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quarta-feira, 3 de julho de 2013

Destruindo o poder criador de ilusões

Quase todos nós vivemos num mundo imaginário. Todas as nossas crenças são ilusões, sem validade alguma. E para se despojar a mente de todas as formas de ilusão e do poder de criar ilusões, requer-se percebimento claro e penetrante, capacidade de raciocinar com acerto, sem fugas nem desvios. Um intelecto sem temor, que não se oculta atrás de desejos secretos, um intelecto tranquilo, sem conflito algum — esse intelecto, essa mente é capaz de perceber o que é verdadeiro, de ver se Deus existe. Não me refiro à palavra “Deus”, mas ao que esta palavra representa, algo que transcenda as medidas das palavras e do tempo — se tal coisa existe. Para se descobrir, é óbvio que devem terminar todas as formas de ilusão e o poder de criar ilusões. E despojar a mente de todas as ilusões é, para mim, a propriedade da meditação. Eu sinto que através da meditação se penetra num vasto campo de extraordinários descobrimentos — não invenções, não visões, porém algo inteiramente diferente, realmente existente além do tempo, além das coisas fabricadas pela mente humana em sua busca secular. Se uma pessoa deseja realmente descobrir, por si própria, deverá lançar a base correta, e a base correta é a meditação. O copiar um padrão, o seguir um sistema, o observar um dado método de meditação — tudo isso é extremamente infantil, imaturo demais; é mera imitação e não conduz a parte alguma, ainda que produza visões.

A base correta para se descobrir se existe uma realidade além das crenças que a propaganda inculcou na mente de cada um, essa base só pode ser criada pelo autoconhecimento. O conhecer a si mesmo é, exatamente, meditação. Conhecer a si mesmo não é conhecer o que se deveria ser. Por isso não tem vitalidade, nem realidade, e não passa de mera ideia ideal. Mas compreender o que é, compreender o fato real — o que somos — momento por momento, isso requer que se liberte a mente de seu condicionamento. Pela palavra “condicionamento”, entendo tudo o que a sociedade nos impôs, tudo o que a religião nos inculcou, pela propaganda, pela insistência, pela crença, pelo medo do céu e do inferno. Inclui o condicionamento referente à nacionalidade, ao clima, aos costumes, à tradição, à cultura como francês, hindu ou russo, e às inumeráveis crenças, superstições, experiências que constituem todo o fundo (background) em que vive a consciência e que se consolidou em consequência de nosso desejo de segurança. É a investigação e a destruição desse fundo que constitui a base correta para a meditação.

Sem liberdade não se pode ir muito longe; apenas divagamos para a ilusão, e isso nada significa. Se desejamos descobrir se existe ou não a Realidade, se de fato almejamos levar a cabo este descobrimento — sem ficarmos apenas a brincar com ideias, por mais agradáveis, intelectuais, razoáveis ou aparentemente sensatas que sejam — necessitamos de liberdade, cumpre estar livre de conflito. E isso é dificílimo. É relativamente fácil fugir ao conflito; pode-se seguir um método, tomar uma pílula, um calmante, uma bebida, e perder a consciência do conflito. Mas o penetrar profundamente a questão do conflito requer atenção. (...) só se pode estar atento quando não há barreiras para a mente.(...) Na atenção não há distração. (...) Isso talvez seja algo novo para vocês; mas se o experimentarem em si mesmos, verão que existe uma qualidade de atenção capaz de escutar, de ver, de observar sem nenhum senso de identificação; nela, há visão completa, observação completa, por conseguinte, nenhuma exclusão. (...)Assim, vocês mesmos devem descobrir se é possível, vivendo-se neste mundo — tendo-se de ganhar a vida, de viver a vida de família, com sua entediante rotina diária, suas ansiedades, o “sentimento de culpa” — se é possível penetrar muito profundamente, ultrapassar a consciência e viver sem conflito interior.

O conflito, certamente, existe quando desejamos “vir a ser” alguma coisa. Existe, quando há ambição, cobiça, inveja. E é possível viver neste mundo sem ambição, sem cobiça? Ou o homem está destinado inapelavelmente a ser perpetuamente cobiçoso, ambicioso, “culpado”, etc.? E é possível eliminar tudo isso? Porque, se não for eliminado, não se pode ir muito longe, uma vez que isso restringe o pensamento. E eliminar da consciência todo esse processo de ambição, inveja, cobiça, é meditação. A mente ambiciosa não tem nenhuma possibilidade de saber o que é o amor; a mente debilitada pelos desejos mundanos nunca pode ser livre. Isso não quer dizer que a pessoa deva viver sem teto, sem comida, sem roupa, sem certo grau de conforto físico; significa apenas que a mente ocupada com a inveja, com o ódio, a cobiça — seja a cobiça de conhecimentos, de Deus, seja de mais roupas —  por se achar em conflito, jamais pode ser livre. E só a mente livre pode ir muito longe.

Conhecer a si mesmo é o começo da meditação. Sem conhecerem a si mesmos, o repetir uma quantidade de palavras da Bíblia, do Gita, ou de qualquer dos chamados livros sagrados, não tem nenhuma significação. Isso poderá satisfazer a mente, mas uma pílula dá o mesmo resultado. Pelo repetir uma frase mais e mais vezes, o cérebro torna-se naturalmente quieto, sonolento e embotado; e como resultado desse estado de insensibilidade, de embotamento, pode-se ter alguma espécie de experiência, obter certos resultados. Mas a pessoa continua ambiciosa, invejosa, cobiçosa, e cria inimizade. Assim, o aprender a conhecer a si própria, aquilo que a pessoa realmente é, é o início da meditação. (...)

Se desejo aprender a conhecer-me, descobrir o que realmente sou, tenho de estar vigilante a todas as horas, a todos os minutos do dia, para ver como estou me manifestando. Estar vigilante não é condenar ou aprovar, porém, ver o que somos de momento a momento. Pois o que somos está sempre a se modificar, — não é verdade? — nunca é estático.(...) Para seguir esta coisa a que chamo “eu”, com todas as suas nuanças, suas expressões, seus desvios, suas sutilezas, sua astúcia, a mente deve estar muito clara e vigilante, uma vez que o que sou está sempre mudando, se modificando, não é assim? Eu não sou o mesmo de ontem ou de há um minuto, porque cada pensamento e cada sentimento está modificando, moldando a mente. E se lhes interessa somente condenar ou julgar, de acordo com os seus conhecimentos acumulados, seus condicionamentos, não estão então seguindo a coisa, não estão acompanhando, observando. Por conseguinte, o aprender a se conhecer é muito mais importante do que o adquirir conhecimentos a respeito de si mesmos. Não se pode ter um conhecimento estático a respeito de uma cosia viva(...) uma coisa viva está sempre mudando, sempre sofrendo modificações; ela difere a cada minuto, e vocês têm de segui-la, para conhece-la. Vocês não podem compreender os seus filhos se continuamente os estiverem condenando, justificando, ou com eles se identificando; vocês têm que observá-los, sem julgamento, quando dormem, quando choram, quando brincam — a todas as horas.

Assim, o aprender a conhecer a si mesmo é o começo da meditação; aprendendo a se conhecer, todas as ilusões vão se eliminando. E isso é absolutamente essencial, pois, para descobrir o que é verdadeiro — se existe a verdade, algo imensurável — não pode haver ilusão. E há ilusão quando há desejo de prazer, de conforto, de satisfação... Desejando satisfação, vocês criam a ilusão e aí ficam atolados para o resto da vida. Aí estão satisfeitos; e a maioria das pessoas está satisfeita com o acreditar em Deus. Assusta-as a vida, a insegurança, a agitação, a agonia, a “culpa”, a ansiedade, as misérias e tristezas da vida; assim estabelecem, finalmente algo a que chamam Deus, onde se acolhem. E tendo-se rendido à crença, têm visões, e se tornam santos, etc. Isto não é investigar se existe ou não uma realidade. Ela poderá existir e poderá não existir; compete a vocês descobri-lo. E para o descobrirem, precisam de liberdade no começo e não no fim — livres de todas essas coisas, tais como a ambição, a cobiça, a inveja, a fama, o desejo de ser importante e todas as demais infantilidades.

Desse modo, ao aprenderem sobre a própria pessoa, estão penetrando em si mesmos, não apenas no nível consciente, mas também no nível mais profundo, inconsciente, e trazendo à luz todos os secretos desejos, buscas, impulsos, compulsões. Destrói-se então o poder de criar ilusões, porque está lançada a base correta. Quando a mente, o intelecto, se examina, se observa a si mesmo no movimento do viver, nunca deixando sem exame e compreensão um só pensamento ou sentimento, então tudo isso, em sua totalidade, é percebimento. É estar consciente de si mesmo, inteiramente, sem condenação, sem justificação, sem escolha — como quem olha o próprio rosto no espelho. Você não pode dizer então: “Eu desejava ter um rosto diferente”; ele está lá, tal como é.

E com essa autocompreensão, o intelecto — que é mecânico e está sempre “tagarelando”, reagindo a todas as influências, todos os desafios — se torna muito quieto, embora sensível e vivo. Ele não está morto; tornou-se um intelecto ativo, dinâmico, vigilante, mas, ao mesmo tempo, tranquilo, silencioso, porque nenhum conflito tem. Está em silêncio porque eliminou, compreendeu todos os problemas que criara para si. Afinal, um problema só se torna existente quando uma dada questão não foi bem compreendida. Quando o intelecto examinou e compreendeu perfeitamente a ambição, acabou-se o problema da ambição. E, assim, o intelecto se tranquilizou. (...) Não se pode eliminar a ambição ou a cobiça pouco a pouco; aqui não há “mais tarde” nem “no interim”. Ou a eliminamos totalmente, ou ela de modo nenhum é eliminada. Mas, quando se alcança o ponto em que não há mais cobiça, nem inveja, nem ambição, o intelecto está então extremamente tranquilo, sensível e, portanto, livre — e tudo isso é meditação; e então, mas não antes, pode-se ir mais longe. Ir mais longe, sem se ter chegado a este ponto, é mera especulação, sem nenhuma significação.(...) Uma mente insignificante a buscar o imensurável continua insignificante. Por conseguinte, a mente embotada deve transformar-se. (...) para descobrir isso, a mente deve tornar-se completamente quieta, não mesmerizando a si própria, não por meio de disciplina, repressão, ajustamento; tudo isso significa, apenas, substituir um desejo por outro. (...) Nosso intelecto, nossos pensamentos resultam do tempo; assim, pensar a respeito do atemporal nenhuma significação tem. Só quando o intelecto se tranquilizou, quando já não busca, nem evita, nem resiste, porém se acha totalmente tranquilo por ter compreendido todo este mecanismo, só então nessa tranquilidade, se manifesta uma vida de espécie diferente, um movimento que transcende o tempo. 

Krishnamurti — Paris, 21 de setembro de 1961

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill