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domingo, 31 de agosto de 2025

O desconforto inicial da vivência do repouso observador

 


O desconforto inicial da vivência do repouso observador

Quando a estrutura mental-emocional condicionada sente que está prestes a perder um apego — seja a uma emoção, a uma crença, a uma relação ou a um hábito — surge uma espécie de pânico silencioso. A mente não tolera bem o vazio que se forma no espaço entre o velho padrão e uma nova forma de ser. Imediatamente, ela busca uma distração, um novo objeto, uma prática ou ritual que substitua o antigo. Não se trata de malícia; é autopreservação: o falso personagem condicionado teme encarar o silêncio interior, o repouso observador que revela o quão dependente e carente de estímulos ele sempre foi.

Esse impulso de ação é, na verdade, uma resistência. É o momento em que o sujeito poderia simplesmente permanecer com a inquietude que se forma no descondicionamento, notar os tremores, a ansiedade ou o desconforto que surgem ao soltar uma peça antiga de sua identidade. Mas, em vez disso, ele corre para um exercício, um esporte radical, uma meditação estruturada, uma leitura, uma prática de respiração, ou qualquer outro comportamento que transforme o estado inquieto em atividade controlável.

O problema é que, nesse pulo automático para a ação (que numa observação apurada se mostra reação escapista), o indivíduo perde a oportunidade de desenvolver a presença pura. Ele evita experimentar a crueza do seu próprio processo: perceber que não precisa fazer nada, que não há problema em estar em repouso, que a inquietude não precisa ser domada, que a ansiedade é apenas uma sensação passageira que não define quem ele é. É no repouso, na observação silenciosa, que a mente começa a dissolver lentamente os padrões condicionados, porque eles só se sustentam através da compulsão ao fazer, do movimento contínuo, da fuga da percepção crua de si mesmo.

Podemos ver isso claramente em processos de descondicionamento emocional: quando alguém percebe que sua necessidade de aprovação social é um condicionamento, a tendência automática é se engajar em alguma prática de “autoafirmação” ou em um ritual de superação externa, em vez de simplesmente observar, sentir e permanecer com a sensação de desapego. É a ação que mascara a ausência de controle, que evita o desconforto de olhar para o próprio vazio interior.

Portanto, esse impulso de reação não é uma estratégia do descondicionamento, mas um reflexo da resistência. Ele revela o quanto a estrutura condicionada está habituada a preencher cada espaço vazio, a substituir a inquietude por movimento, a mediar a consciência através de práticas externas. Reconhecer isso é um passo crucial: perceber que a verdadeira travessia exige, muitas vezes, permanecer em repouso, sem intervenção, permitindo que a mente e as emoções se revelem em sua natureza crua. Só nesse espaço a observação pura pode emergir, e com ela, a dissolução gradual da compulsão ao fazer.

O paradoxo é que a maior ação — a ação que realmente descondiciona — muitas vezes não envolve nenhum movimento. Trata-se de presença silenciosa, de atenção que não interfere, de observação que não julga nem corrige. A mente condicionada teme isso, porque é um território sem scripts, sem resultados previsíveis, sem controle. É a zona do nada, mas é também a zona da liberdade.

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Quando a estrutura mental-emocional condicionada começa a se desprender de velhos padrões, surge um instante delicado e perigoso. Um espaço se abre entre o velho comportamento automático e o que ainda não se formou — um espaço silencioso, ainda não preenchido por uma nova identidade. E nesse instante, quase sempre, a mente reage. Ela busca preencher o vazio antes que ele se torne visível, antes que a consciência perceba que nada precisa ser preenchido.

Essa reação é sutil, mas persistente. Ao sentir que um apego emocional, uma crença enraizada ou um hábito compulsivo começa a se soltar, o sujeito sente um desconforto imediato: uma inquietude, uma ansiedade, uma tensão silenciosa. Em vez de permanecer nesse espaço, de simplesmente observar, a mente condicionada ativa uma estratégia automática: agir.

Agir é, nesse contexto, uma forma de narcotização. Seja por meio de práticas espirituais estruturadas, exercícios físicos, meditações “guiadas”, leituras, dietas ou rituais de autoaperfeiçoamento, a mente busca substituir o espaço interior por movimento exterior. Cada ação é, inconscientemente, uma tentativa de evitar o contato com a própria inquietude, com o vazio que assusta, com o silêncio que confronta as criações do falso personagem.

O paradoxo é claro: quanto mais o desapego interno se instala, mais a mente condicionada tenta narcotizar o processo através de atividades externas. A compulsão ao fazer se intensifica justamente quando a liberdade começa a se insinuar. O sujeito pensa que está avançando, mas, na verdade, apenas desloca a atenção, ocupando o espaço que poderia revelar a natureza crua de seu condicionamento.

Essa dinâmica não é falha nem vergonhosa; é apenas a expressão da sobrevivência do falso personagem condicionado. Ele está habituado a preencher cada vazio com estímulos, respostas ou justificativas. Ele não tolera o silêncio, porque o silêncio revela a farsa do controle. Revela que todas as ações anteriores foram respostas condicionadas, que o conforto emocional sempre dependia de mecanismos externos, e que a identidade construída sobre hábitos e padrões é essencialmente frágil.

O descondicionamento verdadeiro exige uma coragem que a mente raramente admite: permanecer em repouso, em silenciosa observação passiva não reativa diante da própria inquietude. A prática real não é o movimento compulsivo, mas a observação silenciosa, o ato de permitir que o desconforto exista sem interferência. É nesse espaço que o sujeito percebe que a ansiedade não precisa ser domada, que o desejo de agir não precisa ser atendido, que a mente pode se revelar sem máscaras.

Viver nesse repouso observador não é confortável. O corpo reage, a emoção se intensifica, a mente questiona incessantemente. Mas é exatamente nesse território inexplorado que a dissolução gradual dos padrões condicionados se torna possível. Cada impulso de agir que é reconhecido e deixado de lado enfraquece a compulsão, permitindo que a consciência se expanda além do que foi previamente condicionado.

Podemos observar isso em emoções profundas — raiva, tristeza, frustração ou medo. No instante em que a estrutura condicionada sente que vai perder o controle, a compulsão ao fazer é ativada: exercícios, terapias, distrações, até viagens. Cada movimento externo funciona como anestesia, um tapume contra o contato direto com a própria natureza emocional.

Atravessar essa resistência exige reconhecer o impulso de agir não como progresso, mas como resistência. Requer uma atenção silenciosa que observa o corpo, a mente e a emoção sem interferir. Requer uma paciência extrema diante do desconforto, permitindo que a inquietude se revele em sua crueza. Somente quando a mente condicionada percebe que o repouso não é ameaçador, e que a própria presença é suficiente, é que o descondicionamento começa a se consolidar.

O paradoxo final é que a ação mais transformadora, no nível interno, muitas vezes não envolve movimento nenhum. Permanecer em repouso, permitir a inquietude, observar sem tentar moldar ou corrigir, é a ação que dissolve os padrões de forma profunda e duradoura. É a coragem de não fazer, de não preencher, de não controlar. É o encontro com o próprio silêncio, que carrega uma potência descondicionante infinita.

E, ainda assim, a tentação de agir permanece. O falso personagem condicionado olha para o vazio e sussurra: “Faça algo. Mexa-se. Ocupa-se.” Cada impulso de ação é um teste: se a observação silenciosa sucumbir, o processo se repete; se resistir, cada instante de observação silenciosa fortalece a liberdade interior. É nesse ciclo de tentação e presença que se constrói a lucidez, não através de técnicas, práticas ou resultados externos, mas através da coragem de se permanecer, de se permitir existir sem mediadores, de se tornar observador atento da própria mente e emoção.

A travessia é lenta, contínua e profundamente íntima. Ela revela o quanto fomos dependentes de estímulos, movimentos e justificativas externas. Revela que o verdadeiro avanço não é medido por práticas, mas pela capacidade de permanecer com o que é, de aceitar a inquietude, de observar sem reagir. É a paciência silenciosa, o repouso inquebrantável, a atenção sem interferência, que permitem ao descondicionamento revelar seu poder real: dissolver apegos, compulsões, liberar energia contida, e abrir espaço para a consciência que não é refém de padrões nem condicionamentos.

No final, o desafio não é encontrar a prática certa, o método mais eficiente, ou a estratégia mais avançada. O desafio é simplesmente existir, sem intermediários, sem distrações, sem ações que escondam a inquietude. É permitir que a mente e a emoção se revelem em sua crueza, que a presença silenciosa se consolide, e que a verdadeira liberdade, aquela que não depende de movimento nem de resultados, se manifeste.

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill