"O processo da disciplina do Yoga é eliminar as impurezas causadas pelo processo do condicionamento, de modo que a Luz do Puro Percebimento Incondicionado possa brilhar." — Patañjali (150 D.C)
Pode-se perguntar: a disciplina não tem lugar na verdadeira espiritualidade? A vida espiritual é uma vida indisciplinada? Se for, não resultaria em desperdício de nossas energias? E a energia não é necessária para viver a vida espiritual? Parece muito claro que o desperdício de energia deve ser eliminado em TODOS OS NÍVEIS, o que indica que a energia DEVE SER CONSERVADA. Além disso, precisamos conhecer o segredo da renovação de nossa energia se quisermos avançar na direção das expressões criativas da vida espiritual.
É bastante óbvio que a conservação de energia é possível apenas em uma vida disciplinada. Mas, se a planta da vida espiritual floresce em uma atmosfera de liberdade e espontaneidade, como podem ser reconciliadas a liberdade e a disciplina? De hábito, liberdade e disciplina são consideradas contraditórias e, por consequência, mutuamente exclusivas. Porém, o fato é que apenas aquele que é totalmente livre pode ser, na verdade, disciplinado. Sem liberdade, a disciplina é uma imposição, seja de fora ou de dentro. Muitas vezes uma pessoa afirma que não aceita qualquer disciplina que seja imposta por uma autoridade externa, mas esta pessoa esquece que a chamada autoridade interna é também um produto de fatores condicionantes. A autoridade interna é realmente um produto de forças sociais e culturais que invadem o indivíduo, advindas da sociedade ou do grupo ideológico ao qual pertence. A liberdade exige uma completa eliminação da autoridade tanto externa quanto interna. É apenas então que o indivíduo, TORNANDO-SE INDEPENDENTE, assume a completa responsabilidade por tudo o que faz. Com certeza, é no clima de tal responsabilidade que a verdadeira disciplina cresce. Quando o homem compreende que nenhuma autoridade pode salvá-lo NEM MESMO A AUTORIDADE INTERNA, assim, SOZINHO, ele está supremamente disciplinado. Nesta compreensão da auto-responsabilidade, ele sabe que precisará de toda sua energia, e, em consequência, não pode permitir que seja desperdiçada. Sem tal senso de responsabilidade, a disciplina não tem valor, e, quando a responsabilidade é despertada, surge a disciplina natural e espontaneamente.
Quando somos completamente responsáveis por nós mesmos, começamos a viver no verdadeiro sentido da palavra. Sabe-se que uma ação que emerge da ação correta tem a qualidade da verdadeira disciplina. É uma disciplina que emana da própria ação de viver. Não é baseada em um ideal, que tentamos traduzir para nossa conduta diária; surge no próprio processo do aprendizado. Aprendemos, e este mesmo ato de aprender cria sua própria disciplina. É como um rio que, na própria ação de fluir, cria sua própria disciplina em função das suas margens. Estas não são criadas com antecedência. Podemos criar tais margens e descobrir que o rio tomou um curso totalmente diferente. Isso é verdadeiro igualmente com relação ao rio da vida. Se seu fluxo é mantido ininterrupto, este mesmo fluxo cria sua própria disciplina. Quando o fluxo sofre obstrução, começam os desordenamentos. É a mente do homem, com suas conclusões e interesses encobertos, que cria obstruções ao fluxo da vida. É o sentimento de posse que interrompe o fluxo da vida, gerando caos e confusão. Há uma disciplina inerente ao fluxo da vida. É suficiente olhar a natureza para ver que todas as suas atividades são perfeitamente disciplinadas. No entanto, não é uma disciplina aparte da vida. O ato de viver é um estado dinâmico. O dinamismo da vida exige uma disciplina que surge no próprio ato de viver.
Rohit Mehta - Yoga: A arte da integração