Percebendo com total clareza
o pleno alcance da mente
o pleno alcance da mente
K:
Normalmente pensamos que o medo é algo externo, separado de nós, o que levanta
a questão do observador e do observado.
É
possível olhar para o medo sem o observador para que este esteja em contato
total com ele o tempo todo, para perceber o medo sem escolha?
Porque
a escolha implica que há um observador quem escolhe:
"Não
gosto disso".
Mas
quando o observador está ausente, a escolha não intervém e há uma simples
consciência do medo.
HS:
Eu entendo.
K:
Bem, portanto, a palavra impede o contato direto com o medo.
HS:
Sim, as palavras podem agir como um véu.
K:
Exatamente, vamos parar por aqui.
HS:
Ok.
K:
Como vemos, é importante que a palavra não interfira.
HS:
Certo, nós temos que ir além disso.
K:
Mais além da palavra. Bem, agora, podemos fazer isso, estar mais além da
palavra?
Em
teoria, sim, dizemos isso, mas somos escravos das palavras.
HS:
E até que ponto!
K:
É claro que somos.
HS:
Sim.
K:
Então a mente deve perceber sua escravidão e de que a palavra nunca é a coisa.
HS:
Efetivamente.
K:
Só então ele estará livre e será capaz de observar. Tudo isso é implícito.
O
medo que opera no nível consciente se pode entender com relativa facilidade;
mas há
camadas
disso ao que chamamos de medo muito mais profundas, nas partes recônditas da
mente.
Podemos
perceber isso?
HS:
Pergunta se podemos perceber com total clareza do pleno alcance da mente?
K:
Sim, de todo o seu conteúdo e alcance, que é tanto o nível consciente como as
camadas mais ocultas; da totalidade da consciência.
HS:
Entendo. E pergunta se podemos nos perceber explicitamente de tudo isso. Não
estou seguro.
K:
Eu lhe digo que é possível.
Isto
é, só é possível quando durante ao longo do dia percebe-se o que se diz, as
palavras que usa, de seus gestos, seu modo de falar, de caminhar, dos
pensamentos que tem; quando se percebe total e completamente de tudo isso.
HS:
Você acha que nessa plena percepção plena tudo isso aparece diante dos olhos?
K:
claro; quando não há condenação ou justificação; quando se está em contato
direto
com
isso; quando ao longo do dia você se percebe de seus pensamentos, sentimentos e
motivos, o que exige uma mente extremamente sensível.
HS:
Você quer dizer que a chave está em dar uma virada radical ao nosso ponto de
vista?, como se fôssemos prisioneiros lutando com as grades, nos perguntando como
escapar para aquela luz que vislumbramos fora, quando na realidade a porta da
cela está aberta às nossas costas e seria o suficiente que nos virássemos para
que pudéssemos sair para a liberdade.
K:
Indubitavelmente, senhor, que na base de tudo há a batalha, o interminável
conflito do ser humano que, aprisionado em seu condicionamento, se esforça, luta,
dá cabeçadas por ser livre.
Com
a ajuda, também desta vez? das religiões e de várias organizações, aceitamos
que o esforço é necessário, que faz parte da vida.
Creio
que é uma indicação de sua cegueira absoluta e a maior limitação imposta ao ser
humano, ter-nos inculcado que a vida tem que ser um esforço sem fim.
HS:
você acha que podemos viver sem esforço?
K:
Senhor, isso não tem nada a ver com pensar. O pensamento é o mais ...
HS:
Bem, vamos eliminar essa palavra...
K:
Mas viver sem esforço exige a mais sublime sensibilidade, a mais alta forma de
inteligência. Não se trata de dizer "não vou esforçar-me", e a partir
de então viver como uma vaca, inconsciente de tudo.
HS:
Eu entendo.
K:
É preciso entender como surge o conflito, a dualidade que existe em nós.
Conversação com Huston Smith,
Claremont, Califórnia, 1968
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