma

Pergunta: Você não admite a necessidade da orientação dada por um guia? Se, como diz, não deve mais haver nem tradição nem autoridade, nesse caso todos terão de lançar novas bases para a sua existência. Assim como o corpo físico teve um começo, não deve haver também um começo para o nosso corpo espiritual e mental e não deve este ascender de cada degrau para o degrau superior, imediato? Assim como o nosso pensamento se inflama, quando lhe ouvimos, não é necessário despertá-lo, pelo contato com os grandes espíritos do passado?

Krishnamurti: Senhor, este é um problema velho como o mundo. Pensamos que necessitamos de um guru, um instrutor, para nos despertar a mente. Pois bem. No que implica isso? Implica, de um lado, o homem que sabe, de outro lado, o homem que não sabe. Continuemos devagar, sem nos deixarmos influir por preconceitos. "O homem que sabe" se torna a autoridade, e "o homem que não sabe" se torna seu discípulo. E o discípulo vai sempre seguindo o mestre, na esperança de alcançá-lo, de se colocar no mesmo nível que ele. Agora, preste atenção! Quando o guru diz que sabe, já não é guru. Porque o homem que diz que sabe, não sabe. E veja por que não sabe: porque a Verdade, a Realidade, ou o "outro estado", não se acha num ponto fixo, não se pode alcançar por um certo caminho, e temos de descobrí-la momento por momento. Se está num ponto fixo, nesse caso esse ponto se acha dentro dos limites do tempo. Para um ponto fixo pode haver caminho, como há um caminho para a sua casa; mas para uma coisa viva que não tem um pouso fixo, que não tem começo nem fim, não pode haver caminho algum. 

Ora, um guru que se oferece para ajudar-lhe a conhecer a Realidade só pode ajudar-lhe a reconhecer o que você já conhece; porque o que se pode reconhecer, experimentar, tem de ser reconhecível, não acha? Quando o reconhece, você diz: "Experimentei" — mas o que é reconhecível, não pode ser aquele outro estado. O outro estado não é reconhecível, pois nunca foi conhecido; não é uma coisa que você já experimentou e que é capaz de conhecer. O "outro estado" é uma coisa que tem de ser descoberta momento por momento; e para descobri-la, a mente tem de ser livre. Senhor, a mente tem de estar livre para descobrir qualquer coisa; e a mente agrilhoada pela tradição, antiga ou moderna, a mente que leva a carga da crença, dos dogmas, dos ritos, evidentemente, não é livre. Para mim, a ideia de que um outro pode despertar-lhe , não tem validade alguma. isto não é uma opinião: é um fato. Se um outro lhe desperta, você fica sobre sua influência, depende dele; por conseguinte, você não é livre; e só a mente livre pode descobrir. 

É este, portanto, o problema, não acha? 

Aspiramos àquele "outro estado", e uma vez que não sabemos como alcançá-lo, passamos inevitavelmente a depender de alguém, a quem chamamos instrutor, guru, ou a depender de um livro, ou de nossa experiência. E está criada, assim, a dependência, e onde há dependência há também autoridade. A mente se torna, por conseguinte, escrava da autoridade, escrava da tradição, e essa mente, evidentemente, não é livre. Só a mente que é livre, pode descobrir; e contar com ajuda de outro para o despertar da mente, é o mesmo que recorrer a uma droga que lhe fará ver as coisas com muita nitidez, muita clareza. Há drogas que podem fazer a vida parecer, momentaneamente, muito mais "vital", de modo que todas as coisas assumem um relevo, um brilho extraordinário — as cores que você vê todos os dias, sem lhes dar atenção, se tornam extraordinariamente belas, etc. Tal poderá ser o seu "despertar" da mente, mas estará então na dependência da droga, como você depende agora do seu guru ou de um certo livro sagrado. E quando se torna dependente, a mente se embota. Da dependência provém o temor — o temor de não se realizar o que se quer, o temor de não ganhar. Quando dependemos de outro, seja o Salvador, seja outro qualquer, isso significa que a mente está em busca de um resultado feliz, um fim satisfatório. Você pode chamá-lo Deus, a Verdade, ou como quiser — mas é sempre uma coisa que se quer ganhar. E, assim, a mente fica prisioneira, se torna escrava e, não importa o que faça — sacrificar-se, disciplinar-se, torturar-se — essa mente nunca descobrirá "o outro estado". 

O problema, pois, não é quem seja o instrutor correto, mas sim descobrir se a mente pode manter-se desperta. E só se pode descobrir isso quando todas as relações se tornam um espelho, em que ela se vê exatamente como é. Mas a mente não pode ver-se como é, quando há condenação ou justificação daquilo que vê, ou se há qualquer forma de identificação. Todas essas coisas tornam a mente embotada e, embotados que estamos, desejamos ser despertados. Por essa razão amparamo-nos em outro, para que nos desperte. Mas, em virtude do próprio desejo de ser despertada, a mente embotada se torna mais embotada ainda, porquanto não percebe a causa de seu embotamento. É só quando a mente percebe e compreende todo esse processo, e não depende de explicações de ninguém, é só então que ela é capaz de libertar-se. 

Mas, como é fácil nos satisfazermos com palavras, com explicações! São muitos poucos os que rompem a barreira das explicações, ultrapassando as palavras e descobrindo por si mesmos o que é verdadeiro. A capacidade é produto de aplicação, não é? Mas nós nos satisfazemos com palavras, com especulações, com as tradicionais respostas e explicações com que fomos criados.

Krishnamurti em, DA SOLIDÃO À PLENITUDE HUMANA

Por que nossas vidas são em geral superficiais e vazias?

Penso que a maioria de nós acha a vida muito sem graça. Para ganharmos o sustento, precisamos exercer uma certa profissão, e esta se torna muito monótona; começa-se uma rotina, que temos de seguir, ano por ano, até morrer. Ricos ou pobres, e ainda que sejamos muito eruditos ou dotados de espírito filosófico, nossas vidas são em geral superficiais e vazias. Há evidentemente uma insuficiência em nós mesmos, e aos nos tornarmos cônscios desse vazio procuramos preenchê-lo com conhecimentos, com alguma espécie de atividade social, ou nos refugiamos em divertimentos de todo tipo, ou nos apegamos a alguma crença religiosa. Ainda que tenhamos uma certa capacidade e sejamos muito eficientes, nossas vidas são, ainda assim, sem graça e, para nos livrarmos dessa falta de graça, dessa cansativa monotonia da vida, buscamos uma certa forma de enriquecimento religioso, tentamos conquistar aquele "estado de ser" extra-mundano que não é uma rotina e que, por enquanto, pode ser chamado "o outro estado". Em nossa busca desse outro estado, encontramos muitos sistemas diferentes, diferentes caminhos que se supõem conduzirem a ele; e, assim, pelo disciplinamento de nós mesmos, pela prática de determinado sistema de meditação, pela observância de certo ritual ou a repetição de certas frases, esperamos alcançar aquele estado. Sendo a nossa vida um círculo interminável de dores e prazeres, de variadas experiências sem muita significação ou mera repetição, sem sentido algum, de uma mesma experiência — o viver constitui para a maioria de nós uma monótona rotina. Por esta razão, o problema de nosso enriquecimento interior, da conquista do "outro estado" — chame-o Deus, a Verdade, bem-aventurança ou como o quiser — se torna muito urgente, não é verdade? Você pode estar bem de vida, bem casado, ter filhos, pode pensar de forma inteligente e equilibradamente, entretanto, sem aquele, sem aquele estado, a vida se torna horrivelmente vazia. 

O que se deve , pois, fazer? Como conquistar aquele estado? Ou é completamente impossível conquistá-lo? A nossa mente, como está hoje constituída, é sem dúvida muito insignificante, limitada, condicionada; e embora uma mente limitada possa especular a respeito do "outro estado", suas conjecturas serão sempre limitadas. Ela poderá formular um estado ideal, conceber e descrever aquele outro estado, mas suas concepções permanecem dentro de suas estreitas limitações, , e penso que aí é que se encontra o fio da meada: no perceber que a mente não pode, em circunstância alguma, experimentar, viver aquele outro estado, se se limita a formulá-lo ou a especular a seu respeito. Não há dúvida de que esta é uma descoberta extraordinária: o perceber que, sendo a mente limitada, pequena, estreita, superficial, todo movimento que faça para alcançar aquele estado extraordinário, constitui um empecilho. O descobrimento deste fato, não especulativamente porém realmente, é o começo de uma nova maneira de considerar o problema. 

Nossas mentes, em verdade, são produto do tempo, de muitos milhares de dias passados, resultado da experiência baseada no "conhecido"; e, em tais condições, a mente é uma continuação do "conhecido". A mente de cada um de nós é o resultado da cultura, educação, e por mais extenso que seja o seu saber ou preparo técnico, ela é sempre produto do tempo; por conseguinte, é limitada, condicionada. Com esta mente, queremos descobrir o incognoscível; e compreender que essa mente nunca poderá descobrir o incognoscível, constitui uma experiência extraordinária. Descobrir que a mente de um indivíduo, por mais sagaz, por mais sutil, , por mais ilustrada que seja, não pode de modo nenhum compreender aquele outro estado — esse descobrimento traz consigo uma certa compreensão "factual" e acho que este é o começo de uma perspectiva da vida que poderá abrir a porta que conduz àquele outro estado

Expressando o problema de maneira diferente: a mente está sempre e sempre ativa, "tagarelando", planejando, e é capaz de extraordinárias sutilezas e invenções. E de que maneira pode esta mente tornar-se quieta? Vê-se que toda a atividade da mente, todo movimento que faça, em qualquer direção, é reação do passado. Como aquietar a mente? Se a aquietamos por meio de disciplina, sua quietude é um estado em que não há investigação, busca, não é exato? Em tais condições, ela não está aberta para o "desconhecido", "o outro estado". 

Não sei se alguma vez você já pensou neste problema, ou se nele tem pensado unicamente pela maneira tradicional, ou seja, tendo um ideal e dirigindo-se para ele segundo uma certa fórmula ou a prática de determinada disciplina. Disciplina implica, invariavelmente, repressão e conflito da dualidade — e isso está na esfera da mente — e por esse caminho prosseguimos, esperando captar o outro estado. Mas nunca indagamos inteligente e com sanidade se nossa mente é capaz de captá-lo. Foi nos sugerido que a mente deve estar tranquila, mas a tranquilidade foi sempre cultivada por meio de disciplina. Isto é, temos o ideal de uma mente tranquila, e buscamos realizar este ideal por meio de controle, luta, esforço. 

Ora bem, se você considera atentamente esse processo, em sua inteireza, verá que está no terreno do conhecido. Cônscia da monotonia de sua existência, cansada de suas repetidas experiências, a mente se empenha em conquistar aquele "outro estado". mas quando se percebe que a mente é o "conhecido" e que todo o movimento que faz não leva ao outro estado, que é "o desconhecido", o nosso problema se resume então, não em como conquistar o desconhecido, mas em descobrir se a mente pode libertar-se do "conhecido". Penso que este problema deve ser considerado por todo aquele que deseje descobrir se existe alguma possibilidade de "realizar o outro estado", o desconhecido. Assim sendo, como pode a mente, que é resultado do passado, do conhecido, libertar-se do conhecimento?

Krishnamurti em, DA SOLIDÃO À PLENITUDE HUMANA

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Conhecimento: a trave de tropeço para a visão intuitiva

(...)David Bohm: Mas chega então o momento em que o conhecimento não parece mais ser conhecimento.

Krishnamurti: Os políticos e as pessoas que estão no poder não escutariam isso. Nem tampouco os supostos indivíduos religiosos. Apenas as pessoas que estão descontentes, que sentem que perderam tudo, escutarão. Mas nem sempre elas escutam, de modo que isso é realmente um ponto crucial. O que faremos a respeito disso? Digamos, por exemplo, que eu tenha abandonado o catolicismo, o protestantismo, e tudo isso. Além disso, eu tenho uma profissão e sei que é necessário que eu tenha conhecimento nessa área. Percebo, porém, como é importante que eu não seja capturado no processo do conhecimento psicológico, e contudo não consigo abandoná-lo. Ele está sempre se esquivando; estou brincando de pregar peças com ele. É como um jogo de esconde-esconde. Está bem! Dissemos que essa é a parede que tenho de derrubar. Não, eu não — essa é a parede que tem que ser derrubada. E dissemos que ela pode ser derrubada por meio do amor e da inteligência. Não estamos pedindo uma coisa extremamente difícil?

DB: É difícil.

K: Eu estou deste lado da parede, e você está me pedindo para ter esse amor e essa inteligência que a destruirão. Mas eu não sei o que é esse amor, o que é essa inteligência, porque estou preso aqui, neste outro lado da parede. Eu percebo logicamente, de forma sensata, que o que você diz é preciso, verdadeiro, lógico, e vejo sua importância, mas a parede é tão resistente, tão dominante e poderosa que não consigo atravessá-la. Dissemos outro dia que a parede poderia ser derrubada por meio da visão intuitiva — se a visão intuitiva não for transformada numa ideia.

DB: Sim.

K: Quando a visão intuitiva é discutida, há o perigo de fazermos uma abstração dela; isso significa que nos afastamos do fato, e que a abstração se torna extremamente importante. O que quer dizer, mais uma vez, conhecimento.

DB: Sim, a atividade do conhecimento.

K: Assim, estamos novamente de volta!

DB: Penso que a dificuldade geral é que o conhecimento não está simplesmente sentado ali, como uma forma de informação, mas é extremamente ativo, reunindo e modelando todos os momentos em função do conhecimento passado. Desse modo, mesmo quando levantamos essa questão, o conhecimento fica o tempo todo à espera, e depois age. Toda a nossa tradição supõe que o conhecimento não é ativo e sim passivo. Mas na verdade ele é ativo, embora as pessoas geralmente não pensem dessa maneira. Elas acham que ele está apenas sentado ali.

K: Ele está esperando.

DB: Esperando para agir. E não importa o que tentemos fazer a respeito, o conhecimento já estará agindo. No momento em que percebermos que esse é o problema, ele já terá agido.

K: Sim. Mas será que eu o percebo como um problema, ou como uma ideia que devo executar? Percebe a diferença?

DB: O conhecimento, automaticamente, transforma tudo numa ideia, que devemos executar. Essa é a maneira global como ele é construído.

K: A maneira global como temos vivido.

DB: O conhecimento não pode fazer nada além disso.

A Eliminação do Tempo Psicológico

Quem pode ter a visão intuitiva?

N: Quem tem essa visão intuitiva?

K: "Quem", não. Simplesmente, ocorre uma visão intuitiva.

N: Ocorre uma visão intuitiva e então a consciência fica vazia de seu conteúdo...

K: Não, senhor. Não.

N: Você está querendo dizer que o próprio esvaziamento de conteúdo é a visão intuitiva?

K: Não. Estamos dizendo que o tempo é um fator que formou o conteúdo. Ele o construiu, e também pensa a respeito dele. Todo esse fardo é o resultado do tempo. A visão intuitiva de todo esse movimento, que não é "minha" visão intuitiva, provoca transformações no cérebro, pois ela não está ligada ao tempo.

DB: Você está dizendo que esse conteúdo psicológico é uma certa estrutura, que existe fisicamente no cérebro? E que, para esse conteúdo psicológico existir, o cérebro formou durante muitos anos, muitas ligações entre as células, que constituem esse conteúdo?

K: Exatamente.

DB: E há então um lampejo de visão intuitiva, que percebe tudo isso e que não é necessário. Conseqüentemente, tudo isso começa a se dissipar, e quando se dissipou, não há mais conteúdo. Depois, qualquer coisa que o cérebro faça será algo diferente.

K: Vamos um pouco mais adiante. Haverá então um vazio total.

DB: Bem, vazio do conteúdo. Mas quando você diz vazio total, quer dizer vazio de todo esse conteúdo interior?

K: Exatamente. E esse vazio possui uma tremenda energia. Ele é energia. 

DB: Poderíamos dizer então que o cérebro, com todas essas ligações entrelaçadas, prendeu grande quantidade de energia?

K: Isso mesmo. Desperdício de energia.

DB: E quando tudo isso começa a se dissipar, essa energia está ali.

K: Sim.

DB: Você diria que ela é uma energia tão física quanto qualquer outro tipo?

K: Naturalmente. Agora podemos entrar em maiores detalhes, mas esse princípio, a raiz da coisa, é uma ideia ou um fato? Ouço tudo isso fisicamente com o ouvido, mas posso torná-lo uma ideia. Se eu escuto isso, não apenas com o ouvido, mas em meu ser, na minha própria estrutura, o que acontece então? Se esse tipo de audição não ocorrer, tudo isso se toma apenas uma ideia, e eu sigo girando pelo resto da minha vida brincando com idéias. Se houvesse um cientista aqui, especialista em bio-feedback ou outro tipo de estudo do cérebro, será que ele aceitaria tudo isso? Ele ao menos escutaria?

DB: Alguns escutariam, mas evidentemente a maior parte não o faria. 

K: Não. Mas como podemos então atingir o cérebro humano?

DB: Tudo isso soaria bastante abstrato para a maior parte dos cientistas, entende? Eles diriam que talvez seja assim; que é uma bonita teoria, mas que não há qualquer prova de que ela seja verdadeira.

K: Naturalmente. Eles diriam que ela não os instiga muito porque não percebem nenhuma prova.

DB: Diriam que se aparecer mais alguma evidência, eles voltarão mais tarde e ficarão muito interessados. Veja bem, você não pode fornecer qualquer prova, porque não importa o que esteja acontecendo, ninguém poderá vê-la com os próprios olhos.

K: Compreendo. Mas estou perguntando: o que faremos? O cérebro humano — não o "meu " cérebro ou o "seu", mas o cérebro — evoluiu ao longo de um milhão de anos. Uma "aberração" biológica poderá escapar disso, mas como se poderá fazer com que a mente humana em geral perceba tudo isso?

DB: Penso que temos de comunicar a necessidade, a inevitabilidade do que você está dizendo. Como quando uma pessoa vê uma coisa acontecendo diante dos seus olhos e diz: "É assim." Certo?

K: Mas isso requer que uma pessoa escute, que uma pessoa diga: "Quero captar isso, quero compreender isso, quero descobrir isso." Entende o que estou dizendo? Aparentemente, essa é uma das coisas mais difíceis da vida.

DB: Bem, é a função desse cérebro ocupado - que está ocupado consigo mesmo e não escuta.

N: Aliás, uma das coisas é que essa ocupação começa muito cedo. Quando somos jovens ela é muito poderosa, e continua por toda nossa vida, Como podemos tornar isso claro através da educação?

K: No momento em que percebemos a importância de o cérebro não estar ocupado — em que percebemos isso como uma tremenda verdade — descobrimos maneiras e métodos de ajuda por meio da educação, criativamente. Ninguém pode ser ensinado, nem deve copiar ou imitar, senão estará perdido.

DB: Então o problema é este: "Como é possível comunicar isso ao cérebro, que rejeita, que não escuta?" Existe alguma maneira?

K: Não, se eu me recuso a escutar. Veja, acho que a meditação é um fator muito importante nisso tudo. Sinto que estivemos meditando, embora as pessoas comuns não considerem isso como meditação.

DB: Elas usam essa palavra com tanta freqüência...

K: ...que seu significado está realmente perdido. A verdadeira meditação, porém, é esta: esvaziamento da consciência. Você está me seguindo?

DB: Sim, mas sejamos claros. Antes, você disse que isso ocorreria através da visão intuitiva. Agora você está dizendo que a meditação propicia a visão intuitiva?

K: Meditação é visão intuitiva.

DB: Ela já é visão intuitiva. Então é uma espécie de trabalho que fazemos? Considera-se usualmente a visão intuitiva como um lampejo, mas a meditação é mais constante.

K: Temos de ser cuidadosos. O que entendemos por meditação? Podemos rejeitar os sistemas, métodos e autoridades reconhecidas, porque são normalmente apenas repetições tradicionais — bobagens vinculadas ao tempo.

N: Você acha que alguns deles puderam ser originais, puderam ter uma verdadeira visão intuitiva, no passado?

K: Quem sabe? Agora, meditação é essa penetração, essa sensação de se mover sem qualquer passado.

DB: O único ponto a ser esclarecido é que quando você usa a palavra meditação, refere-se a algo mais que visão intuitiva, entende?

K: Muito mais. A visão intuitiva libertou o cérebro do passado, do tempo. Essa é uma declaração imensa...

DB: Você está querendo dizer que precisamos ter visão intuitiva se quisermos meditar?

K: Sim, exatamente. Meditar sem ter qualquer percepção de vir a ser. 

DB: Não podemos meditar sem a visão intuitiva. Não podemos encarar a meditação como um procedimento graças ao qual atingiremos a visão intuitiva.

K: Não. Isso imediatamente implica o tempo. Seguir um procedimento, um sistema, um método, para se alcançar a visão intuitiva é um absurdo. Ter uma visão intuitiva da ganância ou do medo liberta a mente desses últimos. A meditação, portanto, tem uma qualidade muito diferente. Não tem nada a ver com todas as meditações dos gurus. Poderíamos dizer então que para ocorrer a visão intuitiva tem de haver o silêncio?

DB: Bem, isso é a mesma coisa; parece que estamos andando em círculos.

K: No momento.

DB: Sim, minha mente tem o silêncio.

K: Então o silêncio da visão intuitiva limpou, purificou tudo isso. 

DB: Toda essa estrutura da ocupação.

K: Sim. Não há então nenhum movimento como nós o conhecemos; nenhum movimento de tempo.

DB: Existe movimento de algum outro tipo?

K: Não vejo como podemos medir isso com palavras, essa sensação de um estado ilimitado.

DB: Mas você estava dizendo antes que, apesar disso, precisamos encontrar alguma linguagem, mesmo que seja indizível.

K: Sim — nós encontraremos essa linguagem.


Jiddu Krishnamurti e David Bohm - 1° de junho de 1980, Brockwood Park, Hampshire
Do livro: A Eliminação do Tempo Psicológico

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Sobre a visão intuitiva e a morte

K: ...Estávamos realmente falando a respeito da visão intuitiva que efetivamente altera a natureza do próprio cérebro.

DB: Sim, ao dissipar a escuridão no cérebro, a visão intuitiva permite que ele funcione de uma nova maneira.

K : O pensamento tem atuado na escuridão, criando sua própria escuridão e funcionando nela; e a visão intuitiva é, como dissemos, como um lampejo que atravessa a escuridão. Quando, então, essa visão intuitiva clareia a escuridão, o homem pode atuar, ou funcionar, racionalmente?

DB: Sim, o homem poderá, então, funcionar racionalmente, e com percepção, em vez de fazê-lo por meio de regras e da razão. Há, porém, uma razão que flui livremente. Veja bem, algumas pessoas identificam a razão com certas regras de lógica que seriam mecânicas; mas pode existir a razão como uma forma de percepção da ordem.

K: Estamos dizendo, então, que a visão intuitiva é percepção?

DB: Ela é o lampejo de luz que torna possível a percepção.

K: Certo, é isso mesmo.

DB: Ela é até mais fundamental do que a percepção.

K: A visão intuitiva é, pois, pura percepção, e a partir dessa percepção há ação, que é então sustentada pela racionalidade. É isso?

DB: Sim.

K: Exatamente.

DB: E a racionalidade é percepção da ordem.

K: Diria então que existe a visão intuitiva, percepção e ordem?

DB: Sim.

K: Mas essa ordem não é mecânica porque não está baseada na lógica.

DB: Não há regras.

K: Não há regras; vamos colocar as coisas dessa maneira; é melhor. Essa ordem não está fundamentada em regras. Isso significa visão intuitiva, percepção, ação, ordem. Chegamos então à pergunta: a visão intuitiva é contínua, ou ela ocorre em lampejos?

DB: Já abordamos isso, e achamos que essa era uma pergunta errada, de forma que talvez possamos encará-la de modo diferente. Ela não está ligada ao tempo.

K: Não está ligada ao tempo. Sim, concordamos com isso. Vamos um pouco mais adiante então. Dissemos, não foi, que a visão intuitiva é a eliminação da escuridão que é o próprio centro do self, a escuridão que o self cria? A visão intuitiva dissipa exatamente esse centro.

DB: Sim. A percepção não pode ocorrer quando há escuridão. É uma espécie de cegueira.

K: Certo; o que vem a seguir então? Sou um homem comum, com todos os meus instintos animais, prazer e dor, recompensa e castigo, e assim por diante. Ouço você dizer isso, e percebo que o que está dizendo tem uma espécie de razão, de lógica, e de ordem.

DB: Sim, faz sentido até onde podemos observar.

K: Faz sentido. Como posso então ter razão na minha vida? Como vou fazê-la surgir? Você entende que essas palavras que são difíceis estão todas ligadas ao tempo. Porém isso é possível?

DB: Sim, sem o tempo, entende?

K: O homem com sua mente estreita poderá ter essa visão intuitiva, de forma que este padrão de vida seja rompido? Como dissemos no outro dia, tentamos tudo isso, tentamos todas as formas de autonegação, e contudo essa visão intuitiva não apareceu. De vez em quando ocorre uma visão intuitiva parcial, mas essa não é visão intuitiva completa, de modo que ainda existe uma escuridão parcial.

DB: Que não dissipa o centro do self. Ela poderá dissipar alguma escuridão numa área determinada, mas a origem da escuridão, seu criador, seu sustentador, ainda está lá.

K: Ainda está lá. Portanto, o que faremos? Mas essa é uma pergunta errada. Não nos levará a nenhum lugar. Já especificamos o plano geral, certo? E temos então de avançar, ou não avançar em absoluto. Não tenho a energia. Não possuo a capacidade de percebê-lo rapidamente, pois isso é imediato, e não apenas algo que pratico e eventualmente alcanço. Não tenho a capacidade, não possuo o senso de urgência, da ação imediata. Tudo está contra mim: minha família, minha esposa, a sociedade. Tudo! E isso quer dizer que eventualmente terei de me tornar um monge?

DB: Não. Tornar-se um monge é a mesma coisa que tornar-se qualquer outra coisa.

K: Exatamente. Tornar-se um monge é como tornar-se um homem de negócios! Percebo tudo isso, tanto verbal como racionalmente, intelectualmente, mas não consigo captar essa coisa. Existe uma abordagem diferente para esse problema? Estou sempre fazendo a mesma pergunta, porque estou preso no mesmo padrão. Portanto, existe uma maneira completamente diferente? Uma abordagem totalmente diferente de todo o turbilhão da vida? Há um modo diferente de encará-lo? Ou a antiga maneira é a única que existe? Dissemos que enquanto o centro estiver criando a escuridão, e o pensamento estiver operando nela, haverá a desordem, e a sociedade será como é agora. Para nos afastarmos disso, temos de ter a visão intuitiva. A visão intuitiva só pode ocorrer quando há um lampejo, uma luz repentina, que elimina não apenas a escuridão como também o seu criador.

DB: Sim.

K: Agora estou perguntando se existe uma abordagem diferente desse assunto como um todo, embora uma antiga resposta pareça tão absoluta.

DB: Bem, possivelmente. Quando você diz que ela parece absoluta está querendo uma abordagem menos completa?

K: Estou dizendo que se essa é a única maneira, então estamos condenados.

DB: Não podemos criar esse lampejo voluntariamente.

K: Não, ele não pode ser criado por meio da vontade, através do sacrifício, através de qualquer forma de esforço humano. Isso está fora de cogitação; sabemos que já eliminamos tudo isso; e também concordamos com o fato de que para algumas pessoas — para "X" — essa visão intuitiva parecia tão natural, e perguntamos por que ela não é natural para outras pessoas.

DB: Se começarmos com a criança, parece natural que ela responda com seus instintos animais, com uma grande intensidade que arrebata. A escuridão surge porque isso é tão esmagador.

K: Sim, mas por que as coisas são diferentes com "X"?

DB: Em primeiro lugar, parece natural para a maior parte das pessoas que os instintos animais assumam o comando.

K: Sim, é verdade.

DB: E elas diriam que o outro indivíduo, "X", não é natural.

K: Sim.

DB: Essa é a maneira como a espécie humana tem pensado, dizendo que se efetivamente há pessoas que são diferentes, elas devem ser bastante incomuns e não naturais.

K: Exatamente. Os seres humanos têm respondido ao ódio com ódio, e assim por diante. Há aqueles poucos, talvez muitos, que dizem que isso não é natural ou racional. Por que ocorreu essa divisão?

DB: Se dissermos que prazer e dor, medo e ódio, são naturais, sentimos então que temos de lutar para controlá-los, caso contrário eles nos destruirão. O melhor que podemos esperar é controlá-los por meio da razão, ou de qualquer outra maneira.

K: Mas isso não funciona! Serão as pessoas como "X", que funcionam de forma diferente, os poucos privilegiados, devido a algum milagre, a algum estranho evento fortuito?

DB: Muitas pessoas diriam isso.

K: Mas isso é contra a minha natureza. Eu não aceitaria isso.

DB: Bem, se isso não é assim, então, você teria de dizer por que existe tal diferença.

K: É aí que estou querendo chegar, uma vez que "X" nasceu dos mesmos pais.

DB: Sim, fundamentalmente dos mesmos; então, por que ele se comporta de modo diferente?

K: Essa pergunta foi feita muitas vezes, repetidamente, em diferentes partes do mundo. Por que existe essa divisão?

INTERROGANTE: A divisão é realmente total? Veja, até o homem que responde ao ódio com ódio vê que isso não faz sentido, não é natural, e deveria ser diferente.

K: Deveria ser diferente, mas ele ainda está lutando com ideias. Está tentando sair fora disso usando o pensamento, o que produz a escuridão.

I: Quero apenas dizer que a divisão não parece tão integral.

K: Oh, mas a divisão é integral, completa.

I: Bem, então por que as pessoas não estão simplesmente dizendo: vamos continuar a viver dessa maneira, e vamos aproveitá-la até o último momento?

K: Porque não conseguem enxergar nada além da sua própria escuridão.

I: Contudo elas querem se libertar dela.

K: Espere um instante. Elas querem se livrar dela? Elas realmente percebem o estado em que estão, e deliberadamente querem sair dele?

I: Elas são ambivalentes a respeito. Querem continuar a obter os frutos da escuridão, mas têm uma sensação de que a coisa está errada e que conduz ao sofrimento.

DB: Ou então elas julgam que não podem fazer nada a respeito. Veja bem, quando chega a ocasião de elas vivenciarem a raiva ou o prazer, não conseguem escapar.

K: Elas não podem fazer nada a respeito.

I: Mas elas querem se libertar, embora estejam indefesas. Há forças que são mais poderosas do que a sua vontade.

K: O que faremos então? Ou será que essa divisão é falsa?

DB: Esse é o ponto. Seria melhor se falássemos a respeito de uma diferença entre essas duas abordagens. Essa diferença não é fundamental.

K: Não penso que elas tenham qualquer coisa em comum.

DB: Por quê? Você diz que a diferença é falsa, embora fundamentalmente as pessoas sejam as mesmas, mas que uma diferença se desenvolveu entre elas. Talvez a maior parte das pessoas tenha dado um passo na direção errada.

K: Sim, vamos colocar as coisas assim.

DB: Mas a diferença não é intrínseca, não é estrutural, não está embutida como a diferença entre uma árvore e uma pedra.

K: Concordo. Como você diz, há uma diferença entre uma pedra e uma árvore, mas não é assim. Sejamos simples. Há duas respostas. Elas começam da origem; uma tomou uma direção, e a outra tomou uma direção diferente. A origem, porém, é a mesma. Por que ambas não avançaram na direção correta?

DB: Não conseguimos responder a isso. Eu estava exatamente dizendo que se uma pessoa entender isso, e depois voltar à origem, ela não terá que dar o passo na direção errada. Em certo sentido, estamos continuamente dando o passo errado, de forma que se pudermos entender isso, torna-se então possível mudar; e estamos continuamente começando da mesma origem, e não voltando a ela no tempo.

K: Espere um minuto, espere um minuto.

DB: Há duas maneiras de interpretar a nossa declaração. Uma é dizer que a origem está no tempo, que bem longe no passado começamos juntos e tomamos caminhos diferentes. A outra maneira é dizer que a origem não está ligada ao tempo, e que estamos continuamente dando o passo errado. Certo?

K: Sim, constantemente dando o passo errado. Por quê?

I: Isso significa que há possibilidade permanente de darmos o passo certo.

K: Sim, naturalmente. É isso. Se dissermos que há uma origem a partir da qual todos começamos, seremos capturados no tempo.

DB: Não podemos voltar.

K: Não, isso está eliminado. Consequentemente, é evidente que estamos dando o passo errado o tempo todo.

DB: Constantemente.

K: Estamos constantemente dando o passo errado. Mas por quê? Aquele que vive com a visão intuitiva e o outro que não vive com ela — são permanentes? O homem que vive na escuridão pode ir a qualquer momento para o outro lado. Esse é o ponto. Em qualquer ocasião.

DB: Então nada o segura, a não ser o fato de ele estar constantemente dando o passo errado. Poderíamos dizer que a escuridão é tal, que ele não percebe que está dando o passo errado.

K: Estamos indo na direção certa, fazendo a pergunta correta? Suponha que você tenha essa visão intuitiva, e que a sua escuridão, o centro mesmo da escuridão, tenha sido completamente dissipado; e que eu, um ser humano sério, razoavelmente inteligente, escute-o; e não importa que pareça razoável, racional, sensato, qualquer coisa que você tenha dito. Eu questiono a divisão. Ela é criada pelo centro que produz a escuridão. O pensamento a criou.

DB: Bem, na escuridão, o pensamento cria a divisão.

K: Uma sombra é arremessada da escuridão; ela faz uma divisão.

DB: Se tivermos essa visão intuitiva, diremos que não há divisão.

K: Sim. E o homem não aceitará isso, porque na sua escuridão não há nada, exceto a divisão. Nós, então, morando na escuridão, criamos a divisão. Nós a criamos nos nossos pensamentos...

DB: Estamos criando-a continuamente.

K: Sim, estamos sempre querendo viver permanentemente num estado no qual não há divisão. Esse movimento, contudo, ainda é o movimento da escuridão. Certo?

DB: Sim.

K: Como poderei dissipar essa escuridão contínua e permanente? Essa é a única pergunta, porque, enquanto eu existo, crio essa constante divisão. Veja, isso é andar em círculos. Só posso dissipar a escuridão através da visão intuitiva, e não posso obter essa visão intuitiva através de qualquer esforço da vontade, de modo que sou deixado com nada. Então, qual meu problema? Meu problema é perceber a escuridão, perceber o pensamento que está criando a escuridão, e compreender que o self é a origem dessa escuridão. Por que não posso perceber isso? Por que não posso vê-lo nem mesmo de forma lógica?

DB: Bem, logicamente, está claro.

K: Sim, mas de algum modo não parece funcionar. Então o que farei? Percebo pela primeira vez que o self cria a escuridão que está constantemente formando a divisão. Vejo isso muito claro.

DB: E a divisão produz, de qualquer forma, a escuridão.

K: Vice-versa, de trás para diante. E a partir de tudo isso, todas as coisas começam. Vejo isso muito claro. O que farei então? Portanto não admito a divisão.

I: Krishnaji, não estamos, contudo, introduzindo novamente a divisão quando dizemos que existe o homem que precisa da visão intuitiva?

K: Mas o homem tem a visão intuitiva. "X" possui a visão intuitiva, e ele explicou muito claramente como a escuridão desapareceu. Eu o escuto, e ele afirma que a sua própria escuridão está criando a divisão. Esta, na verdade, não existe, não há nenhuma divisão como luz e escuridão. Então ele me pergunta como podemos banir, como podemos afastar esse sentido de divisão?

DB: Você parece estar trazendo de volta uma divisão ao dizer que eu deveria fazê-lo, entende?

K: Não, "deveria" não.

DB: De certa forma você está dizendo que o processo mental de pensamento parece criar espontaneamente a divisão. Você diz, tente colocá-lo de lado e, ao mesmo tempo, ele está tentando fazer a divisão.

K: Entendo. Mas a minha mente pode afastar a divisão? Ou essa é uma pergunta errada?

I: Pode ela afastar a divisão enquanto ela própria está dividida?

K: Não, não pode. Então o que devo fazer? Ouça. "X" diz algo tão extraordinariamente verdadeiro, de um significado e de uma beleza tão imensos que todo o meu ser diz "Apreenda-o". Isso não é uma divisão. Reconheço que sou o criador da divisão, porque vivo na escuridão, e então a partir desta escuridão, eu crio. Mas escutei "X", que afirma que não há divisão e reconheço que essa é uma afirmação extraordinária. Portanto, o próprio fato de isso ser dito a alguém que tem vivido numa divisão permanente tem um efeito imediato. Certo?

DB: Penso que temos, como você diz, de afastar a divisão...

K: Abandonarei isso; não o afastarei. Quero me aprofundar nessa afirmação de que não há divisão. Estou chegando a algum lugar com ela. A afirmação de "X", a partir dessa visão intuitiva, de que não há divisão, tem um tremendo efeito sobre mim. Tenho vivido constantemente na divisão e ele se aproxima e diz que ela não existe. Que efeito isso tem sobre mim?

DB: Você diz então que não há divisão. Isso faz sentido. Mas por outro lado, parece que ela existe.

K: Reconheço a divisão, mas a declaração de que ela não existe tem esse impacto imenso sobre mim. Parece natural, não? Quando vejo algo que é inabalável, isso deve ter algum efeito sobre mim. Respondo com um tremendo choque.

DB: Veja, se você estivesse falando sobre alguma coisa que se encontrasse à nossa frente, e dissesse: "Não, não é dessa maneira", isso mudaria, naturalmente, todo nosso modo de vê-la. Então, você diz que a divisão não é dessa maneira. Tentamos olhar e ver se é de fato assim — correto?

K: Nem mesmo digo: "É assim?". "X" explicou cuidadosamente todo o assunto, e diz no final que não há divisão. Além disso, sou sensível, observo cuidadosamente, e percebo que estou permanentemente vivendo em divisão. Quando "X" faz essa afirmação, ele rompe o padrão. Está acompanhando o que estou tentando explicar? Ele rompeu o padrão porque disse uma coisa que é fundamentalmente verdadeira. Não existe Deus e o homem. Certo, senhor, mantenho-me fiel a isso. Vejo algo — que é: onde há o ódio não existe o outro. Porém, ao odiar, eu quero o outro. Desse modo, uma divisão constante nasce da escuridão; e a escuridão é permanente. Mas tenho escutado muito cuidadosamente, e "X" faz uma afirmação que parece absolutamente verdadeira. Isso penetra em mim, e o ato dessa afirmação dissipa a escuridão. Não estou fazendo um esforço para me livrar da escuridão, mas "X" é a luz. Exatamente, eu mantenho essa posição. Chegamos então a uma coisa, que é: posso eu escutar com a minha escuridão — na minha escuridão, que é permanente? Nessa escuridão, posso lhe escutar? Naturalmente que sim. Vivo em constante divisão, o que causa a escuridão. "X" se aproxima e me diz que não há divisão.

DB: Certo. Entretanto, por que diz que pode escutar na escuridão?

K: Oh, sim, posso escutar na escuridão. Se isso não for possível, estarei condenado.

DB: Mas isso não é um argumento.

K: Claro que não é um argumento, mas é assim!

DB: Não vale a pena viver na escuridão; mas agora estamos dizendo que é possível ouvir na escuridão.

K: Ele, "X", explica-me, muito, muito cuidadosamente. Eu sou sensível, tenho-o escutado em minha escuridão, mas isso está me tornando sensível, vivo, observador. É isso que tenho feito. Temos feito isso juntos; e ele afirma que não há absolutamente nenhuma divisão; e sei que estou vivendo em divisão. Essa própria afirmação fez com que o constante movimento chegasse a um fim. Caso contrário, se isso não ocorrer, não terei nada — entende? Estou perpetuamente vivendo na escuridão. Há, porém, uma voz no deserto, e ouvir essa voz tem um efeito extraordinário.

DB: Ouvir atinge a origem do movimento, ao passo que observar, não.

K: Sim, observei, escutei, participei de todos os tipos de jogos durante toda minha vida; e agora vejo que existe apenas uma coisa. Que existe essa escuridão permanente e que estou atuando na escuridão; nesse deserto que é a escuridão; cujo centro é o self. Percebo isso totalmente, completamente; não posso lutar mais contra isso. "X" então se aproxima e me diz isso. Nesse deserto uma voz afirma que existe água. Entende? Não é esperança. Há uma ação imediata em mim. A pessoa tem de perceber que esse movimento constante na escuridão é a sua vida. Percebe o que estou dizendo? Posso eu, com toda a experiência, com todo o conhecimento que reuni em um milhão de anos, de repente verificar que estou vivendo numa total escuridão? Porque isso significa que atingi o fim de qualquer esperança. Certo? Mas a minha esperança também é escuridão. O futuro está eliminado como um todo, de forma que sou deixado com essa enorme escuridão, e estou lá. Isso quer dizer que a percepção disso é o final da transformação. Atingi o ponto em que "X" me diz que isso é natural. Veja, todas as religiões disseram que essa divisão existe.

DB: Sim, mas elas dizem que ela pode ser superada.

K: É o mesmo padrão que se repete. Não importa quem o disse, mas o fato é que alguém nesse deserto está dizendo alguma coisa, e que nesse deserto tenho escutado todas as vozes, inclusive a minha, o que deu origem a uma escuridão ainda maior. E, contudo, isso está correto. Quer dizer que quando existe a visão intuitiva não há separação, não é?

DB: Sim.

K: Não é a sua visão intuitiva ou a minha visão intuitiva, é visão intuitiva simplesmente; e nela não há divisão.

DB: Sim.

K: O que nos conduz à base à qual nos referimos...

DB: Como assim?

K: Naquela base não há escuridão como escuridão, ou luz como luz. Naquela base não há divisão. Nada tem origem na vontade, no tempo, ou no pensamento.

DB: Está dizendo que aquela luz e aquela escuridão não estão divididas?

K: Exatamente.

DB: O que é a mesma coisa que dizer que não há nem uma nem outra.

K: Nenhuma nem outra; é isso mesmo! Há algo mais. Há uma percepção de que existe um movimento diferente, que é "não-dualista".

DB: O que significa não-dualista? Que não há divisão?

K: Não há divisão. Não empregarei o termo "não-dualista". Não há divisão.

DB: Mas contudo existe movimento.

K: Naturalmente.

DB: Então, o que isso quer dizer, sem divisão?

K: Quero me referir ao movimento, o movimento que não é tempo. Esse movimento não cria a divisão. Portanto, quero voltar, chegar à base. Se, nessa base, não há nem escuridão nem luz, nem Deus nem o filho de Deus - não há divisão — o que acontece então? Você diria que a base é movimento?

DB: Bem, poderia ser, sim. O movimento é indiviso.

K: Não. Eu diria que existe movimento na escuridão.

DB: Sim, mas dissemos que não há divisão de escuridão e luz, e contudo você disse que há movimento.

K: Sim. Diria você que a base é movimento interminável?

DB: Sim.

K: O que isso quer dizer?

DB: Bem, é difícil de expressar.

K: Continue se aprofundando nisso; vamos expressá-lo. O que é o movimento, sem ser o movimento daqui para ali, sem ser a partir do tempo — há qualquer outro movimento?

DB: Sim.

K: Existe. O movimento de ser para o devir psicologicamente. Há o movimento da distância, há o movimento do tempo. Dizemos que tudo isso são divisões. Existe um movimento onde não haja divisão? Quando afirmou que não existe divisão, há com certeza esse movimento?

DB: Bem, você está dizendo que quando não há divisão esse movimento está ali?

K: Sim, e afirmei que "X" diz que ele é a base.

DB: Correto.

K: Diria que não há fim, não há começo?

K: O que significa tempo, mais uma vez.

DB: Podemos dizer que o movimento não possui forma?

K: Não possui forma — tudo isso. Quero ir um pouco mais adiante. O que estou perguntando é que quando você afirmou que não há divisão, isso significa que não há divisão no movimento.

DB: Ele flui sem divisão, entende?

K: Sim, é um movimento no qual não há divisão. Será que consigo captar o significado disso? Será que entendo a profundidade dessa afirmação? Um movimento onde não há divisão; o que significa que não existe tempo nem distância como os conhecemos. Não há nenhum elemento de tempo nele. Então estou tentando verificar se esse movimento circunda o homem.

DB: Sim, ele o envolve.

K: Quero chegar lá. Estou preocupado com a espécie humana, com a humanidade, que sou eu. "X" fez várias afirmações e eu captei uma afirmação que parece absolutamente verdadeira — que não há divisão. O que significa que não há nenhuma ação que seja divisora.

DB: Sim.

K: Percebo isso; e também pergunto se esse movimento não possui tempo, etc... Parece que ele é o mundo, entende?

DB: O universo.

K: O universo, o cosmos, o todo.

DB: A totalidade.

K: A totalidade. Não há uma expressão no mundo judaico que diz: "Apenas Deus pode dizer: eu sou"?

DB: Bem, é assim que a linguagem é construída. Não é necessário expressá-la.

K: Não, eu entendo. Percebe aonde estou querendo chegar?

DB: Sim, que somente esse movimento é.

K: Pode a mente pertencer a esse movimento? Porque ele é eterno, e portanto imortal.

DB: Sim, o movimento não contém a morte; na medida em que a mente toma parte nele, ele é o mesmo.

K: Entende o que estou dizendo?

DB: Sim. Mas o que é que morre quando o indivíduo morre?

K: Isso não tem significado, pois, uma vez que eu tenha compreendido que não existe divisão...

DB: ... então isso não é importante.

K: A morte não tem significado.

DB: Ela ainda possui um significado em algum outro contexto.

K: Oh, o término do corpo; isso é totalmente irrelevante. Mas você entende? Quero captar o significado da afirmação de que não há divisão; ela quebrou o encantamento da minha escuridão, e eu percebo que existe um movimento, e isso é tudo. O que significa que a morte tem um significado muito pequeno.

DB: Sim.

K: Você aboliu completamente o medo da morte.

DB: Sim, entendo que quando a mente está participando desse movimento, ela é esse movimento.

K: Isso é tudo! A mente é esse movimento.

DB: Você diria que a matéria também é esse movimento?

K: Sim, diria que tudo é esse movimento. Na minha escuridão, escutei "X". Isso é extremamente importante. E esse discernimento rompeu meu encantamento. Quando ele disse que não há divisão, ele aboliu a divisão entre a vida e a morte. Não tenho certeza se você está percebendo isso.

DB: Sim.

K: Uma pessoa nunca poderá dizer, então: "Sou imortal". Isso é muito infantil.

DB: Sim, isso é a divisão.

K: Ou: "Estou em busca da imortalidade"; ou: "Estou me transformando!" Acabamos com todo esse sentido de nos movermos na escuridão.

I: Qual seria, então, a importância do mundo? Existe alguma importância nele?

K: No mundo?

I: Com o homem.

DB: Quer dizer, com a sociedade?

I: Sim, parece que quando você faz essa afirmação, não há divisão e que a vida é a morte — qual é então a importância do homem com toda sua luta...?

K: O homem na escuridão. Que importância tem isso? É como nos debatermos numa sala trancada. Essa é toda a questão.

DB: A importância só pode surgir quando a escuridão for dissipada.

K: Naturalmente.

I: A única coisa significativa é a dissipação da escuridão.

K: Oh, não, não!

DB: Não estamos dizendo que algo mais pode ser feito além de dissipar a escuridão?

K: Escutei com bastante cuidado tudo que você, que possui visão intuitiva falou. O que você fez foi dissipar o centro. Na escuridão eu podia inventar muitas coisas importantes; que existe luz, que existe Deus, que existe beleza, que existe isso e aquilo. Mas tudo isso ainda está na área da escuridão. Seu eu ficar preso numa sala escura, posso inventar uma porção de imagens, mas quero obter algo mais. A mente é a única que possui essa visão intuitiva — e que portanto dissipa a escuridão e tem uma compreensão da base que é movimento sem tempo — essa mente em si é o movimento?

DB: Sim, mas não a totalidade. A mente é o movimento, mas estamos dizendo que o movimento é matéria, que o movimento é mente. Além disso, estávamos dizendo que a base poderá estar além da mente universal. Você disse anteriormente que o movimento, que a base, é mais do que a mente universal, mais do que o vazio.

K: Dissemos isso; muito mais do que isso.

DB: Muito mais. Mas temos de esclarecer isso. Dissemos que a mente é esse movimento.

K: Sim, a mente é o movimento.

DB: Não estamos dizendo que esse movimento é apenas a mente?

K: Não, não, não.

DB: Esse é o ponto que eu estava tentando corrigir.

K: A mente é o movimento — mente, no sentido de "a base".

DB: Mas você disse que a base vai além da mente.

K: Espere um minuto: o que quer dizer com "ir além da mente"?

DB: Voltando ao que examinamos há alguns dias: dissemos que temos o vazio, a mente universal, e depois, que a base está além de tudo isso.

K: Diria que ela está além desse movimento?

DB: Sim. A mente emerge do movimento como uma base, e cai de volta na base; é isso que estamos dizendo.

K: Sim, exatamente. A mente emerge do movimento.

DB: E ela morre no movimento.

K: Isso mesmo. Ela tem sua existência no movimento.

DB: E a matéria também.

K: Concordo. Então, eis aonde quero chegar: sou um ser humano que está enfrentando esse fim e esse começo. E "X" elimina isso.

DB: Sim, não é fundamental.

K: Não é fundamental. Um dos maiores temores da vida, que é a morte, foi eliminado.

DB: Sim.

K: Percebe o que significa para um ser humano o fato de não haver a morte? Significa que a mente não envelhece — estou me referindo à mente comum. Não sei se estou conseguindo transmitir isso.

DB: Vamos devagar. Você diz que a mente não envelhece, mas e o fato de as células do cérebro envelhecerem?

K: Questiono isso.

DB: Mas como podemos ter certeza disso?

K: Porque não há conflito, porque não há tensão, não há transformação, não há movimento.

DB: Isso é uma coisa que é difícil de transmitir com certeza.

K: Naturalmente. Não podemos provar nada disso.

DB: Mas, quanto ao outro, dissemos até aqui...

K: ... que podemos raciocinar a respeito dele.

DB: Isso é lógico, e também podemos senti-lo. Mas agora você está afirmando uma coisa sobre as células cerebrais a respeito da qual não sinto nada. Talvez seja assim; poderia ser assim.

K: Penso que é assim. Não vou discutir isso. Quando uma mente viveu na escuridão e está em constante movimento, existe o desgaste, a degeneração das células.

DB: Poderíamos dizer que esse conflito fará com que as células degenerem. Mas alguém poderá argumentar que talvez mesmo sem conflito elas se degenerariam numa taxa mais lenta. Digamos que se vivêssemos centenas de anos, por exemplo, com o tempo as células se degenerariam, não importa o que fizéssemos.

K: Vá devagar.

DB: Posso facilmente aceitar que a taxa de degeneração das células seria reduzida se nos livrássemos do conflito.

K: A degeneração pode ser reduzida.

DB: Talvez bastante.

K: Bastante. Noventa por cento.

DB: Isso poderíamos entender. Mas se disser cem por cento, fica difícil de entender.

K: Noventa por cento. Espere um pouco. Ela pode ser muito, enormemente reduzida. E isso significa o quê? O que acontece a uma mente que não tem conflito? O que é essa mente, qual é a qualidade dessa mente que não tem problemas? Veja, suponha que uma mente viva num ar puro e despoluído com a espécie adequada de alimento, e assim por diante; por que ela não pode viver duzentos anos?

DB: Bem, é possível, algumas pessoas viveram cento e cinquenta anos, num ar bastante puro e comendo boa comida.

K: Mas veja, se essas mesmas pessoas que viveram cento e cinquenta anos não tivessem conflito, poderiam viver muito mais tempo.

DB: Talvez. Li a respeito de um caso de um homem na Inglaterra que viveu até cento e cinquenta anos. Os médicos ficaram interessados nele. Deram-lhe vinho e jantares, e ele morreu em poucos dias!

K: Pobre coitado!

I: Krishnaji, você normalmente diz que qualquer coisa que viva no tempo também morre no tempo.

K: Sim, mas o cérebro, que teve a visão intuitiva, alterou as suas células.

I: Está insinuando que até o cérebro orgânico não vive mais no tempo?

K: Não, não introduza ainda o tempo. Estamos dizendo que a visão intuitiva acarreta uma mudança nas células cerebrais. O que significa que as células cerebrais não pensam mais em termos de tempo.

I: Do tempo psicológico?

K: Naturalmente, isso está claro.

DB: Se elas não estiverem tão perturbadas, permanecerão em bom estado e possivelmente se degenerarão mais lentamente. Talvez possamos aumentar o limite de idade de cento e cinquenta para duzentos anos, desde que a pessoa tenha também uma vida saudável em todos os níveis.

K: Sim, mas tudo isso soa muito superficial.

DB: Sim, não parece fazer muita diferença, embora seja uma idéia interessante.

K: E se eu viver mais cem anos? Estamos tentando descobrir qual o efeito que esse extraordinário movimento tem sobre o cérebro.

DB: Sim. Se dissermos que o cérebro está de algum modo diretamente envolvido nesse movimento, isso o faria ficar em boas condições. Existe, porém, um fluxo direto, fisicamente.

K: Não apenas fisicamente.

DB: Mas também mentalmente.

K: Sim. Ambos. Isso deve ter um efeito extraordinário sobre o cérebro.

I: Você se referiu anteriormente à energia. Não à energia de todo dia...

K: Dissemos que o movimento é energia total. Essa visão intuitiva captou, viu, esse extraordinário movimento, e ele é parte dessa energia. Quero me aproximar muito mais da terra; tenho vivido com o medo da morte, medo de não vir a ser, e assim por diante. De repente, percebo que não há divisão, e compreendo a coisa toda. O que aconteceu então ao meu cérebro — entende? Vamos ver uma coisa; ver toda essa coisa, não verbalmente, mas como uma tremenda realidade, como a verdade. Com todo o seu coração, sua mente, você percebe essa coisa. Essa própria percepção deve afetar o seu cérebro.

DB: Sim, ela produz ordem.

K: Não apenas ordem na vida mas também no cérebro.

DB: É possível provar que quando estamos sob tensão, as células cerebrais começam a degenerar e que se temos ordem nessas células, as coisas são bem diferentes.

K: Tenho um sentimento, senhor — não ria dele; talvez ele seja falso, talvez seja verdadeiro — sinto que o cérebro nunca perde a qualidade desse movimento.

DB: Uma vez que a possua.

K: Naturalmente. Estou falando da pessoa que acabou com tudo isso.

DB: Portanto, provavelmente, o cérebro nunca perde essa qualidade.

K: E consequentemente ele não está mais envolvido no tempo.

DB: Ele não seria mais dominado pelo tempo. O cérebro, com base no que estávamos dizendo, não está evoluindo em qualquer sentido; é apenas uma confusão. Não podemos dizer que o cérebro do homem evoluiu durante os últimos dez mil anos. Veja, a ciência e o conhecimento evoluíram, mas as pessoas sentem hoje a respeito da vida o mesmo que sentiam há milhares de anos.

K: Quero descobrir o seguinte: o cérebro está absolutamente imóvel nesse vazio silencioso que atravessamos? No sentido de não ter movimento.

DB: Não completamente. Veja, o sangue passa pelo cérebro.

K: Não estamos falando disso.

DB: Que espécie de movimento estamos estudando?

K: Estou me referindo ao movimento do pensamento, o movimento de qualquer reação.

DB: Sim. Não há nenhum movimento no qual o cérebro se mova de forma independente. Disse que existe o movimento do todo, mas o cérebro não parte por conta própria, como pensamento.

K: Veja bem, você aboliu a morte, o que é uma coisa extremamente importante; e você pergunta o que é o cérebro, a mente, quando não há a morte. Entende? Ele passou por uma operação cirúrgica.

DB: Dissemos que o cérebro normalmente possui bem no fundo, de modo contínuo, a noção da morte, e que essa noção está permanentemente perturbando o cérebro, porque este antevê a morte, e tenta impedi-la.

K: Impedir o próprio fim, e assim por diante.

DB: Ele antevê tudo isso, e pensa que deve impedi-lo, mas não pode.

K: Não pode.

DB: E consequentemente ele tem um problema.

K: Uma luta permanente com ela; e desse modo, tudo isso chega a um fim. Que coisa extraordinária aconteceu! Como isso afeta minha vida diária, considerando que eu tenha que viver nesta terra? Minha vida diária é agressão, esse vir a ser interminável, essa luta pelo sucesso — tudo isso passou. Prosseguiremos com isso, embora tenhamos compreendido bastante hoje.

DB: Ao introduzir o assunto da vida diária, podemos apresentar o tema da compaixão.

K: Naturalmente. Esse movimento é compaixão?

DB: Ele estaria além dela.

K: Exatamente. É por isso que temos de ser extremamente cuidadosos.

DB: Então, mais uma vez, a compaixão deve surgir dela.

Diálogo entre Krishnamurti e David Bohm em 17 de abril de 1980, Ojai, Califórnia

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill