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quarta-feira, 4 de abril de 2018

Libertando-se da ânsia do amanhã


Libertando-se da ânsia do amanhã

A meu ver, uma das coisas mais difíceis é viver com simplicidade; e talvez possamos, nesta tarde, examinar esta questão, não apenas no nível superficial, mas profundamente, para ver se descobrimos o que, em essência, significa viver simplesmente. Por pouco ativos que sejamos, a vida nos apresenta inúmeros problemas. Cada problema parece gerar muitos outros. Os problemas parecem surgir numa sucessão interminável, tanto no nível consciente como nos níveis mais profundos da consciência. Parece, nunca podemos livrar-nos de um problema, ou resolvê-lo, sem suscitar outros problemas. Mas se pudéssemos compreender o que significa viver simplesmente, pensar simplesmente, então, talvez estivéssemos aptos a produzir em nós mesmos um “estado de ser” em que não criássemos problemas e mais problemas.

Por que é que a mente acumula? Por que armazenamos conhecimentos? Por que nos condiciona a experiência? Se pudermos investigar esse “mecanismo” acumulador da mente, talvez nos seja mais fácil compreender o que é pensar diretamente, simplesmente; e ao percebermos porque a mente colhe, retém, acumula, talvez nos tornemos capazes de dissolver as nossas múltiplas, dificuldades, à medida que surgem.

Acreditamos que, acumulando conhecimentos e experiência, estaremos capacitados para compreender a vida com todas as suas lutas complexas. Mas, que acontece quando acumulamos saber e experiência? Ficamos traduzindo todo incidente, toda crise, toda reação, em conformidade com a nossa passada experiência, que é memória. Com essa carga do passado, não nos é possível ver as coisas diretamente; e talvez aí se encontre o nó do problema. Nunca enfrentamos coisa alguma de maneira nova, mas sempre em conformidade com o “velho”, com o que já conhecemos. E porque jamais encaramos um problema diretamente, para compreendê-lo por nós mesmos, continuamos a produzir problemas e a provocar mais lutas.

Ora, nossa concepção de uma vida simples é que devemos possuir poucas coisas, ou mesmo nada. Mas isso, por certo, não é uma vida simples. Olhamos com reverência os que levam uma vida simples, no sentido físico, que têm poucas roupas e nenhuma propriedade, como se isso fosse uma coisa maravilhosa. Por quê? Porque nós, intrinsecamente, somos apegados a coisas, a posses. Mas o viver uma vida simples requer, meramente, que nos despojemos de tudo, que renunciemos às coisas físicas? Ou é coisa muito mais profunda? Embora tenhamos muito pouco, interiormente estamos sempre juntando, acumulando; estamos cheios de crenças, de dogmas, de toda espécie de experiência e memória, e há em nós um conflito interminável entre as várias necessidades, ânsias, esperanças, desejos. Tudo isso indica, não uma vida simples, mas uma vida interior sobremodo complexa. Creio, pois, importante descobrir-se porque a mente acumula, tanto consciente como inconscientemente; porque é incapaz de ir ao encontro de cada incidente, de cada reação, como se fosse algo inteiramente novo, original. Porque traduzimos cada experiência de acordo com “o velho”, de acordo com o que já é conhecido? A mente está sempre a acumular experiências, reações, e armazenando-as na memória, com o propósito de servir-se delas, como garantia de sua própria segurança. E a compreensão, a inteligência é resultado de experiências inumeráveis? Ou é a capacidade de olhar as coisas de maneira nova, de encarar a vida momento por momento, sem que a experiência do passado lhe empane a visão?

Como disse há dias, não deveis ouvir estas palestras com o fim de compreender o que eu estou dizendo, mas, sim, de descobrir como vós mesmos estais pensando. Não estais aqui apenas para acompanhar a minha descrição de um certo estado mental, mas para descobrir como opera a vossa mente toda vez que surge uma experiência nova.

Consideremos, por exemplo, o problema do temor. Podemos, vós e eu, compreender o temor e dissolvê-lo, sem intrometermos a acumulação do passado? Em geral, temos medo de muitas coisas: do amanhã, do que dizem os outros, da pobreza, da frustração, da morte. Ora, que é esse temor? Não podemos examiná-lo, compreendê-lo de maneira muito simples, e desse modo libertar-nos dele — não para todo o sempre, mas a cada momento, dia por dia — de modo que a mente fique aliviada da ânsia do amanhã? Bem considerado, o temor é uma reação, não é? Fiz algo que me envergonha, cometi um erro que não desejo seja descoberto por outro. O temor, pois, é uma reação, e não adianta lutar contra ele, procurar subjugá-lo, analisá-lo ou evitá-lo. O medo é o fantasma do meu malfeito. O problema, por conseguinte, não é o temor, senão a maneira como considero o meu ato. Ora, posso considerar esse ato de maneira nova? Isto é, posso eu, conhecendo a causa do temor, considerá-lo com toda a simplicidade, sem acumular, sem converter a compreensão da causa numa técnica de dominar o temor? Compreendeis ? Quando, conhecendo a causa do temor, a mente procura compreender essa causa, a fim de proteger-se contra novos temores, os temores de amanhã, põe ela em funcionamento o complexo “mecanismo” da autoproteção, e, por isso, nunca está em condições de corresponder a cada experiência com clareza, simplicidade, de modo direto.

Ora, não pode a mente observar a causa, o incidente que produziu o medo, sem interpretação e sem julgamento? Não pode ela olhar, simplesmente, para a causa do temor, “escutá-la”, deixá-la revelar toda a sua história, sem interpretá-la, sem negá-la ou aceitá-la, sem procurar ocultá-la, sem buscar um abrigo ou fugi-la? Daí, a meu ver, é que nasce a simplicidade, tão essencial à compreensão. Se somos capazes de considerar a causa do problema com muita simplicidade, sem traduzirmos ou condenarmos, parece-me que, então, é possível estarmos livres, momento por momento, não só do temor, mas também da inveja, do ciúme, do desejo de sermos bem-sucedidos e de todos os demais problemas. humanos inevitáveis. Problemas surgirão sempre e teremos sempre reações, enquanto vivermos. Não é, portanto, necessário tenhamos a capacidade de enfrentar os problemas, ao surgirem, dia por dia, sem acumularmos experiência, que nos limita o pensar e impede-nos a compreensão do problema?

Simplicidade de pensamento e de espírito é uma coisa essencial, mas não pode haver simplicidade enquanto estiver em funcionamento o “mecanismo” acumulador da autoproteção; e esse “mecanismo” de pensamento, visando à autoproteção, existe não apenas no nível consciente, mas também nos diferentes níveis inconscientes do nosso ser. É por querermos proteger-nos, que o saber e a experiência se tornam tão extraordinariamente importantes em nossa vida. Quando se nos depara um problema, nunca estamos completamente desvencilhados do passado. E é-nos possível — a vós e a mim — aliviar a mente de todo o passado, do saber acumulado de ontem?

Senhores, reputo assaz importante examinarmos esta questão e compreendê-la. Com a carga do passado, a mente cria os seus próprios problemas, não é verdade? E pode a mente começar a atender a cada problema de maneira nova, observando-o, ao surgir, sem interpor todas as sombras da passada experiência? Sem dúvida, este é que é o nosso problema: considerar cada incidente, cada reação, sem preconceito, sem tendências, sem interpretá-los de acordo com coisas aprendidas, no desejo de nos protegermos. Pode a mente ficar livre de tudo isso e considerar diretamente cada problema que surge? Se pode, então já não há morte, e todos os problemas humanos podem ser resolvidos; mas não para sua satisfação, seu aprazimento. No momento em que introduzimos o desejo de satisfação, começamos a acumular, do que resulta temor. Mas, não nos é possível considerar o problema, qualquer que ele seja, sem julgamento, sem avaliação? O avaliar um problema implica memória, julgamento, pesar, calcular — e tudo isso indica a constante preocupação da mente de proteger-se. O desejo de nos protegermos, de nos resguardarmos, tanto é consciente como inconsciente; e, ao se tornar conhecedora de todo esse mecanismo, pode a mente aboli-lo e considerar o problema diretamente? Só pode fazê-lo quando vós e eu compreendemos a necessidade de nos libertarmos do temor.

O medo corrompe e nos ensombra todas as ações; onde há temor, não há amor. Sabemos disso teoricamente. Temos lido a seu respeito. Quando, porém, estamos cônscios de que tememos inúmeras coisas, não podemos examinar rigorosamente esse fato? Não podemos descobrir a causa do temor e compreendê-la realmente, sem lutarmos, sem traduzirmos, sem julgarmos ou interpretarmos o que é? E quando a mente está apercebida do que é, não apenas no nível consciente, mas como o “mecanismo” total do nosso ser, não há um desafogo, uma libertação da causa que produziu o temor? Mas não há libertação quando não existe a intenção de compreender o que é, de observá-lo, de familiarizar-nos com ele, de “escutar” todo o seu conteúdo, observar-lhe o fluir, o movimento.

Vemos, pois, que a simplicidade do pensar não resulta da acumulação de conhecimentos. Pelo contrário, quanto mais sabemos, tanto menos simples é a nossa mente; e a mente tem de ser sobremaneira simples, para compreender o que é. O que é nunca é a mesma coisa, pois varia de momento a momento, e o seu movimento não pode ser compreendido por uma mente carregada de condenação, julgamento, da ânsia de autoproteção e do temor do futuro.

Senhores, acredito ser da mais alta importância descobrir se podemos observar o que é, sem sentir desgosto e repulsa. Afinal de contas, que somos nós? Somos o resultado de muitas reações, muitas influências condicionadoras, desejos, temores, — e nessa agitação está sempre envolvida a nossa mente; sempre batalhando, sempre em conflito. E para se por fim a essa luta incessante, a esse sofrimento e dor, não nos cabe compreender, simplesmente, momento por momento, o movimento do que é? Se sou ganancioso, colérico, ou invejoso, devo por certo compreender essa coisa tal como é, em vez de tentar dissolvê-la ou dominá-la; pois a própria ação de dominar é uma luta, um novo conflito, e, por conseguinte, não nos traz nenhuma libertação do que é. Mas se estou apercebido não somente da minha inveja, mas também da sua causa mais profunda, cuja reação ela é, e do desejo de estar livre da inveja; se estou apercebido desse “mecanismo” total, sem julgamento, sem escolha, então, acho que esse percebimento esclarece e dissolve aquela causa. Requer isso, não exercício ou disciplina, mas vigilância por parte da mente; e a mente não pode estar vigilante, se está sempre escolhendo, condenando, julgando, fugindo ou procurando modificar o que é.

Simplicidade é compreensão do que é. E só há compreensão do que é quando a mente desistiu de lutar contra o que é e desistiu de moldá-lo de acordo com suas fantasias. Na compreensão do que é revelam-se-nos os movimentos do “eu”, do “ego”; e isso, certamente, é o começo do autoconhecimento, não só no nível verbal, mas também naqueles níveis em que o “eu” se acha profundamente oculto e de onde sai espontaneamente, nas ocasiões em que relaxamos a vigilância.

Quando estamos apercebidos de nós mesmos, não é, todo o movimento do viver, uma forma de revelar o “eu”, o “ego”? O “eu” é um mecanismo muito complexo, que só pode ser revelado na vida de relação, em nossas atividades diárias, na maneira como falamos, como julgamos, calculamos, como condenamos a outros e a nós mesmos. Tudo isso revela o estado condicionado do nosso próprio pensar; e não é importante estar-se cônscio de todo esse mecanismo? Só pela percepção do que é verdadeiro, momento por momento, se dá o descobrimento do atemporal, do eterno. Sem autoconhecimento não pode existir o eterno. Quando não conhecemos a nós mesmos, o eterno se transforma em simples palavra, um símbolo, uma especulação, um dogma, uma crença, uma ilusão em que a mente pode refugiar-se. Se começamos, porém, a compreender o “eu” em todas as suas atividades, dia por dia, então, nessa própria compreensão, apresenta-se, sem nenhum esforço de nossa parte, o inefável, o atemporal. Mas o atemporal não é uma recompensa ao autoconhecimento. O que é eterno não pode ser procurado; a mente não pode adquiri-lo. Ele se apresenta quando a mente está tranquila; e a mente só pode estar tranquila quando é simples, quando já não está armazenando, condenando, julgando, pesando. Apenas a mente simples pode compreender o Real, e não a mente repleta de palavras, de conhecimentos, de ilustração. A mente que analisa, que calcula, não é uma mente simples.

Para ser criadora, a mente tem de estar despojada de todas as suas acumulações; e, sem criação, nossa vida é vazia, ainda que esteja cheia de atividades, de resoluções e determinações, coisas essas de muito pouca significação. Entretanto, a mente que percebe todo esse mecanismo de acumulação para fins de autoproteção; que percebe todo o seu conteúdo, sem procurar alterá-lo ou rejeitá-lo, essa mente, por ser simples, está tranquila e compreende o que é. E nisso há um desafogo extraordinário, uma liberdade em que está a Realidade.
Krishnamurti em, Percepção Criadora,
11 de julho de 1953
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domingo, 29 de novembro de 2015

Sobre os altos e baixos do processo de retomada da Consciência

Essas variações na consciência durante do dia são uma coisa que é comum a quase todos na prática espiritual. O princípio de oscilação, relaxamento, recaída de um estado mais alto, experienciado mais ainda não perfeitamente estável, para uma condição mais baixa habitual ou passada, torna-se muito forte e acentuado quando o trabalho da prática espiritual é feito na consciência física. Pois há uma inércia na natureza física que não permite facilmente que a intensidade, natural à consciência mais alta permaneça constante — o físico está sempre submergindo de volta para algo mais ordinário; a consciência mais alta e sua força têm que trabalhar por muito tempo e voltar sempre de novo, antes que elas possam se tornar constantes e normais na natureza física. Não fique perturbado ou desencorajado por essas variações na consciência ou este atraso, por mais longo e tedioso que seja; apenas tenha cuidado em ser tranquilo, sempre com uma quietude interior, e tão aberto quanto possível ao Poder Superior, não permitindo que qualquer condição realmente adversa se aposse de você. Se não houver onda adversa, então o resto é somente uma persistência de imperfeições que todos têm em abundância; a Força deve trabalhar sobre essa imperfeição e essa persistência e eliminá-las, mas para a eliminação é necessário tempo.

Você não deveria permitir-se ficar desencorajado pela persistência dos movimentos da natureza vital mais baixa. Alguns deles tendem sempre a persistir e a retornar, até que toda a natureza física seja mudada pela transformação da consciência mais material; até lá, a pressão deles ocorre repetidamente — algumas vezes com uma revivificação de sua força, algumas vezes mais frouxamente — como um hábito mecânico.Tire deles toda força de vida, recusando-lhes todo consentimento mental ou vital; então o hábito mecânico perderá o poder de influenciar os pensamentos e os atos, e finalmente cessará. (¹)

Fidelidade é não admitir ou manifestar nenhum outro movimento a não ser os movimentos inspirados e guados pelo Divino.

Sinceridade significa elevar todos os movimentos do ser ao nível da consciência e da realização mais altas já alcançadas.

A sinceridade exige a unificação e a harmonização do ser inteiro, em todas as suas partes e movimentos, em torno da Vontade Divina central.

O Divino se dá àqueles que se dão sem reservas e em todas as suas partes ao Divino. São para eles, a calma, a luz, o poder, a alegria, a liberdade, a amplidão, as alturas do conhecimento, os mares de bem-aventurança.

Falar de entrega ou ter uma ideia ou um tépido desejo de consagração integral não é a coisa; deve haver um impulso ardente para uma mudança radical e total.

Não é tomando uma mera atitude mental que isto pode ser feito, ou mesmo por um número qualquer de experiências interiores que deixam o homem exteriorizado como ele era. É este homem exteriorizado que tem que se abrir, entregar-se e mudar. O menor de seus movimentos, hábitos, ações, tem que ser entregue, visto, levado para cima e exposto à Luz divina, oferecido à Força divina, para que suas velhas formas e motivos sejam destruídos e a Verdade divina e a ação da consciência transformadora da Mãe divina tomem seu lugar.(²)

(¹) Sri Aurobindo em, A Consciência que vê - vol. 1
(²) Sri Aurobindo em, A Consciência que vê - vol. 2

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

O vício do desabafo, Deus, abafa


segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

O sofrimento pode lhe dar a chave da vida

Sempre que você sofrer, da próxima vez, não reclame, não crie uma angústia daquilo. Ao contrário, observe, sinta-o, veja-o, olhe para aquilo de todos os ângulos possíveis. Faça daquilo uma meditação e veja o que acontece: a energia que estava indo para a doença, a energia que estava criando sofrimento, é transformada, a qualidade muda. A mesma energia torna-se sua consciência, porque não há duas energias em você, a energia é uma só. 

(...) Quando você sofre, você está dissipando energia, a energia está vazando. Sempre que há sofrimento,sacuda-se. Feche seus olhos e olhe para o sofrimento. Seja ele qual for — mental, físico, existencial —, seja o que for olhe para ele, faça disso uma meditação. Olhe para ele como se ele fosse um objeto. 

Quando você olha para o seu sofrimento como um objeto, você está separado, você não mais está identificado com ele, a ponte foi quebrada. E, então, a energia que estava indo para o sofrimento, não irá, porque a ponte não existe mais. A ponte é a identificação. Você sente que você é o corpo, então, a energia se move para dentro do corpo. Quando quer que você sinta qualquer identificação, sua energia se move aí. 

(...) Sempre que há sofrimento, fique alerta; então a ponte está partida, então não há nenhuma transferência de energia para o sofrimento. E, pouco a pouco, o sofrimento desaparece, porque o sofrimento é seu filho. Você lhe deu nascimento, você é a causa. E, então, você o alimenta, você o rega. E então, ele cresce e você sofre mais ainda. Então, você reclama, você fica miserável, toda a sua atenção fica identificada com o sofrimento. 

(...) Use todo o sofrimento para a meditação e, logo, logo, verá que o sofrimento desapareceu, porque a energia começa a se mover para dentro. Ela não fica se movendo na periferia, para o sofrimento, você não fica alimentando o sofrimento. Parece ilógico, mas essa é toda a conclusão de todos os místicos do mundo: que você alimenta seu sofrimento e gosta dele de modo muito sutil, você não quer ficar bem — deve haver algum investimento nisso. 

(...) Noventa e nove por cento do sofrimento existe porque vocês associaram algo, que parece bom, com o sofrimento. Abandone essa associação. Ninguém mais pode fazer isso por você. Abandone essa associação completamente. O sofrimento está simplesmente desperdiçando sua energia. Não fique envolvido nele, não pense que ele vale a pena. Há somente um único meio em que o sofrimento vale a pena, e esse meio é com consciência. Torne-se consciente.

(...) Sofra reservadamente, sofra tão reservadamente que ninguém jamais fique sabendo do seu sofrimento. E então medite sobre ele: não o jogue para fora, acumule-o dentro e, depois, feche seus olhos e medite sobre ele. Então, a ponte será partida. 

(...) O sofrimento pertence ao reino da morte, a consciência pertence ao reino da vida. Quebre a ponte e você saberá que algo em você, ao seu redor, vai morrer — aquilo que pertence à morte; e algo em você, sua consciência, não vai morrer, ela é imortal, pertence a vida. Eis que o sofrimento pode lhe dar a chave da vida. 

OSHO

sábado, 25 de outubro de 2014

O medo é uma parte natural do mosaico de mudanças

O medo é uma parte natural do mosaico de mudanças. De alguma forma, ele normalmente acompanha uma emergência espiritual, quer seja uma leve sensação de interesse na participação dos eventos diários, quer um grande terror pairando livremente, que não parece estar vinculado a nenhum aspecto familiar da vida da pessoa. Um pouco de ansiedade é algo típico dessas situações: não apenas muitos de seus sistemas de crença familiares estão sucumbindo, mas a própria pessoa está se tornando extremamente emotiva. O corpo se sente como se estivesse caindo aos pedaços, com novas tensões físicas e dores inoportunas. Porém, o medo parece completamente ilógico, como se não tivesse nenhuma relação com a pessoa envolvida. às vezes, a pessoa em crise pode lidar com vários medos relativamente fáceis enquanto em outras ocasiões o medo parece se desdobrar num pânico totalmente incontrolável. 

Os homens têm vários tipos de medo, desde as formas mais óbvias, como o horror a danos físicos ou à morte, até os mais sutis, como ansiedade ao perguntar um endereço a um estranho. Apesar de seus vários medos, muitas pessoas são capazes de atuar muito bem na vida diária, sem se deixarem dominar por eles. Durante muitas emergências espirituais, no entanto, os medos diários se intensificam e se concentram, tornando-se, frequentemente, incontroláveis. Eles podem assumir a forma de uma ansiedade oscilante ou cristalizar-se em diversos tipos de medo. 

Medo do desconhecido — Em certo grau, isto é comum a muitos seres humanos. Quando nossas vidas tomam um rumo desconhecido, quase sempre reagimos automaticamente tornando-nos apreensivos e resistentes. Algumas pessoas podem atirar-se ao desconhecido quase sem hesitar, com o que parece ser uma coragem invejável. Porém, se algumas pessoas penetrarem em territórios totalmente ignorados, o farão contra a sua vontade ou com a maior cautela possível. 

Para as pessoas em emergência espiritual, o medo do desconhecido pode tornar-se espantosamente exagerado. Seus estados interiores costumam mudar de forma tão rápida que causam receio a respeito do que está por vir. Estão sempre inseridos em domínios insondáveis, em novos conhecimentos e possibilidades não discernidas. Uma mulher materialista pode ter uma manifestação espontânea fora do corpo e aprender que ela é mais do que a sua identidade física. Um homem pode passar, de repente, por uma complexa sequência visual e emocional que parece vir de outra época e de outro lugar. Sua experiência o impele a pensamentos sobre reencarnação, um conceito totalmente estanho a ele. 

Esses tipos de acontecimentos repentinos podem ser muito assustadores para os que estão despreparados. Essas pessoas se sentem inseguras sobre aonde estão indo ou como vão se sentir, e as mudanças muito rápidas levam-nas ao medo de que estejam perdendo o controle de suas vidas. Podem ansiar pela familiaridade da segurança, pelo velho modo de ser e pela vida mais tranquila e menos exigente da qual vieram, ainda que fossem infelizes. 

Medo de perder o controle — Um homem que passou muitos anos trabalhando para ter uma vida familiar próspera pode ter seu futuro bem planejado e se sentir responsável pela sua vida. Quando a mulher desenvolve uma doença terminal, sua vida muda para um rumo diferente do que tinha planejado. Seu sonho é destruído e o desgaste emocional que se segue pode iniciar um processo de transformação nele. Muito dolorosamente, ele percebe que não tem poder sobre as forças da vida e da morte e que está sujeito a forças acima do seu comando. 

Muitas pessoas passam anos sentindo que seu mundo é disciplinado e que têm total autoridade sobre suas vidas. Quando descobrem que não estão inteiramente no controle de suas trajetórias de vida, ficam às vezes muito aliviadas. Outras vezes, tornam-se bastante assustadas, especialmente quando se sentem profundamente responsáveis. Com certeza, perguntarão a si mesmas: "Se não estou no comando, quem está? E ele, ela ou isto é de confiança? Posso me entregar a uma força desconhecida e ter a certeza de que ela tomará conta de mim?"

Comparados aos medos de perder o controle, a mente e o ego tornam-se muito criativos em seus esforços para persistir; as pessoas nessas situação podem criar um sistema complexo de negação, falando para si próprias que estão bem do jeito que são e que não precisam se submeter a mudanças ou que as modificações que sentem são apenas ilusórias. Podem intelectualizar os estados mentais pelos quais estão passando, criando teorias elaboradas para invalidá-los. Ou podem tentar simplesmente anulá-los, passando por eles juntos. Às vezes, a própria ansiedade torna-se uma defesa; apoiando-se nos sentimentos de medo, podem impedi-los de se desenvolverem muito rapidamente. 

Há uma outra forma de perder o controle que é muito menos gradual e mais dramática. Às vezes, durante uma emergência espiritual, a pessoa pode ser dominada por fortes episódios durante os quais perde completamente o controle do seu comportamento. A pessoa pode "explodir" com raiva e em lágrimas, tremer violentamente e gritar como nunca havia feito antes. Essa liberação incomum de emoção talvez aconteça, mas antes disso, a pessoa pode ser tomada por um grande medo e se deixar envolver e resistir a esse sentimento. Depois desse tipo de "explosão", a pessoa também pode se sentir assustada e envergonhada quando se der conta da intensidade da sua atitude.

Christina Grof — A tempestuosa busca do ser

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

O que devemos fazer em momentos de conflito?

Teórica ou verbalmente, pode-se convir em que é muito importante que o indivíduo se desprenda do coletivo, mas parece-me que não se dispensa atenção suficiente a este problema; porque, só quando ocorre a criadora libertação do indivíduo existe a possibilidade de descobrir e viver uma vida totalmente diferente da que atualmente vivemos. Na atualidade, nossa vida, nosso, pensar é coletivo; fazemos parte do coletivo; e se se deseja criar uma sociedade de ordem diferente com valores diferentes, acho que é necessário o indivíduo começar a compreender todas as impressões coletivas que a mente acumulou através dos séculos. E, como disse, só quando existe liberdade exatamente no começo, pode o indivíduo libertar-se. Não se pode negar que quase todos nós somos resultado do ambiente; nossos pensamentos, atividades, crenças, nossos vários interesses, tudo está condicionado pelas numerosas influências existentes ao redor de nós; e para descobrir o que é a verdade, o indivíduo tem de libertar a mente desse conglomerado de influências, tarefa essa extremamente árdua e difícil. Não me parece que estamos dando atenção suficiente a este assunto. Mas é só quando a mente se liberta dessas muitas influências, que se torna incorrupta, e só então existe a possibilidade de descobrir algo inteiramente novo — algo que não foi premeditado, que não é uma autoprojeção, nem resultado de qualquer meio cultural, sociedade ou religião. 

Propaganda é cultivo de preconceitos; e todos nós somos dominados por preconceitos, porque fomos educados para aceitar ou rejeitar, porém nunca para investigar o problema da influência. Dizemos estar em busca da verdade; mas o que é que a maioria de nós está buscando? Se você ficar um pouco vigilante, a auto-observação revelará que está buscando um certo resultado; você deseja uma certa satisfação, uma estabilidade ou permanência interior, que você chama de diferentes nomes, conforme o ambiente em que foi criado. E você não está buscando sucesso? Você deseja sucesso, não só neste mundo mas também no outro. Quer-me parecer que esse desejo de sucesso, de chegar a alguma parte, de tornar-se algo, é resultado de educação errônea. E pode a mente libertar-se totalmente desse desejo? 

Não me parece que costumamos fazer esta pergunta a nós mesmos, porquanto o que nos interessa é, tão-só, seguir um método, um sistema ou um ideal, que esperamos produzirá um resultado, nos  conduzirá à certeza, ao sucesso, à final e permanente felicidade, bem-aventurança, ou seja o que for. Nossa mente, por conseguinte, está sempre empenhada no esforço para alcançar algo; e enquanto a mente estiver visando um alvo, um fim, um resultado que lhe dê satisfação completa, será inevitável a criação da autoridade e a obediência a ela. Não é exato isso? Enquanto penso que a bem-aventurança, a felicidade, Deus, a Verdade, ou o que quiser, é um fim que se deve alcançar, haverá o desejo de alcançá-lo; portanto, preciso de um guru, uma autoridade que me ajude a conseguir o que ambiciono. Por conseguinte, me torno um seguidor, dependente de outra pessoa; e enquanto houver dependência, não se pode pensar na possibilidade de o indivíduo desligar-se do coletivo e encontrar por si mesmo a Verdade, ou descobrir qual é a coisa correta que cumpre fazer. 

Assim, se observar, verá que estamos sempre procurando alguém que nos indique o que devemos fazer. Vendo-nos confusos, dirigimo-nos a outro, em busca de conselho. O resultado é que estamos sempre a seguir e, portanto, psicologicamente, instaurando a autoridade, a qual, invariavelmente, cega-nos o pensar, impedindo-nos a tão essencial ação criadora

Exteriormente, nesta sociedade de competição, aquisição, temos de ser ambiciosos, cruéis, para não sermos expulsos ou exterminados. Interiormente, isto é, psicologicamente, somos também ambiciosos; aí também está o desejo de atingirmos uma certa culminância e, assim, vivemos a perseguir um objetico, de nós mesmos "projetado" ou criado por outro. Percebido esse fato, o que se deve fazer? Como descobrir a ação correta? 

Positivamente, este problema concerne a todos nós. Vemos que há confusão dentro de nós e ao redor de nós; os velhos valores e crença e dogmas, os guias que temos seguido, não mais nos satisfazem, perderam toda a sua força; e se percebemos esse caos em que nos encontramos, o que devemos fazer?Como descobrir qual é a ação correta? Para penetrarmos este problema, temos de perguntar a nós mesmos o que entendemos por "busca", não acha? Todos dizemos que estamos buscando — pelo menos o dizem os que sentem verdadeiro interesse e empenho; mas antes de prosseguirmos em nossa busca, por certo devemos descobrir o que entendemos por essa palavra e o que é que cada um de nós está buscando. 

Senhor, pode-se encontrar alguma coisa nova mediante a busca? Ou só se pode achar, nessa busca, o que já se conheceu antes e que foi "projetado" no futuro? Acho muito importante essa questão. O que é que estamos buscando? E pode a mente que está buscando, encontrar alguma coisa que transcende o tempo, que transcende suas próprias projeções? Isto é, digo que estou buscando a verdade, Deus, a felicidade; mas para achar isso, preciso ser capaz de reconhece-lo, não é verdade? E para ser capaz de reconhece-lo, preciso te-lo experimentado antes. A experiência anterior é indispensável ao reconhecimento e, portanto, se sou capaz de reconhecer uma coisa, ela já existia em minha mente e, por conseguinte, não pode ser a Verdade; é apenas uma "projeção", uma coisa saída de mim mesmo. Todavia, é isso o que está fazendo a maioria de nós. Quando buscamos, estamos a demandar uma coisa já experimentada pela mente e que ela quer de novo agarrar; por conseguinte, o que verdadeiramente nos interessa é a permanência de uma experiência que nos deu prazer, que nos deleitou. Enquanto a mente estiver buscando, é bem evidente que não poderá descobrir o que é a Verdade. Só quando já não está buscando — e isso não significa tornar-se embotada, distraída — e compreende o total "processo" da busca, é só então que se encontra a possibilidade de descobrir algo que não foi "projetado", avaliado pela mente. 

Por exemplo, você lê no Gita ou no Upanishads a descrição de uma certa coisa que é permanente, de uma perene bem-aventurança, ou o que quer que seja; e porque esta nossa vida é transitória, porque o seu pensar, as suas atividades, as suas relações se acham num estado de confusão, transtornando-lhe, tornado-lhe infeliz, você começa a aspirar àquele outro estado, a cujo respeito você leu. É isso o que está buscando. Na busca desse estado, você está cultivando a aceitação da autoridade, colocando-se na dependência de alguém que promete levar-lhe àquilo que você ambiciona. Por conseguinte, você se torna um seguidor; e enquanto um homem está seguindo, é parte integrante do coletivo, da massa. Você já reconheceu, já fixou na mente uma imagem daquele outro estado e agora o está buscando, apoiado num guru, na meditação, na prática de várias disciplinas, etc. O que você está realmente buscando é uma coisa que você já conhece, ou que lhe ensinaram, um estado a cujo respeito você leu alguma coisa ou que vagamente experimentou; a sua busca, pois, visa à continuação de uma experiência aprazível, ou ao descobrimento de um estado deleitável que, esperançosamente, você supõem existir. Não é exato isso? Eu lhe digo que esta busca nunca lhe revelará o desconhecido; ela, portanto, tem de cessar. 

(...) Nossa vida, como vivemos atualmente, é contraditória, superficial, vazia, e nos vemos muito confusos. Andamos de guru para outro, de um livro para outro; ao redor de nós se movimentam os especialistas disso que chamamos espiritualidade, cada um deles oferecendo um método especial de meditação, de disciplina; e nos vemos obrigados a escolher o que é "correto" fazer. Mas, onde há escolha, há sempre confusão; e eu acho que, antes de começarmos a escolher, buscar, é absolutamente necessário que descubramos por nós mesmos o que é liberdade. Porque só a mente livre é capaz de investigar, e não a mente que está aprisionada na tradição, que está condicionada, influenciada; nem aquela que busca um resultado; nem aquela que está toda entregue à atividade, no presente, em relação com o futuro "projetado". 

(...) Cumpre-nos, pois, investigar quais são as pressões, os "motivos" que estão nos impelindo a agir desta ou daquela maneira; porque, a menos que compreendamos tais influências e delas nos libertemos, a nossa ação levará, invariavelmente, à confusão e a sofrimentos ainda piores. Eis porque razão é tão importante possuir autoconhecimento, que consiste em compreender o fundo, o condicionamento da mente, e dele libertar-se a todos os momentos. Você deve saber que, quando estamos interessados apenas na ação imediata, somos por ela arrastados, sem termos investigado o problema do condicionamento, de como a mente foi moldada para ser hinduísta, cristão, etc. E, a menos que a mente se liberte a cada momento de seu condicionamento, toda ação que empreender há de ser desintegradora e produtora de mais caos. O que interessa, portanto, não é escolhermos tal ou qual norma de ação, mas, sim, compreendermos como a mente está condicionada. Porque, do libertar da mente de seu condicionamento resulta uma ação sã, racional, inteligente. 

O importante, por conseguinte, é descobrirmos, por nós mesmos, o que cada um de nós está buscando e se o que buscamos tem valia ou se representa apenas uma fuga. É de toda necessidade possuir o autoconhecimento — conhecer a si mesmo, não como Atman, etc., porém, saber, cada um, o que ele próprio é, de dia em dia; e isso significa observar o seu próprio modo de pensar, as influências que lhe servem de base ao pensar, e estar cônscio dos movimentos conscientes e inconscientes da mente. Então, a mente é capaz de tornar-se muito tranquila; e só nessa tranquilidade é possível acontecer algo real

Krishnamurti em, DA SOLIDÃO À PLENITUDE HUMANA

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Só a mente que está desesperada pode encontrar a Realidade

Compreender as relações significa estar vigilante, não fugir, para que se veja tudo quanto nelas se contém. A verdade não está longe de nós, a verdade está perto; a verdade se encontra debaixo de cada folha, em cada sorriso, em cada lágrima, nas palavras, nos sentimentos e nos pensamentos de cada um. Mas, ela está tão encoberta, que precisamos desencobri-la, para a vermos. E desencobri-la significa descobrir o que é falso; no momento em que reconhecemos o que é falso e este desaparece, a Verdade mostra-se para nós. 

A Verdade, pois, é uma coisa viva, de todos os momentos, que precisamos descobrir, e não somente acreditar nela, falar dela, colocá-la numa fórmula. Mas, para perceberem essa Verdade, vocês precisam de uma mente e de um coração extremamente flexíveis e vigilantes. Entretanto, por infelicidade, a maioria de nós não quer uma mente vigilante e flexível, uma mente ágil; queremos ser colocados a dormir, sob efeito de mantras e pujas — Santo Deus! de quantas maneiras nos colocamos a dormir!

Necessitamos, evidentemente, de um certo ambiente, de uma certa atmosfera, de solidão — o que não significa procurar ou evitar o isolamento — mas necessitamos de uma certa solidão, na qual haja atenção plena; e essa solidão, essa atenção plena, só existe quando há perturbação, quando os seus problemas são realmente intensos; e, se possuem um amigo, se possuem alguém que lhes possa ajudar, podem procurá-lo; mas, francamente, tratar essa pessoa como um guru é, obviamente, falta de maturidade, é infantilidade. É como querer agarrar-se às saias maternas. 

Bem sei que, quando nos achamos em dificuldade, apelamos instintivamente para alguém — para a mãe, para o pai, ou para um pai glorificado, que vocês chamam Mestre ou guru. Mas, se o guru for pessoa de merecimento, lhes dirá, por certo, que vocês devem compreender a si mesmos em ação, isto é, nas suas relações. Por certo, vocês são muito mais importante do que o guru; são muito mais importante do que eu; porque se trata da vida de vocês, seus sofrimentos, seus esforços e suas lutas. O guru, o eu, ou outro qualquer, poderá ser livre, mas o que isso adiante para vocês? Por conseguinte, a veneração de um guru é prejudicial para a compreensão de vocês mesmos. E existe aí, um fator peculiar: quanto mais respeito demonstrai por uma determinada pessoa, tanto menos respeitam os outros. Vocês fazem uma profunda reverência ao guru e dão um pontapé no empregado de vocês. Por conseguinte, o respeito de vocês tem pouquíssima significação. Tudo isso são fatos verdadeiros, e o que acabo de dizer provavelmente não agradou a maioria de vocês, porque a mente de vocês quer ser confortada e não magoada como foi. A mente de vocês está presa em tantas perturbações e aflições, que roga: "Pelo amor de Deus, dê-me uma esperança, de-me um refúgio". Senhores, só a mente que está em desespero pode encontrar a Realidade. Uma mente totalmente insatisfeita pode saltar para dentro da Realidade; mas não o pode uma mente satisfeita, uma mente respeitável e cercada de crenças. 

Assim, pois, vocês só podem florir na vida de relação, só podem florir no amor, e não no disputar. Mas nossos corações estão ressecados; nós os enchemos com as coisas da mente, e por isso vamos pedir aos outros que encham as nossas mentes com as suas criações. Como não temos amor, o procuramos no instrutor, o procuramos noutra pessoa. O amor é coisa que não se pode achar. Vocês não podem comprá-lo e não podem se imolar a ele. O amor só vem à existência quando o "ego" está ausente; mas, enquanto vocês andam à busca de satisfação e de refúgios, enquanto se recusam a compreender a confusão de vocês nas relações com os outros, estão somente dando mais força ao "ego" e, portanto, negando o amor.

(...) tudo isso deve ter produzido deve ter produzido, em vocês, um efeito muito perturbador, não é verdade? Esse efeito tem de ser perturbador, pois, se não o for, então há algo que está errado em vocês.  Isso, porque está sendo atacada toda a estrutura do processo de pensamento de vocês, estão sendo atacados os seus confortáveis hábitos, e uma tal perturbação tem de ser cansativa. E se vocês não se sente cansados, se não se sentem perturbados, o que buscam então aqui? Senhores, vejamos bem claramente o que estamos tentando fazer, vocês e eu. A maioria de vocês dirá, provavelmente: "Conheço tudo isso; Shankara, Buda, ou um outro qualquer já o disse". Tal alegação indica que, tendo lido tanta coisa, superficialmente, vocês relegam o que está sendo dito para um dos compartimentos da mente de vocês e, por conseguinte, o colocam de lado. Essa é uma maneira muito cômoda de se desfazerem do que ouviram, o que significa que estão escutando somente no nível verbal, em vez de absorver o sentido do que se está dizendo, que gera perturbação. Senhores, não se pode ganhar a paz, senão à custa de muita busca; e o que vocês e eu estamos fazendo é uma busca completa em nossas mentes e em nossos corações, com o fim de descobrirmos o que é verdadeiro e o que é falso; e esse rebuscar, naturalmente, exige dispêndio de energia e de vitalidade; é fisicamente exaustivo, tão exaustivo talvez como cavar a terra. Mas, por infelicidade, vocês estão habituados a escutar; são meros expectadores a apreciar e a observar o jogo do outro; por isso, não ficam cansados. Os expectadores nunca ficam cansados, o que indica que não tomam realmente parte no jogo. Mas, como já tenho dito e redito, vocês não são expectadores, e eu não estou representado para vocês. Não estão aqui para ouvir uma canção. O que vocês e eu estamos tentando é encontrar uma canção em nossos próprios corações, e não ouvir a canção do outro. Vocês estão acostumados  a ouvir a canção de outro, e por isso seus corações estão vazios, e vazios ficarão para sempre, porque vocês o enchem com a canção do outro. Esta não é a canção de vocês e são meros gramofones, mudando os discos segundo o capricho de vocês; não são músicos. E, principalmente nas épocas de grande aflição e perturbação, precisamos de ser músicos, cada um de nós, precisamos nos renovar com canções, o que significa livrar, esvaziar o coração daquelas coisas com que a mente o encheu. Por consequência, precisamos compreender as criações da mente, e perceber a falsidade dessas criações. Porque, então, não mais encheremos o coração com essas criações. E, aí, com o coração vazio — e não, como no caso de vocês, cheio de cinzas — com o coração vazio e a mente quieta, se ouvirá uma canção, uma canção indestrutível e incorruptível, porque não foi composta pela mente. 

Jiddu Krishnamurti, em "O Que Te Fará Feliz?"
29 de janeiro de 1949

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Fique com suas inquietações e salte através delas

[...]Como você pode alcançar o êxtase se não conhece a agonia? Se você alcançar o mundo do êxtase sem saber o que é a agonia, não será capaz de reconhecê-lo. O reconhecimento é impossível. Somente através da escuridão se pode reconhecer a luz. Você pode estar vivendo na luz mas, se não conhece a escuridão, não pode saber que está vivendo na luz. Um peixe do mar não pode saber que o mar existe. Somente se o peixe for lançado fora do mar é que poderá reconhecê-lo. Se for jogado outra vez para dentro do mar, esse peixe será totalmente diferente e o mar também será totalmente diferente. A partir de então o peixe será capaz de reconhecê-lo. Sansar, o mundo, é apenas um local de aprendizado. Você precisa entrar profundamente na matéria. Só assim poderá retornar ao outro pólo, ao pico da consciência.

[...]O silêncio real, autêntico, ocorre somente depois de você ter passado pela tormenta. Apenas quando cessa a tormenta é que o silêncio pode explodir dentro de você; nunca antes. Você pode criar uma quietude falsa, antes da tormenta; mas nesse caso estará apenas se iludindo. Você pode criar uma quietude - artificial, cultivada, imposta a partir do exterior - mas ela não será espontânea, não pertencerá ao seu ser interior.

[...]A quietude autêntica surge somente depois da tormenta.

Não force a tormenta a desaparecer. Antes, viva-a; permita que ela aconteça. Traga-a para fora, expulse-a. Permita que a tormenta o abandone, deixe que ela se dissipe. Não a reprima. Reprimida, ela permanecerá em você. Reprimida no inconsciente, ela persistirá; aguardará o momento certo para explodir. Você sempre receará sua explosão, precisará combatê-la continuamente. E você nunca sairá vitorioso, pois aquilo que é reprimido precisa ser combatido repetidas vezes, precisa ser reprimido muitas vezes. Sua quietude estará assentada sobre um vulcão e, a qualquer momento, o vulcão poderá entrar em erupção.

Então você sempre temerá a vida, porque a vida pode criar situações nas quais o vulcão poderá entrar em erupção. Você negará a vida, tentará fugir dela. Desejará ir para Himalaia, pois ali não haverá ninguém que lhe forneça uma oportunidade para que seu vulcão entre em erupção. Mas o vulcão ainda estará aí e o Himalaia não poderá ajudar, a menos que o vulcão seja expulso.

E é bom expulsá-lo. Você está perdendo uma experiência básica, a de expulsar completamente o vulcão, de liberar totalmente a loucura, de trazer para fora tudo o que se encontra ali: a tormenta interior. Deixe-a sair e não resista, não reprima. Deixe-a sair totalmente. Então chegará o momento em que a tormenta passará.

Nesse momento, a quietude real acontece em você. Real no sentido de que, agora, não é cultivada; é espontânea. O rio está fluindo. Não se trata de algo que você criou; não é algo que está acontecendo devido ao seu esforço. Pelo contrário, você não está aí. Apenas a quietude está. E essa quietude é destemida. Nada pode perturbá-la, porque aquilo que poderia ser distúrbio foi expulso. A tormenta se dissipou.

Por isso é que insisto, e insisto bastante para que você expulse a sua loucura. Dentro, ela é perigosa. Expulse-a e ela desaparece. Seu coração torna-se vazio; um certo espaço é criado. Somente nesse espaço a quietude pode acontecer. Então você tem um lugar para ela, está pronta para ela, aberto para ela.

Espere a flor desabrochar na quietude que sucede à tormenta: não se adiante. O que é a flor?

O florescimento do seu ser só ocorrerá quando a quietude real acontecer em você; nunca antes. Você não pode forçar a flor a se abrir. Ela se abre por si mesma. Você não pode forçar o seu ser a se abrir; isso é impossível. Você não pode violentá-lo, não pode ser violento com ele. Ele será simplesmente destruído.

A flor se abre por si mesma. O único solo necessário é a quietude autêntica, real e espontânea. A partir de uma quietude cultivada, a flor nunca se abrirá. Com uma quietude cultivada, você simplesmente se tornará entorpecido. Seu ser ficará menos vivo, apenas isso. Com menos vida, você estará menos inquieto. Isso parece bem, mas lembre-se de que a inquietude é um aprendizado. Você não deve tentar ter menos inquietações. Fique com as suas inquietações e mova-se através delas. Não as abandona, não fuja delas. Chegará um momento em que você terá ido além delas, mas só se atinge esse momento passando-se através delas. Passe através da tormenta e permita que surja uma verdadeira quietude. Só então seu ser florescerá, nunca antes.

[...]Não pense que a tormenta é sua inimiga. Ela não é. Essa tormenta é a sua maior amiga, pois sem ela não haverá quietude, sem ela não haverá florescimento, sem ela não haverá liberação. Assim, nunca pense em termos de inimizade. Não há nada que seja seu inimigo; a existência inteira é amiga. Até mesmo aquilo que parece estar contra você - até mesmo isso não é seu inimigo. Jesus diz: “Ame o seu inimigo.” O verdadeiro inimigo que você precisa amar não é o seu vizinho ou o inimigo do seu país. Eles não são seus verdadeiros inimigos. Seus verdadeiros inimigos são a tormenta, o mundo, o mal. A sexualidade, a raiva, a paixão, o ódio - estes são os seus verdadeiros inimigos.

Jesus diz: “Ama a teus inimigos como a ti mesmo.” Por quê? O cristianismo nunca pôde entender isso. [...] Jesus é muito esotérico. Quando diz: “Ama a teus inimigos como a ti mesmo”, quer dizer: através do pólo oposto, através do inimigo, alcança-se o amigo supremo. Viva o inimigo em sua totalidade para que possa transcendê-lo. Qualquer experiência total torna-se transcendental. Qualquer experiência, eu disse. Viva com a sua totalidade e terá ido além dela. Ela nunca ficará presa a você; você terá ido acima dela. Terá passado através dela, terá aprendido tudo a seu respeito. Esse conhecimento é revolucionário. Cria uma mutação; transforma você.

[...] Não pense que a tormenta é sua inimiga, pois enquanto ela prossegue embaixo da terra, oculta na escuridão, a flor se desenvolverá.

[...] Quando a tormenta cessar, a flor desabrochará. Mas ela já estava se preparando durante a tormenta. Através da tormenta, ela estava se preparando para desabrochar. Estava acumulando energia, vida, vitalidade. Estava se aprontando para explodir. A tormenta é o solo. Sem ela, a flor não pode desabrochar.

[...] Somente passando pela tormenta é que você poderá alcançar uma calma em seu interior, semelhante àquela que, num país tropical, sucede à chuva intensa. Lembre-se disso profundamente, pois lhe será de grande ajuda.

Com cada sofrimento, você está criando a possibilidade de algum êxtase. Após cada sofrimento, o êxtase se seguirá imediatamente. Mas se você estiver muito preso ao sofrimento, poderá perder o êxtase. Se você estiver doente, um momento de saúde, um momento de bem-estar virá a você após essa doença. Mas você pode estar tão preocupado com a doença que, quando o momento vier, poderá perdê-lo — estará muito envolvido com a doença que não existe mais. O momento é instantâneo; você pode perdê-lo facilmente. Após cada dor, o momento vem e visita você.

Após cada sofrimento, o êxtase vem bater à sua porta; mas você continua perdendo-o porque o passado é muito intenso. A doença já passou, mas você continua doente. Ela permanece na memória, cobrindo sua mente de névoas, e você perde esse momento fugaz.

Lembre-se disto: sempre que você estiver deprimido, espere pelo momento em que a depressão for embora. Nada permanece eternamente; a depressão irá embora. E quando ela o deixar, espere — fique atento e alerta — porque após a depressão, após a noite, virá a aurora e o Sol nascerá. Se você puder estar alerta nesse momento, ficará feliz por ter estado deprimido. Ficará grato por ter estado deprimido, porque somente por intermédio dessa depressão é que esse momento de felicidade tornou-se possível.

Mas o que é que fazemos? Movemo-nos numa regressão infinita. Ficamos deprimidos. Então, ficamos deprimidos por causa da depressão; segue-se uma segunda depressão. Se você está deprimido, ótimo. Não há nada de errado nisso. É bom, pois através da depressão você aprenderá e amadurecerá. Mas você se sente mal. “Por que estou deprimido? Não quero ficar deprimido.” Então começa a lutar com a depressão. A primeira depressão é boa, mas a segunda depressão é irreal. E essa depressão irreal cobrirá sua mente de névoas. Você perderá o momento que se seguiria à depressão real.

Quando estiver deprimido, continue deprimido. Simplesmente, continue deprimido. Não fique deprimido por causa da sua depressão. Não lute, não procure se desviar, não force a depressão a ir embora. Apenas permita que ela aconteça; ela irá embora por si mesma. A vida é um fluxo; nada permanece o mesmo. Você não é requisitado; o rio move-se por si mesmo, não precisa que você o empurre. Se está tentando empurrá-lo, você está sendo tolo. O rio fluir por si mesmo. Deixe-o fluir.

Quando a depressão se manifesta, permita que ela se manifeste. Não fique deprimido por causa dela. Se você quiser afastá-la cedo demais, ficará deprimido. Se lutar com ela, você criará uma depressão secundária que é perigosa. A primeira depressão é boa, uma dádiva divina. A segunda depressão é criação sua. Não é uma dádiva divina; não é mental. Então você entrará em esquemas mentais, e eles são infinitos.

Se você ficar deprimido, fique feliz por estar deprimido e permita que a depressão se manifeste. Então, de repente, a depressão desaparecerá e surgirá um espaço, uma brecha. Não haverá nuvens e o céu estará claro. Por um único momento, o céu se abrirá para você. Se você não estiver deprimido por causa de sua depressão, poderá entrar em contato, estar em comunhão, atravessar o portão celeste. E quando o conhecer, terá aprendido uma das leis supremas da vida: que a vida usa o oposto como um professor, como uma base ou trampolim.

[...] Olhe a vida deste modo, e não estará distante o momento em que o sofrimento desaparecerá completamente, em que a dor desaparecerá completamente, em que a morte desaparecerá completamente. Aquele que sabe que a agonia existe em benefício do êxtase não ficará agoniado. Aquele que sabe, sente e compreende que o sofrimento existe em benefício da felicidade, jamais sofrerá. É impossível. Ele usa o próprio sofrimento para ser mais feliz, usa a própria agonia como um degrau para o êxtase. Vai além do domínio do mundo, salta para fora da roda de sansar.

O S H O — A Nova Alquimia

quarta-feira, 26 de março de 2014

Aceitando as dores do processo de ego-esfacelamento

Em primeiro lugar, a via descendente se traduz pela desvalorização das compensações. Quando pensamos em desfrutar algumas delas, uma voz logo se eleva em nós: "E depois?" ou "Para quê?" E o ilusório prazer proposto não NOS ATRAI MAIS. 

À medida que a tela psíquica sobre a qual eram projetados os fantasmas compensatórios perde sua opacidade, o olho espiritual percebe, através dele, a noite profunda, isto é, a nostalgia primitiva do nosso abandono à vontade divina. Isto é o que exprime Jesus crucificado ao gritar: "Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?" Ao nascer, quando a alma — para falar como Platão — cai num organismo humano, tudo passa por nós como se realmente tivéssemos sido abandonados por Deus. 

À medida que o homem percebe a nostalgia primitiva — pois o processo é LENTAMENTE GRADUAL — começa a sentir uma NOVA TRISTEZA, aparentemente incondicionada, da qual ele procura razões; no entanto, NÃO AS ENCONTRA, ou elas não são proporcionais a essa tristeza profunda. Por outro lado, para utilizar esse sofrimento é preciso começar pela própria purificação, expulsando do pensamento essas circunstâncias. O sofrimento continua a estar presente, e podemos então senti-lo conscientemente, SEM PENSAR. Trata-se de um mal-estar difuso em todo o ser, em todo o corpo, talvez localizado a nível do coração. Essa primeira purificação do sofrimento torna-se possível e engrandecida pela compreensão de que TODO SOFRIMENTO MORAL, PEQUENO OU GRANDE, TRADUZ A NOSSA NOSTALGIA DE DEUS. O homem "liberto vivo" — no qual essa nostalgia evidentemente desapareceu — é totalmente invulnerável ao sofrimento justamente porque a fonte deste último já não existe.

Esta é a verdadeira aceitação do sofrimento, que nada tem a ver com a resignação. As palavras de Jesus exprimem perfeitamente essa aceitação: "Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito!"

Quando o homem chega ao fundo da NOITE DOS SENTIDOS E DO ESPÍRITO (São João da Cruz), sua sensibilidade e pensamento tendem a parar completamente, originando a Realização. 

A um discípulo que perguntava qual era a última palavra do Ch'an, seu mestre respondia: "É sim". O homem comum, diante daquilo que lhe causa pesar, adota uma atitude negativa de revolta; esta, por sua vez, normalmente impotente, é cruel. Portanto, devemos aprender a adotar em todas as circunstâncias uma atitude positiva, a entrar em acordo com nossas desgraças, assim como com a nossa alegria. As felicidades são momentos de calma muito úteis, porém também devemos abençoar e experimentar totalmente as nossas infelicidades, sofrimentos e desgostos, já que só assim nossa condição egotista recebe os golpes que provocarão seu desaparecimento. Em nós é feito, então, um trabalho inconsciente que nosso intelecto seria incapaz de assumir e que unicamente realiza o SI. 

Hunert Benoit — A Realização Interior

quarta-feira, 12 de março de 2014

Só a tristeza lhe dá profundidade, o riso é superficial


Pergunta: Em algum ponto existe um medo que me faz ficar fechado, duro, triste, desesperado, com raiva e impotente. Parece ser tão sutil que eu não consigo nem entrar em contato realmente com ele. Como posso vê-lo com mais clareza?
O único problema em relação à tristeza, ao desespero, à raiva, à impotência, à ansiedade, à angústia, à miséria, é que você quer se livrar deles. Essa é a única barreira.

Você tem que conviver com eles. Não pode simplesmente fugir. É nessas situações que a vida se integra e cresce. São os desafios da vida. Aceite-os. São bênçãos disfarçadas. Quando você quer fugir deles, quando quer de alguma maneira evitá-los, é que o problema surge — pois quando se quer fugir de alguma coisa, nunca se olha diretamente. E a coisa começa a se esconder, porque você a condena; a coisa vai entrando cada vez mais no inconsciente, escondendo-se nos cantos escuros do seu ser, onde você não pode encontrá-la. Move-se para os alicerces do seu ser e ali se esconde. E é claro, quanto mais fundo for, mais problemas causará — porque então começarão a agir a partir de cantos desconhecidos do seu ser e você ficará completamente desamparado.

Portanto, a primeira coisa é: jamais reprima. Esta é a primeira coisa: seja o que for que esteja acontecendo, está acontecendo. Aceite e deixe acontecer — deixe que venha à tona. Na verdade, dizer apenas 'não reprima' não é suficiente. Se você me der permissão, gostaria de lhe dizer: "Acolha tudo como a um amigo". Está se sentindo triste? Permita. Sinta compaixão por isso. A tristeza também tem um ser. Permita-a, abrace-a, sente-se com ela, dê-lhe a mão. Seja amigável. Goste dela. A tristeza é bonita! Não há nada de errado com ela. Quem lhe disse que é errado sentir-se triste? Na verdade, só a tristeza lhe dá profundidade. O riso é superficial, a tristeza é profunda. A tristeza chega até os ossos, até a medula. Nada vai mais fundo que ela.

Portanto, não se preocupe. Fique com a tristeza e ela o levará ao seu centro mais profundo. Você poderá conviver com ela e conhecer algumas coisas novas novas sobre o seu ser as quais nunca conheceu. Essas coisas só podem ser reveladas num estado de tristeza, nunca num estado de felicidade. A escuridão também é boa, também é divina. Não só o dia é de Deus, a noite também é. Chamo a isto de atitude religiosa.[...] Deixe que as coisas sejam como elas são. Isto é coragem religiosa permitir que sejam como são. [...]

Um homem que jamais se entristece não pode ser realmente feliz. É impossível que ele seja feliz. Sua felicidade será apenas um gesto forçado — vazio e impotente. Você pode ver isso no rosto das pessoas quando elas riem: o riso é superficial, está só nos lábios. Não tem relacionamento com o coração, está totalmente desligado.

É exatamente como um — os lábios parecem vermelhos e rosados mas essa cor não vem do vermelho do sangue. É bom que os lábios sejam vermelhos, mas quando a cor vem da vitalidade, das células sanguíneas, da sua energia, da juventude. Não, você pinta os lábios — eles parecem vermelhos mas são feios. O batom é feio. E você verá que só as mulheres feias usam batom. Por que as belas precisariam usá-lo? É absurdo. Se os seus lábios são vermelhos, vitais, para que pintá-los? Assim os tornará feios.

A sua felicidade também é como batom. Você não está feliz e sabe que não está, mas não pode aceitar o fato porque isso abalaria o seu ego. Você não é feliz? Como aceitar isso? Talvez não esteja feliz interiormente, mas isso é problema seu; não precisa expressar, não tem que dizer a verdade. Para o mundo, você tem que manter uma aparência, uma personalidade. Por isso continua rindo. Observe o riso das pessoas e verá imediatamente qual deles vem do coração. Quando o riso vem do coração você pode imediatamente sentir uma vibração diferente — um extravasamento. Esse homem  está realmente feliz. Quando o riso acontece apenas nos lábios, é vazio. É só um gesto; não há nada por trás. É só uma fachada.

O homem que não pode rir profundamente é aquele que reprime a tristeza — não pode rir de verdade porque tem medo da tristeza. Mesmo que entre profundamente no riso, tem medo de que a tristeza venha à tona, que ele possa borbulhar. Ele tem de estar sempre em guarda.

Portanto, por favor, seja qual for a situação, comece a aceitá-la. Se você está triste, está triste. É isso o que Deus quer para você — pelo menos nesse momento ele quer que você fique triste. Seja verdadeiro... fique triste! Viva essa tristeza. E se conseguir vivê-la surgirá em você uma nova qualidade de felicidade, a qual não será uma repressão da tristeza, a qual estará além da tristeza.

Uma pessoa que consegue se sentir pacientemente triste descobre, de repente, numa manhã, que uma felicidade está surgindo em seu coração a partir de alguma fonte desconhecida. Essa fonte desconhecida é Deus. Você a merecerá se a sua tristeza tiver sido verdadeira; se tiver se sentido verdadeiramente desesperado, desamparado, infeliz, miserável; se tiver vivido no inferno, merecerá o céu. Você pagou o preço justo.

O S H O

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

O aparente fracasso do homem espiritual

Renunciai à vossa pretensa cultura,
E todos os problemas se resolvem.
Oh! Quão pequena parece à diferença entre o sim e o não!
Quão exíguo o critério entre o bem e o mal!
Como é tolo não respeitar o que merece ser respeitado de todos!
Oh solidão que me envolve todo!
Todo o mundo vive em prazeres como se a vida fosse uma festa sem fim,
Como se todos vivessem em perene primavera!
Somente eu estou só... Somente eu não sei o que farei...
Sou como uma criança que desconhece sorriso...
Sou como um foragido sem pátria nem lar...
Todos vivem na abundância, somente eu não tenho nada...
Sou um ingênuo, um tolo. É mesmo para desesperar...
Alegres e sorridentes andam os outros!
Deprimidos acabrunhado ando eu...
Circunspetos é ele, cheios de iniciativas!
Em mim, tudo jaz morto...
Inquieto, como as ondas do mar, assim ando eu pelo mundo...
A vida me lança de cá para lá, como se eu fosse uma folha seca...
A vida dos outros tem um sentido, e eu não tenho uma razão-de-ser....
Somente a minha vida parece vazia e inútil;
Somente eu sou diferente de todos os outros,
..................................................................
E, no entanto - sossega meu coração!
Tu vives no seio da mãe do Universo.

Lao Tsé - Tao Te King

À primeira vista parece estranho esse pessimismo do autor, esse lúgubre desânimo da vida, que lembra os lamentos de Jó. Mas não convém esquecer que todo homem que deixou a sociedade dos profanos tem, de início, a sensação duma solidão imensa, dum saara sem oásis; sente-se exilado, sem pátria nem lar. O homem espiritual se sente desambientado aqui na terra; ninguém o compreende; todos os consideram um estranho, não pertencente ao nosso mundo. O próprio Jesus passou por esses transes: "As raposas têm suas cavernas, as aves têm seus ninhos — o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça". E a seus discípulos diz ele: "Por causa de mim e do Evangelho sereis odiados de todos..." "Bem-aventurados os que choram..."

Ao descer do Tabor, ele exclama: "Ó geração perversa e sem fé! Até quando estarei convosco? Até quando vos suportarei?"

Mas esta aparente solidão e abandono do homem espiritual é a "Comunhão dos antos", a mais bela companhia do Universo, como Lao-Tsé lembra nas últimas linhas. É o total abandono de Jó — que estava na companhia de Deus, no coração do Universo. Abandonado se sente o ego — bem amparado está sempre o EU. "Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes?... Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito."

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Aprendendo a escutar a natureza do medo

Todos nós temos muitas experiências, e cada experiência deixa sua marca; cada pensamento, cada influência molda-nos de certa maneira a mente. E é uma coisa essencial morrermos para tudo o que temos experimentado, para que a mente se torne jovem, fresca e "inocente". Só uma mente "inocente", que embora tenha passado por milhares de experiências, está morta para o passado — só essa mente pode perceber o que é verdadeiro e transcender as coisas fabricadas pelo homem. E o medo, assim me parece, é uma das forças corruptoras e destrutivas que tornam impossível essa "inocência".

O medo é tempo psicológico. Não há medo, quando não temos tempo psicológico. Se não há um amanhã, para o qual estamos nos movendo, e não há lembranças do passado, o medo, em todas as suas formas, deixa de existir. Nasce o medo quando o pensamento se projeta no futuro, ou se compara com o que ele próprio foi no passado. Psicologicamente, o tempo é pensamento, tanto consciente como inconsciente; e é o pensamento que cria o medo.

Temos toda espécie de medo: medo da morte, medo de adoecer, medo da velhice, medo de perder as satisfações que temos experimentado, medo da opinião pública, de não nos preenchermos, de não termos êxito, de sermos ninguém. Como temos medo, buscamos vários tipos de fuga, tanto exterior como interiormente; e, para a maioria de nós, a religião se tornou um extraordinário meio de fuga ao medo. Para compreendermos o medo, temos de compreender todo o processo do pensar, todo o mecanismo do pensamento.

Como salientei da outra vez, releva escutar o que se diz, sem concordar nem discordar; porque nós estamos considerando fatos e não ideias. Estamos considerando fatos, independentemente de que esses fatos sejam agradáveis ou desagradáveis. E se somos capazes de considerar o fato que é o medo, escutar-lhe todo o conteúdo, ver sua estrutura, estou bem certo de que então a mente ficará num estante livre do medo.

Mas nós não sabemos escutar, porque estamos sempre procurando fugir do medo; queremos dissolvê-lo, descobrir uma maneira de nos livrarmos dele, descobrir-lhe a causa. Damos nome ao fato "medo", e a palavra se torna então importante; por essa razão nunca escutamos  o fato.

O descobrimento da causa do medo não é a libertação do medo. Com muita análise, investigação, é possível conhecermos a causa do medo; mas, no final de tudo, continuamos com medo. E, se não estivermos realmente livres do medo, qualquer espécie de busca, qualquer espécie de investigação só produzirá mais ilusão ou desfiguração. Um homem verdadeiramente religioso, se posso empregar essa palavra, não tem medo, psicologicamente, interiormente. Por "homem religioso" entendo o "homem total", e não aquele que é meramente sentimental ou que foge ao mundo, narcotizando-se com ideias, ilusões, visões. A mente de um homem religioso é muito tranquila, são, racional, lógica; e dessa mente é que necessitamos, e não de uma mente sentimental, emotiva, medrosa, enredada em seu especial condicionamento.

(...)

Como sabeis, desejamos ficar livres do medo para todo o sempre. Não existe tal coisa: "estar livre do medo para todo o sempre". Para se compreender isso, é preciso compreender a continuidade. O que dá continuidade a uma coisa, agradável ou desagradável, é o pensar nela. Ao pensarmos a respeito de uma coisa, damos-lhe continuidade. Damos continuidade ao medo com o pensar sobre ele — mas isso não significa que não devamos investigar o processo total do medo.

Como disse, o medo é tempo, no sentido psicológico, e o tempo é pensamento. Tempo é o processo de "vir a ser", evitar, preencher-se: Sou isto e quero ser aquilo. O tempo, por conseguinte, é o fator do medo. Quando vocês se veem diretamente em presença de uma coisa, qualquer que ela seja, nesse momento não há medo. Mas o pensar a seu respeito causa medo.

O pensamento é reação da memória. A memória, no sentido comum, é necessária, porque do contrário nos colocaríamos à frente de um ônibus em movimento ou tomaríamos nas mãos uma serpente venenosa. Mas, quando a memória cria o pensamento, como reação, ela se torna um empecilho e gera medo. Isso é um fato psicológico.

A morte é o desconhecido; mas, quando dizemos que tememos a morte, não estamos realmente com medo ao desconhecido, porém, com medo de deixar o conhecido, de deixarmos as coisas que temos experimentado, fruído, construído. O pensamento é essa memória do conhecido, e a respectiva reação; o pensamento, pois, nunca pode ser livre. Não há liberdade de pensamento, porquanto o pensamento está sempre condicionado, é sempre reação da memória. E para ficar totalmente livre do medo, é necessário compreender a constituição da memória como continuidade.

Como mecânico, cientista, engenheiro, etc., necessitais da continuidade da memória, pois do contrário não podereis exercer vossas funções. Mas a continuidade do pensamento como feixe de lembranças relativas ao "eu" e ao "meu", e as reações desse pensamento condicionado, tudo isso é tempo psicológico, medo. O pensar a respeito da morte — o súbito findar de tudo o que conhecemos — gera medo e dá-lhe continuidade. Assim, para que o medo termine, é necessário que o pensamento termine. Podeis dizer: "Isto é uma coisa estranha. Como posso por fim ao pensamento? Se ponho fim a todo pensar, como poderei ganhar o meu sustento? Como poderei continuar no meu emprego amanhã de manhã?"

Há duas espécies diferentes de pensar: pensar para exercer uma função, e pensar no sentido de servir-se dessa função como meio de adquirir posição. A continuidade psicológica do pensamento, que se forma quando utilizamos a função como meio de adquirir autoridade, posição, prestígio — é essa continuidade que gera o medo.

(...) O tempo, no sentido psicológico, gera o medo. O tempo é o veículo do pensamento; e o homem que deseja ficar completamente livre do medo tem de colocar fim ao pensamento. Isso requer atenção — não concentração, porém atenção total a cada pensamento. Se puderdes dar atenção total a cada pensamento, importante ou sem importância, profundamente significativo ou sem muita significação, vereis então que nesse estado de atenção total ocorre o findar do pensamento.

O medo gera a "culpa", a ansiedade; e a ansiedade, em qualquer forma, é o começo do sofrer. Há o sofrimento de não ser amado; o sofrimento que experimentamos quando alguém a quem estamos profundamente apegados,  sofre ou está a morrer. E nós temos divinizado o sofrimento. Isso é verdade principalmente em relação ao cristianismo, que sempre considerou o sofrimento uma coisa sublime. Ide a uma igreja, e lá encontrareis o "Crucificado". Não há fim ao sofrimento, para a maioria de nós, porque eternizamos o sofrimento e na sua sombra vivemos até o fim de nossos dias. O sofrimento tornou-se coisa respeitável. É algo que todo homem civilizado conhece e guarda fechado em seu coração; e quando ele vai à igreja, rende-lhe adoração, ou, por várias maneiras, procura evitá-lo.

Mas, o findar do sofrimento. O sofrimento deve findar completamente, porque, do contrário, nunca poderá existir a mente religiosa a que me refiro. O sofrimento não nos leva à verdade; mas o sofrimento tem grande significação, porque algo nos indica. Infelizmente, a maioria de nós evita essa indicação, essa sugestão, e fica "vivendo com o sofrimento". Se o examinardes profundamente, vereis que o sofrimento é autocompaixão, embora possais dar-lhe outro nome. Perdeste alguém — marido, mulher, filho — e vosso sofrimento é a compaixão que tendes de vós mesmo, por terdes ficado só. Todos conhecemos essa autocompaixão resultante da solidão; e a autocompaixão, em qualquer forma que seja, a preocupação a respeito de si mesmo, é o começo do sofrimento. O sentimento de inferioridade e a luta para se tornar superior, o conflito e o triunfo que há em alcançar, atingir, a dor da frustração, — tudo isso produz sofrimento.

Como deveis saber, muito pouco de nós fazemos frente ao sofrimento. Provavelmente nunca experimentamos o sofrimento diretamente... Temos experimentado diretamente a fome, o sexo; mas não estou certo de que já experimentamos diretamente o sofrimento. Nós permanecemos com o que é agradável, queremos continuar nesse estado; mas o sofrimento procuramos evitar, nunca queremos encará-lo. O desejo de encontrar uma saída, um meio de fuga, nas palavras, nas ideias, na crença, na bebida, no que quer que seja — impede-nos de encarar diretamente o fato do sofrimento.

Se perdemos o filho, se a mulher ou o marido nos abandona, ficamos a sofrer. Que sucedeu realmente? Vemo-nos abandonados, sós, sem ninguém mais em quem nos amparar. Nós nos tínhamos identificado completamente com aquela pessoa e, agora, que ela se foi, sentimo-nos perdidos. O fato é que, psicologicamente, somos dependentes, e esse fato provoca outros fatos, ou sejam várias maneiras de fugir, que só podem perpetuar o medo e o sofrimento.  

Assim, sendo, torna-se dificílimo encarar e experimentar diretamente o fato que é o sofrimento. A palavra "sentimento" tem certos significados sugestivos, e, para se experimentar qualquer coisa direta e totalmente, é necessário estar-se livre da palavra. Mas vós sois escravos da palavra... Analogamente, a palavra "sofrimento" tem em vós extraordinária influência. A palavra, o símbolo tem séculos de propaganda religiosa a ampará-lo: que é necessário sofrer, suportar o sofrimento; que pelo sofrimento virá a paz, etc. Tudo isso condicionou a mente, e vós nunca rompeis esse condicionamento. Mas, para ficardes livre do sofrimento, tendes de despedaçar todos os símbolos, rejeitar todas as palavras e encarar diretamente o fato. E não podeis encarar o fato, que é a vossa autocompaixão, se o retrato que está sobre o piano ou sobre a lareira se torna sumamente importante, porque nesse caso estais identificado com a ideia, uma lembrança, uma coisa morta e acabada, e estais vivendo no passado. Libertar-se completamente do passado, destruí-lo totalmente, com toda a sua história, todas as suas memórias, é o findar do sofrimento.

Assim como o medo desfigura a mente, produzindo várias formas de ilusão e corrupção, assim também o sofrimento torna a mente embotada, insensível; porque, no sofrimento, a mente está toda interessada em sua própria autocompaixão, sua própria solidão. E eu vos garanto — não digo que deveis acreditar, mas garanto-vos que o sofrimento pode findar e que, então, veem-se todas as coisas de maneira nova, cada incidente, cada movimento de maneira nova. É só quando a mente está livre do sofrimento e de toda espécie de medo, que há "inocência". E a mente precisa ser "inocente", embora tenha vivido um milênio; porque só a mente nova, inocente, jovem, é capaz de perceber o que se encontra além das limitações humanas.

Mas tudo isso requer muita atenção, verdadeira seriedade, que não significa "fazer uma cara solene", mas, sim, ser capaz de seguir velozmente um dado pensamento, até o fim, deixando que ele se desdobre por inteiro, sem obstáculos; e isso não é possível se tendes amarras no passado.

(...) A maioria de nós jamais experimentou um estado de "inocência"... Se sois rico ou remediado, podereis procurar um analista; mas nenhum agente externo, nenhum esforço pode libertar-vos do sofrimento, a fim de  colocar fim ao seu sofrer — nesse caso não ficais atento.

Tentai uma vez, se o desejardes, considerar totalmente uma flor, uma árvore, um ente humano. Considerar sem conhecimento, sem pensamento — o que não significa um estado de amnésia, ter a mente "em branco". Vereis que, ao considerardes assim uma coisa, há um extraordinário estado de atenção que não é concentração. Concentração é exclusão. A mente que está atenta pode concentrar-se sem esforço, sem exclusão. Mas a mente que adquiriu a faculdade de concentração por meio do esforço, treino, disciplina — essa mente jamais poderá estar atenta. 

Krishnamurti - 7 de junho de 1962
O Homem e seus desejos em conflito - ICK
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill