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sábado, 7 de abril de 2018

O mecanismo da fuga do vazio existencial


O mecanismo da fuga do vazio existencial

Penso que a maioria de nós acha a vida muito insípida. Para ganharmos o sustento, precisamos exercer uma certa profissão, e esta se torna muito monótona; começa-se uma rotina, que temos de seguir, ano por ano, até morrer. Ricos ou pobres, e ainda que sejamos muito eruditos ou dotados de espírito filosófico, nossas vidas são em geral superficiais, vazias. Há evidentemente uma insuficiência em nós mesmos, e ao nos tornarmos apercebidos desse vazio procuramos preenchê-lo com conhecimentos, com alguma espécie de atividade social, ou nos refugiamos em divertimentos de toda ordem, ou apegamo-nos a alguma crença religiosa. Ainda que tenhamos uma certa capacidade e sejamos muito eficientes, nossas vidas são, ainda assim, insípidas e, para nos livrarmos dessa insipidez, dessa cansativa monotonia da vida, buscamos uma certa forma de enriquecimento religioso, tentamos conquistar aquele "estado de ser" extramundano que não é uma rotina e que, por enquanto, pode ser chamado "o outro estado". Em nossa busca desse outro estado, encontramos muitos sistemas diferentes, diferentes caminhos que se supõe conduzirem a ele; e, assim, pelo disciplinamento de nós mesmos; pela prática de determinado sistema de meditação, pela observância de um certo ritual ou a repetição de certas frases, esperamos alcançar aquele estado. Sendo a nossa vida um ciclo interminável de dores e de prazeres, de variadas experiências sem muita significação ou mera repetição, sem sentido algum, de uma mesma experiência — o viver constitui para a maioria de nós uma monótona rotina. Por esta razão, o problema de nosso enriquecimento interior, da conquista do "outro estado" — chamai-o Deus, a Verdade, bem-aventurança ou como quiserdes — se torna muito urgente, não é verdade? Podeis estar bem de vida, bem casado, ter filhos podeis pensar inteligente e equilibradamente, entretanto, sem aquele estado, a vida se torna horrivelmente vazia.

Que se deve, pois, fazer? Como conquistar aquele estado? Ou é completamente impossível conquistá-lo? A nossa mente, como hoje está constituída, é sem dúvida muito insignificante, limitada, condicionada; e embora uma mente limitada possa especular a respeito do "outro estado", suas conjecturas serão sempre limitadas. Ela poderá formular um estado ideal, conceber e descrever aquele outro estado, mas suas concepções permanecem dentro de suas estreitas limitações, e penso que aí é que se encontra o fio da meada: no perceber que a mente não pode, em circunstância alguma, experimentar, viver aquele outro estado, se se limita a formulá-lo ou a especular a seu respeito. Não há dúvida de que esta é uma descoberta extraordinária: o perceber que, sendo a mente limitada, pequena, estreita, superficial, todo movimento que faça para alcançar aquele estado extraordinário, constitui um empecilho. O descobrimento deste fato, não especulativamente porém realmente, é o começo de uma maneira nova de considerar o problema.

Nossas mentes, em verdade, são produto do tempo, de muitos milhares de dias passados, resultado da experiência baseada no "conhecido"; e, em tais condições, a mente é uma continuação do "conhecido". A mente de cada um de nós é resultado de cultura, educação, e por mais extenso que seja o seu saber ou preparo técnico, ela é sempre produto do tempo; por conseguinte, é limitada, condicionada. Com esta mente, queremos descobrir o incognoscível; e compreender que essa mente nunca poderá descobrir o incognoscível, constitui uma experiência verdadeiramente extraordinária. Descobrir que a mente de um indivíduo, por mais sagaz, por mais sutil, por mais ilustrada que seja, não pode de modo nenhum compreender aquele outro estado — esse descobrimento traz consigo uma certa compreensão "factual" e acho que este é o começo de uma perspectiva da vida que poderá abrir a porta que conduz àquele outro estado.

Expressando o problema de maneira diferente: a mente está sempre e sempre ativa, "tagarelando", planejando, e é capaz de extraordinárias sutilezas e invenções. E de que maneira pode esta mente tornar-se quieta? Vê-se que toda atividade da mente, todo movimento que faça, em qualquer direção, é reação do passado. Como quietar esta mente? Se a quietamos por meio de disciplina, sua quietude é um estado em que não há investigação, busca, não é exato? Em tais condições, ela não está aberta para o "desconhecido", "o outro estado".

Não sei se já alguma vez pensastes neste problema, ou se nele tendes pensado unicamente pela maneira tradicional, ou seja, tendo um ideal e dirigindo-se para ele segundo uma certa fórmula ou a prática de determinada disciplina. Disciplina implica, invariavelmente, repressão e o conflito da dualidade — e isso está na esfera da mente e por esse caminho prosseguimos, esperando captar o outro estado. Mas nunca indagamos inteligentes e sãmente se nossa mente é capaz de captá-lo. Sugeriu-se-nos que a mente deve estar tranquila, mas a tranquilidade foi sempre cultivada por meio de disciplina. Isto é, temos o ideal de uma mente tranquila, e buscamos realizar este ideal por meio de controle, luta, esforço.

Ora bem, se considerais atentamente esse mecanismo, em sua inteireza, vereis que está todo no terreno do conhecido. Apercebida da monotonia de sua existência, cansada de suas repetidas experiências, empenha-se a mente em conquistar aquele "outro estado". Mas, quando se percebe que a mente é o "conhecido" e que todo movimento que faz não a leva ao outro estado, que é "o desconhecido", o nosso problema se resume então, não em como conquistar o desconhecido, mas em descobrir se a mente pode libertar-se do "conhecido". Penso que este problema deve ser considerado por todo aquele que deseje descobrir se existe alguma possibilidade de "realizar o outro estado", o desconhecido. Assim sendo, como pode a mente, que é resultado do passado, do conhecido, libertar-se do conhecido? Espero me esteja fazendo claro.

Como disse, a mente atual — tanto consciente como inconsciente — é produto do passado, resultado acumulado de influências raciais, climáticas, dietéticas, e outras. A mente, portanto, está condicionada, condicionada como cristã, hinduísta, budista ou comunista, e é bem óbvio que ela projeta aquilo que considera ser o real. Mas, quer a sua "projeção" seja a do comunista, que julga prever o futuro e quer forçar toda a humanidade a adaptar-se ao padrão de sua Utopia, quer seja a "projeção" do chamado homem religioso, que também julga conhecer o futuro e educa a criança, a pessoa de acordo com o seu ponto de vista particular — nem uma nem outra dessas projeções é o Real. Sem o Real, a vida se torna muito insípida, como é atualmente para a maioria das pessoas. E sendo insípidas as nossas vidas, começamos a tornar-nos românticos e sentimentais, a respeito do outro estado, do Real.

Ora, vendo-se que é este o padrão de nossa existência, e sem entrarmos em muitos pormenores, pergunto se é possível a mente libertar-se do conhecido, constituído das acumulações psicológicas do passado. Há também o conhecido representado pelas nossas atividades diárias, mas deste, como é bem óbvio, a mente não pode livrar-se; porque se qualquer de nós esquecesse o caminho de sua casa ou esquecesse os conhecimentos que o habilitam a ganhar o sustento, estaria à beira da demência. Mas pode a mente libertar-se dos fatores psicológicos do conhecido, que lhe oferecem a segurança pela associação e a identificação?

Para investigar esta matéria, teremos de descobrir se há realmente diferença entre o pensador e o pensamento, entre o observador e o objeto observado. Atualmente, há uma divisão entre os dois, não é verdade? Pensamos que o "eu", a entidade que experimenta, é diferente da experiência, do pensamento. Há um intervalo, uma divisão entre o pensador e o pensamento e por esta razão dizemos: "Tenho de controlar o pensamento". Mas o "eu", o pensador, é diferente do pensamento? O pensador está sempre procurando controlar o pensamento, moldá-lo de acordo com o que considera ser um padrão bom; mas existe pensador, se não existe pensamento? Só há pensar, e este cria o pensador. Podemos colocar o pensador em qualquer nível, chamá-lo o Supremo, o Atman; ou o que quer que seja; mas ele continua a ser resultado do pensar. O pensador não criou o pensamento; foi o pensamento que criou o pensador. Reconhecendo sua própria impermanência, o pensamento cria o pensador como entidade separada, a fim de dar permanência a si mesmo, pois é isso, afinal de contas, o que todos desejamos. Podeis dizer que a entidade a que chamais Atman, alma, pensador, está separada do pensamento, da experiência; mas só podeis estar apercebido da existência de uma entidade separada, por meio do pensamento e, também, por causa de vosso condicionamento como hinduísta, cristão, ou o que quer que sejais. Enquanto existir esta dualidade de pensador e pensamento, existirá necessariamente conflito, esforço, ou seja, a ação da vontade. E uma mente que quer libertar-se, que diz: "Tenho de libertar-me do passado" — o que essa mente faz é só criar outro padrão.

Assim, a mente só pode libertar-se — e só então se torna possível a existência do "outro estado" — depois de cessar o esforço do "eu" para alcançar um resultado, neste mundo ou no outro mundo. Tudo o que fazemos se baseia em luta, ambição, sucesso, consecução de objetivos; e por esta razão, pensamos que a "realização" de Deus, ou da Verdade, só se torna possível mediante esforço. Mas esforço denota atividade egocêntrica para alcançar um fim. Não significa abandono do "eu".

Agora, se estais apercebidos de todo esse processo da mente — tanto consciente como inconsciente — se o percebeis e compreendeis realmente, vereis a mente tornar-se sobremaneira tranquila, sem esforço algum. A tranquilidade conseguida a força de disciplina, controle, repressão, é a tranquilidade da morte. A tranquilidade a que me refiro se manifesta sem esforço algum assim que compreendemos todo esse mecanismo da mente. Só então existe possibilidade de manifestar-se aquele outro estado, que se pode chamar a Verdade, ou Deus.

Krishnamurti, Terceira Conferência em Madanapale
26 de fevereiro de 1956, Da Solidão à Plenitude Humana


sexta-feira, 6 de abril de 2018

O mecanismo da insatisfação e do descontentamento

O mecanismo da insatisfação 

e do descontentamento

Parece-me muito importante descobrirmos, por nós mesmos, o que é que estamos buscando, e porque estamos buscando. Se pudermos examinar esta questão com certa profundeza, acho que descobriremos muitas coisas nela envolvidas. Os mais de nós estamos em busca de alguma espécie de preenchimento. Estando insatisfeitos, queremos achar a satisfação em certa relação, no exercício de certas capacidades, ou na busca de certa espécie de ação que seja completamente satisfatória. Ou, se não somos desse temperamento, então, em geral, buscamos o que pensamos ser a verdade, Deus, etc. Quase todos nós estamos buscando, procurando; e se pudéssemos, cada um de nós, descobrir por nós mesmos o que é que estamos buscando, e porque estamos buscando, esse descobrimento, penso, muitas coisas nos revelaria. Vendo-nos insatisfeitos com nós mesmos, com nosso ambiente, com nossas atividades, nossas ocupações, quase todos desejamos um emprego melhor, uma posição melhor, melhor compreensão, atividades mais amplas, uma filosofia mais satisfatória, um cargo inteiramente satisfatório. Exteriormente, é isso que desejamos; e, quando não podemos satisfazer-nos, procuramos águas mais profundas, cultivamos a filosofia, interessamo-nos por reformas, reunimo-nos em grupos diversos, para discutir, etc., e a insatisfação continua... Acho importante averiguarmos se o motivo de nossa busca é compreender a insatisfação, ou achar a satisfação. Porque, se é a satisfação que estamos buscando em qualquer nível, é claro, então, que nossa mente se tornará muito vulgar. Mas pode ser que haja um descontentamento sem objetivo, o descontentamento em si, que não é impulso para a consecução de um resultado, para se chegar a alguma parte. Acho que a maioria de nós, vendo-nos insatisfeitos com nossas relações, nossas profissões, nossas atitudes, nossos valores, estamos procurando desvencilhar-nos de tudo isso para adotarmos um diferente sistema de valores, diferentes relações, diferentes ideias, diferentes crenças; mas, no fundo de tudo isso, está o impulso para nos tornarmos satisfeitos.

Seria interessante se pudéssemos descobrir, por nós mesmos, se existe uma coisa tal como um descontentamento sem "motivo" algum, descontentamento que não seja produto de certa frustração; porque esse próprio descontentamento sem "motivo" pode ser a qualidade que se faz necessária. Presentemente, quando estamos buscando, a nossa busca resulta de insatisfação, descontentamento, e nosso "motivo" é achar satisfação desta ou daquela espécie. Principalmente quando falamos a respeito da verdade ou Deus, estamos — não é verdade? — em busca de certo estado de espírito que seja completamente satisfatório. Quer a mente seja muito ampla, muito sutil, quer tenha muito pouca capacidade, se ela está em busca da satisfação — ainda que sob a forma mais sutil — então os seus deuses, suas virtudes, suas filosofias, seus valores, serão forçosamente vulgares, mesquinhos, superficiais.

Nessas condições, é possível a mente ficar livre de toda busca, o que significa: livre daquele descontentamento cujo "motivo" é achar satisfação? Porque, por mais sutil e por mais inteligente que a mente seja, e quaisquer que sejam as virtudes que tenha cultivado, se ela está meramente buscando satisfação, sob qualquer forma, é então incapaz de compreender o que é verdadeiro. Sem dúvida, todo o mecanismo do pensar é medíocre, muito limitado. Afinal de contas, o pensar é resultado da memória acumulada, da associação, da experiência; o pensar é a reação dessa memória, a reação da mente condicionada. Quando esse condicionamento cria insatisfação, então tudo o que resulta dessa insatisfação é também condicionado. Nossa busca será sempre de todo em todo fútil enquanto estiver baseada num descontentamento que não seja mais do que uma simples reação a dado condicionamento.

Percebido isso, surge a questão de saber se existe alguma outra forma de descontentamento, se existe um descontentamento que não esteja "canalizado", que não tenha "motivo" algum, que não vise a um preenchimento. É possível que a coisa essencial seja esse descontentamento "sem motivo", esse descontentamento que não é reação a certo condicionamento. Por ora, o nosso pensar, a nossa busca, tem um "motivo", e esse motivo baseia-se em nossa exigência de um estado permanente de satisfação completa, ao abrigo de toda e qualquer perturbação, estado que chamamos "paz", "verdade", "Deus", etc.; e toda a finalidade da nossa busca é o alcance desse estado. Vemos, pois, que a busca, em geral está baseada na exigência de satisfação, na exigência de um estado de permanência, onde nunca sejamos perturbados. E pode uma mente nessas condições, cujo pensar é "motivado" pelo desejo de satisfação, descobrir, em algum tempo, o que é verdadeiro?

Parece-me que devemos compreender por nós mesmos todo o "mecanismo" que motiva a nossa busca, o porque buscamos, sem nos deixarmos satisfazer por nenhuma palavra preferida, nenhuma finalidade ou alvo preferido, por mais nobre, inspirador ou ideal que pareça. Porque, sem dúvida, o próprio do "eu" é, exatamente, esse constante "mecanismo" de descontentamento dirigido para uma realização, um preenchimento; é só isso que conhecemos. Quando não há preenchimento há frustração; e surgem então os numerosos problemas relativos a como superar este sentimento de frustração. E, assim, a mente busca um estado livre de frustração, sofrimento. Por conseguinte, a nossa busca da verdade pode ser, justamente, preenchimento, expansão do "eu", de "mim". E vemo-nos, assim, aprisionados neste círculo vicioso. Se estamos apercebidos disso, completamente, totalmente, não há então nenhuma tendência para o preenchimento em qualquer crença, qualquer dogma, qualquer atividade, ou qualquer estado particular. A busca de preenchimento implica sofrimento, frustração; e, se percebe a verdade a esse respeito, a mente deixa de buscar. Em meu sentir, há diferença entre a atenção que se dá a um objetivo e a atenção sem objetivo algum. Podemos concentrar-nos em dada ideia, crença, objetivo, o que é um processo de "exclusão"; e há outra atenção, um percebimento que não é "exclusivo". Identicamente, existe um descontentamento, sem "motivo", que não é produto de nenhuma frustração, que não pode ser "canalizado", que não pode aceitar preenchimento algum. Talvez eu não esteja empregando a palavra correta, mas acho que esse extraordinário descontentamento é a coisa essencial. Sem ele, qualquer outra forma de descontentamento se torna mero caminho para a satisfação.

Assim sendo, pode a mente que está apercebida de si mesma, que conhece as peculiaridades de seu próprio pensar, pôr fim a essa exigência de preenchimento? E, terminada ela, podemos permanecer sem buscar, num estado de completa vacuidade, sem esperança, sem medo? Não devemos chegar a esse estado, quando ocorre a completa cessação do buscar? Porque só então é que será possível acontecer algo que não é produto da mente. Nosso pensar, afinal de contas, resulta do tempo, de muitos dias passados; e, através do tempo, que é pensar, estamos tentando achar algo que está além do tempo. Estamo-nos servindo da mente, o instrumento do tempo, para achar uma coisa que não pode ser medida. Nessas condições, pode a mente imobilizar-se de todo para que possa acontecer algo, o que, naturalmente, não significa um estado de amnésia, um estado de inexistência, de não pensamento. Pelo contrário, isso requer muita vigilância, um percebimento em que não há objeto nem "entidade que percebe". Acho importante compreender isso. Atualmente, quando estamos percebendo, comumente, na vida cotidiana, nesse percebimento há julgamento, avaliação; tal é o nosso percebimento normal. Quando olhamos um quadro, começa a funcionar imediatamente o processo de condenação, de comparação, de avaliação; e não podemos ver o quadro, porque o mecanismo de avaliação, como uma cortina, se pôs de permeio. Podemos olhar o quadro sem avaliação, sem comparação? Analogamente, posso olhar a mim mesmo, não importa o que eu seja — todos os erros, tribulações, fracassos, tristezas, alegrias — e ver tudo isso sem avaliação, percebê-lo simplesmente, sem pôr no meio a cortina da condenação ou da comparação? Se a mente for capaz de fazê-lo, veremos que esse próprio percebimento "queima" a raiz de qualquer problema. Quando a mente está assim apercebida, totalmente cônscia, então não há busca; a mente já não está comparando, buscando a satisfação, pensando em termos de realizarão. Não é a mente, então, ela própria, atemporal? Enquanto a mente compara, condena, julga, está condicionada, e está no tempo; mas quando tudo isso cessou, de todo, não se acha então a própria mente naquele estado que se pode chamar "eternidade"? Nesse estado não há observador, não há "experimentador" que tem associações, que tem lembranças, que está buscando, pois tudo isso é produto do tempo. Enquanto o experimentador está buscando, tentando preencher-se, acumulando experiência, acumulando conhecimentos, tentando descobrir campos mais vastos onde viver, está criando o tempo, e suas ações, quaisquer que sejam, estarão sempre dentro da esfera temporal. O imensurável não pode, jamais, ser encontrado pelo experimentador, "aquele que busca". É só naquele estado em que a mente já não está buscando, em que já não está cultivando, pela busca, um fim para ser alcançado, é só então que se torna possível despontar na existência a realidade.

Krishnamurti, Sexta Conferência em Londres, 26 de junho de 1955

Qual é o fator que cria o mecanismo da dependência?

Qual é o fator que cria o mecanismo da dependência?

Um dos nossos numerosos problemas parece ser o da dependência, esta nossa dependência de pessoas para nossa felicidade, dependência de capacidade, a dependência que nos obriga a ficar apegados a alguma coisa. E a questão é: pode a mente, em algum tempo, estar totalmente livre de toda dependência? Considero esta uma das perguntas fundamentais que deveríamos fazer a nós mesmos constantemente. Naturalmente, não estamos falando da dependência superficial, mas, no nível mais profundo, encontra-se aquela dependência psicológica, de certa segurança, de certo método que garanta à mente um estado de permanência; há a busca de uma ideia, de uma relação que seja duradoura. E sendo este um dos nossos principais problemas, parece-me muito importante que o examinemos com certa profundeza, pois não devemos "responder" superficialmente com uma reação imediata.

Porque é que dependemos? Psicologicamente, interiormente, dependemos de uma crença, um sistema, uma filosofia; pedimos a outro uma norma de conduta; procuramos instrutores, em busca de uma maneira de vida que nos propicie certa esperança, certa felicidade. Assim, estamos sempre — não é verdade? — procurando alguma espécie de dependência, de segurança. Tem a mente possibilidade de libertar-se dessa ideia de dependência? Com isso não quero dizer que a mente deva conquistar a independência, o que só seria uma reação à dependência. Não estamos falando de independência, libertação de certo estado. Se pudermos investigar, sem a reação de buscar libertar-nos de certo estado de dependência, poderemos penetrar muito mais profundamente na questão da dependência. Mas se, na nossa investigação, saímos por uma tangente, buscando a independência, nunca compreenderemos integralmente esta questão da dependência psicológica. Sabemos que dependemos: das nossas relações com pessoas, de certa ideia, ou de um sistema de pensamento. Por quê? Aceitamos a necessidade de dependência. Dizemo-la inevitável. Nunca pusemos em questão este ponto, nunca indagamos porque cada um de nós anda em busca de alguma espécie de dependência.

A causa não é que, na realidade, e muito profundamente, sentimos necessidade de segurança, permanência? Vendo-nos num estado de confusão, desejamos que algo nos salve dessa confusão. Estamos, pois, sempre interessados em fugir ou evitar o estado em que nos achamos. No processo de evitar esse estado, temos de criar, forçosamente, alguma espécie de dependência, a qual se torna nossa autoridade. Se dependemos de outrem para nossa segurança, nosso bem estar interior, dessa dependência resultam inumeráveis problemas; e tentamos então resolver esses problemas, que são problemas criados pelo apego. Mas nunca inquirimos, nunca examinamos o próprio problema da dependência. Talvez, se pudermos examinar este problema de maneira verdadeiramente inteligente, com plena atenção, talvez então possamos descobrir que não é, em absoluto, a dependência que constitui o problema, que ela é apenas um modo de fugirmos a um fato mais profundo.

Peço licença para sugerir, àqueles que estão tomando notas, que se abstenham disso. Porque estas reuniões não serão proveitosas se o que queremos é meramente lembrar-nos, depois, do que se esteve dizendo. Mas, se pudermos experimentar diretamente o que se está dizendo, agora, e não depois, isso terá um significado positivo, será uma experiência direta, e não uma experiência recolhida, mais tarde, das vossas notas, e pensada de memória. Além disso, se posso observá-lo, o tomar notas perturba os que estão perto de vós.

Como dizia, porque dependemos e fazemos da dependência um problema? Na verdade, penso, o problema não é a dependência; a meu ver, há outro fator mais profundo, que nos faz depender. E, se pudermos descobrir esse fator, então a dependência e a luta pela libertação se tornam muito pouco significativas; então, todos os problemas que surgirem em razão da dependência reduzir-se-ão a nada.

Qual é, pois, esse fator mais profundo? É a mente detestar e temer a ideia de estar só? E conhece a mente esse estado que está evitando? Dependo de alguém, psicologicamente, interiormente, por causa de um estado que estou tentando evitar, mas que nunca investiguei, nunca examinei. Por isso, a minha dependência de uma pessoa — de quem desejo amor, estímulo, orientação — se torna imensamente importante, como todos os problemas dela decorrentes. Mas, se sou capaz de perceber o fator que é o meu depender de uma pessoa, de Deus, da oração, de certa capacidade, certa fórmula ou conclusão que chamo "crença", talvez então eu possa descobrir que tal dependência resulta de uma exigência interior a que, em verdade, nunca prestei atenção, nem levei em conta.

Podemos, nesta tarde, dar atenção a este fator, o fator que a mente evita o sentimento de completa solidão, que só conhecemos superficialmente? Que é "estar solitário"? Podemos examinar isso agora, sem o perdermos de vista um só instante, sem introduzirmos nenhum outro problema? Considero, com efeito, esta questão sumamente importante, porque, enquanto aquela solidão não for realmente compreendida, sentida, penetrada, dissolvida — ou qualquer outra palavra que preferirdes —, enquanto persistir este sentimento de solidão, será inevitável a dependência, nunca seremos livres, nunca poderemos descobrir por nós mesmos o que é verdadeiro, o que é religião. Enquanto estou dependendo tem de haver alguma autoridade, tem de haver imitação, tem de haver compulsão sob diferentes formas, tem de haver disciplinamento segundo certo padrão. Pode, pois, a mente descobrir o que é "estar na solidão", e passar além, de modo que seja posta em liberdade e não dependa mais das crenças, dos deuses, dos sistemas, das orações, nem de coisa alguma?

Não há dúvida de que, enquanto estamos buscando um resultado, um fim, um ideal, essa própria ânsia de achar cria dependência, de que resultam os problemas da inveja, da "exclusão", do isolamento, e tudo o mais. Nessas condições, pode a minha mente conhecer a solidão em que de fato se encontra, embora eu a esteja encobrindo com o saber, relações, e várias outras formas de distração? Posso compreender efetivamente essa solidão? Porque não é este um dos nossos maiores problemas, este apego e a luta para nos desapegarmos? Podemos examinar juntos este problema, ou isto é completamente impossível? Enquanto há apego, dependência, tem de haver "exclusão" (separação). A dependência da nacionalidade, a identificação com determinado grupo, determinada raça, determinada pessoa ou crença, é evidentemente um fator de separação. Assim, é provável que a mente esteja sempre, como entidade separada, buscando isolamento e evitando um fator mais profundo, que realmente é separativo: o processo egocêntrico de seu próprio pensar, gerador de solidão.

Vós conheceis o sentimento de que devemos identificar-nos como hinduístas, cristãos, como pertencentes a certa casta, grupo, raça, tudo isso é bem sabido de vós. Se pudermos, cada um de nós, compreender o problema mais profundo, o problema implícito, talvez então termine toda influência geradora de dependência, e a mente fique de todo livre. Este problema é talvez tão difícil que não possa ser discutido num tão grande grupo.

OUVINTE: Podeis definir a palavra "só", em contraste com "solidão"?

KRISHNAMURTI: Por favor, nós não estamos, com certeza, buscando definições, estamos? Estamos perguntando se cada um de nós está apercebido de sua solidão — não agora, talvez —, mas nós conhecemos esse estado e sabemos que estamos fugindo dele por vários meios, e, consequentemente, multiplicando os nossos problemas. Ora, posso eu, pelo percebimento, "queimar" a raiz do problema, de modo que ele nunca mais torne a surgir ou, se tornar, eu saiba resolvê-lo sem criar novos problemas?

OUVINTE: Significa isso que devemos quebrar os laços que são insatisfatórios?

KRISHNAMURTI: Ora, não é isto que estamos discutindo, é? Parece que não nos estamos entendendo bem. É por isso que estou incerto quanto à possibilidade de discutirmos este problema num grupo tão grande. Nós sabemos — não é verdade? — que estamos apegados. Dependemos de pessoas, de ideias. Faz parte da natureza do nosso ser o depender de alguém. E a essa dependência chamamos amor. Agora, pergunto a mim próprio, e talvez pergunteis também a vós mesmos, se é possível libertar a mente, psicologicamente, interiormente, de toda dependência, pois percebo que, por causa da dependência, surgem problemas e mais problemas, um nunca acabar de problemas. Por essa razão, pergunto a mim mesmo se é possível ficarmos num estado de percebimento tal que esse próprio percebimento faça consumir-se o sentimento de dependência, de outrem ou de uma ideia, de modo que a mente, com o total desaparecimento da dependência, não mais se veja isolada.

Por exemplo: eu dependo da identificação com um dado grupo; satisfaz-me intitular-me hinduísta ou cristão; pertencer a uma dada nacionalidade é muito satisfatório. Eu mesmo, interiormente, sinto-me muito insignificante. Não sou ninguém, e, assim, se posso chamar-me "alguém", sinto satisfação. Esta é uma forma de dependência, num nível muito superficial, talvez, mas que gera o veneno do nacionalismo. E há muitas outras formas, mais profundas. Pois bem, posso transcender tudo isso, de modo que minha mente nunca mais dependa, psicologicamente, não tenha dependência de espécie alguma e não busque nenhuma forma de segurança? Ela não buscará a segurança se compreendo esse senso de "exclusão", de que estou apercebido, e a que chamo "solidão" — esse mecanismo egocêntrico de pensar, que gera o isolamento.

O problema, pois, não é de como nos tornarmos desapegados, de como libertar-nos de pessoas ou ideias, mas, sim: pode a mente deter esse mecanismo em que ela se fecha a si mesma por meio de suas próprias atividades, suas próprias exigências, seus anseios? Enquanto houver a ideia de "mim", "eu", tem de haver solidão. Atingimos a própria essência do processo de autoenclausuramento quando descobrimos esse extraordinário sentimento de solidão. Posso "queimar" tal mecanismo, de modo que a mente nunca mais busque nenhuma forma de segurança, e não tenha mais exigências? Isso não pode ser respondido por mim, mas por cada um de vós. O que posso fazer é só descrever; mas a descrição se torna simplesmente um obstáculo se não for realmente experimentada. Mas, se esta descrição vos revela o mecanismo do vosso pensar, então ela própria é um percebimento de vosso próprio estado. E, nesse caso, posso permanecer nesse estado? Posso deixar de movimentar-me para longe do fato da solidão, e permanecer "lá", sem fugir de maneira nenhuma, sem evitá-la nunca? Ao perceber, compreender que o problema não é a dependência, mas a solidão, pode a minha mente permanecer imóvel nesse estado a que chama "solidão"? Isto é dificílimo, porque a mente nunca pode "ficar" com um fato; ela sempre o traduz, ou o interpreta, ou faz alguma coisa com relação ao fato; nunca "fica" com o fato.

Se a mente puder permanecer com o fato, sem dar nenhuma opinião a respeito dele, sem traduzi-lo, sem condená-lo, sem evitá-lo, é o fato então diferente da mente? Existe separação entre o fato e a mente, ou a própria mente é o fato? Por exemplo, eu estou solitário. Estou apercebido disso, sei o que significa: é um dos problemas de nossa existência diária, de toda a nossa existência. E quero estudar, por mim mesmo, esta questão da dependência, para ver se a mente pode ficar livre, não apenas especulativa, teórica, ou filosoficamente, mas livre, efetivamente, da dependência. Porque, se meu amor depende de outra pessoa, não tenho amor. E desejo descobrir que estado é esse a que chamamos "amor". Ao tentar descobri-lo, é possível que desapareça completamente a disposição para a dependência, para a segurança, nas relações, que desapareça toda exigência, todo desejo de permanência; e posso então ver-me em presença de um fato completamente diferente. E, assim, pelo investigar, pelo examinar a mim mesmo, posso chegar àquela coisa a que chamo "solidão". Agora, posso "ficar" com ela? Com "ficar", quero dizer: não interpretá-la, não avaliá-la, não condená-la, mas só observar o estado de solidão, sem nenhum movimento de recuo. E se minha mente é capaz de "ficar" com esse estado, esse estado é então diferente da minha mente? É possível que a minha mente esteja, ela própria, solitária, vazia, e que não haja um estado de vazio, que a mente observa. Minha mente observa a solidão, e a evita, foge dela. Mas, se não fujo à solidão, há então divisão, há separação, há um observador que observa a solidão? Ou só há um estado de solidão — a minha mente vazia, solitária, e não um observador que sabe que há solidão? Acho importante compreender isso, rapidamente, sem muita "verbalização". Digo, agora: "Sou invejoso e quero livrar-me da inveja" — temos assim um observador e uma coisa observada; o observador quer livrar-se daquilo a que observa. Mas o observador não é a mesma coisa que aquilo que está sendo observado? Foi a própria mente que criou a inveja, e portanto a mente nada pode fazer com relação a inveja. A minha mente, pois, observa a solidão; o pensador está apercebido de achar-se solitário. Mas, se ele "ficar com isso", em pleno contato com "isso" — quer dizer, não fugir da coisa, não a traduzir, etc. —, há então alguma diferença entre o observador e aquilo que está sendo observado? Ou só há um estado único, que é: a própria mente está solitária, vazia? Isto não quer dizer que a mente se observa como estando vazia, mas, sim, que ela própria é vazia.

Pode então a mente, percebendo que ela própria é vazia e que toda tentativa, todo movimento para afastar-se desse vazio, é meramente uma fuga, uma dependência, pode a mente apartar de si toda dependência, e ser o que ela é — vazia, solitária, completamente? E nesse estado, não está a mente livre de toda dependência, todo apego? Notai, por favor, que isto é uma coisa que tem de ser investigada, e não aceita só porque eu o estou dizendo. Nenhuma significação tem ela se meramente a aceitais. Mas, se estais experimentando a coisa enquanto vamos caminhando, vereis que todo movimento por parte da mente — sendo movimento: avaliação, condenação, tradução, etc. —, que todo movimento é uma distração que nos afasta do fato de o que é e cria conflito entre a mente e a coisa observada. Isto, para irmos mais longe, é realmente uma questão de saber se a mente pode existir sem esforço, sem dualidade, sem conflito, e ser, portanto, livre. No momento em que a mente se vê envolvida em conflito, ela não é livre. Quando não há esforço para ser livre, há liberdade. Pode, pois, a mente existir sem esforço e, por conseguinte, ser livre?

Krishnamurti, Quinta Conferência em Londres, 25 de junho de 1955

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Como chegou a este grau de compreensão?

Pergunta: Pode dizer-nos como chegou a este grau de compreensão?

Krishnamurti: Receio que fosse demorar muito tempo, e pode ser muito pessoal. Em primeiro lugar, Senhores, eu não sou um filósofo, não sou um estudante de filosofia. Penso que aquele que seja apenas estudante de filosofia está já morto. Mas vivi com toda o gênero de pessoas, e fui criado, como talvez saibam, para levar a cabo uma certa função, um certo cargo. Mais uma vez, isso significa “explorador”. E era também o dirigente de uma enorme organização em todo o mundo, para fins espirituais; e vi a falácia disso, porque não se pode conduzir os homens à verdade. Só se pode torná-los inteligentes através da educação, o que nada tem a ver com sacerdotes e os seus meios de exploração – as cerimônias. Portanto dissolvi essa organização; e, vivendo com as pessoas, e não tendo uma ideia fixa sobre a vida, ou uma mente limitada por um determinado contexto tradicional, comecei a descobrir o que, para mim, é a verdade: verdade para toda a gente – uma vida que se pode viver saudavelmente, sensatamente, humanamente, não baseada na exploração, mas nas necessidades. Sei o que preciso, e que não é muito, portanto quer trabalhe para elas escavando um jardim, ou falando, ou escrevendo, isso não é de muita importância.

Em primeiro lugar, para descobrir qualquer coisa, tem que haver um grande descontentamento, um grande questionamento, infelicidade; e muito poucas pessoas no mundo, quando estão descontentes, desejam acentuar esse descontentamento, desejam passar por ele para descobrir. Geralmente as pessoas querem o oposto. Se estão descontentes, querem felicidade, ao passo que, por mim – se me permitem ser pessoal – eu não queria o oposto, eu queria descobrir; e assim gradualmente através de vários questionamentos e através de um atrito contínuo, cheguei a compreender isso a que se chama a verdade ou Deus. Espero ter respondido à pergunta.

Jiddu Krishnamurti em Auckland, Nova Zelândia, palestra a homens de negócios 6 de abril, 1934.

sábado, 25 de outubro de 2014

Por que minha vida é insignificante?

"Minha vida é insignificante — suponhamos — e trato, pois de dar-lhe significação. Pergunto: “Qual é a finalidade da vida?” — porque, se a vida tem alguma finalidade, poderei então viver em harmonia com essa finalidade. E, assim, invento ou imagino uma finalidade, ou, pela leitura, pela investigação, pela busca, encontro uma finalidade; estou, por conseguinte, dando significação à vida. Como o intelectual, à sua maneira, dá significação à vida, negando ou afirmando que ela tem finalidade e um significado, nós também atribuímos significação à vida por meio de nossos ideais, da busca de um alvo, de Deus, de Amor, da Verdade. E isso, com efeito, significa que, se não damos significação à vida, nossa existência não terá para nós importância alguma. O viver não nos parece tão bom como desejaríamos que fosse, e por isso desejamos dar significação à vida. Não sei se estais percebendo isto.”

“Qual é a significação de nossa vida, da vossa e da minha, independentemente dos filósofos? Ela tem alguma significação, ou lhe estamos dando significação pela crença, tal como faz o intelectual que se torna católico, isto ou aquilo, encontrando assim um abrigo? Como seu intelecto reduziu tudo a cacos, ele se vê agora sozinho, desamparado, etc., e não podendo suportar tal estado, necessita de uma crença, no catolicismo, no comunismo, em qualquer coisa que lhe dê alento e dê significação à sua vida.”

“Agora, pergunto a mim, mesmo: Por que razão queremos uma finalidade? E que significa viver sem finalidade alguma? Compreendeis? Sendo a nossa vida vazia, atribulada, triste, precisamos dar-lhe uma significação. E há possibilidade de ficarmos cônscios de nosso vazio, nossa solidão, nossos sofrimentos, todas as tribulações e conflitos de nossa existência, sem darmos, artificialmente, um significado à vida? Podemos estar cônscios dessa coisa extraordinária que chamamos a vida — que significa ganhar o próprio sustento, que significa inveja, ambições e desenganos — estar cônscios, simplesmente, de tudo isso, sem condenação ou justificação, e passar além? A mim me parece que, enquanto estivermos procurando ou dando uma significação à vida, estaremos perdendo algo de extraordinariamente vital. O mesmo acontece com o homem que quer achar a significação da morte e está constantemente empenhado em racionalizá-la, explicá-la, e impedido, assim, de “experimentar” o que é a morte.”

Krishnamurti – 13 de agosto de 1955 – Ojai (Califórnia) U.S.A.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Perca o presente e você viverá no tédio

Osho, eu sinto que a vida é muito chata. O que deveria fazer?

 Brij Mohan, desse jeito você já fez o bastante: você tornou a vida chata — uma grande façanha! A vida é uma tal dança de êxtase e você a reduziu à chatice. Você fez um milagre! O que mais você quer fazer? Você não pode fazer nada maior que isto. Vida, e chata? Você deve ter uma tremenda capacidade de ignorar a vida. 

Outro dia eu estava dizendo a vocês que a ignorância significa a capacidade de ignorar. Você deve estar ignorando os pássaros, as árvores, as flores, as pessoas. De outra maneira, a vida é tão tremendamente bela, tão absurdamente bela, que se você puder vê-la como ela é, você nunca parará de rir. Você dará risadas — pelo menos internamente. 

A vida não é chata, mas a mente é chata. E nós criamos uma tal mente, tão forte, como uma Muralha da China ao nosso redor, que a vida não entra dentro de nós. A mente nos desconecta da vida. Nós nos tornamos isolados, encapsulados, sem janelas. Vivendo atrás de uma parede de prisão você não vê o sol da manhã, você não vê os passarinhos voando, você não vê o céu à noite cheio de estrelas. E, certamente, você começa a achar que a vida é chata. Sua conclusão é errada. Você  está num espaço errado, você está vivendo num contexto errado.

Você deve ser uma pessoa religiosa, Brij Mohan, porque para tornar a vida chata pessoa tem que ser religiosa; tem que ser muito erudita. A pessoa tem que conhecer o Cristianismo, o Hinduísmo, o Islamismo. A pessoa tem que aprender muito dos Vedas, do Corão e da Bíblia. Você deve ser muito bem informado. Um homem que é bem-informado demais, culto demais, cria uma parede de palavras tão grande — palavras fúteis, vazias — em volta dele que se torne incapaz de ver a vida. 

O conhecimento é uma barreira para a vida. 

Ponha de lado seu conhecimento! E então olhe com olhos vazios... e a vida é uma constante surpresa. Eu não estou falando sobre alguma vida divina —a vida ordinária é tão extraordinária. Em pequenos incidentes você vai achar a presença de Deus — uma criança rindo, um cachorro latindo, um pavão dançando. Mas você não pode ver se seus olhos estiverem cobertos de conhecimento. O homem mais pobre do mundo é o homem que vive atrás de uma cortina de conhecimento. Os mais pobres são aqueles que vivem atrás da mente. Os mais ricos são aqueles que abriram as janelas da não-mente e se aproximaram da vida com ela. 

Brij Mohan, essa não é somente sua experiência, você não está sozinho nela. De fato, a maioria das pessoas concordará com você. Eles não encontraram nenhuma surpresa em lugar algum. E em cada momentos existem surpresas e surpresas porque a vida nunca é a mesma; ela está constantemente mudando, ela toma rumos bastante imprevisíveis. Como você pode não se afetar pela sua própria maravilha? A única maneira de permanecer não afetado é se ligar ao seu passado, às suas memórias, à sua mente. Então você não pode ver o que é, você vai perdendo o presente.

Perca o presente e você viverá no tédio. Esteja no presente e você ficará surpreso por não haver nenhum tédio.

OSHO 


quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Mergulhando no poço sem fundo chamado solidão

Acho que a maioria de nós sabe o que é solidão. Conhecemos esse estado em que todos os laços de relação foram cortados, em que não há senso do futuro nem do passado, em que prevalece um completo sentimento de isolamento. Vocês podem se achar no meio de uma multidão, num ônibus superlotado, ou estar sentado ao lado de um amigo, do marido ou da esposa, e eis que subitamente lhes assalta essa onda, esse sentimento de vácuo, vazio, de um abismo. E a reação instintiva é fugir. Assim, tratam de ligar o rádio, de tagarelar, de ingressar em alguma associação, ou de pregar Deus, a verdade, o amor, etc. O meio de fuga de vocês pode ser Deus ou pode ser o cinema; todos os meios de fuga são idênticos. E a reação é de medo a esse sentimento de total isolamento e, por conseguinte, a fuga. Vocês conhecem todos os meios de fuga: o nacionalismo, a pátria, os filhos, o nome, a propriedade, — e por todas essas coisas vocês estão dispostos a lutar e a morrer. 

Ora, se se reconhece que todos os meios de fuga são iguais, e se percebe realmente a significação de um dado meio de fuga, pode-se ainda fugir? Ou não há mais fuga? E, se não estão fugindo, há ainda conflito? Estão me seguindo? É a fuga ao que é, o esforço para alcançar uma coisa diferente do que é, que cria o conflito. Assim, para que a mente possa transcender esse sentimento de solidão, essa súbita cessação da lembrança de todas as relações, as quais envolvem ciúme, inveja, ânsia de aquisição, esforço para ser virtuoso etc. — primeiro ela tem de enfrentá-lo, passar por ele, de modo que o medo em todas as suas formas se definhe até desaparecer de todo. Dessa forma, pode a mente perceber, um dado meio de fuga, a futilidade de todas as fugas? Não há então conflito, há? Porque já não há nenhum observador da solidão: só há o experimentar dela. Estão seguindo? Essa solidão é o cessar de todas as relações; as ideias já não tem importância; o pensamento perdeu toda a valia. Estou descrevendo as coisas, mas não se limitem a ouvir, pois, assim, ao saírem daqui, levarão somente cinzas. Afinal de contas, estas nossas investigações têm por fim liberar-nos de todas essas terríveis complicações, dar-nos na vida algo mais do que apenas conflito, medo, fadigas e tédio. 

Onde não existe o medo, está a beleza — não a beleza de que falam os poetas, aquela que os artistas pintam, etc., porém, coisa bem diferente. E para descobrir a beleza, um homem terá de conhecer esse isolamento completo — ou, melhor, não terá de conhecê-lo, pois ele já existe. Vocês fugiram dele, mas ele continua existente e lhes segue para sempre. Ele lá está, no coração e na mente, nos mais profundos recessos do ser de vocês. Vocês o encobriram, fugiram dele; mas ele continua existente. E a mente tem de passar por ele, como quem se submete à purificação pelo fogo. Ora, pode a mente passar por ele sem reação, sem dizer que é um estado horrível? No momento em que há reação, torna-se existente o conflito. Se vocês o aceitam, continuarão debaixo de seu peso; e se o rejeitam, tornarão a encontrá-lo na primeira curva do caminho. A mente, pois, tem de passar por ele. Estão me acompanhando? A mente é então aquela solidão, não precisa de passar por ela; ela é a solidão. Quando vocês pensam em termos de "passar por uma coisa" para alcançar outra, já estão em conflito. No momento em que dizem: : "De que maneira devo passar pela solidão, de que maneira devo olhá-la?" — nesse momento já se acham de novo em conflito. 

Existe, pois, uma solidão extraordinária que nenhum Mestre, nenhum guru ou ideia, nenhuma atividade poderá afastar de vocês. Já andaram "mexendo" com essas coisas, já se entretiveram com todas elas; mas elas não podem preencher esse vazio; ele é um abismo sem fundo. Mas deixa de ser esse "abismo sem fundo" no momento em que o experimentam. Compreendem?

Para que a mente possa ficar inteiramente livre do conflito, total e completamente livre de apreensão, medo e ansiedade, torna-se necessário o experimentar desse extraordinário sentimento de não relação com alguma coisa; daí provem o sentimento de solidão. Não imaginem que já o possuem; isso é muito difícil. Só quando temos esse sentimento de solidão em que não há medo é que existe o movimento para o imensurável; porque então não há ilusão, não há fabricante de ilusão, não há o poder de criar ilusão. Enquanto existe conflito, existe o poder de criar ilusão; e com a total cessação do conflito, o temor deixa de existir completamente, e, portanto, não há mais o buscar. 

(...) A mente que passou por essa extraordinária revolução pode enfrentar todo ou qualquer problema, sem que nenhum problema deixe marca nem raízes. Desapareceu, então, todo o sentimento de medo.

Krishnamurti em, O PASSO DECISIVO

quarta-feira, 12 de março de 2014

Só a tristeza lhe dá profundidade, o riso é superficial


Pergunta: Em algum ponto existe um medo que me faz ficar fechado, duro, triste, desesperado, com raiva e impotente. Parece ser tão sutil que eu não consigo nem entrar em contato realmente com ele. Como posso vê-lo com mais clareza?
O único problema em relação à tristeza, ao desespero, à raiva, à impotência, à ansiedade, à angústia, à miséria, é que você quer se livrar deles. Essa é a única barreira.

Você tem que conviver com eles. Não pode simplesmente fugir. É nessas situações que a vida se integra e cresce. São os desafios da vida. Aceite-os. São bênçãos disfarçadas. Quando você quer fugir deles, quando quer de alguma maneira evitá-los, é que o problema surge — pois quando se quer fugir de alguma coisa, nunca se olha diretamente. E a coisa começa a se esconder, porque você a condena; a coisa vai entrando cada vez mais no inconsciente, escondendo-se nos cantos escuros do seu ser, onde você não pode encontrá-la. Move-se para os alicerces do seu ser e ali se esconde. E é claro, quanto mais fundo for, mais problemas causará — porque então começarão a agir a partir de cantos desconhecidos do seu ser e você ficará completamente desamparado.

Portanto, a primeira coisa é: jamais reprima. Esta é a primeira coisa: seja o que for que esteja acontecendo, está acontecendo. Aceite e deixe acontecer — deixe que venha à tona. Na verdade, dizer apenas 'não reprima' não é suficiente. Se você me der permissão, gostaria de lhe dizer: "Acolha tudo como a um amigo". Está se sentindo triste? Permita. Sinta compaixão por isso. A tristeza também tem um ser. Permita-a, abrace-a, sente-se com ela, dê-lhe a mão. Seja amigável. Goste dela. A tristeza é bonita! Não há nada de errado com ela. Quem lhe disse que é errado sentir-se triste? Na verdade, só a tristeza lhe dá profundidade. O riso é superficial, a tristeza é profunda. A tristeza chega até os ossos, até a medula. Nada vai mais fundo que ela.

Portanto, não se preocupe. Fique com a tristeza e ela o levará ao seu centro mais profundo. Você poderá conviver com ela e conhecer algumas coisas novas novas sobre o seu ser as quais nunca conheceu. Essas coisas só podem ser reveladas num estado de tristeza, nunca num estado de felicidade. A escuridão também é boa, também é divina. Não só o dia é de Deus, a noite também é. Chamo a isto de atitude religiosa.[...] Deixe que as coisas sejam como elas são. Isto é coragem religiosa permitir que sejam como são. [...]

Um homem que jamais se entristece não pode ser realmente feliz. É impossível que ele seja feliz. Sua felicidade será apenas um gesto forçado — vazio e impotente. Você pode ver isso no rosto das pessoas quando elas riem: o riso é superficial, está só nos lábios. Não tem relacionamento com o coração, está totalmente desligado.

É exatamente como um — os lábios parecem vermelhos e rosados mas essa cor não vem do vermelho do sangue. É bom que os lábios sejam vermelhos, mas quando a cor vem da vitalidade, das células sanguíneas, da sua energia, da juventude. Não, você pinta os lábios — eles parecem vermelhos mas são feios. O batom é feio. E você verá que só as mulheres feias usam batom. Por que as belas precisariam usá-lo? É absurdo. Se os seus lábios são vermelhos, vitais, para que pintá-los? Assim os tornará feios.

A sua felicidade também é como batom. Você não está feliz e sabe que não está, mas não pode aceitar o fato porque isso abalaria o seu ego. Você não é feliz? Como aceitar isso? Talvez não esteja feliz interiormente, mas isso é problema seu; não precisa expressar, não tem que dizer a verdade. Para o mundo, você tem que manter uma aparência, uma personalidade. Por isso continua rindo. Observe o riso das pessoas e verá imediatamente qual deles vem do coração. Quando o riso vem do coração você pode imediatamente sentir uma vibração diferente — um extravasamento. Esse homem  está realmente feliz. Quando o riso acontece apenas nos lábios, é vazio. É só um gesto; não há nada por trás. É só uma fachada.

O homem que não pode rir profundamente é aquele que reprime a tristeza — não pode rir de verdade porque tem medo da tristeza. Mesmo que entre profundamente no riso, tem medo de que a tristeza venha à tona, que ele possa borbulhar. Ele tem de estar sempre em guarda.

Portanto, por favor, seja qual for a situação, comece a aceitá-la. Se você está triste, está triste. É isso o que Deus quer para você — pelo menos nesse momento ele quer que você fique triste. Seja verdadeiro... fique triste! Viva essa tristeza. E se conseguir vivê-la surgirá em você uma nova qualidade de felicidade, a qual não será uma repressão da tristeza, a qual estará além da tristeza.

Uma pessoa que consegue se sentir pacientemente triste descobre, de repente, numa manhã, que uma felicidade está surgindo em seu coração a partir de alguma fonte desconhecida. Essa fonte desconhecida é Deus. Você a merecerá se a sua tristeza tiver sido verdadeira; se tiver se sentido verdadeiramente desesperado, desamparado, infeliz, miserável; se tiver vivido no inferno, merecerá o céu. Você pagou o preço justo.

O S H O

O homem está doente de tanto buscar - parte 2


"A busca só existe quando você está dormindo; só existe quando você não está atento; a busca só existe na sua desatenção. A desatenção cria a busca."

Você já perguntou a si mesmo o que está procurando? Já fez disso um ponto de profunda meditação, saber o que está procurando? Não. Mesmo que em alguns vagos momentos, em momentos de sonhos, você tem algum pressentimento do que está buscando, ele nunca é preciso, nunca é exato. Você ainda não o definiu. Se tentar definir, quanto mais definido se tornar, mais você sentirá que há necessidade de buscá-lo. A busca só pode continuar num estado de incerteza, num estado de sonho; quando as coisas não estão claras, você simplesmente continua buscando, empurrado por alguma urgência interna, puxado por alguma necessidade interior. Uma coisa você sabe: precisa buscar. Esta é uma necessidade interior. Mas você não sabe o que está buscando. 

E a menos que saiba o que está buscando, como poderá encontrar? É vago — você pensa que é dinheiro, poder, prestígio, respeitabilidade. Mas então vê as pessoas respeitáveis, poderosas, também procurando.  Vê as pessoas que são tremendamente ricas — elas também estão buscando. Até o fim de suas vidas, estão buscando. A riqueza então não vai adiantar, o poder não vai adiantar. A busca continua a despeito do que você tem. 

A busca tem que ser por alguma outra coisa. Esses nomes, esses rótulos — dinheiro, poder, prestígio — são só para satisfazer a sua mente. Só são para ajudá-lo a sentir que está buscando por alguma coisa. Essa coisa é indefinida, um sentimento muito vago. 

A primeira coisa para um buscador real, para o buscador que quer tornar-se um pouco alerta, atento, é definir a busca; formular o conceito claro do que ela é; trazê-la para fora da consciência sonhadora; encontrá-la num profundo estado de alerta; olhá-la diretamente; encará-la. Imediatamente começa a acontecer uma transformação. Se você começar a definir a sua busca, começará a perder o interesse por ela. Quanto mais definida ela se tornar, menos existirá. Quando o que ela é tornar-se claramente conhecido, ela desaparece subitamente. Só existe quando você não está atento. 

Deixe-me repetir: a busca só existe quando você está dormindo; só existe quando você não está atento; a busca só existe na sua desatenção. A desatenção cria a busca.[...]

Nossos sentidos são extrovertidos. Os olhos abrem-se para fora, as mãos movem-se, espalmam-se para fora, as pernas movem-se para fora, os ouvidos ouvem os barulhos, os sons exteriores. Tudo o que está disponível a você abre-se para o exterior; todos os cinco sentidos movem-se extrovertidamente. Você começa a buscar lá onde você vê, sente, toca — a luz dos sentidos incide no exterior. E o buscador está dentro. 

Esta dicotomia precisa ser entendida. O buscador está dentro, mas como a luz está fora, o buscador começa a mover-se de uma maneira ambiciosa, tentando encontrar alguma coisa fora que o satisfaça. 

Isso nunca irá acontecer. Nunca aconteceu. Não pode acontecer pela própria natureza das coisas — porque, a menos que você tenha buscado o buscador, toda a sua busca será insignificante. A menos que você venha a saber quem você é, tudo o que buscar será fútil, pois você não conhece aquele que busca. Sem conhecer o buscador, como poderá se mover na dimensão certa, na direção certa? É impossível. As primeiras coisas devem ser consideradas antes. 

Portanto, estas duas coisas são muito importantes: primeiro, deixe absolutamente claro para si mesmo qual é o seu objetivo. Não fique tateando na escuridão. Enfoque a sua atenção no objeto — o que você realmente está buscando. Porque às vezes você quer uma coisa e sai buscando alguma outra; assim, mesmo que seja bem-sucedido, não conseguirá ficar satisfeito. Você já viu as pessoas bem-sucedidas? Pode encontrar maiores fracassados em algum outro lugar? Você já ouviu o provérbio que nada é mais bem-sucedido do que o sucesso. Está absolutamente errado. Gostaria de lhe dizer: nada fracassa mais do que o sucesso. O provérbio deve ter sido inventado por pessoas estúpidas.[...]

Um homem bem sucedido é sempre atirado para si mesmo no final, e então sofre as torturas do inferno, porque desperdiçou toda a sua vida. Buscou e buscou, arriscou tudo o que tinha, obteve sucesso — e agora seu coração está vazio e sua alma insignificante, sem fragrância, sem bênção.

Portanto, a primeira coisa é saber exatamente o que você está buscando. Insisto nisso porque quanto mais você focar seus olhos no objeto da sua busca, mais ele começará a desaparecer. Quando seus olhos estão absolutamente fixos, subitamente não há nada a buscar; imediatamente seus olhos começam a voltar-se para você mesmo. Quando não há objeto de busca, quando todos os objetos desapareceram, há o vazio. E nesse vazio acontece a conversão, a volta. De repente, você começa a olhar para si mesmo. Não há nada a procurar e um novo desejo surge em conhecer o buscador. 

Se existe algo a ser buscado, você é um homem mundano; se não há nada a buscar, e a questão "Quem é este buscador?" tornou-se importante para você mesmo, então você é um homem religioso. É assim que defino o mundano do religioso. 

Se você ainda está buscando alguma coisa — talvez na outra vida, na outra margem, no céu, no paraíso, no moksha, não faz nenhuma diferença — você ainda é um homem mundano. Se toda a busca cessou e subitamente você percebeu que agora só há uma coisa para conhecer — "Quem é este buscador em mim? O que é esta energia que quer buscar? Quem sou eu?" —, há então uma transformação. De repente, todos os valores mudam. Você começa a mover-se para dentro.

O S H O

O homem está doente de tanto buscar - parte 1


"Você busca neste mundo, busca no outro mundo; às vezes busca no dinheiro, no poder, no prestígio, e às vezes busca em Deus, na graça, no amor, na meditação, na prece, mas a busca continua. Parece que o homem está doente com a busca."


A vida é uma busca, uma busca constante, uma busca desesperada, uma busca sem esperança... uma busca por algo que não se sabe o que é. Há uma profunda urgência em busca, mas não se sabe o que se está buscando.

E há um certo estado de mente no qual seja o que você consiga acaba não lhe dando nenhuma satisfação. A frustração parece ser o destino da humanidade, pois tudo o que se consegue torna-se insignificante no momento em que você consegue. Você começa de novo a buscar.

A busca continua, consiga você alguma coisa ou não. Parece irrelevante o que você consegue e o que não consegue — de qualquer maneira a busca continua. O pobre está buscando, o rico está buscando, o doente está buscando, o são está buscando, o poderoso está buscando, o fraco está buscando, o estúpido está buscando, o sábio está buscando e ninguém sabe exatamente o quê.

A busca — o que é e por que existe — tem que ser entendida. Parece que há um hiato no ser humano, na mente humana; na própria estrutura da consciência humana parece haver um buraco, um buraco negro. Você vai jogando coisa dentro dele e elas vão desaparecendo. Nada parece enche-lo, nada parece ajudar a preenchê-lo. É uma busca febril. Você busca neste mundo, busca no outro mundo; às vezes busca no dinheiro, no poder, no prestígio, e às vezes busca em Deus, na graça, no amor, na meditação, na prece, mas a busca continua. Parece que o homem está doente com a busca.

A busca não permite que você esteja aqui e agora porque ela sempre o leva para algum outro lugar. A busca é uma projeção, é um desejo: em algum outro lugar está o que se precisa; existe, mas em algum outro lugar, não aqui onde você está. Certamente existe, mas não neste momento, não agora, mas em outro lugar qualquer. Existe no depois, lá, nunca aqui e agora. Isso vai importunando-o, vai empurrando-o, puxando-o, atirando-o para uma loucura cada vez maior; deixa-o louco e jamais satisfeito.

O S H O  

quinta-feira, 6 de março de 2014

O "outro estado" além da monotonia da vida

Penso que a maioria de nós acha a vida muito insípida. Para ganharmos sustento, precisamos exercer uma certa profissão, e esta se torna muito monótona; começa-se uma rotina, que temos de seguir, ano por ano, até morrer. Ricos ou pobres, e ainda que sejamos muito eruditos ou dotados de espírito filosófico, nossas vidas são em geral superficiais, vazias. Há evidentemente uma insuficiência em nós mesmos, e ao nos tornarmos cônscios desse vazio procuramos preenchê-lo com conhecimentos, com alguma espécie de atividade social, ou nos refugiamos em divertimentos de toda ordem, ou apegamo-nos a alguma crença religiosa. Ainda que tenhamos uma certa capacidade e sejamos muito eficientes, nossas vidas são, ainda assim, insípidas e, para nos livrarmos dessa insipidez, dessa cansativa monotonia da vida, buscamos uma certa forma de enriquecimento religioso, tentamos conquistar "aquele estado de ser" extra-mundano que não é uma rotina e que, por enquanto, pode ser chamado "o outro estado". Em nossa busca desse "outro estado", encontramos muitos sistemas diferentes, diferentes caminhos que se supõe conduzirem a ele; e, assim, pelo disciplinamento de nós mesmos, pela prática de determinado sistema de meditação, pela observância de certo ritual ou a repetição de certas frases, esperamos alcançar aquele estado. Sendo a nossa vida um ciclo interminável de dores e prazeres, de variadas experiências sem muita significação ou mera repetição, sem sentido algum, de uma mesma experiência — o viver constitui para a maioria de nós uma monótona rotina. Por esta razão, o problema de nosso enriquecimento interior, da conquista do "outro estado" — chame-o Deus, Verdade, bem-aventurança ou como você quiser — se torna muito urgente, não é verdade? Você pode estar bem de vida, bem casado, ter filhos, você pode pensar inteligente e equilibradamente, entretanto, sem aquele estado, a vida se torna horrivelmente vazia. 

Que se deve fazer? Como conquistar aquele estado? Ou é completamente impossível conquistá-lo? A nossa mente, como hoje está constituída, é sem dúvida muito insignificante, limitada, condicionada; e embora uma mente limitada possa especular a respeito do "outro estado", suas conjecturas serão sempre limitadas. Ela poderá formular um estado ideal, conceber e descrever aquele outro estado, mas as suas concepções permanecem dentro de suas estreitas limitações, e penso que aí é que se encontra o fio da meada: no perceber que a mente não pode, em circunstância alguma, experimentar, viver aquele outro estado, se se limita a formulá-lo ou a especular a seu respeito. Não há dúvida de que esta é uma descoberta extraordinária: o perceber que, sendo a mente limitada, pequena, estreita, superficial, todo movimento que faça para alcançar aquele estado extraordinário, constitui um empecilho. O descobrimento deste fato, não especulativamente porém REALMENTE, é o começo de uma maneira nova de considerar o problema.

Nossas mentes, em verdade, são produto do tempo, de muitos milhares de dias passados, resultado da experiência baseada no "conhecido". A mente de cada um de nós é resultado da cultura, educação, e por mais extenso que seja o seu saber ou preparo técnico, ela é sempre produto do tempo; por conseguinte, é limitada, condicionada. Com esta mente, queremos descobrir o incognoscível; e compreender que essa mente nunca poderá descobrir o incognoscível, constitui uma experiência verdadeiramente extraordinária. Descobrir que a mente de um indivíduo, por mais sagaz, por mais sutil, por mais ilustrada que seja, não pode de modo algum compreender aquele estado — esse descobrimento traz consigo uma certa compreensão "fatual" e acho que este é o começo de uma perspectiva da vida que poderá abrir a porta que conduz  àquele outro estado. 

Expressando o problema de maneira diferente: a mente está sempre e sempre ativa, "tagarelando", planeando, e é capaz de extraordinárias sutilezas e invenções. E de que maneira pode esta mente tornar-se quieta? Vê-se que toda atividade da mente, todo movimento que faça, em qualquer direção, é reação do passado. Como aquietar esta mente? Se a aquietamos por meio da disciplina, sua quietude é um estado em que não há investigação, busca, não é exato? Em tais condições, ela não está aberta para o "desconhecido", o "outro estado".

[...] Disciplina implica, invariavelmente, repressão e o conflito da dualidade — e isso está na esfera da mente — e por esse caminho prosseguimos, esperando captar o "outro estado". Mas nunca indagamos inteligentes e sãmente se nossa mente é capaz de captá-lo. Sugeriu-se-nos que a mente deve estar tranquila, mas a tranquilidade foi sempre cultivada por meio da disciplina. Isto é, temos o ideal de uma mente tranquila, e buscamos realizar este ideal por meio do controle, luta, esforço.

Ora bem, se você considera atentamente esse processo, em sua inteireza, verá que está todo no terreno do conhecido. Cônscia da monotonia da existência, cansada de suas repetidas experiências, empenha-se a mente em conquistar aquele "outro estado". Mas, quando se percebe que a mente é o "conhecido" e que este movimento que faz não a leva ao outro estado, que é "o desconhecido", o nosso problema se resume então, não em como conquistar o desconhecido, mas descobrir se a mente pode libertar-se do "conhecido". Penso que este problema deve ser considerado por todo aquele que deseje descobrir se existe alguma possibilidade de "realizar o outro estado", o desconhecido. Assim sendo, como pode a mente, que é resultado do passado, do conhecido, libertar-se do conhecido? Espero que esteja me fazendo claro.

Como disse, a mente atual — tanto consciente como inconsciente — é produto do passado, resultado acumulado de influências raciais, climáticas, dietéticas, e outras. A mente, portanto, está condicionada, condicionada como cristão, hinduísta, budista, comunista, e é bem óbvio que ela projeta aquilo que considera ser o real. Mas, quer a sua "projeção" seja a do comunista, que julga prever o futuro e quer forçar toda a humanidade a adaptar-se ao padrão de sua Utopia, quer seja a "projeção" do chamado homem religioso, que também julga conhecer o futuro e educa a criança, a pessoa de acordo com o seu ponto de cista particular — nem uma nem outra dessas projeções é o Real. Sem o Real, a vida se torna muito insípida, como é atualmente para a maioria das pessoas. E sendo insípidas as nossas vidas, começamos a tornar-nos românticos e sentimentais, a respeito do outro estado, do Real.

[...] Tudo o que fazemos se baseia em luta, em ambição, sucesso, consecução de objetivos; e por esta razão, pensamos que a "realização" de Deus, ou da Verdade, só se torna possível mediante esforço. Mas esforço denota atividade egocêntrica para alcançar um fim. Não significa abandono do "eu". 

Agora, se você está cônscio de todo esse processo da mente — tanto consciente como inconsciente — se o percebe e compreende realmente, verá a mente tornar-se sobremaneira tranquila, sem esforço algum. A tranquilidade conseguida à força de disciplina, controle, repressão, é a tranquilidade da morte. A tranquilidade a que me refiro se manifesta SEM ESFORÇO ALGUM assim que compreendemos todo esse processo da mente Só então existe a possibilidade de manifestar-se aquele outro estado, que se pode chamar a Verdade, ou Deus.

Krishnamurti — Da solidão à plenitude humana


segunda-feira, 3 de março de 2014

Encare o fato e veja o que acontece

Todos nós tivemos experiências de tremenda solidão, onde livros, religião, tudo passou e ficamos tremendamente, interiormente sós, vazios. A maioria de nós não pode encarar esse vazio, essa solidão, e fugimos dela. A dependência é uma das coisas para onde corremos, dependemos porque nós não conseguimos ficar sós conosco mesmos. Temos que ter o rádio ou livros ou conversa, o tagarelar incessante sobre uma coisa ou outra, sobre arte e cultura. Assim nós chegamos nesse ponto em que sabemos que existe este extraordinário sentido de autoisolamento. Podemos ter um emprego muito bom, trabalhar furiosamente, escrever livros, mas interiormente há este tremendo vácuo. Queremos preencher isso e a dependência é um dos meios. Usamos dependência, diversão, trabalho na igreja, religiões, bebida, mulheres, uma dúzia de coisas para encher, encobrir isto. Se virmos que é absolutamente fútil tentar encobrir isto, completamente fútil, não verbalmente, não com convicção e, portanto, concordância e determinação, mas se virmos o total absurdo disto, então estamos frente a um fato. Não é uma questão de como se livrar da dependência; isso não é um fato; isso é apenas uma reação a um fato. Por que eu não encaro o fato e vejo o que acontece? Agora surge então o problema do observador e do observado. O observador diz, “Eu sou vazio; não gosto disso” e foge disto. O observador diz, “Eu sou diferente do vazio”. Mas o observador é o vazio; não é o vazio visto por um observador. O observador é o observado. Há uma tremenda revolução no pensar, no sentir, quando isso acontece.

J. Krishnamurti, The Book of Life

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Por que observar o tédio, a insatisfação e a solidão?

Quando nos observamos, observamos os seres humanos.
Eu gostaria agora, se me permitem, de abordar o problema de nós mesmos nos observarmos. Quando nos observamos, não estamos nos isolando, ou nos limitando, ou nos tornando centrados em nós mesmos, porque, conforme explicamos, nós somos o mundo e o mundo é nós. Isso é um fato. E quando nós, como seres humanos, examinamos todo o conteúdo da nossa consciência, de nós mesmos, estamos realmente investigando o ser humano como um todo — quer ele viva na Ásia, na Europa ou na América. Então, não se trata de uma atividade autocentrada. Quando nos observamos, não estamos nos tornando egoístas, centrados em nós mesmos, nos tornando cada vez mais neuróticos, desequilibrados; ao contrário, quando nos olhamos, estamos examinando todo o problema humano da desgraça, do conflito, bem como tudo quanto de aterrador o homem produziu para si mesmo e para os outros. Assim, é muito importante compreender este fato: nós somos o mundo e o mundo é nós. Você pode ter maneirismos superficiais, tendências superficiais, mas, na essência, todos os seres humanos, por toda parte deste mundo desafortunado, estão acometidos de angústia, de confusão, de agitação, de violência, de desespero, de agonia. Há então um espaço comum, sobre o qual todos nós nos encontramos. Assim, quando nos observamos, observamos os seres humanos.

Krishnamurti — Saanen, 13 de julho de 1976

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

O aparente fracasso do homem espiritual

Renunciai à vossa pretensa cultura,
E todos os problemas se resolvem.
Oh! Quão pequena parece à diferença entre o sim e o não!
Quão exíguo o critério entre o bem e o mal!
Como é tolo não respeitar o que merece ser respeitado de todos!
Oh solidão que me envolve todo!
Todo o mundo vive em prazeres como se a vida fosse uma festa sem fim,
Como se todos vivessem em perene primavera!
Somente eu estou só... Somente eu não sei o que farei...
Sou como uma criança que desconhece sorriso...
Sou como um foragido sem pátria nem lar...
Todos vivem na abundância, somente eu não tenho nada...
Sou um ingênuo, um tolo. É mesmo para desesperar...
Alegres e sorridentes andam os outros!
Deprimidos acabrunhado ando eu...
Circunspetos é ele, cheios de iniciativas!
Em mim, tudo jaz morto...
Inquieto, como as ondas do mar, assim ando eu pelo mundo...
A vida me lança de cá para lá, como se eu fosse uma folha seca...
A vida dos outros tem um sentido, e eu não tenho uma razão-de-ser....
Somente a minha vida parece vazia e inútil;
Somente eu sou diferente de todos os outros,
..................................................................
E, no entanto - sossega meu coração!
Tu vives no seio da mãe do Universo.

Lao Tsé - Tao Te King

À primeira vista parece estranho esse pessimismo do autor, esse lúgubre desânimo da vida, que lembra os lamentos de Jó. Mas não convém esquecer que todo homem que deixou a sociedade dos profanos tem, de início, a sensação duma solidão imensa, dum saara sem oásis; sente-se exilado, sem pátria nem lar. O homem espiritual se sente desambientado aqui na terra; ninguém o compreende; todos os consideram um estranho, não pertencente ao nosso mundo. O próprio Jesus passou por esses transes: "As raposas têm suas cavernas, as aves têm seus ninhos — o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça". E a seus discípulos diz ele: "Por causa de mim e do Evangelho sereis odiados de todos..." "Bem-aventurados os que choram..."

Ao descer do Tabor, ele exclama: "Ó geração perversa e sem fé! Até quando estarei convosco? Até quando vos suportarei?"

Mas esta aparente solidão e abandono do homem espiritual é a "Comunhão dos antos", a mais bela companhia do Universo, como Lao-Tsé lembra nas últimas linhas. É o total abandono de Jó — que estava na companhia de Deus, no coração do Universo. Abandonado se sente o ego — bem amparado está sempre o EU. "Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes?... Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito."

sábado, 28 de setembro de 2013

Por que buscamos, exterior ou interiormente?

K: Buscamos por causa de nosso vazio, dirigimos-nos para o exterior a fim de preenchermos este vazio ou para fugirmos dele. Tal movimento em direção ao exterior, fugindo à pobreza interior, é conceitual, especulativo, dualista. É conflito, e não tem fim. Portanto, não busquemos o exterior!  Mas a energia que se dirigia para o exterior, volta-se da busca exterior para a busca interior; e fica a buscar, a explorar, pedindo uma certa coisa que agora chama "interior". os dois movimentos são essencialmente idênticos. Ambos devem terminar.

P: Você está simplesmente a pedir-nos que nos contentemos com esse vazio? 

K: De modo nenhum.

P: Por conseguinte, o vazio permanece, e uma espécie de perene desespero, que se torna maior ainda, se nem ao menos é permitido buscar!

K: É desespero ver esta verdade que o movimento para fora e para dentro nenhuma significação tem? Isso é contentar-se com O QUE É? É aceitação do vazio? Nada disso. Assim, pois, acabamos com o movimento para fora, com o movimento para dentro, com a aceitação; negamos todo movimento à mente que se vê frente a frente com o vazio. Então a própria mente está vazia, PORQUE O MOVIMENTO É ELA PRÓPRIA. A mente está vazia de todo movimento e, por conseguinte, não existe entidade alguma para iniciar qualquer movimento. Deixemos a mente vazia. Deixemos a mente SER vazia. A mente depurou-se do passado, do futuro e do presente. Depurou-se do "vir a ser", e "vir a ser" é tempo. Portanto, nela não há tempo; nela não há medida. E, ENTÃO, isso é o vazio? 

P: Esse estado aparece e desaparece frequentemente. Ainda que não seja o vazio, decerto não é o êxtase que você fala.

K: Esqueça o que foi dito. Esqueça também que ele aparece e desaparece. Quando ele aparece e desaparece, pertence ao tempo; existe então o observador que diz: "Ei-lo aqui — foi-se". Esse observador é a entidade que mede, compara, avalia; portanto, não é o vazio a que nos referimos. 

P: Você está me anestesiando? — e riu-se. 

K: Quando não há medida nem tempo, existe algum limite ou contorno do vazio? Você pode então chamá-lo de vazio ou nada? Então, tudo existe nele, e nada está contido nele. 

Jiddu Krishnamurti - A outra margem do caminho 




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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill