A mente é um instrumento maravilhoso; não há mecanismo feito pelo homem que se lhe compare em complexidade e sutileza, e com tão infinitas possibilidades. Só temos percebimento — se alguma vez estamos vigilantes — dos níveis superficiais da mente e satisfazemo-nos com viver e agir na sua periferia. Consideramos o pensamento como sendo a função da mente: o pensamento do general que planeja a morte por atacado, o pensamento do político sagaz, o do professor erudito e do carpinteiro. Mas existe pensamento profundo? O pensar não é sempre uma atividade superficial da mente? Com o pensamento, a mente é profunda? Pode a mente, uma coisa composta, resultado do tempo, da memória, da experiência, tornar-se cônscia de algo que não faz parte dela própria? A mente está sempre lutando, em busca de algo existente fora do âmbito de suas atividades egocêntricas, mas o centro de onde parte a busca permanece sempre o mesmo.
A mente não é apenas atividade superficial, mas é constituída, também, de movimentos ocultos, multisseculares. Esses movimentos modificam e controlam as atividades exteriores e, assim, a mente cria o seu próprio conflito dualístico. Não existe mente integral, total, pois a mente é fracionada em partes numerosas, opostas umas às outras. A mente que procura integrar-se, coordenar-se, não pode estabelecer a paz entre os seus múltiplos fragmentos; mas a reunião de numerosas partes não produz integração e nem tem muita importância, quando existe harmonia entre as diferentes partes. A mente que se torna integral mediante o pensamento, o conhecimento, a experiência, continua sendo o resultado do tempo e do sofrimento; ao ser integrada, ainda é produto das circunstâncias.
Estamos considerando de maneira errada este problema da integração. A parte jamais poderá constituir o todo. Pela parte o todo não pode realizar-se, mas não percebemos isto. O que percebemos é uma dada parte a distender-se para conter as demais; porém a reunião dessas partes não produz a integração, nem é de grande significação quando existe harmonia entre elas. Não é a harmonia ou a integração o que mais importa, pois isso é praticável, com um pouco de inteligência e atenção, e adequada educação; mas o que tem a máxima importância é que se deixe surgir na existência o "desconhecido". O conhecido não pode, em tempo algum, receber o desconhecido. A mente procura, cem cessar, viver feliz na estagnação da integração por ela própria produzida, mas nesta estagnação não pode surgir a ação criadora do "desconhecido".
Essencialmente, auto-aperfeiçoamento é indício de mediocridade. Auto-aperfeiçoamento, pela virtude, pela identificação com certas capacidades, pela segurança em qualquer forma positiva ou negativa, é um processo egocêntrico, ainda que seja muito amplo. A ambição gera mediocridade, porque ambição é preenchimento do "eu", pela ação, por meio do grupo, da idéia. O "eu" é o centro de tudo o que é conhecido, o passado atravessando o presente para o futuro, e toda atividade que se verifica na esfera do conhecido leva à superficialidade mental. A mente não pode ser grande em tempo algum, porque o que é grande é imensurável. O "conhecido" é comparável, e todas as atividades do conhecido só podem produzir sofrimentos.
Krishnamurti - Reflexões sobre a vida, pág. 261 à 263