[...] Há o cérebro e há a mente. Notai, por favor, que estou empregando estas duas palavras muito cautelosamente. Há séculos que o cérebro se ocupa com sua própria conservação; ele é produto do tempo, resultado de todos os esforços “animalísticos” do homem. O cérebro humano é ainda como o animal que luta para a própria conservação, e ele é o justo centro do “eu”: minhas posses, minha casa, minha mulher, minha religião. Todos nós o conhecemos. Todos temos esse cérebro que busca a própria conservação; herdamo-lo do passado.
Agora, consoante os biologistas, a parte posterior do cérebro constitui o cérebro animal, e é muito ativa, enquanto que a parte anterior ainda está por desenvolver. Isso não significa que eu leio biologia, mas tenho amigos que o fazem e me disseram que a parte anterior do cérebro não está ainda totalmente desenvolvida, e que o cérebro humano deverá converter-se de “animalístico” em algo novo, maravilhoso. E meu desejo é salientar-vos que para se alcançar a totalidade da mente, que inclui o limitado cérebro, o tempo não é necessário. A mente integral é uma coisa que tem de ser compreendida; não se pode especular a seu respeito, porquanto não se trata de uma simples ideia religiosa, como a ideia de Deus, ou a ideia da alma, ou a ideia do céu. E podemos saltar daquele limitado estado da mente que é produto do passado e se desenvolveu através do tempo, diretamente para o atemporal, o completo, o total? É possível saltar do limitado para o ilimitado? Eis a questão. Eu digo que é possível — mas cumpre romper “explosivamente” com o passado. Precisa-se daquela extraordinária energia sobre a qual estive falando e que não é resultado de ajustamento, de resistência, de conflito. Deve a pessoa estar inteirada de seus próprios instintos animais, ciente do medo, da ambição, das buscas inspiradas pelo desejo; cumpre dar plena atenção a tudo isso. Descobre-se, assim, que o tempo como fator de evolução deixa de existir. Não estou dizendo que não há evolução — pois, de fato, há; mas vós tereis ultrapassado as fronteiras do tempo. O tempo já não será um meio de chegar a alguma parte, um meio de se alcançar gradualmente o Sublime, a mais elevada forma da criação. A o verificar-se essa “explosiva” realização da atenção total, o cérebro, sempre muito ativo no afã de adquirir, torna-se quieto; essa quietude lhe é necessária para superar o mecanismo do tempo.
Notai que a tranquilidade do cérebro faz parte da meditação. Não desejo discorrer agora sobre a meditação; fá-lo-emos dentro em pouco. Mas é preciso percebermos a importância de termos o cérebro tranquilo, pois isso significa ficar livre da estrutura psicológica da sociedade. A estrutura psicológica da sociedade é ainda animalística; ela torna o cérebro ambicioso, ávido, invejoso, ciumento, apegado, e, em tais condições, o cérebro não conhece o amor. Podeis estreitar nos braços um homem ou uma mulher, podeis casar-vos, segurar a mão de um amigo, fazer o que quer que seja, mas não haverá amor enquanto o cérebro ainda constituir uma parte do passado “animalístico”, que constitui a estrutura psicológica da sociedade. A compreensão dessa estrutura, em nós mesmos, faz também parte da meditação; e, se chegardes até aí, descobrireis que, com aquela compreensão, se apresenta uma imensidade, um impulso criador que nada tem em comum com o escrever livros, poesias, ou pintar quadros, nem com nenhum dos absurdos e exigências infantis de uma sociedade em que tanto valor se atribui à fama. É uma criação que se verifica no imensurável — a culminância da existência. Mas, tal só será realizável quando a estrutura “animalística”, a estrutura psicológica da sociedade tiver sido de todo rejeitada — significando isso que a mente, o cérebro, já não é ambiciosa, apegada, dependente, já não deseja preencher-se, já não deseja ser alguém, já não busca o poder, a posição, o prestígio.
Respondi à vossa pergunta, senhor?
OUVINTE: Destes-me algo sobre que pensar.
KRISHNAMURTI: Não penseis nisso, senhor. Pensar sobre uma coisa implica tempo. Dizeis “Não percebo isso agora, mas vou refletir a seu respeito e posteriormente o perceberei”. O pensamento não vos fará perceber nada; o tempo não vos dará compreensão. No momento em que dizeis que ides pensar acerca de uma coisa, criastes a estrutura do “por enquanto vou tentar” — e estais, então, completamente perdido. O importante é cada um escutar com todo o seu ser; e esta é realmente a nossa dificuldade. “Escutar com todo o ser” não é apenas ouvir as palavras do orador, mas também ver, imediatamente, por si mesmo, a verdade ou a falsidade do que se está dizendo; e esse escutar exige extraordinária energia. Não se trata, pois, de “tentar, por enquanto”. Ou a pessoa escuta com todo o seu ser, ou nada escuta. Se escutardes com todo o vosso ser, vereis que ocorrerá uma “explosão” interior, não amanhã ou no fim do dia, porém instantaneamente. Foi sobre isto que estive falando: esta “explosiva” transformação que deverá verificar-se no presente imediato.
Notai que, se apenas ficais pensando sobre isso, todas as vossas reações defensivas entram em cena e, assim, continuais a ajustar-vos ao padrão de vossa existência diária, a submeter-vos a esse padrão sempre que seja inconveniente rejeitá-lo. E isso é tudo o que o pensamento pode fazer: dar voltas e mais voltas, infinitamente. O pensamento, pois, não é o instrumento da percepção, não é a dinamite que destruirá o passado. Tendes de dar vosso coração ao escutar — é isso mesmo que quero dizer: tendes de dar vosso coração ao escutar, e não, simplesmente, ouvir palavras com o intelecto. Pode uma pessoa ser extraordinariamente sutil, capaz de falar com eloquência, de citar muitos livros, mas nada disso operará o milagre. O milagre está no “escutar totalmente”.
Respondi à vossa pergunta, senhor?
OUVINTE: Destes-me algo sobre que pensar.
KRISHNAMURTI: Não penseis nisso, senhor. Pensar sobre uma coisa implica tempo. Dizeis “Não percebo isso agora, mas vou refletir a seu respeito e posteriormente o perceberei”. O pensamento não vos fará perceber nada; o tempo não vos dará compreensão. No momento em que dizeis que ides pensar acerca de uma coisa, criastes a estrutura do “por enquanto vou tentar” — e estais, então, completamente perdido. O importante é cada um escutar com todo o seu ser; e esta é realmente a nossa dificuldade. “Escutar com todo o ser” não é apenas ouvir as palavras do orador, mas também ver, imediatamente, por si mesmo, a verdade ou a falsidade do que se está dizendo; e esse escutar exige extraordinária energia. Não se trata, pois, de “tentar, por enquanto”. Ou a pessoa escuta com todo o seu ser, ou nada escuta. Se escutardes com todo o vosso ser, vereis que ocorrerá uma “explosão” interior, não amanhã ou no fim do dia, porém instantaneamente. Foi sobre isto que estive falando: esta “explosiva” transformação que deverá verificar-se no presente imediato.
Notai que, se apenas ficais pensando sobre isso, todas as vossas reações defensivas entram em cena e, assim, continuais a ajustar-vos ao padrão de vossa existência diária, a submeter-vos a esse padrão sempre que seja inconveniente rejeitá-lo. E isso é tudo o que o pensamento pode fazer: dar voltas e mais voltas, infinitamente. O pensamento, pois, não é o instrumento da percepção, não é a dinamite que destruirá o passado. Tendes de dar vosso coração ao escutar — é isso mesmo que quero dizer: tendes de dar vosso coração ao escutar, e não, simplesmente, ouvir palavras com o intelecto. Pode uma pessoa ser extraordinariamente sutil, capaz de falar com eloquência, de citar muitos livros, mas nada disso operará o milagre. O milagre está no “escutar totalmente”.
Krishnamurti, Saanen, 31 de julho de 1962,
O homem e seus desejos em conflito