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sábado, 30 de agosto de 2025

O Observador e a Ditadura da Performance

Vivemos sob o jugo invisível de uma compulsão coletiva: a de performar. Não se trata apenas de fazer, mas de parecer estar fazendo, de evidenciar movimento, progresso, engajamento, brilho. É a ditadura da performance — silenciosa, sutil, onipresente. Em nome dela, sorrisos são exibidos como conquistas, corpos são moldados como argumentos, rotinas são editadas como propaganda de um viver bem-sucedido. E sob toda essa encenação, está o Observador: aquele que, ao invés de atuar, observa em silêncio.

A performance moderna não acontece apenas nos palcos formais — ela colonizou os espaços mais íntimos da vida: o trabalho, o afeto, a espiritualidade, o lazer e até mesmo o sofrimento. Tudo se torna vitrine. A dor precisa ter estética. A alegria precisa ter alcance. A vida precisa de validação. E o ser autêntico, sufocado, se desintegra em avatares eficientes, vendáveis, consumíveis.

A pressão para performar não é um fenômeno novo, mas foi radicalizada por uma cultura onde tudo é medido, rastreado, comparado. Números viraram oráculos. Seguidores, curtidas, diplomas, metas cumpridas, lifestyle projetado, produtividade maximizada — são os ídolos diante dos quais se sacrifica o silêncio interior, a pausa, a sinceridade bruta, a falha legítima.

Essa pressão tem um rosto socialmente aceitável, mas interiormente devastador. Ela exige que o indivíduo se desdobre em mil versões para corresponder à expectativa do sistema — seja ele corporativo, familiar, espiritual, romântico ou digital. Ninguém escapa. O artista precisa se tornar influencer. O terapeuta precisa provar resultados. O pobre precisa parecer esforçado. O rico precisa parecer feliz. O rebelde precisa parecer coerente. O espiritualizado precisa parecer em paz. Todos, de um jeito ou de outro, são convocados a atuar.

Mas o Observador não atua. Ele observa em silêncio.

O Observador é a consciência que testemunha, silenciosa e crua, essa engrenagem de encenação. Ele observa o personagem tentando provar valor. Observa a mente traçando estratégias para parecer competente, querido, desperto. Observa os gestos contaminados pela necessidade de aceitação. Observa a voz se ajustando para parecer convincente. Observa o corpo se moldando para caber no ideal. E, ao observar, não reage — apenas reconhece: “isso também é condicionamento”.

Performar é trair a presença. Toda performance exige um deslocamento de si: em nome do outro, do sucesso, do pertencimento, da imagem. A performance é a negação do instante — ela se projeta sempre para o aplauso futuro, para o julgamento do outro, para o ideal que ainda não se encarnou. Ela é filha do medo e do desejo: medo de não ser aceito, desejo de ser reconhecido. E nessa dicotomia, o ser autêntico se eclipsa.

Quantas vezes você já performou uma emoção que não sentia? Quantas vezes disse “tá tudo bem” apenas para manter a máscara intacta? Quantas vezes se forçou a sorrir, meditar, se entusiasmar, amar, quando tudo dentro gritava “não”? Quantas vezes fingiu produtividade, lucidez ou evolução, apenas para não parecer fracassado, atrasado, comum?

Essa pressão é um cárcere psicológico. E pior: é um cárcere que se autoalimenta. Quanto mais se performa, mais se esquece de como é existir sem máscara.                    A performance cria um personagem. O personagem vira identidade. E o ser real, sufocado, começa a parecer disfuncional, inapto, inadequado. É aí que começa a tortura interna: o conflito entre a verdade sentida e a imagem projetada.

O Observador, quando desperta, rasga esse véu. Ele observa a neurose da performance, mas não a condena — apenas observa em silêncio. Ele reconhece que a performance é uma estratégia de sobrevivência psíquica em um mundo onde o ser nu é considerado fraco, improdutivo, estranho. O Observador entende: há dor por trás da performance. Há solidão. Há medo. Há o trauma ancestral de não ser amado por ser apenas quem se é.

E justamente por ver isso, o Observador inicia um processo de descondicionamento. Ele começa a desaprender a atuar. Começa a silenciar o desejo de agradar. Começa a questionar os papéis que assumiu. Começa a suportar o incômodo de não corresponder. Começa a abrir mão do aplauso. Começa a aceitar o risco de parecer errado.

Essa é a verdadeira rebelião: desapegar da performance e ainda assim permanecer. Ficar em silêncio quando se espera fala. Não produzir quando se exige resultado. Não se explicar quando se cobra coerência. Não se exibir quando se pede brilho. Não se ajustar quando se impõe forma. Não competir. Não provar. Não convencer. Apenas ser.

Mas isso cobra um preço.

O mundo não perdoa quem se recusa a performar. O que não performa é tratado como falha do sistema. O ser nu incomoda. O silêncio desestabiliza. A vulnerabilidade exposta escandaliza. O cansaço confessado é lido como fraqueza. A honestidade crua é confundida com desequilíbrio. E o que se recusa a participar do jogo é logo diagnosticado, desqualificado, silenciado.

É por isso que poucos ousam ser apenas o que são. Porque ser-se exige atravessar a solidão de não ser entendido. Exige abrir mão da zona de conforto do reconhecimento. Exige romper com os pactos invisíveis de atuação coletiva. Exige perder o “valor de mercado” em nome da inteireza. Exige suportar a ausência de aplauso.

Mas é só aí que a liberdade começa. Quando o ser se liberta da necessidade de parecer, começa a viver. Não mais como um personagem que responde ao script externo, mas como uma consciência que emerge do centro silencioso da existência.

O Observador sabe: a vida verdadeira não se prova. Não precisa ser defendida, ilustrada, compartilhada, performada. Ela pulsa em si, sem espetáculo. E é nesse reconhecimento que o ser repousa.

O Observador e o fim da performance:

Observar sem julgar - Não se trata de combater a performance com outra performance mais "autêntica". Trata-se de observar, apenas observar, o impulso de atuar — e nesse observar, permitir que ele se desintegre.

Permitir a falha - A falha não é um inimigo; é um portal. Toda falha de performance é uma brecha na máscara. O Observador celebra essas rachaduras: são nelas que o real começa a respirar.

Suportar o não reconhecimento - A liberdade nasce quando não se é mais escravo do olhar do outro. Quando se é capaz de viver sem aprovação, sem curtidas, sem palmas, sem recompensa externa — nasce o ser indomável.

Não buscar coerência artificial - A coerência imposta é prisão. O Observador se permite contradição, porque sabe que o ser humano é fluxo, não é tese. Só os mortos são coerentes o tempo todo.

Cessar a autopromoção espiritual - Até a busca por despertar pode virar performance. O Observador observa isso também — e então larga o desejo de parecer desperto, mergulhando apenas, no silêncio da presença.

O observador sabe que a sociedade continuará performando. Continuará exigindo que você sorria, produza, compareça, brilhe, declare, se posicione, publique, comprove, evolua. Mas o Observador não negocia com essa pressão. Ele não é reativo, mas é radical: radicalmente verdadeiro. Radicalmente presente. Radicalmente inútil para o sistema que vive de imagens.

Ser Observador é escolher a inteireza em vez da relevância. É escolher o silêncio em vez da explicação. É escolher a presença em vez da autopropaganda. É escolher o ser em vez do parecer.

No fim, tudo se reduz a isso: ou você atua, ou você observa silenciosamente.             Ou você performa, ou você vive. Ou você coleciona aplausos, ou recolhe-se à dignidade de uma existência anônima, silenciosa, lúcida.

A escolha está diante de você — mas o Observador sabe: qualquer escolha feita por medo ou desejo já é performance. Só há uma saída real: observar tudo o que está acontecendo, sem se perder no papel.

E isso, no mundo da atuação compulsiva, já é uma revolução.

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill