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segunda-feira, 9 de abril de 2018

A totalidade da consciência é contradição


A totalidade da consciência é contradição

Creio que a maioria de nós deseja fruir uma certa paz. Muito falam os políticos a esse respeito; isso se tomou sua fraseologia predileta, seu tema favorito. Cada um de nós, também, deseja a paz. Mas, parece-me, a espécie de paz a que aspiram os entes humanos representa mais uma fuga; desejamos encontrar um estado no qual a mente se possa recolher e nunca refletimos se é realmente possível nos libertarmos de nossos conflitos e alcançarmos, assim, a verdadeira paz. Desejo, pois, falar a respeito do conflito, porque acho que se o conflito pudesse ser eliminado — fundamentalmente, profundamente, interiormente, além do nível mental consciente — então, talvez, haveria paz.

A paz a que me refiro não é a paz que buscam o intelecto e a mente; é coisa inteiramente diferente. Ela se torna um fator altamente perturbador, tanto é criadora e, por conseguinte, destrutiva. Para chegarmos a essa compreensão da paz, parece-me essencial que compreendamos o conflito, porquanto, se não penetrarmos fundo, radicalmente, o problema do conflito, não teremos paz nem exterior nem interior, por mais que a busquemos, ainda que a desejemos com ardor.

Para conversarmos a respeito de alguma coisa — sem distinção entre orador e ouvintes, pois esta é uma relação absurda — cumpre que vós e eu estejamos pensando e sentindo no mesmo nível, investigando do mesmo ponto de vista. Se vós e eu pudermos examinar juntos esta questão do conflito, com excepcional ardor e vitalidade, é bem possível que venhamos a descobrir uma paz completamente diferente daquela que a maioria de nós está a buscar.

Existe conflito quando existe um problema, não? Todo problema redunda em conflito, porquanto implica ajustamento, esforço para compreender algo, livrar-se de algo, encontrar uma solução. E temos, quase todos nós, uma grande variedade de problemas — problemas sociais, econômicos, problemas atinentes às relações, ao conflito entre as ideias etc. E esses problemas permanecem sem solução, não é verdade? De fato, nunca pensamos neles de maneira completa, até o fim, para deles nos libertarmos; mas continuamos a levar de dia para dia, de mês para mês, pela vida afora, toda espécie de problema, como um fardo na mente e no coração. Parecemos incapazes de gozar a vida, de ser simples, porque tudo o que tocamos — o amor, Deus, as relações, tudo — se reduz, por fim, a um problema medonho, inquietador. Se tenho apego a uma pessoa, isso se torna um problema e desejo, então, saber como desapegar-me. E se amo, vejo que nesse amor há ciúme, ansiedade e medo. E não podendo resolver os nossos problemas, vamo-los levando conosco, pois não nos sentimos aptos a solucioná-los.

Em seguida, temos a competição, que também suscita problemas. Competição é imitação, é tentar igualar a outro. Temos o modelo de Jesus, o modelo do herói, do santo, do vizinho mais rico, e há também o padrão interior que a pessoa estabelece para si própria e procura seguir, viver de acordo com ele. A competição, pois, faz nascer muitos problemas.

E há também a ânsia de preenchimento. Cada um deseja preencher-se de uma ou de outra maneira — por meio da família, da esposa, do marido, do filho. E, passando um pouco mais além, encontramos o desejo de nos preenchermos socialmente, escrever um livro, tornar-nos famosos de alguma maneira. E quando existe esta ânsia de preenchimento, de nos tornarmos alguma coisa, existe também a frustração, e com a frustração vem o sofrimento. E apresenta-se então o problema de como evitar o sofrimento e, ao mesmo tempo, termos a possibilidade de preencher-nos. E ficamos, assim, aprisionados neste círculo vicioso, em que tudo se converte num problema, num conflito.

E já nos acostumamos a admitir o conflito como coisa inevitável; consideramo-lo, até, respeitável e necessário à evolução, ao desenvolvimento, ao “vir a ser” algo. Cremos que se não houvesse competição, conflito, estaríamos condenados à estagnação, à deterioração; assim, mental e emocionalmente, estamos sempre tratando de nos tornar mais sagazes, sempre lutando, perpetuamente em conflito com nós mesmos, nosso próximo, e o mundo. Isto não é exageração; é um fato. E acho que todos sabemos que fardo tremendo esse conflito representa.

Assim, parece-me que a questão urgente é esta: se percebeis a real importância de se ficar livre do conflito — mas não com o fim de alcançar outra coisa. É verdadeiramente possível ser livre, simplesmente, intrinsecamente, de modo que a mente não mais esteja em conflito, quaisquer que sejam as circunstâncias? No momento não sabemos se isso é possível ou não. O que sabemos é só que estamos em conflito, e conhecemos as penas que ocasiona, o sentimento de “culpa”, o desespero, o irremediável da moderna existência; é só o que sabemos.

Assim, como poderemos descobrir, não no nível verbal, intelectual ou puramente emocional, mas descobrir realmente se é possível ser livre? Como começar? Certo, se não se compreender inteiramente esse conflito, em todos os níveis da consciência, não será possível nos libertarmos dele e compreendermos o que é a Verdade. A mente em conflito está confusa. E quanto maior a tensão do conflito, tanto maior a produtividade de ação. Deveis ter notado como os escritores, os oradores, os chamados intelectuais, estão sempre a produzir teorias, filosofias, explicações. Se são dotados de algum talento, então, quanto maior a tensão e a frustração, tanto mais produzem; e o mundo os chama grandes autores, grandes oradores, grandes líderes religiosos, etc.

Ora, se observarmos atentamente, veremos que o conflito desfigura, perverte; ele é, em essência, confusão, e destrutivo da mente. Se pudermos perceber isso verdadeiramente — sem dizer que o conflito da competição é inevitável, que a estrutura social é edificada sobre esta base, e que temos de tê-lo, etc. — então penso que nossa atitude em relação ao problema será bem diferente. Penso ser esta a coisa primordial: ver o fato, não intelectualmente, verbalmente, mas, sim, entrando realmente em contato com o fato. Desde o momento de nascermos até o momento de morrermos, existe esta incessante batalha interior e exterior; e somos capazes de ver realmente o fato de que esse conflito é ininteligente? Que é que nos dá energia e vitalidade para entrarmos em contato emocional com um fato?

Vede, há séculos que somos educados para viver em conflito, para aceitar ou encontrar uma maneira de fugir-lhe. E, como sabeis, existem inúmeras vias de fuga — contrair o hábito de beber, frequentar mulheres, igrejas, buscar a Deus, tornar-se altamente intelectual, repleto de saber, ligar o rádio, comer em excesso. E sabemos também que nenhuma dessas fugas resolve o problema do conflito; só serve para aumentá-lo. Mas estamos dispostos a enfrentar deliberadamente o fato de que não existe fuga de espécie alguma? Creio que nossa principal dificuldade resulta de termos criado tantos meios de fuga, que nos tornamos incapazes de ver o fato diretamente.

É preciso, pois, examinarmos profundamente esta questão relativa às nossas fugas conscientes e inconscientes. Parece bastante fácil descobrir as fugas conscientes. Delas estais apercebidos — não é verdade? — ao ligardes o rádio, ao vos dirigirdes à Igreja no domingo, depois de terdes levado na semana inteira uma vida brutal, ambiciosa, invejosa, repulsiva. Mas é muito mais difícil descobrir quais são as fugas ocultas, inconscientes.

Desejo examinar um pouco este problema da consciência. A consciência, na sua totalidade, é formada através do tempo, não? Resulta de milhares de anos de experiência; é constituída de influências raciais, culturais, sociais, provindas do passado e mantidas pela família, pelo indivíduo, pela educação, etc. A totalidade disso é a consciência; e, se examinardes vossa própria mente, vereis que na consciência existe sempre uma dualidade, “o observador e a coisa observada”. Tal fato não é de difícil percepção. Isto aqui não é uma aula de psicologia, nem um entretenimento analítico, intelectual. Estamos falando de uma experiência viva, real, que devemos — vós e eu — examinar deliberadamente, a fim de não ficarmos no nível puramente verbal.

Há necessariamente conflito na totalidade da consciência quando nela existe divisão entre pensador e pensamento. Esta divisão ocasiona a contradição; e onde há contradição é inevitável o conflito. Sabemos — não é verdade? — que estamos em contradição, tanto exterior como interiormente. Exteriormente, existe contradição em nossas ações, pois desejamos viver de certa maneira e vemo-nos obrigados a exercer atividades de outra ordem; e, interiormente, existe contradição em nossos pensamentos, sentimentos e desejos. Sentimento, pensamento, desejo, vontade, e a palavra, constituem a totalidade de nossa consciência, e nesta totalidade existe contradição, porque nela há sempre divisão — o censor, o observador sempre a observar, esperar, modificar, reprimir, e o sentimento ou pensamento sobre o qual (o censor ou observador) atua.

Quando examinamos este problema, nós mesmos — não através de livros, filosofias e leituras de tudo o que foi dito por outras pessoas, que é apenas palavras ocas, — quando o examinamos muito profundamente, persistentemente, sem escolha, sem rejeição ou aceitação descobre-se, então, necessariamente, o fato de que a totalidade da consciência é, em si, um estado de contradição, porque lá existe sempre o pensador a atuar sobre o pensamento, e a criar, por consequência, intermináveis problemas.

Surge assim a questão sobre se é inevitável esta divisão da consciência. Existe realmente um pensador separado, ou foi o pensamento que criou o “pensador”, a fim de ter um centro permanente, de onde pensar e sentir?

Vede, senhores, que para compreendermos o conflito temos de examinar bem isto. Não basta dizer-se: “Desejo libertar-me do conflito”. Se é só isso que se deseja, então podemos também tomar uma droga, um calmante — coisa muito simples, e barata. Mas, se se deseja realmente penetrar a fundo na questão e extirpar completamente todas as fontes de conflito, cumpre investigar a totalidade da consciência — todos os obscuros recantos da mente e do coração, onde se embosca a contradição. E só podemos compreender profundamente ao começarmos a indagar porque existe esta divisão entre pensador e pensamento. É preciso indagar se existe realmente um pensador, ou se apenas existe pensamento. E se só existe pensamento, onde está o centro de onde procedem todos os pensamentos?

Pode-se ver — não é verdade? — porque o pensamento criou um centro que se tornou “eu”, “ego” — o nome que se lhe dê é sem importância, desde que se reconheça que existe um centro de onde promana o pensamento. O pensamento anseia pela permanência; e vendo que suas próprias expressões são impermanentes, cria o centro — o “eu”. E logo surge a contradição.

Para se perceber tudo isso realmente — e não apenas aceitá-lo verbalmente — é necessário em primeiro lugar rejeitar todas as fugas; eliminar, como um cirurgião, toda forma de fuga. Requer isso intenso percebimento, sem escolha, sem apego às fugas agradáveis e evitando-se as desagradáveis. Isso requer energia, vigilância constante, porque o intelecto de tal maneira se acostumou à fuga, que esta se tornou mais importante do que o fato concreto do qual está a fugir. Mas só quando há a total rejeição da fuga, estamos em condições de encarar, de enfrentar o conflito.

Então, se chegamos até esse ponto, se, física, emocional e intelectualmente rejeitamos toda forma de fuga, que acontece? Existe então problema? Por certo, é a fuga que cria o problema. Quando já não estais competindo com vosso vizinho, já não estais tentando preencher-vos, nem transformar-vos noutra coisa, existe então conflito? Estais apto a enfrentar o fato — o que sois realmente — como quer que ele seja. Não há então julgamento como “bom” ou “mau”. Sois então o que sois. E o próprio fato tem efeito atuante: não há mais “vós” a atuar sobre o fato.

Tudo isso é realmente muito interessante, como vereis se deveras o examinardes. Considere-se o ciúme. Em geral somos ciumentos, invejosos, em grau agudo ou tolerável. Ao perceberdes efetivamente que sois ciumento, sem rejeitar nem condenar esse estado, que sucede? O ciúme é então mera palavra ou um fato? Espero estejais prestando atenção, porquanto, como sabeis, a palavra tem extraordinária importância para a maioria de nós. A palavra “Deus”, a palavra “comunista”, a palavra “negro” têm imenso conteúdo emocional neuroló­gico. Do mesmo modo, a palavra “ciúme” já está “carregada”. Ora, se se põe de parte a palavra, resta então o sentimento. Este é que é o fato, não a palavra. E encarar o sentimento sem a palavra requer completa isenção de condenação e justificação.

Quando, alguma vez, sentirdes ciúme, cólera, ou, mais especialmente, quando sentirdes deleite a respeito de alguma coisa, vede se podeis distinguir a palavra do sentimento, se a palavra é o mais importante, se o sentimento. Descobrireis, então, que, no olhar o fato sem a palavra, há uma ação que não é processo intelectual; o próprio fato está operando e, por conseguinte, não há contradição, nem conflito.

É verdadeiramente extraordinário o descobrirmos diretamente que só há pensar e não há pensador. Porque se vê, então, que se pode viver neste mundo sem contradição, já que se necessita de muito pouca coisa. Se se necessita de muita coisa — sexual, emocional, psicológica ou intelectualmente — há dependência de outrem; e no momento em que começa a dependência, começa a contradição e o conflito. Quando a mente se liberta do conflito, com essa liberdade se manifesta um movimento de caráter de todo diferente. A palavra “paz”, como a conhecemos, não tem aí aplicação, porque esta palavra tem para nós diferentes significados, conforme a pessoa que a emprega — um político, um sacerdote, ou quem quer que seja. Não é a prometida paz celestial, após a morte; ela não se encontra em nenhuma igreja, nenhuma ideia, nem na adoração de nenhum Deus. Ela surge quando ocorre a cessação total de todo conflito interior; e isso só é possível quando não há nenhuma necessidade. Não há então necessidade, nem mesmo de Deus. Só há um movimento imensurável que não pode ser corrompido por ação alguma.[...]

PERGUNTA: Que queríeis dizer ao declarardes, há dias, que devemos ser perturbados?

KRISHNAMURTI: Peço-vos não considerar-me como uma autoridade; isso seria uma coisa terrível. Mas podeis ver por vós mesmo que o desejo de não sermos perturbados é uma de nossas principais necessidades. E é possível que a mente, o intelecto, ao deter seu incessante “tagarelar”, descubra uma grande perturbação interior. Podeis ver por vós mesmo que vossa mente vive ocupada — com a esposa, o marido, o sexo, a nacionalidade, Deus, sobre onde obter a próxima refeição, etc. E já procurastes averiguar por que ela vive ocupada, e que aconteceria se não estivesse ocupada? Se o fizerdes, vos vereis frente a frente com algo em que nunca pensastes; e esse algo pode ser um fato extremamente perturbador. E é realmente. Esta constante ocupação da mente pode ser uma simples fuga ao fato, ou seja, nossa tremenda solidão e vazio. E essa perturbação precisa ser enfrentada e profundamente examinada.

Krishnamurti, Paris, 10 de setembro de 1961, O Passo Decisivo

A percepção total que é livre de hesitação

A percepção total que é livre de hesitação

Desejo apreciar junto convosco a questão da autoridade e da liberdade. E pretendo penetrá-la muito profundamente, pois considero bem importante compreender toda a anatomia da autoridade.

Assim, em primeiro lugar, preciso assinalar que não estou discursando academicamente, superficialmente, verbalmente; mas, se estamos real e seriamente interessados, então, penso eu, pelo simples ato de escutar corretamente, ocorre não só a compreensão, mas também a libertação imediata da autoridade. Por certo, o tempo não liberta a mente de coisa alguma. Só é possível a libertação quando há percepção direta, compreensão completa, sem esforço, sem contradição, sem conflito. Essa compreensão liberta a mente, de pronto, de qualquer problema que a acabrunha. Se seguirmos o problema e a mente for capaz de penetrá-lo de modo completo, por inteiro, ver-nos-emos então livres desse peso.

Não sei se já refletistes com profundeza sobre a questão da autoridade. Se o fizestes, deveis saber que a autoridade destrói a liberdade, impede a criação, gera medo e, de fato, entrava o pensamento. Autoridade implica submissão, imitação, não achais? Existe não apenas a autoridade exterior da polícia, da Lei — a qual até certo ponto é compreensível — mas também a autoridade interior do saber, da experiência, da tradição, da observância de um padrão estabelecido pela sociedade, por um instrutor, determinando como devemos proceder, comportar-nos, etc.

Vamos tratar inteiramente da compreensão da autoridade interior, psicológica; da psique, que estabelece um padrão de autoridade para sua própria segurança.

Já vos perguntastes alguma vez por quê, através das idades, os entes humanos sempre confiaram a outros o estabelecer seus padrões de conduta? Queremos — não é verdade? — que nos digam o que devemos fazer, como devemos portar-nos, o que devemos pensar, como devemos agir em certas circunstâncias. Esta busca de autoridade é constante, porque a maioria de nós teme o erro, o malogro. Vós adorais o êxito, e a autoridade oferece o êxito. Se seguis uma determinada linha de conduta, se vos disciplinais consoante certas ideias, dizem-vos que, no fim, encontrareis a salvação, a perfeição, a liberdade. Para mim, a ideia de que a disciplina, o controle, a repressão, a imitação e o ajustamento podem conduzir à liberdade, é totalmente absurda. Decerto não podemos cercear a mente, moldá-la, pervertê-la e, graças a esse mecanismo, encontrar a liberdade. As duas coisas são incompatíveis, mutuamente se repelem.

Ora, por que é que a mente e o intelecto humano buscam sempre um padrão ao qual ajustar-se? E permiti-me dizer aqui que minha explicação não tem valor nem significado se não estais, cada um de vós, apercebidos de vossa própria inclinação para seguir — seguir uma ideia ou um instrutor. Mas, se a explicação vos está realmente despertando o percebimento do estado de vossa própria mente, então as palavras têm significação. Assim, por que existe esse impulso para seguir? Não resulta ele do desejo de certeza, de segurança? Sem dúvida, o desejo de segurança é o motivo, a razão fundamental dessa ânsia de seguir. E isso subentende não é verdade? — o sentimento de que pelo bom êxito, pelo ajustamento, evitaremos completamente o medo. Mas, existe segurança interior? Ora, a própria busca de segurança é medo, não? Exteriormente, talvez seja necessário um certo grau de segurança — teto, três refeições por dia, roupas, etc.; mas, interiormente, existe segurança? Estais seguro em vossa família, em vossas relações? Não ousais duvidar disso, não é verdade? Achais que sim, pois isso se tornou tradição, costume. Entretanto, no momento em que pondes em dúvida vossas relações com vosso marido, vossa esposa, vosso filho, vossos vizinhos, esse próprio duvidar se torna perigoso.

Todos nós buscamos segurança, nesta ou naquela forma; e, portanto, necessitamos da autoridade. Assim, dizemos que existe Deus e que Ele, quando tudo mais falhar, nos dará a segurança final. Vivemos apegados a certos ideais, esperanças, crenças, que nos garantirão a permanência, neste mundo e no outro. Mas, existe segurança? E eu acho que cada um de nós precisa descobrir, precisa lutar para compreender claramente se há, ou não, tal coisa — segurança.

Exteriormente, pouca segurança existe hoje em dia. As coisas estão mudando com rapidez; mecanicamente, temos novas invenções, bombas atômicas; e, socialmente, temos revoluções externas, principalmente na Ásia, a ameaça de guerra, o comunismo, etc. Mas as ameaças à nossa segurança interior criam em nós uma resistência muito maior. Quando credes em Deus ou numa certa espécie de permanência interior, é quase impossível quebrar tal crença, porque nessa esperança estais firmemente enraizado. Já aderimos, cada um de nós, a uma certa maneira de pensar e, se ela é verdadeira ou falsa, se tem alguma realidade ou racionalidade, isso parece não nos importar; aceitamo-la e a ela nos atemos.

Abrir caminho através de tudo isso, descobrir sua verdade intrínseca, implica uma revolução muito mais importante do que qualquer revolução comunista, socialista ou capitalista. Isso significa o começo da libertação da autoridade, e o descobrimento de que positivamente não existe permanência ou segurança interior. Significa, por conseguinte, descobrir que a mente deve estar a todas as horas num estado de incerteza. E nós tememos a incerteza, não é verdade? Pensamos que, se se visse num estado de incerteza, o intelecto se despedaçaria, se tornaria doente. Infelizmente, existem tantos casos de insanidade mental por causa dessa impossibilidade de encontrar a segurança. Arrancadas de suas amarras, suas crenças, ideais, fantasias, mitos, as pessoas se tornam mentalmente doentes. A mente que está realmente incerta não conhece medo. Só a mente medrosa segue, exige a autoridade. E é possível perceber bem isso e lançar fora, completa e totalmente, a autoridade e o medo?

E que se entende por ver? Ver é uma simples questão de explicação intelectual? As explicações, os raciocínios, a lógica sutil, vos ajudarão a perceber o fato de que a autoridade, a obediência, a aceitação, o conformismo entravam a mente? Considero muito importante esta pergunta. Ver nenhuma relação tem com palavras nem com explicações. Estou certo de que se pode ver qualquer coisa diretamente, independente de persuasão verbal, argumentação ou raciocínio intelectual. Se rejeitais a persuasão, a influência — que são coisas elementares, infantis — que poderá impedir-vos de ver e, portanto, de ser livre imediatamente? Para mim, ver é uma ação de caráter imediato, independente do tempo. E, portanto, a libertação da autoridade não depende do tempo; não é dizer: “Serei livre”. Mas, enquanto a autoridade vos dá prazer, enquanto o mecanismo de seguir vos parece atraente, não estais permitindo que o problema se vos mostre diretamente e, por conseguinte, se torne urgente, de vital importância.

O fato é que a maioria de nós gosta do poder — o poder da mulher sobre o marido ou deste sobre a mulher, o poder que a capacidade dá, o sentimento de se ser talentoso, o poder que dão a austeridade e o controle do corpo. Qualquer forma de poder representa autoridade — seja o poder do ditador, o poder político, o poder religioso, seja o domínio de um indivíduo sobre outro. O poder é extremamente nocivo, e porque não podemos ver isso, simples e diretamente? Com ver, refiro-me a um percebimento total, livre de hesitação: uma “correspondência” total. Que é que impede essa correspondência total?

Isso suscita a questão da autoridade da experiência, do saber, não é verdade? Está visto que, para se ir à Lua, para se construir um foguete, necessita-se de conhecimentos científicos; e à acumulação de saber chamamos experiência. Externamente, necessita-se do saber. Precisamos saber onde moramos, precisamos saber construir, juntar coisas e separar coisas. Esse conhecimento externo é superficial, mecânico, puramente adicional, um contínuo descobrir de coisas e mais coisas. Mas acontece que o saber e a experiência se tornam nossa interna autoridade. Podemos rejeitar a autoridade externa como infantil; podemos deixar de pertencer a determinada nação, grupo ou família, de estar apegados a uma dada sociedade com seus peculiares costumes, códigos, etc.; mas, renunciar às experiências que acumulamos, à autoridade do saber que acumulamos, isso é extremamente difícil.

Não sei se já tendes considerado este problema; mas, se o fizerdes, vereis que a mente que está carregada, pejada de saber e de experiência, não é uma mente “inocente”, uma mente
nova; é uma mente velha, decadente, que nunca será capaz de entrar em contato — livremente, plenamente, totalmente — com uma coisa viva. E no mundo atual, tanto interior como exteriormente, urge que tenhamos uma mente nova, fresca, uma mente jovem, para podermos resolver todos os nossos problemas — não um dado problema específico da ciência, da medicina, da política, etc., mas o problema humano total. A mente velha é uma mente cansada, entravada; mas a mente nova vê prontamente, sem distorção, sem ilusão: é penetrante, precisa, livre das limitações do conhecimento acumulado e da passada experiência.

Afinal, que é essa experiência que nos proporciona um tão forte sentimento de nobreza, de sabedoria, de superioridade? “Experiência”, sem dúvida, é a reação de nosso “fundo mental” (background) a um “desafio”. A reação é condicionada por esse “fundo” e, portanto, cada experiência torna mais forte o “fundo”. Se sois membro de alguma igreja, devoto de determinada seita, tendes experiências e visões de acordo com esse fundo — e essas experiências e visões, por sua vez, reforçam o fundo. Não é verdade isso? E esse condicionamento, essa propaganda religiosa — seja velha de dois mil anos, seja moderna — nos está moldando a mente, influenciando a reação de nosso intelecto. São inegáveis essas influências; elas prevalecem sempre. A influência comunista, socialista, católica, protestante, hinduísta e dúzias e centenas de influências outras invadem-nos a mente a todas as horas, consciente ou inconscientemente, moldando-a, controlando-a. A experiência, pois, não liberta a mente, não a torna jovem, fresca, “inocente”. O que se faz necessário é a destruição total do fundo.

A compreensão, disso não é questão de tempo. Se empreenderdes a tarefa de compreender cada influência separadamente, estareis morto antes de terdes compreendido todas elas. Mas, se compreenderdes plenamente, completamente, uma só influência, destroçareis todas as formas de influência. Todavia, para compreenderdes uma influência deveis examiná-la totalmente, completamente. Limitar-se a dizer que ela é boa ou má, é insuficiente. E para podermos penetrá-la completamente, não devemos ter medo. Penetrar inteiramente esta questão da autoridade é muito perigoso, não achais? Estar livre da autoridade é atrair o perigo, pois ninguém deseja viver na incerteza. Porém, a mente que está certa é uma mente morta; só a mente incerta é nova, fresca.

Para se compreender a autoridade, tanto interior como exterior, não se necessita do tempo. Um dos piores erros, um dos maiores empecilhos, é depender do tempo. Tempo, na realidade, significa adiamento. Significa que estamos gostando da segurança, da imitação, do seguir, e só dizemos isto: “Não me perturbeis. Ainda não estou disposto a ser perturbado”. Não vejo razão para não sermos perturbados; que há de errado em estar perturbado? Na realidade, quando uma pessoa não deseja ser perturbada, está justamente atraindo perturbações. Mas o homem que quer descobrir, não lhe importando se isso será perturbador ou não, esse homem está livre do medo à perturbação. Sei que isso fará sorrir a alguns de vós, mas a questão é muito grave, não é para rir. É fato que nenhum de nós deseja ser perturbado. Mas caímos numa rotina, num estreito canal — intelectual, emocional ou ideológico — e não desejamos ser perturbados. Em nossas relações e tudo mais, só queremos viver vida confortável, não perturbada, respeitável, burguesa. E desejar ser o contrário de burguês, o contrário de respeitável, é a mesma coisa.

Agora, se enquanto escutais estais atentos a vós mesmos, podeis ver que estar livre da autoridade não é uma coisa temível. É como aliviar-se de um pesado fardo. A mente experimenta de imediato uma extraordinária revolução. Para o homem que não busca a segurança em forma nenhuma, não há perturbações; há um contínuo movimento de compreensão. Se isso não se está passando convosco, neste caso não estais escutando, não estais vendo; estai-vos unicamente comprazendo em aceitar ou em rejeitar um certo conjunto de explicações. Assim, seria muito interessante descobrirdes por vós mesmo qual é vossa verdadeira reação.

PERGUNTA: A mente traz em si mesma os elementos de sua pró­pria compreensão?
KRISHNAMURTI: Acho que sim; não achais também? Que é que impede a compreensão? Os obstáculos não são criados pela própria mente? Por conseguinte tanto a compreensão como as próprias barreiras são elementos mentais.

Vede, senhor, para se viver numa base de incerteza, sem se tornar mentalmente doente, requer-se grande dose de compreensão. Não achais que uma das barreiras é o insistente desejo de segurança interior? Exteriormente, vejo que não existe segurança; assim, a mente cria, interiormente, a sua própria segurança, numa crença, num deus, numa ideia. A mente, portanto, cria sua própria escravidão, mas tem, também, os elementos de sua própria libertação.

PERGUNTA: Por que não pode ser perturbado um homem livre?

KRISHNAMURTI: É correta esta pergunta? Como nada sabeis acerca do homem livre, vossa pergunta se reduz a simples especulação; não tem — perdoai-me dizê-lo — significação nem para mim nem para vós. Mas, se inverterdes a pergunta, formulando-a assim: “Por que sou perturbado?” — então ela tem validade e pode ter resposta correta. Por que é perturbada uma pessoa — se meu marido me repudia, se me morre um ente querido, se experimento um fracasso, se sinto que não estou tendo êxito na vida? Se realmente investigásseis isto até o fim, podereis ver toda a sua essência.

PERGUNTA: A crença em Deus se baseia sempre no medo?

KRISHNAMURTI: Por que credes em Deus? Qual a necessidade? Interessa-vos a crença em Deus quando sois muito feliz ou só quando se vos apresentam tribulações? Vós credes, porque fostes condicionado para crer? Como bem sabemos, há dois mil anos que nos dizem que existe Deus; e no mundo comunista estão condicionando a mente para não crer em Deus. É a mesma coisa; tanto num como noutro caso a mente está sendo influenciada. A palavra “Deus” não é Deus; e o descobrirdes verdadeiramente, por vós mesmo, se tal coisa — Deus — existe, é muito mais significativo do que vos apegardes a uma crença ou descrença. E o descobrir por si mesmo requer enorme energia — energia para libertar-se de todas as crenças; porém isto não importa um estado de ateísmo ou de dúvida. Mas a crença é uma coisa muito confortante, e poucos estão dispostos a despedaçar-se interiormente. A crença não vos conduz a Deus. Nenhum templo, nem igreja, nem dogma, nem ritual pode conduzir-vos à Realidade. Essa Realidade existe; mas para descobri-la precisais de uma mente imensurável. A mente pequena, limitada, só pode encontrar os deuses pequeninos e limitados que ela mesma cria. Portanto, devemos estar prontos a perder toda a nossa respeitabilidade, todas as nossas crenças, para podermos descobrir o que é real.

Acho que não podeis continuar escutando. Se estivestes escutando indolentemente, ouvindo puramente as palavras, neste caso, sem dú­vida, poderíeis continuar ouvindo por mais algumas horas. Mas, se escutastes corretamente, atentamente, com o propósito de aprofundar, então dez minutos bastariam, porque neste espaço poderíeis destroçar as barreiras que a mente criou para si própria e descobrir o que é Verdade.

Krishnamurti, Paris, 7 de setembro de 1961, O Passo Decisivo

sexta-feira, 6 de abril de 2018

O mecanismo da ação contraditória


O mecanismo da ação contraditória

Um dos nossos grandes problemas, quer-me parecer, é saber o que nos cumpre fazer, que espécie de ação empreender, nesta civilização tão confusa e contraditória e exigente. Quase todos somos educados para fazer uma coisa e desejamos fazer outra coisa. O governo quer soldados e burocratas eficientes, e os pais desejam que seus filhos se adaptem à sociedade e ganhem o seu sustento; tal é mais ou menos o padrão adotado no mundo inteiro. A ocupação do indivíduo é determinada principalmente pela sua educação e as exigências da sociedade que o cerca.

Se estais de acordo, vou nesta tarde falar sobre um problema um tanto complicado e se tiverdes a bondade de prestar um pouco de atenção, penso que daí resultará uma ação não cultivada nem moldada por determinado meio social; e essa ação bem pode ser a solução do complicado problema de nossa existência.

Naturalmente, a todos nós interessa a ação, o que é necessário fazer; e "o que é necessário fazer" é geralmente ditado pelo mundo que nos cerca. Isto é, sabemos que temos de ganhar o nosso sustento numa dada função, como engenheiro, cientista, advogado, funcionário de escritório, ou o que quer que seja; e a isso se restringe a nossa superficial cultura, nossa educação. Nossa mente está ocupada, na maior parte do dia, com o meio de ganharmos o nosso sustento, o modo de nos ajustarmos ao padrão de nossa sociedade. Nossa educação limita-se ao cultivo de capacidades e à "memorização" de uma série de fatos, que nos habilitará a passar num dado exame e obtermos um dado emprego; assim, a nossa ação se estabiliza nesse nível, moldando-se de acordo com as necessidades de uma certa sociedade, uma sociedade que se está preparando para a guerra. A industrialização exige mais cientistas, mais físicos, mais engenheiros, e por consequência torna-se necessário cultivar essa camada da mente, pois é isso que interessa em primeiro lugar à sociedade.

E, se examinardes bem, reconhecereis que é isto que interessa à maioria de nós: — adaptar-nos às exigências da sociedade. E surge, assim, em nossa vida, uma contradição entre esse nível mental, supostamente educado, e aquela atividade mental profunda, inconsciente, contradição de que bem poucos se dão conta. E se dela nos damos conta, passamos meramente a buscar alguma espécie de satisfação, uma certa solução fácil para as torturas impostas pela necessidade de ganharmos nosso sustento, numa dada profissão, enquanto interiormente desejamos ser ou fazer outra coisa. É isto que está realmente acontecendo, em nossa vida, ainda que não o notemos. Toda ação nascida do nível mental superficial, "educado", é evidentemente ação incompleta, e esta ação parcial se acha sempre em contradição com a ação total do homem. Isto me parece bastante claro.

Isto é, um indivíduo é educado para ser funcionário de escritório, para ser advogado, ou exercer qualquer outra profissão, e é só isso que interessa à sociedade. Os governos e as indústrias querem cientistas, físicos, engenheiros, a fim de prepararem a guerra, incrementarem a produção, etc. etc. E, assim, cada um é educado para uma certa profissão, mas a totalidade do seu ser fica por descobrir, não revelada, e, por consequência, vê-se o homem num perene conflito interior. Acho que isso se torna bastante claro a quem observa as atividades sociais e políticas, e as práticas religiosas do homem. Quase todos fazemos, na vida diária, alguma coisa em franca contradição com o que sentimos ser a verdadeira coisa que desejamos fazer. Temos responsabilidade e deveres que nos escravizam e dos quais gostaríamos de livrar-nos, e a fuga que empreendemos assume o aspecto de especulação, de teorias a respeito de Deus, de ritos religiosos, etc. Há inumeráveis formas de fuga, inclusive o beber, mas nenhuma delas resolve o nosso conflito interior. Que cumpre então fazer?

Não sei se já fizestes, alguma vez, esta pergunta a vós mesmos. Toda ação nascida dessa contradição interior, tem de criar inevitavelmente, mais malefícios e sofrimentos. E é isto justamente o que estão fazendo os políticos, neste mundo. Por mais sensato que seja o político, criará inevitavelmente malefícios se não compreender o movimento total da mente e promover uma ação resultante dessa compreensão. E é sobre isto que quero falar: se se pode promover ação que não seja a ação da mera influência ou "motivo".

Tende a bondade de acompanhar-me um pouquinho mais longe. A ação que é produto da influência é ação limitada. Nossas mentes são o resultado de inumeráveis e contraditórias influências, e toda ação nascida desse estado contraditório tem de der também contraditória. E a cultura, a sociedade, baseada nessa contradição, há de criar, necessariamente, intermináveis conflitos e sofrimentos. Isto também é muito claro é um fato histórico, quer vos agrada, quer não. Pode-se ver que, enquanto a mente está ocupada, à superfície, com o viver de cada dia, existem, abaixo desse nível, uma infinidade de "motivos": Desejos de satisfação, avidez, inveja, os impulsos da paixão, do medo, etc. — com os quais a mente está também ocupada, embora possa o indivíduo não o perceber. E pode a mente descer além desse nível?

Expressando-o de outra maneira: com o que está ocupada a mente? Notai: não a minha mente, mas a vossa mente. Sabeis com o que está ocupada à vossa mente? É óbvio que, durante o dia, ela está sempre ocupada, com o trabalho do escritório, a rotina da profissão. Abaixo dessa ocupação superficial da mente, existe uma ocupação de outra ordem: desejo de proteção, de segurança, ambição, etc. — e esta ocupação, em geral, está em contradição com a outra ocupação.

Para que esta palestra seja frutuosa e significativa, permito-me sugerir-vos escuteis com o fim de observar e descobrir de que modo está ocupada a vossa mente. Desejo examinar este problema da ocupação, porque estou convencido de que, se pudermos compreender perfeitamente a questão da ocupação da mente, nascerá, dessa compreensão uma ação que será a ação verdadeira, ação não nascida da vontade, da disciplina, e portanto não contraditória. Está claro o que estou dizendo?

Isto é, a menos que compreendais a totalidade de vossa ocupação, não é possível a ação "integrada". Vossa mente está superficialmente ocupada, no correr do dia, com as atividades de vosso emprego e outras, mas se acha também ocupada noutros níveis, noutras direções. Existe pois uma contradição entre essas duas camadas da mente, contradição que procuramos vencer pela disciplina, pelo conformismo, por várias maneiras de ajustamento, baseadas todas elas no temor; e a ação, por conseguinte, permanece contraditória; e é isso que se está passando com a maioria de nós. "O que cumpre fazer" não é problema nenhum, porque, quando perguntamos o que cumpre fazer, a resposta que vem está inevitavelmente em correspondência com os vossos níveis de ocupação e, consequentemente, só criará mais contradição.

Ora, com o que está ocupada a vossa mente? Prestai bem atenção a isto. Sabeis com o que a vossa mente está ocupada, todos os dias? Sabeis muito bem que ela se ocupa com os seus deveres e obrigações de cada dia. Abaixo desse nível, com o que mais está ocupada? Estais apercebidos da ocupação mais profunda? Se estais, percebereis que ela está em contradição com as atividades diárias; e, ou a mente consegue, de alguma maneira, adaptar-se, ajustar-se às atividades diárias, ou a contradição se torna tão completa que alimenta um conflito perpétuo, conducente a enfermidades de toda ordem.

Agora, senhores, de onde deve partir a ação? Desejo fazer certas coisas no mundo, tenho de ganhar a vida, trabalhar como um mouro; ou desejo pintar, escrever, pensar, ser uma entidade religiosa. Desejo trabalhar de uma certa maneira e, assim, a ação se torna necessária. De que fonte, de que centro, deve emanar essa ação? Eis o problema. Percebo que a ação procedente de qualquer "nível de ocupação", não pode deixar de criar contradição e sofrimentos. Não há diferença entre a ação de uma dona de casa, a ação de um advogado, e a ação da mente que busca Deus. Essas ações podem ser diferentes do ponto de vista social, mas na realidade não há diferença alguma, uma vez que a dona de casa, o advogado, e o homem que busca a Deus, estão todos ocupados. Socialmente, uma ocupação pode ser melhor do que outra, mas fundamentalmente todas as ocupações são mais ou menos a mesma coisa — não há "ocupação melhor".

Assim sendo, de onde deve partir a ação? De que centro deve proceder a ação para não ser contraditória, não produzir malefícios, sofrimentos e corrupção? Pode haver ação procedente de uma fonte verdadeira, que não seja "ação da ocupação"? Estou esclarecendo bem o ponto? Provavelmente, não. Como disse, este é um problema muito complexo, e espero não o estar tornando complicado demais.

Deixai-me expor a questão de maneira diferente. Vossas mentes estão ocupadas, não é verdade? E que aconteceria, se a mente não estivesse ocupada? Que aconteceria a uma dona de casa, se não estivesse ocupada com as coisas da cozinha, ou ao homem que não estivesse ocupado com os seus negócios? Que vos aconteceria, se vossa mente não estivesse ocupada? A reação imediata é de responder que estaríamos ocupados com isto ou aquilo, se não estivéssemos ocupados com o que ora estamos fazendo — o que indica a necessidade que temos, de ocupação. A mente que se vê desocupada, sente-se perdida e, por isso, está sempre em busca de ocupação. Sua ocupação é invariavelmente contraditória, gerando, portanto, malefícios. E depois de criarmos o malefício, nos preocupamos sobre como afastá-lo, e nunca damos atenção à ocupação da mente. Mas se pudermos compreender a ocupação da mente, em diferentes níveis, descobriremos a ação que surge quando a mente já não está ocupada, a ação que não gera malefícios.

Já procurastes averiguar porque a mente está ocupada? Tentai-o agora, senhores, pelo menos para vos distrairdes. Mas, antes de tudo, precisais estar apercebidos de que vossa mente está ocupada, como é bem óbvio. Estais ocupado com vossos negócios, vosso progresso ou fracasso, as brigas de vossa mulher convosco, ou vossas brigas com ela, etc. E há a ocupação do sanyasi, do homem dito religioso, que está sempre lendo, murmurando palavras, cantando litanias, celebrando intermináveis rituais, disciplinando-se, adaptando-se ao padrão de um ideal. Tudo isso é ocupação.

Todos vivemos ocupados, não é verdade? É o natural da mente, estar sempre ocupada? Se é esse o seu estado natural — estar ocupada, com coisas elevadas ou com coisas vulgares (o que é muito relativo) — a mente então nunca descobrirá a verdadeira ação. Não pode a mente observar, prestar atenção, descobrir, quando está constantemente ocupada e, sim, apenas, quando é capaz de não estar ocupada. Enquanto a mente estiver ocupada, toda ação nascida dessa ocupação há de ser restritiva, limitada, causadora de confusão. Experimentai para ver como é sutil e difícil ter uma mente que não esteja sempre cheia; entretanto, se há um impulso ardoroso, para descobrir a ação correta, neste mundo louco, confuso e sofredor, tendes de chegar a esse ponto.

Nosso problema, por conseguinte, é: De que fonte, de que centro deve emanar a ação, para que não seja contraditória e causadora de confusão? O reformador social nunca faz esta pergunta, porque ele quer agir, reformar; e no próprio processo de reformação está criando malefícios. Todos os políticos e guias religiosos estão procedendo desse modo. Nem as mais extensas leituras de Escrituras, nem os maiores esforços de adaptação, ajustamento à sociedade, jamais deram solução aos nossos problemas. Pelo contrário, eles se estão multiplicando. Percebendo bem isso, cabe-nos compreender por que razão surgiu este estado de confusão e aflições. Ele surgiu, porque todos queremos ação imediata; e a ação imediata só se pode achar nas camadas superficiais de nossa consciência, procede da ocupação, da chamada mente educada.

Ora, existe ação que não seja resultado de esforço, que não seja da vontade? A ação da vontade é a ação do desejo; e o desejo, educado ou não, refreado ou livre, está circunscrito às camadas superficiais da consciência. Já não notastes, senhores, que quando desejais fazer determinada coisa, surge imediatamente uma contradição, sob a forma de temores coibitivos, exigências, exemplos, um senso de disciplina, que vos diz: "Não façais isto"? E vos vedes, assim, envolvidos em conflito. Em toda a duração de nossa vida, estamos presos nestas redes, da infância à morte, existe este perene estado de contradição e ajustamento. Em vista disso, pode a mente descobrir uma ação que não seja contraditória, que não seja mero ajustamento, que não seja produto de influências? Penso ser esta a questão fundamental, a questão certa. E aquela ação só pode ser achada quando estamos apercebidos da total ocupação da mente, e a compreendemos.

Sabeis com que está ocupada a vossa mente? Percorrei-a, camada por camada, e nela não encontrareis espaço algum não ocupado. E quando investigais o inconsciente, para descobrir a sua ocupação, mesmo assim a mente superficial, que está examinando o inconsciente, tem a sua ocupação própria. Que se deve então fazer? Queremos descobrir a total ocupação da mente, porque percebemos que, se dela não nos tornamos conhecedores, toda ação criará necessariamente contradição e, portanto, maiores sofrimentos.

Com que está ocupada a mente, a vossa mente? E, se não estivesse ocupada, que aconteceria? Não vos assustaríeis se descobrísseis que vossa mente não estava ocupada com coisa nenhuma? Surgiria imediatamente o impulso para vos ocupardes com alguma coisa. "Experimentai", e vereis que não há um só momento de desocupação da mente. E se experimentardes um raro momento em que ela não esteja ocupada — e esse é um estado indescritível — então, o "como retornar a esse estado" ou como retê-lo, se tornará vossa nova ocupação.

Estou, pois, alvitrando que só se tornará possível a verdadeira ação quando a mente compreender a totalidade de sua ocupação, tanto consciente como inconsciente, e conhecer o momento em que cessou a ocupação. Vereis, então, que a ação resultante desses momentos de desocupação, é a única ação "integrada". Quando não está ocupada, a mente não está contaminada pela sociedade, não é produto de inumeráveis influências, não é hinduísta nem cristã, nem comunista, nem capitalista. Por conseguinte, ela própria é uma totalidade de ação, com que não tereis de ocupar-vos e em que não precisais pensar.

Agora, se tivestes a bondade de escutar até aqui com atenção, se não estivestes dormindo, porém escutando com atenção completa, tereis experimentado, diretamente, o estado de não ocupação. Quando falamos ou escutamos, estamos apercebidos dos vários níveis de ocupação e de como eles são contraditórios. E apercebida da natureza totalmente contraditória da consciência, descobre a mente um estado em que não há ocupação. Isso traz um senso de ação completamente diferente. Não tendes então de fazer nada, porque a própria mente atuará.

Krishnamurti, Terceira Conferência em Madrasta, 18 de janeiro de 1956
Da Solidão à Plenitude Humana


quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Sobre o perene estado de contradição em nós mesmos

[...]Devemos estar interessados numa única questão, ou seja, como operar em nós mesmos uma transformação fundamengtal, que atinja não só as nossas relações sociais, mas também o nosso pensar, as nossas emoções, nossa expressão criadora e nosso viver diário. Se não se realiza, dentro do indivíduo, uma transformação fundamental, sem dúvida qualquer reforma proveniente do exterior só o forçará a ajustar-se ao novo padrão e, por conseguinte, não será transformação nenhuma. Transformação sob compulsão, influência, pressão sociológica, várias formas de legislação, não constitui a verdadeira transformação, porém, simplesmente, "continuidade modificada" do que já existia. Transformação dentro da esfera do tempo não é transformação — sendo "tempo" o processo de pensamento, de compulsão, imitação, gradual ajustamento. 

Agora, existe uma transformação fundamental não produzida sob pressão de espécie alguma, nenhum ajustamento a certo padrão ideológico? Existe uma transformação proveniente, totalmente, do interior e que não resulte de nenhuma pressão exterior? Nós nos transformamos superficialmente em virtude da compulsão, em várias formas, da ideia de recompensa, das pressões externas, da influência que em nós exercem os livros que lemos, etc.; mas tal mudança me parece superficial e, de modo nenhum, é a verdadeira transformação. Entretanto, é isso o que quase todos nós estamos fazendo com nossa vida. A mente consciente ajusta-se a um novo padrão social, econômico ou legislativo, mas isso não transforma na essência o indivíduo. Assim, se somos realmente sérios, deve-se-nos apresentar, inevitavelmente, a pergunta: É possível o indivíduo transforma-se a fundo, de modo que considere a vida, não parcialmente, fragmentariamente, porém como entidade integral, um ente humano total? 

Em regra, nós reagimos à ideia de recompensa e punição, a uma certa forma de compulsão, e é a isso que chamamos "atenção", em nossa vida diária. Se observardes, vereis que vossa ação, religiosamente e a outros respeitos, é parcial, fragmentária, não é a ação completa de nosso ser integral. E parece-me de toda necessidade, na presente crise mundial, que cada um de nós descubra por si mesmo se é possível agir, não em mera conformidade com padrões ideológicos, ou governamentais, ou pessoalmente impostos, porém como ente humano total, com todo o seu corpo, mente e coração. É possível atuar de maneira total? Basicamente, este me parece ser o único problema do homem.  

Vemos o que está acontecendo no mundo; vemos tirania, medonha crueldade, desditas a que estamos sujeitos, compulsões, uniformidade de pensar, como nacionalista, socialista, imperialista, o que quer que seja. Nesse "processo" não existe nenhuma ação plena por parte do indivíduo, ação em que sua mente e coração estejam unificados, seu ser inteiro completamente integrado. E parece-me que, se somos realmente sérios, em nosso próprio interesse devemos criar individualmente essa ação total; porque, enquanto nossa ação for simplesmente fragmentária, só da mente ou dos sentimentos, ou apenas dos sentidos, tal ação tem de ser contraditória e invariavelmente criará confusão. 

Agora, existe desejo, aspiração, vontade capaz de atuar como entidade total? Ou o desejo é sempre contraditório? E é possível a mente compreender a totalidade de si própria, tanto o consciente como o inconsciente, e atuar, não parcial ou fragmentariamente, porém como ente humano integrado, sem autocontradição? Para mim, tal ação é a única ação reta, porque todas as outras formas de ação gerarão conflito, tanto interior como exteriormente. 

Assim, como produzir essa transformação? Como poderá a mente atuar como entidade total, não dividida interiormente? Não sei se já refletistes alguma vez sobre este problema. Se já o fizestes, provavelmente pensais que os desejos contraditórios da mente podem ser harmonizados e que essa harmonia vem pelo esforço, pelas atividades ideológicas e várias formas de disciplina. Mas é possível harmonizar desejos contraditórios, como estamos tentando fazer? Eu sou violento e desejo ser "não-violento"; desejo ser artista, no lídimo sentido da palavra, e, no entanto, minha mente tende para a ambição, a avidez e a inveja, impedindo, assim, esse esforço criador. Dessarte, há uma perene contradição em nós mesmos. Esses desejos e conflitos promovem realmente certas atividades mas estas, também, em si mesmas, são contraditórias, como se pode ver diariamente em nossa vida. E é possível a mente alcançar aquela compreensão da totalidade de si própria, na qual a ação já não é questão de imitação, de compulsão, de medo, ou desejo de recompensa?[...] Isto é, a necessidade de uma ação não organizada pela mente, ação que não seja resultado de um pensar fragmentário, mas, sim, o reflexo de todo o nosso ser. Todos sentimos essa necessidade, porém não sabemos como atingir aquela ação. Podemos recorrer à religião, esperando encontrar uma ação não-contraditória, que seja completa; todavia, religião, para a maioria de nós, é uma coisa um tanto vaga e superficial, questão de crença, e nenhuma eficácia tem em nossa vida diária. Muito falamos a respeito disso que chamamos religião, mas o que dizemos não tem significação básica e apenas se torna mais um fator de contradição em nossa vida. Pensamos que devemos amar, mas não amamos. Desejamos buscar Deus, porém ao mesmo tempo estamos todos empenhados em atividades mundanas; e vemo-nos, assim, divididos, puxados em ambas as direções. Parece-me, entretanto, que a real compreensão do que é religião constitui a única solução para os nossos problemas. O mais importante, decerto, é que cada um de nós experimente diretamente a Realidade; e no próprio "processo" de experimentar a Realidade se encontra a ação da Realidade. Não se trata de experimentar a Verdade, e depois agir; o que há é ação da Verdade, no próprio "processo" de experimentar e compreender a Verdade. É então a Verdade que atua, e não a pessoa que compreende a Verdade. 

Jiddu Krishnamurti em, O Homem Livre

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Posso encontrar Deus numa trincheira?

[...] Interlocutor: Posso encontrar Deus numa trincheira?

Krishnamurti: Um homem que procura Deus não estará numa trincheira. Quão falsos são os modos do nosso pensamento. Criamos uma falsa situação e nela esperamos encontrar a verdade; no falso tentamos encontrar o real. Feliz daquele que vê o falso como falso e aquilo que é verdadeiro como verdadeiro.

Tornamo-nos pervertidos nos nossos modos de pensar-sentir. Na infelicidade desejamos encontrar a felicidade; só abandonando a causa da infelicidade é que há alegria, Você e o soldado criaram uma cultura que os força a matar e a serem mortos, e no meio desta crueldade desejam encontrar o amor. Se está à procura de Deus não estará numa trincheira, mas se lá estiver e o procurar, saberá como atuar. Justificamos o homicídio e no próprio ato de matar tentamos encontrar o amor. Criamos uma sociedade essencialmente baseada no valor sensorial, na mundaneidade, que necessita de trincheiras. Justificamos e consentimos a trincheira e depois, na trincheira ou no bombardeiro, esperamos encontrar Deus, o amor. Sem alterarmos fundamentalmente a estrutura do nosso pensamento-sentimento, o Real não é encontrado. Sendo invejosos, gananciosos e ignorantes, queremos ser pacíficos, tolerantes e sensatos; com uma mão assassinamos e com a outra pacificamos. É esta contradição que tem que ser compreendida; não pode ter ambas, ganância e paz, a trincheira e Deus; não pode justificar a ignorância e contudo esperar por iluminação.

A própria natureza do ego é estar em contradição; e só quando o pensamento-sentimento se liberta dos seus próprios desejos contraditórios pode haver tranquilidade e alegria. Esta liberdade com o seu júbilo chega com a consciência profunda do conflito da ânsia. Quando se tornar consciente do processo dual do desejo e estiver passivamente alerta, haverá a alegria do Real, alegria essa que não é o produto da vontade ou do tempo.

Não pode fugir da ignorância em qualquer altura, ela tem que ser dissipada através do seu próprio despertar; ninguém o pode despertar, salvo você mesmo. Através da sua própria auto-consciência é que o problema da sua criação cessa de ser.[...]

Jiddu Krishnamurti em Ojai - 5ª Palestra - 24/06/1945

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Contradições - Uma Entrada Criativa

Pergunta: Suas contradições, suas mentiras, e sua insistência em que nós não temos que acreditar em você, fez minha mente inoperante. Tudo o que posso dizer, certamente, é: "Eu não sei." Eu costumava ser bastante orgulhosa da minha mente, mas agora isto simplesmente parece estúpido. 

Osho: Minhas contradições estão destinadas a fazer exatamente o que está acontecendo com você. Eu não quero a sua mente sendo convencida por mim. Eu quero me relacionar com o seu coração, porque esta é a única comunhão verdadeira. Mente à mente é sempre superficial. 

Eu posso ser consistente, mas, então, estarei convencendo a sua mente e esta é a última coisa que quero fazer. Eu não sou um missionário e eu não tenho nenhuma mensagem para vocês. Só tenho experiência e o caminho que transmite a experiência para vocês, não é por meio de palavras, teorias, filosofias. O argumento não é a resposta. 

Portanto, primeiro, eu tenho que desmantelar sua mente, e a melhor maneira de desmantelar sua mente é contradizer-me tanto quanto eu puder. Ou você escapará, sentindo medo de que você possa ir à loucura ou, se você tiver coragem, você permanecerá aqui e irá realmente à loucura!

Quando a mente se torna inoperável é o momento quando o coração começa a funcionar. Você está em um bom espaço. Se a mente está dizendo: "Eu não sei", a mente está fechando a loja. E aqui, quando a mente fecha a loja, imediatamente as portas do seu coração começam a se abrir. São dois lados da mesma moeda: e é por isso que quando você me escuta me contradizendo, você tem que dar uma boa gargalhada. Esta é a resposta certa à minhas contradições.

Sim, isto ainda não é um estado de não-mente. Isto ainda é a mente que está dizendo: "Eu não sei." Quando a mente se for completamente, em um estado de não-mente, não haverá ninguém para dizer: "Eu não sei." Isto é o último saber. Isto é saber: "Eu não sei." - ao menos este tanto você sabe. Esta e a última barreira. Isto também se solta: então, não existe nenhum questão de saber ou não saber. Pela primeira vez você sente, e sentir é o caminho do experienciar. 

Quando você está na sua cabeça você está milhões de milhas distante de mim. Quando você está no seu coração você está no meu coração também, porque corações não conhecem separação. O coração é um. Ele bate em muitas pessoas e todo meu trabalho existe para que ele bata no mesmo ritmo em todos vocês. Então vocês se tornam uma orquestra. Há ainda muito mais do que o coração em você, mas sem coração você não pode alcançar seu tesouro mais interno: o Ser.

Portanto, estas são as três palavras: pensar, sentir, ser. Partindo do pensar, ninguém tem sido capaz de alcançar o Ser. Ninguém pode pular o sentir: o sentir é a ponte. O primeiro passo é ir do pensar ao sentir, e o segundo passo é, do sentir ao Ser. E em dois passos, toda a jornada está completa. Então lembre-se: o sentir será tremendamente lindo, mas não pare aí. Isto é só uma parada na viagem: você pode descansar aí por um pouco, desfrutar do mundo do coração, mas lembre-se que há um passo a mais.

Por meio de contradições eu destruo sua ligação com a mente e o pensar.  Através do silêncio eu destruo o mundo do seu sentimento. E, quando ambas estas camadas se forem, você é como a Existência queria que você fosse... na sua pureza, na sua individualidade. Você voltou para casa.

Portanto não se preocupe, a jornada começou. Não pare até que você volte para casa: onde não existe nenhum pensar, nenhum sentir, mas apenas um sentir a Existência. Nesta experiência, eu serei capaz de transmitir a você aquilo que é intransmissível por qualquer outro modo.

Então, eu não sou o mestre e você não é o discípulo. Na mente: eu sou o professor, você é a estudante. No sentir: eu sou o mestre, você é a discípula. No Ser, eu não sou, você não é: a Existência é.

O S H O

sábado, 31 de agosto de 2013

O que significa nossa chamada “busca da verdade”?

Que entendemos com conflito, por contradição? Por que existe contradição em nós? Compreendem o que eu entendo por contradição? — esta luta constante para ser algo diferente do que sou. Sou isto e quero ser aquilo. Essa contradição em nós é um fato, não um dualismo metafísico, sobre o qual não há necessidade de discorrermos. A metafísica nenhum valor tem para a compreensão do que é. Podemos discutir sobre o dualismo, dizer o que ele é, se existe, etc.; mas, que valor tem ele se não sabemos se existe contradição em nós, desejos antagônicos, interesses opostos? Isto é, quero ser bom e não consigo. Essa contradição, essa oposição que existe em nós precisa ser compreendida, porque gera conflito; e no conflito, na luta, não podemos criar individualmente. Vejamos com clareza o estado em que nos encontramos. Há contradição, e por isso tem de haver luta; e a luta é sempre destruição, desperdício. Em tal estado, nada podemos produzir, senão antagonismo, luta, mais amarguras e sofrimentos. Se pudermos compreender perfeitamente esse estado e ficarmos livres da contradição, haverá paz interior, a qual nos trará a mútua compreensão.

O problema, portanto, é este: Visto que o conflito é destrutivo, inútil, por que existe contradição em cada um de nós? Para compreender isso, precisamos ir um pouco mais longe. Por que existem desejos opostos? Não sei se estamos bem conscientes disso — dessa contradição, desse querer e não querer, desse lembrar-nos de uma coisa e querermos esquecê-la, substituí-la por algo novo. Observem bem. É um fato muito simples e muito normal. Nada tem de extraordinário. A verdade é que existe contradição. Mas, como nasce a contradição? Não é importante compreendê-lo? Porque se não fosse a contradição, não haveria conflito, não haveria luta, e o que é seria compreendido sem lhe acrescentarmos um elemento oposto, gerador de conflito. A questão que temos de examinar, portanto, é: Por que existe essa contradição e, consequentemente, essa luta inútil e destrutiva? Que significa contradição? Não implica ela um estado impermanente ao qual se opõe um outro estado impermanente? Isto é, julgo que tenho um desejo permanente. Admito em mim a existência de um desejo, e logo surge outro desejo, que o contradiz; e essa contradição gera conflito, que é desperdício. Isto é, há uma constante negação de um desejo por outro desejo, um interesse que se sobrepõe a outro interesse. Mas existe de fato um desejo permanente? Sem dúvida, todo desejo é impermanente — não metafisicamente, mas de fato. Não deem a isso uma significação metafísica, pensado que assim a compreendem. Na realidade, todo desejo é impermanente. Desejo um emprego. Isto é, penso que um determinado emprego me proporcionará felicidade, e quando o obtenho vejo-me insatisfeito. Quero tornar-me gerente, depois proprietário, etc.; não somente neste mundo, mas também no mundo dito espiritual — o professor quer ser diretor, o ministro quer ser bispo, o discípulo Mestre.

Assim, esse constante “vir a ser”, esse sucessivo passar de um estado para outro, produz contradição, não é verdade? Nessas condições, por que não encarar a vida, não como um desejo permanente, mas como uma série de desejos fugitivos, em constante oposição entre si? A mente, não tem necessidade de permanecer em estado de contradição. Se considero a vida, não como um desejo permanente, mas como uma série de desejos temporários, em constante mutação, não existe contradição... Muito importa compreender que, onde há contradição há sempre conflito, e que o conflito é improdutivo, inútil, quer se trate de uma disputa entre duas pessoas, quer de uma luta interior; como a guerra, ele é totalmente destrutivo.

A contradição, surge apenas quando temos um ponto fixo de desejo, isto é, quando a mente, não considerando todo desejo como uma coisa em movimento, transitória, se apodera de um desejo, atribuindo-lhe permanência: só então, ao surgirem outros desejos, apresenta-se a contradição. Mas todos os desejos estão em constante movimento, não há fixação do desejo. Não há um ponto fixo de desejo; a mente estabelece um ponto fixo, porque se serve de todas as coisas como um meio de ganho; e há de haver contradição, conflito, enquanto houver esse empenho de chegar. Não sei se percebem isso.

É importante compreender, em primeiro lugar, que o conflito é essencialmente destrutivo, quer se trate de conflito comunal, do conflito entre nações, entre ideias, quer do conflito interno do indivíduo. Ele é sempre destrutivo; e essa luta é aproveitada, explorada pelos sacerdotes, pelos políticos. Se percebemos bem isso, se percebemos realmente que toda luta é destrutiva, cabe-nos então descobrir a maneira de colocar fim à luta, isto é, investigar a contradição; a contradição implica sempre o desejo de vir a ser, de ganhar, o desejo de chegar — é isso, afinal de contas o que significa a chamada busca da verdade. Isto é, vocês querem atingir algo, querem alcançar bom êxito, querem encontrar, no final de tudo, um Deus ou a verdade, que passará a ser a permanente satisfação de vocês. Por conseguinte, não estão em busca da verdade, não estão à procura de Deus. Procuram satisfação com uma ideia, uma palavra de som respeitável, tal como Deus, a verdade; mas de fato, cada um de vocês está é em busca de satisfação, e, pondo essa satisfação, no mais alto nível, vocês a chamam Deus: no mais baixo nível ela se chama embriaguez pela bebida. Enquanto o que a mente busca é satisfação, não há muita diferença entre Deus e a bebida... Se desejam realmente encontrar a verdade, devem ser sinceros, ao extremo, e não apenas no nível verbal, mas totalmente; precisam estar extraordinariamente lúcidos, e não podem ter lucidez se se furtam a encarar os fatos. E é isto o que estamos tentando, nestas reuniões: perceber claramente, por nós mesmos o que é. Se não desejam ver, podem ir embora; mas se desejam encontrar a verdade, precisam estar extraordinariamente lúcidos, escrupulosamente lúcidos... Enquanto a mente estiver fixa com uma ideia, com uma crença, haverá contradição na vida; e essa contradição gera antagonismo, confusão, luta, o que significa que não haverá paz.

Jiddu Krishnamurti — O que estamos buscando?

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Observando a natureza exata da contradição

Não é possível a ação produtiva de energia enquanto existe contradição interior; e quase todos temos, consciente ou inconscientemente, muitas formas de contradição(...) Toda nossa vida se acha enredada nesse estado de contradição e, por conseguinte, não há uma ação clara, direta — a única que produz energia. (...) Em geral, estamos conscientes dessa contradição interior se de algum modo percebemos nossas atividades, nossos pensamentos e estados psicológicos. Por conseguinte, tentamos promover uma integração dentro de nós, e, para mim, esse ato, essa tentativa de integração é PURO CONTRA-SENSO. Não se podem integrar os opostos; não há nenhuma possibilidade de integrar o amor e o ódio.(...) Deve, pois, ficar bem claro — pelo menos por hora — que a tentativa de realizar a integração interior nada significa. O importante é COMPREENDER A CONTRADIÇÃO e, assim, ficar livre dela.

Para nos libertarmos da contradição, temos, primeiramente, de nos TORNARMOS CONSCIENTES DELE; e provavelmente nem todos a percebemos. Vamos, simplesmente, seguindo nosso caminho habitual. E ao darmos com essa enorme contradição, existente não só em nossa vida exterior, mas também muito profundamente, dentro de nós, o que ocorre? Como para ela não achamos solução, nenhuma possibilidade de libertação, voltamo-nos para aquilo que chamamos Deus, para aquela estrutura de crença, dogmas, ritos e autoridade, conhecida em geral pelo nome de “religião”. Ou aceitamos a vida tal como se nos oferece e nenhuma significação lhe damos — como estão tentando fazer vários escritores modernos. Rejeitaram toda a estrutura da Igreja, da religião organizada — COMO DEVE FAZER TODO HOMEM INTELIGENTE, já que, de fato, ELA NADA SIGNIFICA; mas, vendo-se, então, forçados a enfrentar suas próprias contradições, seus ódios, esperanças, frustrações, sua total impotência, dizem eles: “ A vida não tem significação nenhuma; tratemos, pois, de tirar dela o melhor partido possível” — e inventam uma filosofia do desespero. Existem, por conseguinte, estes dois e contraditórios extremos.

No meu sentir, é perfeitamente possível desarraigar todas as contradições — MAS NÃO PELO ATO DA VONTADE, porque a vontade, por sua vez, gera em si CONTRADIÇÃO. (...) Somos educados para exercer a vontade de todas as maneiras possíveis; somos ensinados a superar, a negar, a afirmar, a determinar. E, se se observa a natureza da vontade, percebe-se que ela é, em si própria, uma forma de resistência e, portanto, intrinsecamente, um estado de contradição.

(...) Para compreendermos a contradição em nossa vida, temos de penetrá-la muito profundamente (a contradição); e é aí que se nos apresenta o problema. Queremos que nos digam o que fazer; queremos ajustar-nos a algum padrão, ou seguir alguém, esperando, assim, sublimar, negar ou reprimir todas as formas de contradição — maneira muito superficial de proceder. Assim, para investigarmos a questão da contradição, temos de aprofundar-nos muito mais.

(...)Penetrar fundo significa compreender a contradição; e é necessário compreendermos a contradição, para podermos ter paz, não só dentro de nós, mas também na sociedade de que fazemos parte. Devemos ter paz; não guerra e paz. Para compreendermos esse extraordinário estado de contradição, altamente complexo e sutil, não podemos simplesmente ataca-lo exteriormente ou procurar remediar seus sintomas; o que temos de fazer é penetrar-lhe as próprias raízes.

A raiz da contradição é a separação entre o pensador e o pensamento. Para a maioria de nós existe um largo intervalo entre o “observador” e a “coisa observada”, entre o “pensador” e o “pensamento”, entre o “centro que experimenta” e a “coisa que é experimentada”; e é esse intervalo, vão, ou demora que é a verdadeira fonte da contradição.

Enquanto houver “pensador”, um censor a determinar o que é bom e o que é mau, haverá inevitavelmente essa constante separação criada pelo “pensador”, a qual, obviamente, sustenta a contradição. Esse é um fato que você deve descobrir diretamente, e não apenas aceita-lo porque alguém lhe disse; e esse próprio descobrimento é o começo daquela energia com a qual você tem a possibilidade de atacar a raiz do problema da contradição. (...) Se você admite essa separação entre o “pensador” e o “pensamento”, só porque lhe dizem que ela existe, isso não será para você uma revelação vital. Mas, se pessoalmente, descobre a separação, e percebe como um fato real, esse próprio percebimento produz a energia necessária para extinguir a contradição.

(...)Havendo na mente uma forte contradição, esta produz uma certa tensão. Quanto maior a tensão e maior a capacidade de expressão do indivíduo — como escritor, artista, político — tanto mais desgraças ele criará não só para si mesmo, mas também para o público.

(...) É necessário, pois, compreendermos a grande profundeza e o significado da contradição, para dela nos libertarmos completamente; porque, de outra maneira, o amor não pode existir. O que conhecemos do amor é apenas um estado contraditório, em que há ciúme, ódio, antagonismo. Amor não é o prazer carnal que denominamos “amor”, e tampouco é o suposto amor que está ligado ao ódio, à inveja, à ambição. O homem ambicioso, é óbvio, nunca conhecerá o amor. Quando o ambicioso, aquele que compete, fala a respeito de paz, o que diz nada significa. Só existe paz quando sua mente não compete, não compara e, por conseguinte, nenhuma contradição há em você. Assim, para se poder criar uma diferente estrutura social, uma diferente sociedade, é absolutamente necessário compreender a natureza e o significado dessa contradição interior.

(...) Assim, como estava dizendo, a raiz da contradição é essa separação existente entre “pensador” e o “pensamento”; e esses dois não podem integrar-se. Mas, se você observar a estrutura do “pensador”, verá que ele não existe quando não há pensamento. O pensamento é que gera o “pensador”, o “experimentador”, a entidade criadora do tempo e que é a origem do medo.

(...) Devemos, pois, compreender a natureza da contradição, e só podemos compreendê-la observando a integral estrutura do “pensador” com seus pensamentos, suas esperanças, seus desesperos — o pensador que, como censor, cria uma perene contradição entre si próprio e a coisa que em si mesmo observa. Por conseguinte, a observação DO QUE É exige seriedade, ardor, e não uma maneira leviana de observar. Só o ardoroso vive realmente; o homem superficial não viver absolutamente. Poderá ter riquezas, posse, posição, mas nada sabe acerca da vida. Dela só conhece a superfície. Para compreendermos toda essa estrutura de nós mesmos, a ela nos devemos chegar, não com a determinação de mudar, um esforço para sermos diferentes, porém, tão só com a disposição de observar O QUE É. Não há então, contradição, porque o observador já não está atuando como censor, como juiz que condena, que rejeita, que diz o que é certo e o que é errado, o que é bom e o que é mau. Isso não significa viver uma vida extremamente superficial. Ao contrário, para você alcançar esse ponto em que o censor é inexistente, você tem de compreender todo o seu condicionamento. Não se trata simplesmente de aceitar minha asserção, porquanto, para você compreender o condicionamento, tem de trabalhar, e verá então que sua mente se tornará simples observadora. Já não se achará num estado de contradição e, por conseguinte, disporá de intensa energia. Essa energia é amor, paixão — não a paixão física, que é relativamente fácil, relativamente comum, que é a sensualidade que todos conhecemos. Refiro-me à paixão que não tem causa e, portanto, nenhuma contradição encerra, nenhum motivo e, consequentemente, nenhum fim. Onde está o amor, aí está também a morte; os dois são inseparáveis, porque o amor é sem ambição.

A criação só pode verificar-se quando há uma energia que nunca foi contaminada pela vontade, que de nenhum esforço resulta; essa é a energia que a própria ação traz consigo. Atualmente todas as nossas atividades são mais ou menos egocêntricas, tem por centro nós mesmos em relação com várias coisas; e essa atividade egocêntrica, que é a atividade do “pensador”, inevitavelmente gera contradições. Vendo-se num estado de contradição, a mente exige alguma forma de expressão: preciso fugir, escrevendo, fazendo isto ou aquilo. O homem que se acha num estado de autocontradição — estado de atividade egocêntrica — e que porventura é pintor, artista, músico, poderá chamar “criação” ao que faz, mas não é criação. A criação DEVE ser, e é algo totalmente diferente.  

Agora, como disse, a mente não atingida pela contradição por ter compreendido sua integral estrutura, tanto consciente como inconsciente, essa mente está perfeitamente tranquila; porque todo movimento constitui dissipação de energia. Só quando a mente está serena e carregada de forte energia, pode verificar-se uma “explosão”; essa explosão é criação, a qual pode expressar-se ou não. A mente temerosa, ambiciosa, ávida, invejosa, ciumenta, que está competindo — essa mente nunca terá aquela energia que vem com a AÇÃO SEM MOTIVO; e também, naturalmente, jamais conhecerá o amor. Onde está o amor, há constante morrer para todas as “memórias” da experiência de cada dia e, por conseguinte, o amor e a morte coexistem. O amor é sempre vigoroso, novo, juvenil, puro, e sempre incontaminado pelo passado, porque morre para o passado de cada dia. O amor e a morte existem nessa abundante energia, quando essa energia está totalmente imóvel. Há então CRIAÇÃO — ou você pode lhe dar o nome que quiser. O nome é de ínfima importância. A menos que se verifique essa transformação em cada ente humano — que faz parte da sociedade, que é o próprio meio social, não poderá existir uma nova sociedade.

Krishnamurti - O descobrimento do amor

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill