O que é profundo não tem fim; o
atemporal é a sua essência. Não podemos experimentá-lo; a experiência é coisa
sem valor, algo que se perde ou ganha com maior facilidade; o pensamento não
pode concebê-lo, nem o sentimento é capaz de apreendê-lo. Estas coisas são
tolas e imaturas. A maturidade não resulta do tempo, nem é questão de idade ou
o produto de influências ou do ambiente. Não se pode comprá-la; nem os livros,
nem os instrutores ou redentores, individualmente ou em conjunto, poderão
engendrá-la. A maturidade não é um fim em si mesma; ela se realiza sem que o
pensamento a cultive; ela surge, chega misteriosamente, sem meditação,
imprevistamente. É imprescindível haver maturidade, esse amadurecimento na
vida; não a que resulta da doença e do tormento, ou da dor e da esperança. O
desespero e o esforço não trazem esta total maturidade; é preciso que ela venha
naturalmente, sem a buscarmos.
Nesta total maturidade existe
austeridade. Não a austeridade da penitência ou do hábito religioso, mas a
displicente e espontânea indiferença para com as coisas mundanas, perante suas
virtudes, seus deuses, sua respeitabilidade, suas esperanças e valores. Cumpre
negar tudo isto para que desponte a austeridade contida no estar
"só". Nem a sociedade nem a cultura podem influir nesta solidão. Mas
ela deve existir, não concebida pelo cérebro, esse produto do tempo e das
influências. Tem de surgir como um raio, sem se saber de onde vem. Sem a
austeridade, é impossível haver plena maturidade. O isolamento — que é a
essência da compaixão, da autodefesa, da vida reclusa baseada no mito, no
conhecimento e na ideia — nada tem de comum como estar "só"; no
isolamento, busca-se incessantemente a integração, porém, mantendo-se a
divisão. Estar só é viver livre de qualquer influência. E é esta solidão que é
a essência que é a essência da austeridade.
Ela surge quando o cérebro
funciona com clareza, não danificado por traumas psicológicos, causados pelo
medo; todo e qualquer conflito destrói a sensibilidade do cérebro; a ambição,
com sua crueldade, com seu incessante esforço para vir a ser, provoca o desgaste
do sutil mecanismo cerebral; a avidez e a inveja embotam e desgastam o cérebro
através do prazer e da frustração. É essencial uma vigilância sem opção, uma
percepção isenta da ideia de receber ou de ajustamento. Comer em excesso ou
comprazer-se em alguma coisa embota o corpo e insensibiliza o cérebro.
(...) A libertação da autoridade,
da inveja, do medo, da solidão, não suscita o estar só, com sua extraordinária
austeridade. Ela vem quando o cérebro não o está buscando; vem quando nem
sequer olhamos em sua direção. Aí, então, nada lhe será adicionado ou
subtraído. Terá então vida própria, um movimento que é a essência da vida
total, sem tempo ou espaço.
E sobreveio aquela benção, e uma
paz imensa.
Ainda que brando, o processo
continua.
Jiddu Krishnamurti – Diário de Krishnamurti