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sábado, 7 de abril de 2018

O mecanismo de segurança na autoridade


O mecanismo de segurança na autoridade

PERGUNTA: Na Índia é-nos ensinado, há séculos, a sermos espirituais, e nossa vida diária é uma rotina interminável de rituais e cerimônias. Isto é espiritualidade? Se não, que significa, então, "ser espiritual"?

KRISHNAMURTI: Vejamos, senhor, o que significa "ser espiritual". Não queremos a definição da palavra, que se pode achar num dicionário, mas procuremos, aqui sentados, como estamos, experimentar realmente esse estado, se ele existe.

A mente, mutilada pela autoridade — de um livro, um guru, uma crença ou uma experiência — é incapaz, evidentemente, de descobrir o verdadeiro. E pode a mente ficar livre de toda e qualquer autoridade? Isto é, pode a mente deixar de procurar a segurança, na autoridade? Por certo, só a mente que não teme a insegurança, a incerteza, é capaz de descobrir o que significa ser espiritual. O homem que se limita a aceitar uma crença, um dogma, que observa ritos e cerimônias, não é capaz de descobrir o que é verdadeiro ou o que é "ser espiritual", porque sua mente está presa no padrão da tradição, do medo, da avidez.

Ora, pode a mente que se tornou escrava das cerimônias abandoná-las imediatamente? Por certo, este é o único critério adotável, já que, abandonando-se as cerimônias, será possível descobrir quanto elas implicam: temores, antagonismos, disputas. Deste modo, tudo o que a mente se exime de enfrentar sairá à luz. Mas tal coisa não queremos fazer. Só sabemos falar em "ser espiritual". Lemos o Upanishads, o Gita, recitamos mantras, entretemo-nos com cerimônias — e a isso chamamos religião.

Por certo, o que é espiritual tem de ser atemporal. Mas a mente é resultado do tempo, de incontáveis influências, ideias, imposições; ela é produto do passado, que é tempo. E pode alguma vez essa mente perceber o que é atemporal? Nunca, naturalmente. Poderá especular; poderá — inutilmente — buscar ou repetir certas experiências que outros porventura tiveram; mas, sendo resultado do passado, a mente nunca achará o que existe além do tempo. Portanto, o que ela pode fazer é, apenas, ficar quieta, completamente, sem nenhum movimento de pensamento, porque só assim há possibilidade de se revelar aquele estado que é atemporal. A própria mente é, então, atemporal, eterna.

As cerimônias, pois não são espirituais, tampouco o são os dogmas, as crenças, a prática de determinado sistema de meditação. Porque todas essas coisas são produto de uma mente em busca de segurança. O estado de espiritualidade só se pode experimentar pela mente que nenhum "motivo" tem, pela mente que já não está a buscar, pois toda busca se baseia em algum "motivo". A mente capaz de nada perguntar, nada procurar, de ser completamente nada, só essa mente pode compreender o atemporal.

Krishnamurti, Quinta Conferência em Madrasta, 01 de fevereiro de 1956
Da Solidão à Plenitude Humana


quarta-feira, 17 de setembro de 2014

É preciso transcender os estreitos limites da tradição

Pergunta: Você diz que seguir a tradição invariavelmente gera mediocridade. Mas sem nenhuma tradição, não nos sentiremos desorientados?

Krishnamurti: O que você entende por "tradição"? A transmissão, de pais para filhos, por escrito ou oralmente, de uma crença, um costume, de experiência, conhecimento científico, musical, artístico, religioso, ou moral. Por certo, é isso que entendemos por "tradição". E, quando,  de forma vã, estou repetindo as tradições que me foram transmitidas, essa repetição torna minha mente embotada, medíocre. O conhecimento é necessário para o exercício de certas profissões. Para construir uma ponte, dividir o átomo, operar um motor, produzir as muitas coisas que nos são necessárias na vida moderna, é imprescindível o conhecimento; mas o conhecimento se torna tradicional, a mente deixa de criar e fica funcionando, apenas, de maneira mecânica. Há máquinas que calculam muito mais rapidamente do que homem;e se, religiosamente ou por outras maneiras, nos limitamos a aceitar a tradição, não há dúvida que ficaremos funcionando exatamente como máquinas. A tradição nos oferece uma certa segurança, na sociedade, e temos medo de sair dessa trilha. Temos medo do que os vizinhos digam de nós; temos uma filha para casar e, portanto, precisamos ter cuidado. Nossa mente, como é fácil observar, funciona de maneira tradicional e por essa razão nos tornamos medíocres e perpetuamos os nossos sofrimentos. 

Verbalmente, reconhecemos esse fato, mas interiormente e em nossa ação, não o reconhecemos, porque todos desejamos segurança. E a segurança é uma coisa muito estranha. No momento em que a buscamos, criamos invariavelmente circunstâncias e valores produtores de insegurança — como se vê acontecer no mundo, hoje em dia. Todos estamos em busca de segurança, em todos os sentidos — segurança econômica, social, nacional — e no entanto esse próprio desejo de segurança está produzindo mais caos e aumentando a insegurança. 

A mente, pois, funciona dentro da rotina da tradição, porque aí espera encontrar segurança; e uma mente em segurança não é livre para descobrir. Não se pode repudiar a tradição, mas se se compreender o seu processo total, as suas consequências psicológicas, veremos que a segurança já não terá significação nenhuma e não será mais necessário "repudiá-la", porque ela cai por si mesma, qual uma folha seca.

Krishnamurti em, DA SOLIDÃO À PLENITUDE HUMANA

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Diálogos sobre a busca de segurança

Amigos.

Nossos problemas humanos exigem um pensar esclarecido, simples e direto. Talvez alguns dentre vós imaginem que por simplesmente escutarem umas poucas palestras que vou fazer, seus problemas ficarão resolvidos. É que vós desejais remédios imediatos para as vossas múltiplas dores e tristezas, desejais modificações superficiais que revolucionem o vosso pensamento, o vosso ser inteiro. Só existe um meio de encontrar a felicidade inteligente, que é o de vossa percepção e discernimento próprios; e só por meio da ação é que poder dissipar os múltiplos obstáculos que vos impedem o preenchimento. Si, por vós próprios, puderdes perceber, simples e diretamente, as limitações que vos impedem de um viver completo e profundo, e de como foram elas criadas, então, sereis capazes de as dissipar.

Eu vos pediria, ao me escutardes, que ultrapassásseis essa ilusão cômoda e confortável que fez dividir o pensamento em oriental e ocidental. A verdade sobrepuja todos os climas, povos e sistemas. Se bem que eu venha da Índia, o que digo não se acha condicionado pelo pensamento desse país. Preocupo-me com o sofrimento humano, que existe por todo o mundo. Peço-vos que não repudieis o que digo sob a alegação de que não é pratico e sim apenas uma certa forma de misticismo oriental. Eu vos pediria também que não pensásseis eivados de formulas, de sistemas, de frases feitas, porém, que libertásseis a mente desse fundo de idéias herdado de múltiplas gerações, e pensásseis de forma nova, direta e simplesmente. Por favor, não penseis que chamando-me anarquista, comunista ou dando-me qualquer outro nome que vos convenha, haveis compreendido o que eu disse. Temos que pensar por forma renovada, compreender o problema humano como um todo e, somente então, poderemos viver harmoniosa e inteligentemente. Onde houver verdadeiro preenchimento individual, haverá também verdadeiro bem estar do todo, da coletividade.

Si cada qual de vós puder ter plenitude, viver em completa harmonia — coisa que exige grande inteligência e não a persecução de desejos egoístas — então haverá o bem estar para o todo. Posto que necessitemos de uma completa revolução do pensamento e do desejo, deve ela ser a resultante da compreensão voluntária por parte do individuo e não a da compulsão.

Dado o fato de vós, em maioria, estardes interessados pela felicidade e pela consumação, e não terdes aqui vindo por simples curiosidade, se exatamente compreenderdes o que digo e agirdes, dar-se-á, então, o verdadeiro êxtase da vida.

Há intenso sofrimento por todo o mundo. Existe a fome em meio da abundancia. Há exploração das classes pelas classes, das mulheres pelos homens e dos homens pelas mulheres. Existe o absurdo do nacionalismo que mais não é que a expressão coletiva da busca egoísta da segurança.

Este caos é a expressão objetiva do sofrimento interno do homem. Subjetivamente, há a incerteza, o temor angustiante da morte, do ser incompleto, da vacuidade. Nossa ação no mundo subjetivo e no objetivo, nada mais é que a expressão do desejo egoísta da segurança. Assim, criou a mente múltiplos obstáculos, limitações, e enquanto não houvermos compreendido plena, integralmente, esses obstáculos, e voluntariamente nos libertado deles, não pode haver preenchimento.

Compreendendo e libertando-nos, individualmente, destas limitações, podemos criar a ação verdadeira, necessária e, por esse modo, modificar o ambiente. Muitas pessoas pensam que é preciso operar-se um movimento em massa afim de que o preenchimento individual venha a ter lugar. Porém, para criar um verdadeiro movimento em massa, temos que haver primeiramente completa revolução de pensamento e de desejo no individuo, isto é, em vós próprios. Para mim, esta mudança voluntária e individual é a verdadeira revolução. Ela tem que começar convosco, em vós, indivíduos, e não em uma vaga massa coletiva. Não vos deixeis hipnotizar pela frase “movimento em massa”. Cada individuo que se acha colhido pelo sofrimento, precisa mudar, precisa compreender a causa da sua tristeza e os obstáculos que em redor de si próprio criou. De nada serve o meramente buscar uma substituição, pois que isso de modo algum viria resolver os problemas e as angustias humanas. Isso seria apenas um falso ajuste a uma condição falsa. A maioria dentre vós, que busca uma substituição, está apenas se aferrando as suas finalidades egoístas.

Por favor, não digais no final desta palestra que eu não vos dei um sistema positivo.

Vou tentar explicar-vos como as vossas tristezas foram criadas; e quando, por vós mesmos, lhes houverdes discernido a causa então terá lugar uma ação direta, a única, que será positiva. Essa ação nascida da compreensão, da inteligência, não é a imitação de um sistema.

Cada individuo procura a segurança, subjetiva e objetiva. A busca subjetiva é a da certeza, de modo a poder a mente apegar-se a ela e não ser perturbada. A busca objetiva é a da segurança, a do poder e do bem estar.

Ora, o que acontece ao buscardes a segurança, a certeza? Necessariamente, haverá medo; e se fordes conscientes de vosso pensamento, discernireis que ele tem sua raiz no temor. A moral, a religião e as condições objetivas, acham-se fundamentalmente baseadas no medo, por serem a resultante do desejo, da parte do individuo, de sentir-se em segurança. Ainda que não alimenteis nenhuma crença religiosa, tendes, contudo, o desejo de vos sentirdes subjetivamente seguros, coisa que nada mais é do que espírito religioso. Compreendamos a estrutura daquilo a que chamamos religião.

Como disse, quando se busca segurança, há de haver medo; para vos certificardes subjetivamente buscais aquilo a que chamais imortalidade. Na busca dessa segurança, aceitais instrutores que vos prometem a imortalidade e chegais a admiti-los como autoridades a quem se deve temer e a quem se deve adorar. E onde houver este temor, tem que haver dogmas, credos, crenças, ideais e tradições que prendem a mente.

Aquilo a que chamais religião, nada mais é que uma forma organizada da auto-proteção individual para alcançar a segurança subjetiva. Para administrar esta autoridade baseada no temor, tem que haver sacerdotes que se tornam vossos exploradores. Sois vós os criadores dos exploradores, visto que, pelo medo, haveis criado a causa da exploração. A religião tornou-se uma crença organizada, uma forma cristalizada do pensamento, da moral, da opressão, do domínio. A religião cujo Deus é o medo — embora apliquemos palavras tais como amor, benignidade, fraternidade, para disfarçar esse medo profundo — nada mais é que a submissão subjetiva a um sistema que nos garante a segurança. Eu não falo de uma religião ideal. Falo da religião tal qual ela se encontra por todo o mundo, a religião da exploração, a religião do interesse rendoso.

Existe, depois, a busca objetiva da segurança, por meio do poder egoísta essencialmente baseado no temor e, portanto, na exploração. Se lançardes as vistas para o nosso sistema atual, verificareis ser ele nada mais que uma série de explorações astutas do homem pelo homem. A família torna-se o próprio centro de exploração. Peço-vos que não compreendais mal o que entendo por família. Por família entendo o centro que vos faz sentir seguros, que exige a exploração do vosso próximo. A família, que deveria ser a própria expressão do amor e não da exclusividade, torna-se um meio da auto-perpetuação egoísta. Daí desenvolvem-se classes, as superiores e as inferiores; e os meios de adquirir riqueza acumulam-se nas mãos de uns poucos. Vem, a seguir, a moléstia do nacionalismo, o nacionalismo como um meio de exploração e opressão. Esta perigosa doença do nacionalismo divide as pessoas, assim como as religiões também o fazem. Daí surgem os governos soberanos, cuja tarefa é preparar a guerra. As guerras não constituem uma necessidade; matar a outro ser humano, não é uma necessidade.

Assim, buscando a vossa própria segurança, haveis criado múltiplos obstáculos, de que sois integralmente inconscientes; e esses obstáculos não somente vos tornam em máquinas, como também vos impedem de serdes verdadeiros indivíduos. Quando vos tornais conscientes destas limitações, surge o conflito. E vós não desejais o conflito, desejais apenas a satisfação, a segurança e, por isso, esses obstáculos continuam a criar tumulto e tristeza. Vós, porém, só encontrareis verdadeira felicidade, plenitude, realidade, quando entrardes em conflito com os valores que agora oprimem e limitam a mente.

O examinar intelectualmente esses valores, não vos revela o seu verdadeiro significado. O mero exame intelectual não cria o conflito, é somente por meio do sofrimento que começais a compreender o seu significado profundo, oculto.

A maior parte das pessoas agem mecanicamente dentro de um sistema; portanto, é essencial que elas venham a ficar face a face com aqueles valores e obstáculos de que são inconscientes. Aí dá-se o despertar da verdadeira inteligência, a única que pode dar lugar á plenitude. Essa inteligência única revelará o eterno. Assim como o sol aparece límpido e brilha através das nuvens escuras, assim, através do vosso próprio discernimento e da pureza da vossa ação, advirá a realização daquela vida que está sempre se renovando a si mesma.

Krishnamurti
Do livro: Krishnamurti no Chile e no México em 1935 - ICK
PRIMEIRA PALESTRA EM SANTIAGO
Em 1 de Setembro de 1935.

domingo, 9 de março de 2014

A natureza interior do descontentamento


Jovem ou idoso, muitos de nós estamos descontentes apenas porque desejamos alguma coisa: mais conhecimento, um emprego melhor, um carro mais novo, um salário maior. Nosso descontentamento baseia-se no desejo "de ter mais". É somente porque desejamos algo mais que nos sentimos descontentes. Mas não estou falando sobre esse tipo de descontentamento. 

Pergunta: O descontentamento impede o pensamento claro. Como superar esse obstáculo?

Krishnamurti: Acho que você não me ouviu; provavelmente estava preocupado com sua pergunta, em como iria formulá-la. Isso é o que todos vocês estão fazendo, de maneiras diferentes. Cada um tem sua própria preocupação, e se o que eu disse não é o que gostariam de ouvir, deixam-no de lado, porque a mente de vocês está ocupada com seus problemas. Se quem fez a pergunta tivesse ouvido o que eu falei, se tivesse realmente sentido a natureza interior do descontentamento, da alegria, de ser criativo, acho que não teria feito essa pergunta.

O descontentamento impede o pensamento claro? E o que é o pensamento claro? É possível pensar com clareza se desejam conseguir alguma coisa com seu pensamento? Se sua mente está preocupada com um resultado, poderão pensar com clareza? Ou só conseguem pensar muito claramente quando não estão buscando um fim, um resultado, sem tentar ganhar algo?

E vocês conseguem pensar com clareza se se agarrarem a um preconceito, a uma crença particular — isto é, se pensarem como um hindu, um comunista ou um cristão? Certamente poderão pensar claramente apenas quando a mente não estiver acorrentada a uma ideologia — como um macaco preso a uma estaca; podem pensar muito claramente apenas quando não estão buscando resultado; podem pensar com clareza somente quando não têm preconceitos. O que tudo isso significa, na verdade, é que vocês podem pensar com clareza, simples e diretamente, quando a mente não estiver mais buscando qualquer forma de segurança; estando, portanto, livre do medo.

Então, de alguma maneira, o descontentamento impede o pensamento claro. Quando, por meio do descontentamento, vocês procuram um resultado, ou quando buscam minimizar o descontentamento, porque a mente detesta ficar perturbada e tenta a todo custo ficar calma, pacífica, então o pensamento claro não é possível. Mas, se estiverem descontentes com tudo — com seus preconceitos, suas crenças e seus medos — e não estiverem desejando um resultado, então esse mesmo descontentamento dará foco aos seus pensamentos ( não sobre um objeto em particular, ou qualquer direção específica), e todo o processo do pensamento se tornará bem simples, direto e claro.

Jovem ou idoso, muitos de nós estamos descontentes apenas porque desejamos alguma coisa: mais conhecimento, um emprego melhor, um carro mais novo, um salário maior. Nosso descontentamento baseia-se no desejo "de ter mais". É somente porque desejamos algo mais que nos sentimos descontentes. Mas não estou falando sobre esse tipo de descontentamento. É o desejo pelo "mais" que impede o pensamento claro. Se estamos descontentes não por desejarmos alguma coisa, mas por não saber o que desejamos; se estamos insatisfeitos com nosso emprego, com o dinheiro que temos, com a busca por status e poder, com a tradição, com o que temos e com o que deveríamos ter; se estamos insatisfeitos não com algo em particular, mas com tudo, então penso que esse nosso descontentamento trará clareza. Quando não aceitamos ou seguimos, mas questionamos, investigamos, aprofundamos, ocorre um insight do qual brota a criatividade, a satisfação.

Krishnamurti — Pense nisso

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Por que razão a mente se deteriora?

Numa destas manhãs, vi quando um morto era levado para ser cremado. Envolto em vistoso pano cor de vermelho purpúreo, o corpo oscilava ao ritmo dos quatro mortais que o transportavam. Que espécie de impressão lhe causa um corpo morto? Você não desejaria saber por que há deterioração? Você compra um motor novo em folha e, passados poucos anos, está completamente gasto. O corpo também se gasta; mas, você não desejaria investigar um pouco mais além, para descobrir porque razão a mente se deteriora? Mais cedo ou mais tarde ocorrerá a morte do corpo, mas a maioria de nós já tem a mente morta, já se verificou a deterioração; por que a mente se deteriora? O corpo se deteriora porque o mantemos em uso constante, e o organismo se gasta. Doença, acidente, velhice, má alimentação, deficiências hereditárias — tais são os fatores responsáveis pela deterioração e morte do corpo. Mas, por que deve a mente deteriorar-se, envelhecer, tornar-se pesada, embotada?

Ao ver um corpo morto, isso não lhe dá o que pensar? Embora nosso corpo deva morrer, por que deve a mente deteriorar-se? Nunca lhe ocorreu esta pergunta? Pois a mente, com efeito, se deteriora; vemos isso acontecer não só com as pessoas idosas, mas também com as pessoas jovens. Vemos como, nos jovens, a mente já está se tornando embotada, pesada, insensível; e, se pudermos descobrir por que razão a mente deteriora, então talvez descubramos algo verdadeiramente indestrutível. Talvez compreendamos, então, o que é a vida eterna, a vida que não tem fim, que não está no tempo, a vida que é incorruptível, que não degenera como o corpo que se transporta para o cais à beira do rio, onde é cremado e suas cinzas lançadas ao rio.

Mas, por que a mente se deteriora? Você já refletiu a esse respeito? Como você ainda é muito jovem — e se a sociedade, ou seus pais, ou as circunstâncias ainda não lhe tornaram embotado — você possui uma mente nova, ardorosa, curiosa. Você deseja saber por que existem as estrelas, por que morrem os pássaros, por que caem as folhas, como voa o avião a jato; muitas coisas você deseja saber. Mas, esse impulso vital para investigar, descobrir, é depressa sufocado, não é verdade? Sufocado pelo medo, pelo peso da tradição, por sua própria incapacidade para enfrentar essa coisa extraordinária que se chama a vida. Você já não notou quão rapidamente é destruído o seu ardor, através de uma palavra áspera, um gesto depreciativo, pelo medo de um exame, a ameaça de um pai — significando isso que a sua sensibilidade já está sendo destruída e sua mente se tornando embotada?

Outro caso de embotamento é a imitação. Pela tradição, você é obrigado a imitar. O peso do passado lhe força a se ajustar, a estabelecer uma linha de conduta e, com esse ajustamento, a mente se sente protegida, em segurança; você se instala numa rotina bem “lubrificada”, para que possa deslizar suavemente, livre de perturbações, sem o mais ligeiro estremecimento de dúvida. Observe os adultos que lhe rodeiam e verá que a mente deles não quer ser perturbada. Eles querem paz, ainda que seja a paz da morte; mas a verdadeira paz é coisa muito diferente.

Você já notou que, quando a mente se fixa numa rotina, num padrão, sempre o faz inspirada pelo desejo de segurança? É por esta razão que ela segue um ideal, um guru. Quer segurança, ausência de perturbação e, por isso, adormece. Quando lê, em seus livros de história, a respeito dos grandes líderes, santos, guerreiros, você não se surpreende desejando igualá-los? Isto não significa que não haja grandes homens no mundo; mas o instinto é imitar os grandes homens, procurar tornar-se igual a eles — e este é um dos fatores de deterioração, porque, então, a mente se coloca num molde. Igualmente, a sociedade não deseja indivíduos alertados, ardorosos, revolucionários, porque tais indivíduos não se ajustarão ao padrão social estabelecido e há sempre o perigo de que quebrem esse padrão. É por isso que a sociedade se empenha em prender sua mente em seu padrão, e é por isso que a chamada educação lhe estimula a imitar, a seguir, a se ajustar.

Ora, pode a mente deixar de imitar? Isto é, pode deixar de formar hábitos? E pode a mente que já se acha enredada no hábito, dele ficar livre?

A mente é o resultado do hábito, não? Ela é o resultado da tradição, do tempo — sendo “tempo” a repetição, a continuidade do passado. E pode a mente, a sua mente, deixar de pensar em termos daquilo que foi — e daquilo que será, que é, na verdade, uma projeção do que foi? Pode sua mente se libertar dos hábitos e deixar de criar hábitos? Se você penetrar bem profundamente neste problema, verá que pode. E quando a mente se renova sem formar novos padrões, novos hábitos, sem tornar a cair na rotina da imitação, permanece, então, fresca, jovem, “inocente”, sendo, portanto, capaz de infinita compreensão.

Para essa mente, não há morte, uma vez que já não existe processo de acumulação. É o processo de acumulação que cria o hábito, a imitação, e, para a mente que acumula, há deterioração, morte. Mas, para a mente que não está cumulando, juntando, que está morrendo a cada dia, a cada minuto — para essa mente não há morte. Ela se acha num estado de “espaço infinito”.

Assim, pois, deve a mente morrer para tudo o que acumulou, todos os hábitos e virtudes imitadas, para todas as coisas de que se acostumou a depender, para ter o sentimento de segurança. A mente então já não está aprisionada na rede de seu próprio pensar. No morrer para o passado, a cada instante, a mente se torna fresca, nova, nunca se deteriorará nem colocará em movimento a “onda da escuridão”. 

Krishnamurti - A cultura e o problema humano

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Quando você se abre à vida, coisas começam a acontecer

Pergunta: Se meu maior desejo é ser engenheiro e meu pai se opõe a isso e me nega sua ajuda, como poderei estudar engenharia?

Krishnamurti: Se você persistir no propósito de ser engenheiro, ainda que seu pai lhe expulse de casa, você pensa que não encontrará meios e modos de estudar engenharia? Você pode pedir esmolas, ou apelar para os amigos. Senhor, a vida é uma coisa muito estranha. No momento em que você sabe com toda a clareza o que deseja fazer, coisas acontecem. A vida vem em sua ajuda  — um amigo, um parente, um professor, uma avó, alguém lhe dará a mão. Mas, se você tiver medo de tentá-lo, porque seu pai poderá lhe expulsar de casa, nesse caso você está perdido. A vida não acode nunca aos que, por simples medo, se sujeitam a uma dada exigência. Mas, se você disser: "É isto o que quero e que tratarei de conseguir" — verá que, então, algo miraculoso acontecerá. Você terá, talvez, de passar fome, de lutar, para ir até o fim, mas será um ente humano valoroso, e não uma mera cópia; eis o milagre!

Em geral, temos medo de nos vermos sós; e sei que, para você, jovem, isso é muito difícil, porquanto não há neste país (Índia) a liberdade econômica que se observa na América e na Europa. Neste país há excesso de população e, por isso, todos cedem. Você diz: "Que será de mim?" Mas, se você persistir, verá que algo ou alguém lhe ajudará. Quando você toma uma firme atitude ante a exigência geral, é então um indivíduo e a vida vem em sua ajuda.

Há, em biologia, um fenômeno que se chama "mutação", ou seja, um súbito e espontâneo desvio do tipo. Se você tem um jardim e está cultivando uma certa espécie de flor, pode acontecer que, numa certa manhã, encontre algo totalmente novo, derivado daquela espécie. Isto é o que se chama "mutação". Sendo coisa completamente nova, atrai a atenção, e o floricultor lhe dedica especiais cuidados. Assim também é a vida. No momento em que você se aventura, algo acontece dentro de você e ao redor de você. A vida, de diferentes maneiras, vem em sua ajuda. Você pode não gostar pelo caminho que ela vem — que poderá ser de sofrimento, luta, fome — mas, quando você se abre para a vida, coisas começam a acontecer. Todavia, nós não queremos nos abrir para a vida, queremos fazer o "jogo seguro"; e os que fazem o "jogo seguro" morrem de maneira muita segura. Não é assim?

Krishnamurti — A cultura e o problema humano

segunda-feira, 27 de maio de 2013

A incessante busca de segurança cria desigualdade social

Interrogante: O problema da mente e o problema social da pobreza e da desigualdade precisam ser abordados simultaneamente. Por que o senhor acentua apenas um?

Krishnamurti: Eu estou acentuando apenas um? E acaso existe uma coisa como o problema social da pobreza e da desigualdade, da deterioração e da miséria, apartado do problema da mente? Não existe apenas um problema que é a mente? Foi a mente que criou o problema social e, tendo criado o problema, ela tenta solucioná-lo sem alterar-se fundamentalmente. De forma que o nosso problema é a mente, a mente que deseja sentir-se e que, desse modo, cria desigualdade social e procura comprar de várias maneiras porque sente segurança na propriedade, no relacionamento ou nas ideias, que são conhecimentos. É essa necessidade incessante de segurança que cria a desigualdade, que é um problema que não poderá jamais ser solucionado até que entendamos a mente que cria a diferença, a mente que não sente amor. As leis não vão resolver esse problema, nem ele pode ser solucionado pelos comunistas ou pelos socialistas. O problema da desigualdade só poderá ser solucionado quando houver amor e amor não é uma palavra para ser desperdiçada. O homem que ama não está preocupado com quem lhe seja superior ou inferior; para ele não existe nem igualdade nem desigualdade; somente um estado de ser que é amor. Nós, porém, não conhecemos esse estado, jamais o sentimos. Portanto, como pode a mente que está inteiramente voltada às suas próprias atividades e ocupações, que já criou tamanha miséria no mundo e que vai criar ainda mais danos e destruição — como pode essa mente suscitar dentro de si mesma uma total revolução? É esse, sem dúvida, o problema. E não podemos provocar tal revolução por intermédio de qualquer reforma social senão quando a própria mente compreender a necessidade de sua total redenção, onde então está a revolução. 

Estamos sempre falando de pobreza, de desigualdade e reforma, porque nossos corações estão vazios. Quando houver amor não teremos problemas, porém o amor não se concretiza através de um método qualquer. Ele somente se concretiza quando você deixa de ser, isto é, quando você não mais estiver preocupado consigo mesmo, com sua posição, seu prestígio, suas ambições e frustrações, quando você parar completamente de pensar em você, não no dia de amanhã, mas hoje. Essa ocupação consigo mesmo é idêntica à do homem que está no encalço do que ele chama Deus ou à do homem que está empenhado em uma revolução social. E uma mente assim ocupada não pode jamais saber o que é o amor. 

Krishnamurti — Sobre Deus

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Qual a diferença entre o selvagem e o homem civilizado?

Qual a diferença entre o selvagem e o homem civilizado? O selvagem — e uso a expressão em seu sentido literal — pinta o seu corpo, orna-se de penas e contas e usa outros métodos molestos para se adornar externamente. O homem aparentemente civilizado, tem as complicações da beleza interior; tem suas penas mentais, suas pinturas emocionais; suas inúmeras contas doutrinais. O homem civilizado do mundo, poderá não adornar o seu corpo à maneira bárbara do selvagem; somente não o mostra exteriormente. Mas o homem verdadeiramente está pra além de todos os adornos, para além de todas as complicações, e, para sua beleza, não depende de coisas externas, porque alcançou a simplicidade da vida.

Por homem civilizado não entendo o homem que haja dominado o maquinismo da vida moderna.

A civilização é o resultado dessa cultura que constitui a expressão destrutiva da percepção individual da verdade.

Um homem civilizado, antes de mais nada, nada deve pedir para si mesmo, seja de quem for e nada deve querer para si mesmo. Este é o primeiro requisito de acordo com o meu ponto de vista, para um homem civilizado, um homem culto. Se, portanto, nada deve pedir de outrem, isto significa que ele é um padrão para si próprio, uma luz para si mesmo, e, portanto, não lançará sombras no caminho de outrem.

Não se acha limitado pelo medo, ou pela autoridade externa, pelo temor de um deus desconhecido, por superstição, por tradições, pois, desde o momento em que o homem confie em outrem, a sua percepção da verdade diminuirá.

Portanto, ele deve ser guiado pela intuição, que é o ápice da inteligência — por inteligência entendo a ação completa no presente, a ausência de toda a experiência e desta vem a intuição. E, se quiserem despertar essa intuição que necessariamente, deve ser o único guia e influência única, devem conservar entusiasticamente desperta a inteligência de vocês. Daí, um homem civilizado, um homem culto, deve ser tolerante, deve ser capaz de discernir qualquer assunto imparcialmente, sem preconceitos, deve ser despido de travas, capaz de exame crítico de algo novo, antes de rejeitá-lo ou descartá-lo. A maioria das pessoas no mundo são dominadas pelo medo, medo do desconhecido, medo da superstição, medo do preconceito, medo dos desejos, medo dos deuses, medo das crenças, dos sistemas, das filosofias. Um homem civilizado ou culto não deve ter medo, pois eu afirmo que o homem verdadeiramente culto, no sentido próprio do termo, que estou usando, é a forma mais elevada de conquista espiritual. Tal homem verdadeiramente conseguiu; tal homem, na verdade, recebeu em seu coração, as águas da vida. E assim, como as águas vagueiam, assim vagueia ele no mundo, nada desejando, nada temendo, nada querendo para si mesmo. E só se pode chegar a isto, se se tiver por meta como árbitro final, como final autoridade.

Tal homem é simples, é puro. É lúcido e calmo como a montanha pela manhã, pois chegou ao ponto onde está absolutamente livre de toda a experiência, por ter passado através de todas elas. Tal homem preencheu a sua vida, pois deixou a vida pintar o quadro que deseja; nem ele, pela estreiteza, pelas suas limitações, deturpou e corrompeu a vida.

Se considerarem seus pensamentos e os atos deles originados, verificarão, que, onde existir o desejo de fuga, deverá coexistir a busca de segurança; porque encontram conflito na vida com todas as suas ações, suas afeições, seus pensamentos; dele desejam escapar para uma segurança satisfatória, uma permanência. Assim, toda a ação de vocês se acha baseada nesse desejo de segurança. Mas realmente, não há segurança na vida — nem física, nem intelectual; nem emocional, nem espiritual.

Se vocês se sentirem seguros, jamais poderão encontrar essa realidade vivente.

Na vitalidade da insegurança, reside o eterno.

Krishnamurti — O medo — 1946 — ICK


terça-feira, 26 de março de 2013

Não há realidade no pensamento psicológico

Pergunta: Como podem unir-se o pensador e o pensamento?

Krishnamurti: "Como"? é uma pergunta de colegial. Mas vamos averiguar se é possível unir os dois processos que separam as coisas, quando em curso. Em primeiro lugar, sabemos que o pensador e o pensamento são separados. Estamos conscientes disso? Para você o pensador e o pensamento são duas entidades separadas e você deseja saber se é possível uni-las. Se o pensante está separado e está sempre dominando o pensamento, o pensamento está sempre tolhido e o pensante sempre a subjugá-lo. Não haverá trégua, haverá uma batalha constante entre o pensador e o pensamento. Preciso averiguar se é possível os dois existirem juntos, de modo que não haja divisão, nem batalha; porque reconheço que só quando não há luta existe algo novo.

A violência não produz a paz; só quando não há violência, há paz. Identicamente, preciso verificar se o pensador e o pensamento são duas entidades separadas, eternamente divididas, nunca unidas.

Você e eu vamos empreender juntos a viagem para descobrir e "experimentar" verdadeiramente o fato. Sabemos que o pensante e o pensamento estão separados. A maioria de nós nunca sequer refletiu a respeito, — o temos como um fato verdadeiro. Só quando alguém lhe faz essa pergunta, você começa a indagar; eu o interpelo, agora, e portanto você está indagando, está fazendo a viagem de investigação. Essa viagem é a compreensão do que é, do que está realmente acontecendo, e não do que você desejaria que acontecesse.

Porque estão separados o pensante e o pensamento? Não pergunto se deviam ou não estar separados, e, sim, porque estão separados. Estão separados por força do hábito. Nunca duvidamos disso; nós o aceitamos e o reconhecemos como coisa certa e verdadeira; por conseguinte, transformou-se em hábito. O pensante está separado do seu pensamento e a luta entre os dois, a dominação do pensamento pelo pensante, é um hábito diário, nosso — sendo o hábito, rotina, repetição. Isso é um fato, você não acha?

O que aconteceria se o pensante e o pensamento não estivessem separados? Minha mente se acostumou com esse hábito. O que lhe aconteceria se esse hábito cessasse? Sentir-se-ia perdida, não é assim? Ver-se-ia desnorteada, perplexa, diante de uma coisa inesperada, nova; por isso, a mente prefere viver de hábitos; e, assim, diz ela: "conservarei o meu hábito. Já que não sei o que acontecerá se aquelas duas entidades se juntarem, é melhor deixar as cosias como estão". Você está, pois, mais interessado na continuação do hábito do que em procurar saber o que aconteceria se o pensante e o pensamento se juntassem.

Por que desejamos que continue o velho hábito? Pela razão muito clara de que desejamos segurança, certeza, alguma coisa em que nos apoiarmos; porque é a única que conhecemos. Estamos bem seguros com relação ao pensador e o pensamento. Nunca pensamos no que aconteceria se eles se juntassem. A certeza faz com que nos apeguemos ao que é velho. Isso é um fato psicológico, um fato observável. Nosso problema, pois, não é de como unir o pensante e o pensamento, mas sim, de por que a mente busca segurança, certeza. Pode a mente existir sem certeza, sem estar procurando alguma coisa em que se apoiar — saber, crença, ou o que quer que seja? A mente não pode se abstrair do processo de segurança. A mente que conhecemos está segura; não lhe interessa indagar; só lhe interessa estar bem abrigada, em perfeita segurança.

Por que a mente procura por segurança? Porque você percebe que o pensamento se modifica subitamente, a qualquer instante; não há realidade no pensamento; por isso, o pensamento cria o pensante, como entidade permanente que subsistirá indefinidamente; tem, pois, no pensante interesses adquiridos. A mente, assim,  encontra a sua segurança no pensante, a certeza, que é o velho hábito.

Temos, pois, de verificar se a mente pode em algum tempo ter segurança, ou se está apegada à mera ilusão de segurança. A mente tem o poder de criar a ilusão de segurança, e, de a ela se apegar; consequentemente, enquanto estiver em busca de segurança, não será capaz de compreender o outro estado. Enquanto a mente não estiver interessada em descobrir o que acontecerá se se ajuntarem o pensante e o pensamento, continuará apegada àquilo a respeito de que está bem segura.

Nosso problema, por conseguinte, consiste em saber se há segurança, certeza. Existe tal coisa? Evidentemente não existe. Você não achará segurança, nem em Deus, nem em sua esposa, nem nos bens materiais que deseja. Não existe segurança. Disso você não está convencido; disso você ainda não teve experiência alguma. Sem segurança, sem coisa alguma em que a mente possa apoiar-se, a que possa segurar-se, apegar-se, reina uma solidão absoluta. Porque a mente teme estar só, a mente inventa o pensante, como entidade permanente, de existência contínua. Ou, se não inventa o pensante, inventa Deus, a propriedade, a esposa... qualquer coisa serve: uma árvore, uma pedra, uma imagem esculpida.

A mente, em seu desejo de segurança, criou o pensante como entidade separada do pensamento e se acostumou a esta divisão pelo hábito; onde existe hábito, existe permanência, e a mente se torna mecânica. Ao perceber realmente — não apenas verbalmente, mas como uma experiência real — que o pensante é o resultado do pensamento, que ele busca permanência na continuidade, você verá então que não há esforço por parte da mente para efetuar a união dos dois. Só existe, então, um estado de compreensão, sem palavras, sem o processo de pensamento constituído de pensante e pensamento. Para tal necessita-se uma extraordinária intuição de todo o processo da consciência, que estivemos considerando nesta tarde, sendo essa intuição o processo da meditação. Essa meditação só é possível quando a mente compreende todo o conteúdo da consciência, isto é, você mesmo.

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill