Enquanto há medo, não há a liberdade do amor impessoal e, enquanto não há o derrame de lucidez, há permanência do medo. Sem o libertário derrame de lucidez permanecemos num viver imaturo.
O processo de descondicionamento
não apenas começa num vislumbre da libertária e amorosa lucidez, mas também
nela termina.
O tempo que o indivíduo leva para
completar o processo de descondicionamento depende de vários fatores, mas, sem
dúvida, o mais importante é a força do anseio pelo colapso da estrutura
psicológica fundamentada no medo.
Quando o indivíduo tem, pela
primeira vez, um vislumbre do lúcido e integrado estado incondicionado de ser,
geralmente, nada sabe sobre ele; com a sua experiência passa a saber que é a
sua exata natureza, possuidora de criatividade, sentido lógico e lucidez que
transcendem totalmente seu próprio esforço e cálculos autocentrados
provenientes do medo e da carência de lucidez.
No derrame de lucidez, o
indivíduo sente a completa libertação do medo, e se vê inserido numa sabedoria,
nobreza, beleza, dignidade e reverência por tudo que é. Com ele, a vida fundamentada na maturidade do
estado incondicionado de ser, finalmente desabrocha e se expressa.
O indivíduo que sente um vazio em
suas relações e atividades, apesar das realizações sociais e posses materiais,
pode estar inconscientemente ansiando pelo lúcido estado de ser superior às
adulterações do medo.
A profunda sensação de futilidade
e de ausência de real conexão se manifestará, repetidamente e numa crescente,
até que a insatisfação e falta de sentido de uma vida totalmente condicionada
ao materialismo e ao hedonismo, sejam reconhecidos e aceitos. Nessa faze
extremamente inquietante (e quase que enlouquecedora), tem início o processo do
colapso da estrutura psicológica fundamentada no medo.
O lúcido e integrado estado
incondicionado de ser não é um devaneio intelectual, mas, sim, um estado
integrado de presença, sublime, depuradora e livre das adulterações do medo, e
que se fundamenta na expandida capacidade de percepção da realidade, dos
pensamentos, sentimentos e sensações, fazendo com que o indivíduo veja suas
relações e ambientações (que até então eram percebidas como vazias e
destituídas de real conexão), por um ponto de vista nobre e amorosamente
impessoal.
Do derrame de lucidez surgido da
mais profunda sensação de vazio de ausência de sentido e de real conexão, surge
uma indescritível liberdade, uma paz mental e emocional, uma sensação de viva
conexão com tudo que é, que nenhum condicionamento ou pressão social podem
remover.
A estabilização do lúcido estado
incondicionado de ser extingue instantaneamente, os desejos e apegos imaturos,
neutralizando os cálculos autocentrados que impedem a manifestação do amor
impessoal. Então, indivíduo nunca mais sente vazio, solidão ou carência de
sentido.
Na estabilização do lúcido estado
incondicionado de ser, toda inquietude se dissolve, dando lugar a um
indescritível bem-estar.
A estabilização do lúcido estado
Incondicionado de ser não é um devaneio ou passageiro estado agradável,
ilusório. É o interno e profundo desabrochar de um vital fluxo de paz, poder,
leveza e compaixão.
A estabilização do lúcido estado
incondicionado de ser produz uma ampliada capacidade de percepção da realidade
na qual o "aqui" é universal e o "agora" é eterno. Ocorre a
percepção da total ausência de tempo, um sentido do caráter infinito do próprio
ser.
A estabilização do lúcido estado
incondicionado de ser ocorre de surpresa. Num momento inesperado, ocorre um
repentino aprofundamento da capacidade de percepção da realidade, seguido por
um deslizar para uma dimensão intocada pelo medo, onde o indivíduo, finalmente,
se sente realmente vivo e num ambiente repleto de sentido.
Quando o indivíduo começa a
conhecer a si mesmo e a tudo que lhe circunda, sem a antiga adulteração dos
condicionamentos, ele se sente verdadeiramente livre das contradições do
limitado intelecto e de seus cálculos autocentrados; se sente vivo e naturalmente
conectado.
Na estabilização do lúcido estado
incondicionado de ser, a benevolência, a paz, o amor, a compaixão e a sabedoria
se tornam vivas realidades na natureza do indivíduo, dissolvendo
instantaneamente o antigo sentimento de pequenez da vida, sendo substituído por
um sentimento de sagrada grandeza.
A estabilização do lúcido estado
incondicionado de ser traz um sentimento de elevação, exaltação, esclarecimento
pleno e de revelação da própria imortalidade; um estado de refinada ternura e
de uma capacidade de amar que se irradia para tudo que circunda o indivíduo.
Quando, na maturidade plena da
silenciosa observação, a estrutura calculista, usuária e interesseira
finalmente colapsa dando lugar ao lúcido e integrado estado incondicionado de
ser, o indivíduo sente uma inenarrável sensação de aguda libertação e total
alívio.
No libertário derrame de lucidez,
o indivíduo se sente totalmente aberto, retirado da debilidade e pequenez de
seu "eu" usuário e recolocado num nível livre de autointeresses
adulterantes. Um sentimento de reverência e admiração por tudo que é, preenche
seu coração. Então, finalmente, ele se sente em casa e não mais como um
inseguro, deslocado e desprotegido estrangeiro.
O derrame de lucidez liberta o
indivíduo de tudo que nele é baixo, mesquinho, egoísta, dependente e tacanho,
fazendo com que os desejos imaturos se dissolvam, e com eles as dependências e
frustrações, a ansiedade, o desespero e a expectativa que os acompanham quando
não realizados.
Quando o indivíduo, pelo derrame
de lucidez, transcende a imatura vida temporal da estrutura psicológica
fundamentada no medo para a libertadora e integrada atemporalidade do estado
incondicionado de ser, se dissolve a sensação de estar confinado num viver sem
sentido. Ele experimenta uma alegria, bondade e beleza jamais imaginadas.
Na estabilização do lúcido estado
incondicionado de ser o indivíduo é preenchido por uma fluente inspiração, uma
esplêndida esperança e uma claríssima percepção da realidade. O que em sua
natureza condicionada é vil, sovino, indigno e baixo é substituído pelo que é
nobre, elevado e verdadeiro. Dessa abençoada estabilização, ele extrai uma paz
indizível e uma suprema elevação.
Nesse derrame glorioso a
consciência do mal no mundo se esvai; em contraposição, a continuidade da
bondade e sentido original permanecem intactas.
À medida que a bem-aventurança da
lucidez amorosa do estado incondicionado de ser penetra e afeta a natureza
sensível do indivíduo, todo apego, preconceito e ressentimento se dissolvem,
dando lugar à uma sensação de encantamento e inundação de esperança.
Quando o indivíduo toca o estado
incondicionado de ser, sente que seu verdadeiro eu é eterno e que o antigo eu
usuário e calculista é uma coisa tola, se alegrando por dele, finalmente, se
livrar.
O colapso da estrutura
psicológica fundamentada no medo lança o indivíduo numa experiência de completa
segurança, fazendo com que ele se sinta humilde e sensibilizado, a tal ponto
que o ar parece cálido e agradável e o universo, repleto de cordialidade. A
antiga e adulterante estrutura desliza de seus ombros como um pesado e surrado
sobretudo, e ele se sente deliciosamente livre.
No bem-aventurado estado de ânimo
resultante do libertário derrame de lucidez amorosa e integrativa, o indivíduo
é envolvido por uma folga perfeita. Sente que agora tem o tempo e tudo do que
precisa. Como sente que não precisa mais correr atrás de nada, não há mais
urgência, tensão ou ansiedade, descobrindo assim, uma nova alegria e completude
em si mesmo e um novo e mais elevado sentido nas profundezas do viver.
O derrame de lucidez não pertence
à consciência do viver condicionado pelo medo; de fato, manifestamente revela
sua lamentável mesquinhez e confusão, sua miserável falta de propósito e
insatisfação. O indivíduo que vive a imensurável alegria da paz do estado
incondicionado de ser não desejará se minguar novamente à limitação do inseguro
eu calculista e usuário, pois sabe que o colapso da estrutura não é uma perda
de felicidade, mas sim, uma ilimitada ampliação dela.
No derrame de lucidez é como se o
próprio ser do indivíduo se clareasse, a tal ponto de se tornar transparente, e
se dissipassem as obscuridades que encobrem sua lúcida, amorosa e integrativa
natureza incondicionada.
A perspectiva torna-se
imensuravelmente mais ampla, o entendimento mais claro e a intuição mais
imediata. Um sentimento de certeza feliz e absoluta toma lugar das dúvidas
inquietantes. A verdade fica diante do indivíduo e ele a percebe como o
fundamento de seu próprio ser.
O libertário derrame de lucidez é
precedido por uma revelação vívida, intensa e autocrítica de quão adulterante o
indivíduo tem sido, de como tocou de forma leviana seus relacionamentos. Tal
revelação o chacoalha até os ossos de modo quase que enlouquecedor. No entanto,
com o derrame, ele compreende isso e, ao mesmo tempo, perdoa a si mesmo,
sentindo que tudo está certo. Nesse auto perdão, ele se sente enriquecido, como
se caísse a teia adulterante que envolvia suas ações.
Perceber o "x" de toda
questão conflitante, que resolve todos os problemas de uma existência
inconsciente, observar de súbito o que isso tudo significa e perceber como esse
"x" libertário sempre esteve presente, pode levar o indivíduo a cair
em gargalhada de si mesmo.
A partir da vivência do derrame
de lucidez, o indivíduo sabe que começa a viver o amor real que a sociedade em
geral desconhece, uma bondade e compaixão que ele raramente vê em ação e um
entendimento imediato que ilumina todas as ocorrências da vida.
O derrame eleva o indivíduo muito
acima de seus próprios interesses e além de sua limitada consciência insegura e
dependente, possibilitando uma compreensão mais aguçada que resulta numa real e
profunda solidariedade.
A venturosa experiência do
derrame de lucidez chega abruptamente. Num momento o indivíduo é seu habitual
eu calculista, usuário e adulterante, lutando contra seus pensamentos
irriquietos, sentimentos e sensações psicossomátivas inquietantes. No momento seguinte,
colapsa a estrutura fundamentada no medo e, em consequência todas as suas
faculdades se acalmam. O intelecto é suspenso; vontade, julgamento, memória e
raciocínio são suavemente desativados. Uma profunda serenidade, até então
desconhecida, apodera-se do indivíduo e uma primorosa calma nele se instala.
Nessadimensão de alegre beleza, o mais adulterante e inconsequente passado é
obliterado e a mais débil história é instantaneamente redimida. Com a
consciência profundamente tomada pelo derrame de lucidez numa atmosfera de
exaltação, os aborrecimentos, dúvidas, pensamentos desconexos e culpas de um
viver calculista e usuário mal tocam os umbrais da atenção. Os problemas de
toda uma vida de inconsciência reduzem-se a nada e desaparecem os medos com relação
ao futuro. A visão de mundo se torna ampliada, enobrecida e esclarecida e deixa
de ser limitada por interesses condicionados pelos implantes sociais.
Levantam-se os véus que lhe ocultam a verdade única de tudo que é. O estado
incondicionado de ser está estabilizado e percebido profundamente. Sua presença
nos seus sentimentos mais internos. Nada em sua experiência, intelectual ou
emocional, jamais teve para o indivíduo um êxtase tão satisfatório, um
contentamento tão paradisíaco, pois o deleite dos níveis que são superiores ao
antigo domínio da mente fundamentada no medo, nunca fenece, permanecendo sempre
novo e vívido. O mudo toma a textura de um agradável devaneio; é como se o
indivíduo ganhasse asas. Jubiloso, maravilhado, irresistivelmente ele se torna
aquilo que inquietamente, tanto esperava.
O momento do derrame de lucidez é
acompanhado por um breve estado de êxtase, em que a percepção dual de mundo
desaparece da consciência, e o corpo permanece totalmente imóvel. Uma
idescritível leveza perpassa a cabeça, parecendo imobilizar os pensamentos,
mantendo o corpo rígido por algum tempo na mesma posição e lugar em que o
encontrou. O indivíduo se sente então em perfeita conexão com todas as
criaturas viventes por elos invisíveis de grande compaixão altruísta. A ilusão
de separatividade é sublimada, conducida a um nível mais elevado em que a
Unidade Universal é verdadeiramente sentida.
No mais elevado estágio do
processo de descondicionamento, existem certos momentos em que imensa tristeza
e falta de identificação deixam o indivíduo profundamente inquieto. Os antigos
desejos imaturos perdem o poder de enredamento, as posses conquistadas perdem o
seu valor e até a própria existência carece de um sentido lógico. O indivíduo
se sente alérgico ao corre-corre do condicionamento social. O ior de todos os
sentimentos, talvez, seja o significado se esvair da atividade humana, que
agora se mostra uma inútil tragicomédia, um incessante ir a toda parte sem
chegar a lugar algum, um insano soar de instrimentos sem que nenhuma música
real seja criada, uma vaidade de todas as vaidades. É então que, para a grande
maioria, um terrível ímpeto de se suicidar pode adentrar em seu sangue, e o
indivíduo precisará de todo o seu poder de silenciosa observação passiva não
reativa, para não ceder ao supremo e neurótico impulso emotivo reativo
escapista, para não se esfazer de si mesmo. No entanto, esses negros momentos
são imensamente preciosos, pois se mostram como um terreno fértil para a
ocorrência do libertário derrame de lucidez. Poucos percebem esse momento como
valioso, se mantendo apenas na lamentação ácida. A autodestruição para a qual o
indivíduo é compelido por essas experiências do mais elevado estágio do
processo de descondicionamento, não é o neurótico ato físico em si, mas algo
sutil — um suicídio do pensamento, da emoção e da vontade condicionada pelo
medo e seus cálculos autocentrados. Na verdade, o indivíduo está sendo chamado
para o colapso de sua estrutura psicológica, a se desapegar de seus desejos,
apegos, paixões, ressentimentos, ambições e preconceitos e conquistar a
capacidade de viver em total independência psicológica em relação aoexterior.
Assim, esses momentos solitários de limbo pesaroso, não são mais que um meio
transitório — uma espécie de platô — para um fim que amplia a lucidez da
consciência ao ponto de lhe revelar a eternidade de si mesma.
Todo apego que o indivíduo possa
ter, desaparece instantaneamente com o derrame de lucidez, como se nunca
tivesse existido, pois o indivíduo sente que só existe pura harmonia no âmago
das coisas, na Cônsciência Única, e que ele, com o derrame, Nela se estabilizou.
No momento do derrame, há uma pesença que amorosamente envolve o coração e de
forma serena aquieta os pensamentos, os sentimentos, as emoções e as sensações,
levando a uma harmonia e a uma genuína conexão nos relacionamentos humanos e à
ausência da adulteração do medo e dos cálculos autocentrados nas relações
morais.
O brilho da transcendência de uma
estutura psicológica fundamentada no medo para a estrutura psicológica lúcida e
incondicionada, permanece no coração mesmo depois de sua ocorrência. Ele o
permeia com uma felicidade que não é deste mundo e o preenche com solene
reverência por tudo que é. Mas antes desse brilho da transcendência, o
indivíduo se sente abandonado, desconectado, emocionalmente fatigado e
intelectualmente aborrecido a tal ponto que pode se tornar um ser amargo, ácido
e depressivo. Nesse período, tudo que foi lido, toda prática espiritual, se
mostram infrutíferos, as aspirações anteriores, como mortas e sem atrativos.
Quase sempre se vê involto por uma terrível sensação de solidão, não física,
mas sim, no que diz respeito a qualidade de sua percepção e intensão. O aspecto
mais perigoso desse avançado estágio do processo de descondicionamento é o
enfraquecimento da vontade, que ocorre juntamente com o reaparecimento de
antigos padrões de comportamento disfuncional, já esquecidos e, por vezes, somados
ao impulso neurótico de colocar fim na própria existência. O indivíduo que
passou por esse mais profundo e mais longo período de conturbada inquietação e
dúvidas, que precede realizações maduras jamais tornará a sentir excessivos
extremos emocionais. O processo de descondicionamento foi como uma operação
cirúrgica que lhe extirpou tais extremos. Da renúncia total da identificação
com os neuróticos impulsos emotivos reativos escapistas resulta o brilho de uma
perfeita estabilização, inquebrantável e permanente com o lúcido estado
incondicionado de ser.
A alegria plenamente satisfatória
que o indivíduo esteve buscando em várias coisas e práticas — materiais,
fisicas ou espirituais — e que vem sempre acompanhadas de algum modo ou em
algum momento por desapontamentos, aguarda o indivíduo para sempre na dimensão
mais profunda do coração. Mas o indivíduo chega a ela apenas quando tudo aquilo
que ele tentou, se mostrou falho, discuncional.
O derrame de lucidez é um fato
histórico mundial. Se não o fosse, a perspectiva de saúde mental e emocional
para a raça humana, em total dependência dos próprios esforços para um
possível descondicionamento, seria pobre e desalentadora. O derrame de
lucidez é a força de recolhimento ou de atração para dentro exercida pela
natureza primária do ser, que é anterior aos implantes culturais
condicionantes. Esta natureza primária, por estar sempre presente, garante que
o derrame de lucidez também esteja.
É um sussurro que vem da
maturidade da profunda observação silenciosa, uma luz que brilha onde tudo era
dúvidas, medos e inquietação. É uma ocorrência que produz duradoura mutação
psicológica, descondicionamento profundo e radical e esclarecimento permanente.
É um poder que inspira o coração,
esclarece a mente e faz as devidas reparações no adulterado caráter do
indivíduo.
O derrame de lucidez é uma
mutação psicológica benéfica que ocorre no indivíduo - não pela sua limitada
força de vontade -, mas por algum poder interno que não é parte de sua
consciência condicionada.
É o derrame de lucidez que
inspira as melhores ações do indivíduo, tornando-o capaz de praticá-las. Ele
pode ser definido como a resposta da natureza primária, anterior aos implantes
culturais condicionantes, à aspiração, sinceridade e fé do indivíduo, resposta
que o eleva a um nível relacional acima do seu estado condicionado. Essa ação
que nele ocorre, sem que seja uma ação pessoal, começa em quietude profunda e
passiva e termina em atividade mental, emocional e física.
Quando o indivíduo é arrasado por
acontecimentos e cai emocionalmente prostrado, sua estrutura psicológica
fundamentada no medo, fica temporariamente arrasada. Depois, sequem-se momentos
de completa exaustão e de completo repouso. Ocorre então uma quietude breve, e
é nessa quietude que o derrame de lucidez que sempre emana da natureza primária
anterior aos implantes culturais condicionantes, é capaz de produzir a benéfica
mutação psicológica.
Ninguém, exceto a própria
natureza primária do homem, que é anterior aos implantes culturais
condicionantes, pode lhe conceder o libertário e integrativo derrame de
lucidez.
O destino da estrutura mental e
emocional fundamentada no medo é ser levada por um processo de
descondicionamento até a estabilização do estado de ser intocado pelo medo e lá
colapsar ou, mais corretamente, transcender a si mesma. Mas, como ela não vai de
boa vontade colocar fim à própria existência, algum poder além dela precisa
intervir para efetuar tal transcendência salutar. Tal poder é o incausado
derrame de lucidez, e essa é a razão pela qual a manifestação do derrame de
lucidez é imperativo.
O que justifica o derrame de
lucidez é o fato de que apenas o estado intocado pelo medo pode contar ao
indivíduo o que ele é, pode ensiná-lo sobre si mesmo. O limitado intelecto não
pode fazê-lo, os sentidos certamente não o podem, e a experiência comum está
muito longe disso.
Não está dentro da capacidade
humana ir além do vislumbre do estado incondicionado de ser. Se nele deve o
indivíduo se estabelecer de maneira firme e duradoura, então o derrame de
lucidez é absolutamente necessário. Nenhuma metodologia fará com que isso ocorra.
Programações espirituais, ritos, abstinências, meditação profunda sobre os mais
novos livros jamais farão com que ele ocorra.
O derrame de lucidez age como um
catalizador. Onde o indivíduo é incapaz de se liberar de inconfessos
comportamentos débeis, ele o ajuda a fazê-lo. Onde o jugo das respostas
mecânicas dos sentidos, das glândulas e dos complexos inconscientes o mantém
cativo de um padrão condicionado, ele o liberta.
Nada que o indivíduo faça pode
trazer essa maravilhosa mutação psicológica, porque ela não resulta de esforço.
Não depende do poder da sua vontade nem da força de seu desejo. É algo que pode
apenas ser feito para o indivíduo, não pelo indivíduo. É o resultado de sua
absorção por outra Força mais elevada, que é o derrame de lucidez. É mais esquivo e ao mesmo tempo mais
satisfatório que tudo o mais na vida.
O esforço violento pode conseguir
a maioria das coisas, mas não pode conseguir o derrame de lucidez. O colapso da estrutura adulterada deve ser,
no final, um presente da exata natureza incondicionada do ser. Quando a
estrutura sabe de sua impotência e desiste de seus esforços e objetivos
imaturos, quando se vê empacada e espera por uma ocorrência superior a si
mesma, então o derrame de lucidez tem a possibilidade de ocorrer.
Não está dentro da capacidade do
indivíduo terminar o processo de descondicionamento nem sua subsequente
libertação do medo: sua natureza primária anterior aos implantes culturais
condicionantes precisa efetuá-los atuando na mutação de sua psique. Esse poder
ativador é o derrame de lucidez.
A plenitude do processo de
descondicionamento que o indivíduo é incapaz de conseguir por todos os seus
esforços vai, se ele for abençoado pelo derrame de lucidez, ser-lhe dado
inesperada e repentinamente, quando todo o desejo por isso se acalmar.
Muitos não conseguem se
desidentificar de seus pensamentos, emoções e sensações, apesar de seus maiores
esforços. Isso só demonstra a dificuldade que há em fazê-lo, não a sua
impossibilidade. Em tais casos, só o derrame de lucidez vai livrá-los de sua mecanicidade‐grilhão não solicitada.
Só quando o indivíduo, frustrado
e desapontado, ferido e em sofrimento, descobre que não pode mudar
significativamente seu caráter é que, a partir da profunda percepção de sua
impotência, fica pronto para a ocorrência do libertário e integrativo derrame de
lucidez. Enquanto acreditava no esforço de sua busca poderia fazê-lo, só
colecionava frustrações. E o modo de esperar pelo derrame de lucidez é
manter-se na observação silenciosa, passiva e não reativa, sem fazer
absolutamente nada, já que tudo que fez anteriormente, além de não funcionar,
só causou diferentes adulterações.