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sábado, 30 de agosto de 2025

O amadurecimento da observação e a estabilização da Grande Completude

A lucidez em sua fase madura


A maioria dos buscadores imagina que o despertar seja um ápice, um evento culminante que dissolve o falso personagem de uma vez por todas e nos lança num estado permanente de iluminação. Essa crença — romantizada e vendida em várias linhagens — esconde uma verdade mais profunda e exigente: a lucidez real não é um estado, mas um amadurecimento. E esse amadurecimento não é um processo passivo. Exige uma depuração radical, um afinamento constante da percepção, uma permanência na chama da observação até que toda sombra seja vista sem medo.

O despertar pode ocorrer como lampejo, vislumbre, ruptura inicial. Mas o que vem depois — o que importa de fato — é o que se faz com esse vislumbre. Ele precisa amadurecer. Ele precisa estabilizar-se. E a via pela qual isso acontece não é uma técnica, nem um novo saber, mas a Observação Silenciosa, que, amadurecida, torna-se a própria morada da Grande Completude.


A Observação em sua fase inicial

Na primeira fase da jornada, a observação surge como ferramenta: um método para escapar da identificação com os conteúdos mentais, emocionais e sensoriais. É um gesto de recuo. O observador inicial tenta manter-se separado do fluxo de pensamentos e sentimentos, testemunhando sem se envolver. É o início do descondicionamento. Mas esse estágio é frágil, vulnerável às reativações do velho eu. O personagem espiritualizado facilmente sequestra essa posição e se apropria da “testemunha” como um novo papel.

Nesse ponto, a observação ainda é tática. O observador ainda é uma entidade separada, alguém fazendo observação. Ainda há um centro que observa algo fora dele. O mundo ainda é dividido. A mente ainda é levada a procurar resultados. A vigilância é ansiosa. A quietude é buscada como estado, não como identidade. A prática, por mais sincera, ainda é dual.

Mas é preciso atravessar esse estágio. Ele é necessário. Sem essa disciplina inicial, sem essa ruptura mínima com o automatismo da mente, a Consciência nunca conhecerá a si mesma fora do espelho dos pensamentos.


A decomposição do observador

O amadurecimento começa quando essa “entidade que observa” começa a ruir. O buscador começa a suspeitar que até o “observador” é apenas outro objeto — outro reflexo dentro da Consciência. A vigilância começa a se libertar do vigilante. A atenção torna-se sem dono. O testemunho não é mais operado por um sujeito. A observação se torna impessoal.

Essa é a fase da decomposição. A máscara da testemunha cai. O meditador perde o chão das técnicas. O discípulo silencioso não sabe mais “quem observa”. E é precisamente aí que a observação começa a amadurecer. Quando ninguém mais está observando, mas a observação continua. Quando não há mais estratégia, mas apenas presença nua. Quando não há mais centro.

Esse colapso do observador é uma morte. O eu vigilante morre. O eu que praticava dissolve-se. Não sobra personagem. Não sobra referência. Apenas o Silêncio observa. E esse Silêncio não é algo que se conquista: ele é o que somos.


A observação como espelho absoluto

A observação amadurecida é um espelho que não retém reflexos. Tudo passa por ela, mas nada nela gruda. Os pensamentos vêm, as emoções passam, os impulsos surgem — mas a consciência já não se confunde com nenhum fenômeno. Não há luta, nem rejeição, nem apego. O espelho nada diz, nada julga, nada faz. Ele apenas é.

Nesse ponto, a observação deixa de ser esforço. Torna-se natureza. Não é mais algo que se pratica — é a própria substância do ser. Um estado de repouso sem o menor traço de inércia. Um vazio sem ausência. Um silêncio que não depende da ausência de sons. Uma paz que permanece no meio do caos.

A observação madura é puro amor silencioso. Tudo é visto, e tudo é permitido ser. Não porque se perdeu a capacidade de discernir, mas porque se compreendeu que nada jamais ameaçou a Grande Completude.


A Grande Completude: estabilização e retorno ao Uno

A Grande Completude é lucidez plena, natural, desfeita de esforço. É a visão pura. A Grande Completude não é um estado alterado de consciência — é a consciência em sua inteireza, sem adulterações. E ela só se estabiliza quando não há mais ninguém tentando alcançá-la.

Quando a observação amadurece totalmente, ela não precisa mais vigiar. Ela repousa. O que chamamos de “estabilização da Grande Completude” é a ausência de oscilação entre ser e parecer, entre observar e se identificar. É quando a percepção se assenta definitivamente na base silenciosa de onde tudo surge.

A mente pode continuar operando. As emoções podem surgir. O corpo pode sofrer, adoecer, vibrar. Mas nada disso é confundido com o que se é. O centro já não se desloca para a superfície. O falso eu não tem mais chance de reassumir o trono. O trono já está vazio — e por isso, repleto da Presença.


O perigo dos retornos sutis

Mesmo após lampejos de Grande Completude, há o risco de retornos sutis ao sonambulismo. Uma pequena identificação. Um apego sutil a uma ideia. Um orgulho disfarçado de humildade. Um desejo de transmitir a experiência. Todos esses são convites à recaída.

Por isso, a observação madura não deve descansar na arrogância do já-visto. Ela permanece alerta, mas sem tensão. Ela sabe que o retorno ao personagem pode vir como brisa, não como tempestade. E, por isso, ela se entrega — não ao esforço — mas à vigilância natural da clareza

Estabilizar a Grande Completude é viver sem comparação, sem expectativa, sem pertencimento. É viver como o céu vive as nuvens: sem se opor a elas, sem se misturar com elas, sem se deixar limitar por sua forma.


As fases da estabilização

  1. Ruptura inicial – lampejo, despertar, vislumbre de que o eu é uma ilusão.
  2. Desconstrução do observador – crise da prática, abandono das técnicas, sensação de vazio.
  3. Observação impessoal – testemunho sem testemunha, silêncio operante, dissolução do fazer.
  4. Assentamento da presença – tudo visto, nada retido; tudo sentido, nada sofrido.
  5. Estabilização da Completude – consciência sem esforço, vida sem centro, lucidez sem oscilação.

Essas fases não são lineares. O caminhar é espiralado. Cada estabilização revela novos véus. Cada silêncio revela novas palavras escondidas. Cada repouso revela camadas mais profundas de agitação a serem vistas. A profundidade da observação não tem fim.


O risco de interromper antes da maturação

Muitos param no meio do processo de descondicionamento. Confundem vislumbre com realização. Transformam o início em doutrina. Congelam o fluxo num sistema. Tornam-se “mestres” antes da morte do mestre interior. E assim, perpetuam a ignorância espiritual com roupagem iluminada.

A observação amadurecida é cruel com a ilusão. Ela não poupa o “eu que sabe”. Ela não negocia com o orgulho místico. Ela não faz concessões ao apego ao especial. Por isso é tão difícil. Por isso é tão libertadora.


Quando não há mais quem observe

No ápice da maturação, a observação desaparece como prática. Não há mais quem observe, nem o que seja observado. O espelho se funde com o reflexo. A separação se dissolve. A não-dualidade não é mais um conceito: é a textura da própria experiência.

O silêncio não é mais uma conquista — é o som de tudo. A lucidez não é mais uma lâmpada — é o próprio escuro visto com os olhos abertos. O mundo não precisa mais ser negado ou transcendido — porque não há mais mundo separado daquilo que observa.

Esse é o verdadeiro fim da busca. Não o fim de caminhar, mas o fim do quem caminha. A vida continua. As responsabilidades seguem. O corpo vive e morre. Mas já não há centro fixo, nem expectativa, nem carência. A Completude já não depende de nada. Ela é.


Considerações finais

O amadurecimento da observação é o caminho silencioso que conduz ao coração da realidade. Não há mapa, nem mestre, nem método definitivo. Mas há uma direção: sempre mais fundo, sempre mais nu, sempre mais entregue.

A Grande Completude não é uma promessa. É um retorno. Não é um ponto de chegada. É o ponto de origem, visto sem véus. Estabilizá-la não é conquistá-la — é desaparecer nela.

Aos que sentem esse chamado — silenciem. Observem. Morram em cada instante. E verão que nunca houve distância entre vocês e a Totalidade. Havia apenas uma crença: a de que era preciso chegar.

E a observação passiva não reativa, quando madura, dissolve até essa crença.

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill