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terça-feira, 1 de setembro de 2015

Existe alguma diferença entre pensador e o pensamento?

[...] Existe o pensador, a entidade separada do pensamento, separada dos pensamentos maus e incontroláveis? Tenha a bondade de observar a sua própria mente. Dizemos "há o 'eu', que deseja permanecer separados dos pensamentos maus, dos pensamentos instáveis, erradios". Isto é: há o "eu" que diz: "este é um pensamento extravagante", "esta é uma má ação"", "isto é bom", "isto é mau", "preciso controlar este pensamento", "preciso reter este pensamento". É isso o que sabemos. A pessoa, o "eu", o pensador, o juiz, a entidade julgadora, o censor, é diferente de tudo isso? O "eu" é diferenciado do pensamento, da inveja, do que é mau? O "eu" que se diz distinto de uma coisa má está sempre lutando para sobrepujá-la, dominá-la, lutando para tornar-se alguma coisa. Vocês têm, pois, esta luta, este esforço de banir pensamentos e de "não ser extravagante". 

No próprio "processo" do pensar criou este problema do esforço. Compreendem? É então que nasce a disciplina, o controle, por parte do "eu", do pensamento mau; o esforço do "eu" para tornar-se não invejoso, não violento, para ser isto ou aquilo. Criaram, pois, deveras, o processo do esforço, no qual afiguram o "eu" e a coisa que ele está controlando. este é o fato real de nossa existência de cada dia. 

Ora bem, o "eu" que está observando, o observador, o pensador, o agente é diferente da ação, do pensamento, da coisa que observa? Temos dito, até agora, que o "eu" é diferente do pensamento. Consideremos, pois, esta coisa: "o pensante é diferente do pensamento?" Diz o pensante: "meus pensamentos são erradios, maus; por conseguinte, devo controlá-los, moldá-los, discipliná-los". Nesse processo criou-se o problema do esforço e a fórmula negativa "não-ser". Tenha a bondade de "escutar" o que estou dizendo, sem interpretá-lo; se escutarem com muita atenção, verão surgir algo extraordinário. Como disse, criamos o esforço sob várias formas distintas — de negação e afirmação; tal é a nossa vida de cada dia. 

Mas, existe alguma diferença entre pensador e o pensamento? Investiguem isso. Há diferença? Isto é, se não pensassem, existiria um "eu"? Se não houvesse pensamento, ideia, memória, experiência, existira o "eu"? Vocês dizem ser, o "eu", a entidade superior, a coisa que está acima dos pensamentos a lhes guiar e a lhes governar. Pois bem, se dizem isso, tornem a considerá-lo; não o adotem. Se dizem tal coisa, então essa mesma entidade que pensa a respeito do Atman, continua compreendida na esfera do pensamento. Toda coisa suscetível de ser pensada está na esfera do pensamento. isto é, quando penso a respeito de vocês, no nome próprio que sei, quando os reconheço, já se acham na esfera do meu pensamento, não é verdade? Meu pensamento, está, por conseguinte, em relação com a pessoa de vocês. Assim, pois, o Atman, ou o "eu superior", ou qualquer palavra que preferirem, está sempre na esfera do meu pensamento, não é verdade? Meu pensamento, está, por conseguinte, em relação entre o pensador e o pensamento; eles não constituem dois estados separados, mas um processo unitário. 

Há, pois, tão-somente, pensamento, o qual se divide, a si mesmo, em duas partes — pensador e pensamento, atribuindo ao pensador a preeminência. Esse pensamento cria o "eu", que se torna permanente, porque, na verdade, é este o estado a que ele aspira: a segurança, a permanência, a certeza, — nas relações, com minha esposa, com meu filho, minha sociedade; sempre o desejo de inalterável certeza. O pensamento é desejo; por conseguinte, o pensamento, o desejo, buscando a certeza, cria o "eu". E o "eu", então, se fecha, na permanência e começa a dizer: "preciso controlar os meus pensamentos, preciso banir tal pensamento e adotar tal pensamento." — como se esse "eu" tivesse existência separada. Se observarem, verão não ser, o "eu" separado do pensamento. Aí se faz sentir a importância de se experimentar realmente essa coisa, de que o pensador é o pensamento. Esta é a meditação verdadeira: o descobrir como a mente está sempre produzindo a separação do pensador e do pensamento

Nessas condições, ao reconhecerem esse fato, ao apresentar-se essa percepção, esta compreensão, que acontece aos pensamentos erradios, instáveis, a saltitarem para todos os lados, como borboletas ou macaquinhos? Quando já não existe o censor, quando já não há nenhuma entidade que diz "preciso controlar o pensamento" — que acontece? Sigam bem isso, senhores. Existe então "pensamento errático?" Entendem? Não há nenhuma entidade operando, julgando; por conseguinte, cada pensamento é um pensamento, de per si, e não deve ser comparado e declarado bom ou mau. Por conseguinte, não há divagação ou instabilidade.

Só há pensamentos erráticos, quando o pensamento diz: "estou divagando; não devo fazer aquilo; devo fazer isto". Quando não há o pensador, a entidade que quer controlar o pensamento, então o que nos interessa é só o pensamento, tal qual é, e não como deveria ser. E descobrirão então quanto é belo o observar, na sua realidade, cada pensamento e a respectiva significação; porque, então, não há mais pensamento errático. Eliminem definitivamente o problema do esforço, pois não se pode alcançar a Realidade por meio de esforço; o esforço tem de cessar, para que a Realidade possa apresentar-se. Devem ser receptivos. Não se trata de recompensa ou castigo. Não se trata de uma recompensa às suas boas ações. À sociedade interessa a respeitabilidade de vocês; a Verdade, porém, não. 

Para que a Verdade possa existir, o pensamento deve estar em silêncio. Não deve estar o pensamento estar em busca de recompensa ou punição, e nem ter apreensões. Só nesse estado de espírito em que não há busca, é possível manifestar-se a Verdade. A Verdade resultante de busca não é Verdade nenhuma; não é senão uma voz projetada do "eu", traduzindo-lhe a ambição de preenchimento. Assim, pois, ao perceberem tudo isso, ao perceberem na sua inteireza o quandro em que se mostra como a mente opera, não há então pensamento para controlar nem disciplinar; todo pensamento tem então sua importância; há a observação do pensamento, com o pensamento no papel de observador que observa o pensamento,  coisa essa dificílima de experimentar-se, uma vez que requer uma extraordinária lucidez e tranquilidade de espírito. Todo pensamento é resultado da memória — da memória que não é mais do que um nome. Porque, em verdade, nós pensamos com palavras; o pensamento de vocês é produto ou "projeção" da memória; a memória se constituí de imagens, símbolos, palavras. Portanto, enquanto houver aquela, haverá pensamento. Um homem interessado em compreender o pensamento deve, por conseguinte, compreender todo o processo da sua produção: dar nome, lembrar-se, reconhecer. Só então há a possibilidade de tornar-se, a mente, absolutamente tranquila. Essa tranquilidade vem com a compreensão. Pode então a Verdade dispensar ao indivíduo as suas bençãos, chegar-se a ele, libertá-lo de todos os seus problemas; somente aí surge o ente criador — que não é o homem que pinta quadros, escreve um poema ou trabalha dez horas por dia.

Krishnamurti em, Autoconhecimento — Base da Sabedoria

quinta-feira, 13 de março de 2014

Simplesmente feche seus olhos e observe os pensamento

Simplesmente feche seus olhos e observe os pensamento.
O que acontece?
Os pensamentos estão aí dentro, mas você não está.
O observador sempre está além.
O observador sempre está no alto da montanha.
Todas as coisas se movem o redor, mas o observador está além.
O observador nunca está dentro, não pode nunca ser o de dentro - ele está sempre fora.
Observar significa estar fora.
Pode chamar esse fenômeno de testemunho, de percepção, de consciência, ou seja lá do que quiser, mas o segredo é: observe!

Assim, sempre que sentir que sua cabeça está demais, sente-se sob uma árvore e observe, não tente sair.
Quem sairá? - não há ninguém dentro.
Como você pode sair?
Pode continuar tentando e tentando, e ir se envolvendo cada vez mais.
Pode até ficar louco, mas nunca sairá.
Uma vez que você sabe que num momento de vigilância está além, transcendendo - já está fora.
A partir desse momento, está sem cabeça.
A cabeça pertence ao corpo não a você.
A cabeça faz parte do corpo, pertence ao corpo, tem uma função no corpo.
Ela é bela, é boa.[...]

Uma vez que você sabe que, observando, está fora, fica acéfalo.
Anda por esta terra sem nenhuma cabeça.
Que beleza de fenômeno!
Um homem andando sem cabeça. 
É este o significado quando digo: torne-se uma nuvem branca - um fenômeno acéfalo.
Você não pode imaginar quanto silêncio pode descer ao seu encontro quando a cabeça não está presente.
Sua cabeça física estará presente, mas o envolvimento, a obsessão não estará.
A cabeça não é o problema!
Ela é bela, uma criação maravilhosa, o maior computador já inventado - algo tão complexo, um mecanismo tão eficiente.
Ela é linda.
Deve ser usada, e você pode alegrar-se em usá-la.
Mas de onde tirou a idéia de que está dentro dela?
Isto parece ser um falso ensinamento.[...] 
Qual é a realidade?
A realidade é: você está além.
[...]

Observe...
E quando observar, lembre-se de que enquanto estiver observando, não deve julgar.
Se julgar, a observação será perdida.
Enquanto observar, não avalie.
Se avaliar, a observação será perdida.
Enquanto observar, não condene.
Se condenar, perderá o ponto.

Enquanto observar, apenas observe...
seja um rio fluindo, deixe a corrente da consciência fluir, permita que os pensamentos atômicos flutuem como bolhas e fique sentado na margem observando.
O curso continuará e continuará.
Não diga isto é bom, não diga isto é mau, não diga que isto não deveria ter acontecido, não diga que aquilo deveria ter acontecido.
Não diga nada - simplesmente observe.
Não queira criticar.
Você não é um juiz - é apenas um observador.
E veja o que acontecerá.
[...]

Observando o rio, de repente, você estará além... 
E uma vez que sabe que está fora, pode permanecer fora.
Pode mover-se nesta terra sem a cabeça.
Este é o jeito de cortar a cabeça.
Todo o mundo está interessado em cortar a cabeça dos outros -
isto não auxilia em nada.
Você já fez isso demais.
Corte a sua mesma.
Seja acéfalo, e estará em profunda meditação.

O S H O

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Como se pode controlar o pensamento?

Que entendemos por pensamento? O pensador é diferente do pensamento? O que medita é diferente da sua meditação? O observador está separado d coisa observada? A qualidade é diferente da pessoa? Assim, antes que possa ser controlado o pensamento, qualquer que ele seja, devemos compreender o processo de pensar e aquele que pensa, e verificar se constituem dois processos separados, ou se são um processo unitário.

O pensador existe quando deixa de pensar? Quando não há pensamentos existe pensador? Evidentemente, se não temos pensamentos, não há pensador. Por que então a separação entre pensador e pensamento? Na maioria de nós existe esta separação. Por quê? É uma coisa real, verdadeira, ou se trata de coisa meramente fictícia, criada pela mente?

(...) Não estão crentes de que os seus pensamentos são separados de vocês? Esta pergunta implica — não é verdade? — que há o que controla e há a coisa controlada, o observador e a coisa observada. Pois bem, sabemos se esse processo é um fato real, isto é, se há observador e coisa observada, controlador e coisa controlada? É real esta separação? Só é real no sentido de que nós a aceitamos. Mas não é uma armadilha da mente?(...) Quase todos vocês acreditam que o pensador é separado, o “eu” superior, “Atman”, o observador, que domina o “eu” inferior, etc. Por que existe esta separação? Esta separação não está também dentro dos domínios da mente? Quando dizem que o pensador é o “Atman”, o observador, e que os pensamentos estão separados dele, isto de certo também está no campo mental. Ora, o fato não é que a mente, o pensador, se separou dos seus pensamentos para dar permanência a si mesma? Porque assim o pensador pode sempre modificar os seus pensamentos, dar-lhes nova uma moldura, enquanto ele se conserva separado, dando assim permanência a si mesmo. Mas, sem o pensamento, não existe o pensador. Pode separar-se dos seus pensamentos, mas se deixa de pensar, deixa também de existir, não é verdade? Assim, esta separação do pensador dos seus pensamentos é uma armadilha do pensador para dar segurança e permanência a si próprio. Isto é, a mente percebe que os pensamentos são transitórios e adota, por esse motivo, a astuciosa armadilha de dizer que ela é o pensador, independente dos seus pensamentos, que ela é o “Atman”, o observador, separado da ação, do pensamento. No entanto, se observarem o processo com muita atenção, pondo de lado todo conhecimento de vocês adquirido de outros, por maiores que sejam esses outros, verão que o observador é a coisa observada, que o pensador é o pensamento. Não há pensador separado do pensamento; por mais ampla, por mais profunda e extensa que seja a separação, a muralha por ele edificada entre si e os seus pensamentos, o pensador fica sempre dentro do campo do seu pensar. Por conseguinte, o pensador é o pensamento; e assim, quando perguntam, “como se pode controlar o pensamento?” vocês fazem a pergunta errada. Quando o pensador começa a controlar os seus pensamentos, ele o faz apenas para dar continuidade a si próprio, ou porque acha que os seus pensamentos lhe são dolorosos demais. Deseja, por isso, modificar os seus pensamentos, ficando ele permanente, atrás da cortina de palavras e pensamentos. Uma vez que admitam isso, que é um fato verdadeiro, as suas disciplinas, suas buscas do superior, as suas meditações, os seus controles, tudo se desfaz em nada. Isto é, se quiserem olhar para o fato evidente de que o pensador é o pensamento e se ficarem perfeitamente cônscios desse fato, então não mais pensarão em termos de dominar, modificar, controlar ou canalizar os seus pensamentos. Então o pensamento se torna importante e não o pensador. O que tem peso então não é o controlador, nem a maneira de controlar, mas o pensamento, que é a coisa controlada, se torna importante por si mesmo. A compreensão do processo do pensamento é o começo da meditação, que é autoconhecimento. Sem autoconhecimento não há meditação; e a meditação do coração é compreensão. Se querem compreender, não devem estar ligados a crença alguma. (...) só podem estar livres quando percebem a verdade sobre a falsidade da crença de que o pensador é separado dos seus pensamentos. Isto é, quando se percebe a verdade acerca do falso, ficamos livres do falso. Por muito tempo temos admitido a ideia de que o o pensador é separado dos pensamentos; e vemos agora que a separação é falsa. Percebendo a verdade acerca do falso, vocês ficam livres do falso, com tudo o que ele implica — disciplinar, controlar, dirigir, canalizar o pensamento, o colocar o pensamento num determinado molde de ação. Quando estamos fazendo essas coisas estamos ainda dando importância ao pensador; e por isso o pensador e o pensamento continuam separados, o que é falso. Mas se percebem essa falsidade desfaz-se a separação e resta apenas o pensamento. Podem então investigar o pensamento, a mente então é apenas a máquina do processo do pensamento, e o pensante não está separado do pensamento.

Ora bem, a mente é o aparelho que registra, que experimenta, e, portanto, a mente é memória, memória sensorial; porque a mente é resultado dos sentidos. Logo, o pensamento, que é produto da mente, é sensorial; sem dúvida o pensamento é resultado da sensação. A mente é o aparelho que registra, que acumula, a consciência que experimenta, que dá nome, que registra. Isto é, a mente experimenta, depois dá nome à experiência, como agradável ou desagradável, e depois a registra, guarda-a no arquivo que é a memória. Essa memória atende a um novo estímulo. Cada estímulo é sempre novo, e a memória, que é um mero registro do passado, atende ao novo. Esse encontro do novo com o velho é chamado experiência. Ora, a memória não têm vida, por si. Ela só tem vida, só é vitalizada quando vai ao encontro do novo. Por conseguinte, o novo está sempre dando vida ao velho. Isto é, quando a memória atende ao estímulo, que é sempre novo, ela se verifica, se fortalece com essa experiência. Examinem a própria memória de vocês, e verão que ela não tem vida, por si; mas quando a memória se encontra com o novo e traduz o novo de acordo com o seu condicionamento, ela é então revitalizada. Assim, a memória só tem vida quando se encontra com o novo, revitalizando-se e fortalecendo-se continuamente. Essa revivificação da memória se chamar pensar.

(...)Vemos, pois, que o pensar é sempre reação condicionada, que o pensar é processo de reação a estímulo. O desafio é sempre novo; mas o pensar, que é uma reação derivada da memória, é sempre velho, revitalizado.(...) Por isso, o pensar nunca pode ser criador, porque é sempre reação da memória. (...) Só quando atendemos o novo como novo, temos o viver criador. A mente é a máquina que registra, que acumula lembranças; e enquanto a memória continuar a ser revitalizada pelo desafio, subsistirá o processo de pensamento. Mas se cada pensamento for observado, sentido, examinado integralmente, e perfeitamente compreendido, verão então como a memória começa a extinguir-se. Estamos falando da memória psicológica, não da memória fatual.(...) Acompanhar até o fim um pensamento ou sentimento, é dificílimo; porque quando queremos acompanhar um pensamento até o fim, outros pensamentos se insinuam. E ficamos a dar voltas, correndo atrás de pensamentos sucessivos, inutilmente, por causa da rapidez do pensamento.(...) Quando se acompanha cada pensamento até o fim, e a mente fica despida da memória, ela se torna tranquila, sem problema nenhum. Por quê? Porque o criador de problemas, que é a memória, desapareceu; e nessa tranquilidade, que é absoluta, desponta a realidade. (...) Quando o pensador se separa dos seus pensamentos e procura controla-los, está caminhando para a ilusão; ao passo que perceber a verdade no falso nos liberta do falso. Resta então apenas o pensamento e quando há compreensão perfeita do pensamento, vem a tranquilidade. Nessa tranquilidade há criação; isto é, quando a mente deixa de criar, há a criação que está fora do tempo, que é imensurável, que é o real.

Jiddu Krishnamurti — 7 de março de 1948 — Da insatisfação à felicidade

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

É possível uma total mudança na consciência humana?

(...) Os problemas humanos, o problema de nossa confusão, de nossa total falta de afeição, o sentimento de solidão, as contradições, a perpétua ânsia de preenchimento e as intermináveis frustrações que a acompanham — todos eles foram criados pelo pensamento. Edificamos uma sociedade, uma estrutura, um estado sócio-psicológico que é o resultado de nossa avidez, inveja, comparação, competição, ambição, desejo de poder, posição, prestígio, fama. Tudo isso foi construído pelo pensamento, e nós somos o resultado desse pensamento e nos vemos aprisionados nessa estrutura, na estrutura psicológica da sociedade, da qual somos uma parte. Isso também é muito óbvio; nós não somos diferentes da sociedade. A sociedade somos nós — você e eu — a sociedade que criamos com o pensamento, consciente ou inconscientemente, a qual aceitamos ou contra a qual nos revoltamos — revolta que, todavia, permanece dentro da estrutura de uma dada sociedade. O pensamento construiu, através dos séculos, esta sociedade, com seus deuses, seus instrutores, suas religiões, suas nacionalidades, e toda esta confusão medonha em que estamos vivendo. O pensamento não pode livrar-se daquilo que ele próprio construiu. Se o faz, ou se pensa que o faz, isso será ainda uma reação, uma continuidade “modificada” do que foi.

O pensamento é para nós de desmedida importância — o pensamento que é a palavra, a ideia, o passado, o presente e o futuro; o pensamento que cria extravagantes ideologias que com tanta facilidade aceitamos. Não importa se tais ideologias são nobres ou ignóbeis. O homem vive pelo pensamento, como o fazem certos animais, e, percebendo a confusão, a aflição em que nos encontramos, exercemos o pensamento a fim de operarmos uma mudança, à força de determinação, através do tempo, pela asserção da vontade: “Sou isto e devo ser aquilo”. O que o futuro será foi criado pelo pensamento, pela ideologia, pelo ideal, pelo exemplo. Embora desejemos mudar — e todo ente humano inteligente deseja promover uma mudança no mundo e em si próprio — utilizamos o instrumento do pensamento para efetuar a modificação, crendo que o pensamento resolverá todos esses problemas. Não é assim? Não estão aqui escutando, com o pensamento funcionando? Natural e evidentemente! E, não percebemos claramente que o pensamento não tem possibilidade de criar um mundo novo, de promover uma revolução total na consciência humana. O que fazer? O pensamento criou esta confusão e ele — assim esperamos — produzirá a clareza. Estamos muito certos de que o pensamento o fará, o pensamento que é brilhante, sutil, criador de ideologias; o pensamento que é egotista e não egotista; o pensamento que não funciona egocentricamente, devotado à reforma social, à revolução, a novos sistemas de ideias, a utopias.

Se percebemos o seu verdadeiro significado, se percebemos, mesmo verbal ou intelectualmente, que o pensamento é incapaz de promover uma mudança radical, e que a revolução radical da consciência humana é de essencial necessidade, vemos então quanto é insensato continuarmos pelo caminho que estamos seguindo, a lutar, dia por dia, cheios de aflição e confusão, à espera da desolação e da morte. Temos recorrido ao pensamento, para resolver esta situação, entretanto o pensamento nada resolveu. Se compreendermos isso, mesmo verbalmente, que iremos fazer?

Quando fazemos esta pergunta, desejamos que nos digam o que cumpre fazer — peço-lhes toda a atenção! — e, por conseguinte, estamos reagindo com o pensamento, queremos descobrir a resposta por meio do pensamento. Não é exato isso? O problema está claro, e agora estamos esperando, enquanto procuramos a resposta. O que é isso que está esperando? Que entidade é essa que está esperando a resposta? É ainda o pensamento! O pensamento quer agora descobrir se o que está dizendo é verdadeiro ou falso, está a concordar ou a discordar, a reverter ao seu condicionamento, e a dizer: “Como se pode viver neste mundo sem pensar?” Não estamos dizendo que não devemos pensar; seria infantil dizê-lo.

Vocês sabem qual é o problema. Por conseguinte, ao perguntarem “O que devo fazer?” —precisam descobrir quem é que está fazendo essa pergunta... É ainda o pensamento? Se é, podemos agora investigar a questão da origem do pensamento.

Não dizemos que o pensamento deve cessar, pois o pensamento tem uma função definida. Sem ele, não poderíamos nos dirigir ao escritório, não saberíamos nosso próprio endereço, nenhum possibilidade teríamos de funcionar. Mas, se desejamos efetuar uma revolução radical em toda a consciência, na própria estrutura do pensar, devemos compreender que o pensamento, que criou esta sociedade, com toda a confusão nela existente, não pode em absoluto dissolvê-la.

(...)O pensamento é essencialmente conservador. O pensamento quer ocupado com o futuro, quer com o presente, funciona sempre com base no passado, em suas memórias, seu condicionamento, seu conhecimento. O pensamento é a essência mesma da segurança, e é isso o que a mente, conservadora por excelência, também quer — segurança, sempre segurança, em todos os níveis! Para se efetuar uma total mudança na consciência humana, deve o pensamento funcionar num certo nível que lhe compete, mas não deve transbordar para outra esfera em que o pensamento não tem realidade alguma. Se eu não pensasse, não poderia falar. Mas, não é possível efetuar-se nenhuma transformação radical em mim mesmo, como ente humano, por meio de uma ideia, de um pensamento, porque o pensamento só é capaz de funcionar em conjunção com o conflito. O pensamento só pode criar conflito.

Dito isto, se, como espero, tenham muito interesse, devem perguntar a si mesmos qual é a origem do pensar.(...) Esta é uma pergunta sobremodo complexa, cuja compreensão requer uma mente muito sutil e destemida. No momento em que se descobre realmente a origem do pensar, o pensamento recebe o lugar que lhe compete e não transbordará para outra esfera, outra dimensão onde não há lugar para ele. Só nessa dimensão pode-se operar a transformação radical; só nela pode nascer uma coisa nova, não produzida pelo pensamento.(...)

Jiddu Krishnamurti – Encontro com o eterno

terça-feira, 26 de março de 2013

Não há realidade no pensamento psicológico

Pergunta: Como podem unir-se o pensador e o pensamento?

Krishnamurti: "Como"? é uma pergunta de colegial. Mas vamos averiguar se é possível unir os dois processos que separam as coisas, quando em curso. Em primeiro lugar, sabemos que o pensador e o pensamento são separados. Estamos conscientes disso? Para você o pensador e o pensamento são duas entidades separadas e você deseja saber se é possível uni-las. Se o pensante está separado e está sempre dominando o pensamento, o pensamento está sempre tolhido e o pensante sempre a subjugá-lo. Não haverá trégua, haverá uma batalha constante entre o pensador e o pensamento. Preciso averiguar se é possível os dois existirem juntos, de modo que não haja divisão, nem batalha; porque reconheço que só quando não há luta existe algo novo.

A violência não produz a paz; só quando não há violência, há paz. Identicamente, preciso verificar se o pensador e o pensamento são duas entidades separadas, eternamente divididas, nunca unidas.

Você e eu vamos empreender juntos a viagem para descobrir e "experimentar" verdadeiramente o fato. Sabemos que o pensante e o pensamento estão separados. A maioria de nós nunca sequer refletiu a respeito, — o temos como um fato verdadeiro. Só quando alguém lhe faz essa pergunta, você começa a indagar; eu o interpelo, agora, e portanto você está indagando, está fazendo a viagem de investigação. Essa viagem é a compreensão do que é, do que está realmente acontecendo, e não do que você desejaria que acontecesse.

Porque estão separados o pensante e o pensamento? Não pergunto se deviam ou não estar separados, e, sim, porque estão separados. Estão separados por força do hábito. Nunca duvidamos disso; nós o aceitamos e o reconhecemos como coisa certa e verdadeira; por conseguinte, transformou-se em hábito. O pensante está separado do seu pensamento e a luta entre os dois, a dominação do pensamento pelo pensante, é um hábito diário, nosso — sendo o hábito, rotina, repetição. Isso é um fato, você não acha?

O que aconteceria se o pensante e o pensamento não estivessem separados? Minha mente se acostumou com esse hábito. O que lhe aconteceria se esse hábito cessasse? Sentir-se-ia perdida, não é assim? Ver-se-ia desnorteada, perplexa, diante de uma coisa inesperada, nova; por isso, a mente prefere viver de hábitos; e, assim, diz ela: "conservarei o meu hábito. Já que não sei o que acontecerá se aquelas duas entidades se juntarem, é melhor deixar as cosias como estão". Você está, pois, mais interessado na continuação do hábito do que em procurar saber o que aconteceria se o pensante e o pensamento se juntassem.

Por que desejamos que continue o velho hábito? Pela razão muito clara de que desejamos segurança, certeza, alguma coisa em que nos apoiarmos; porque é a única que conhecemos. Estamos bem seguros com relação ao pensador e o pensamento. Nunca pensamos no que aconteceria se eles se juntassem. A certeza faz com que nos apeguemos ao que é velho. Isso é um fato psicológico, um fato observável. Nosso problema, pois, não é de como unir o pensante e o pensamento, mas sim, de por que a mente busca segurança, certeza. Pode a mente existir sem certeza, sem estar procurando alguma coisa em que se apoiar — saber, crença, ou o que quer que seja? A mente não pode se abstrair do processo de segurança. A mente que conhecemos está segura; não lhe interessa indagar; só lhe interessa estar bem abrigada, em perfeita segurança.

Por que a mente procura por segurança? Porque você percebe que o pensamento se modifica subitamente, a qualquer instante; não há realidade no pensamento; por isso, o pensamento cria o pensante, como entidade permanente que subsistirá indefinidamente; tem, pois, no pensante interesses adquiridos. A mente, assim,  encontra a sua segurança no pensante, a certeza, que é o velho hábito.

Temos, pois, de verificar se a mente pode em algum tempo ter segurança, ou se está apegada à mera ilusão de segurança. A mente tem o poder de criar a ilusão de segurança, e, de a ela se apegar; consequentemente, enquanto estiver em busca de segurança, não será capaz de compreender o outro estado. Enquanto a mente não estiver interessada em descobrir o que acontecerá se se ajuntarem o pensante e o pensamento, continuará apegada àquilo a respeito de que está bem segura.

Nosso problema, por conseguinte, consiste em saber se há segurança, certeza. Existe tal coisa? Evidentemente não existe. Você não achará segurança, nem em Deus, nem em sua esposa, nem nos bens materiais que deseja. Não existe segurança. Disso você não está convencido; disso você ainda não teve experiência alguma. Sem segurança, sem coisa alguma em que a mente possa apoiar-se, a que possa segurar-se, apegar-se, reina uma solidão absoluta. Porque a mente teme estar só, a mente inventa o pensante, como entidade permanente, de existência contínua. Ou, se não inventa o pensante, inventa Deus, a propriedade, a esposa... qualquer coisa serve: uma árvore, uma pedra, uma imagem esculpida.

A mente, em seu desejo de segurança, criou o pensante como entidade separada do pensamento e se acostumou a esta divisão pelo hábito; onde existe hábito, existe permanência, e a mente se torna mecânica. Ao perceber realmente — não apenas verbalmente, mas como uma experiência real — que o pensante é o resultado do pensamento, que ele busca permanência na continuidade, você verá então que não há esforço por parte da mente para efetuar a união dos dois. Só existe, então, um estado de compreensão, sem palavras, sem o processo de pensamento constituído de pensante e pensamento. Para tal necessita-se uma extraordinária intuição de todo o processo da consciência, que estivemos considerando nesta tarde, sendo essa intuição o processo da meditação. Essa meditação só é possível quando a mente compreende todo o conteúdo da consciência, isto é, você mesmo.

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill