O medo é uma parte natural do mosaico de mudanças. De alguma forma, ele normalmente acompanha uma emergência espiritual, quer seja uma leve sensação de interesse na participação dos eventos diários, quer um grande terror pairando livremente, que não parece estar vinculado a nenhum aspecto familiar da vida da pessoa. Um pouco de ansiedade é algo típico dessas situações: não apenas muitos de seus sistemas de crença familiares estão sucumbindo, mas a própria pessoa está se tornando extremamente emotiva. O corpo se sente como se estivesse caindo aos pedaços, com novas tensões físicas e dores inoportunas. Porém, o medo parece completamente ilógico, como se não tivesse nenhuma relação com a pessoa envolvida. às vezes, a pessoa em crise pode lidar com vários medos relativamente fáceis enquanto em outras ocasiões o medo parece se desdobrar num pânico totalmente incontrolável.
Os homens têm vários tipos de medo, desde as formas mais óbvias, como o horror a danos físicos ou à morte, até os mais sutis, como ansiedade ao perguntar um endereço a um estranho. Apesar de seus vários medos, muitas pessoas são capazes de atuar muito bem na vida diária, sem se deixarem dominar por eles. Durante muitas emergências espirituais, no entanto, os medos diários se intensificam e se concentram, tornando-se, frequentemente, incontroláveis. Eles podem assumir a forma de uma ansiedade oscilante ou cristalizar-se em diversos tipos de medo.
Medo do desconhecido — Em certo grau, isto é comum a muitos seres humanos. Quando nossas vidas tomam um rumo desconhecido, quase sempre reagimos automaticamente tornando-nos apreensivos e resistentes. Algumas pessoas podem atirar-se ao desconhecido quase sem hesitar, com o que parece ser uma coragem invejável. Porém, se algumas pessoas penetrarem em territórios totalmente ignorados, o farão contra a sua vontade ou com a maior cautela possível.
Para as pessoas em emergência espiritual, o medo do desconhecido pode tornar-se espantosamente exagerado. Seus estados interiores costumam mudar de forma tão rápida que causam receio a respeito do que está por vir. Estão sempre inseridos em domínios insondáveis, em novos conhecimentos e possibilidades não discernidas. Uma mulher materialista pode ter uma manifestação espontânea fora do corpo e aprender que ela é mais do que a sua identidade física. Um homem pode passar, de repente, por uma complexa sequência visual e emocional que parece vir de outra época e de outro lugar. Sua experiência o impele a pensamentos sobre reencarnação, um conceito totalmente estanho a ele.
Esses tipos de acontecimentos repentinos podem ser muito assustadores para os que estão despreparados. Essas pessoas se sentem inseguras sobre aonde estão indo ou como vão se sentir, e as mudanças muito rápidas levam-nas ao medo de que estejam perdendo o controle de suas vidas. Podem ansiar pela familiaridade da segurança, pelo velho modo de ser e pela vida mais tranquila e menos exigente da qual vieram, ainda que fossem infelizes.
Medo de perder o controle — Um homem que passou muitos anos trabalhando para ter uma vida familiar próspera pode ter seu futuro bem planejado e se sentir responsável pela sua vida. Quando a mulher desenvolve uma doença terminal, sua vida muda para um rumo diferente do que tinha planejado. Seu sonho é destruído e o desgaste emocional que se segue pode iniciar um processo de transformação nele. Muito dolorosamente, ele percebe que não tem poder sobre as forças da vida e da morte e que está sujeito a forças acima do seu comando.
Muitas pessoas passam anos sentindo que seu mundo é disciplinado e que têm total autoridade sobre suas vidas. Quando descobrem que não estão inteiramente no controle de suas trajetórias de vida, ficam às vezes muito aliviadas. Outras vezes, tornam-se bastante assustadas, especialmente quando se sentem profundamente responsáveis. Com certeza, perguntarão a si mesmas: "Se não estou no comando, quem está? E ele, ela ou isto é de confiança? Posso me entregar a uma força desconhecida e ter a certeza de que ela tomará conta de mim?"
Comparados aos medos de perder o controle, a mente e o ego tornam-se muito criativos em seus esforços para persistir; as pessoas nessas situação podem criar um sistema complexo de negação, falando para si próprias que estão bem do jeito que são e que não precisam se submeter a mudanças ou que as modificações que sentem são apenas ilusórias. Podem intelectualizar os estados mentais pelos quais estão passando, criando teorias elaboradas para invalidá-los. Ou podem tentar simplesmente anulá-los, passando por eles juntos. Às vezes, a própria ansiedade torna-se uma defesa; apoiando-se nos sentimentos de medo, podem impedi-los de se desenvolverem muito rapidamente.
Há uma outra forma de perder o controle que é muito menos gradual e mais dramática. Às vezes, durante uma emergência espiritual, a pessoa pode ser dominada por fortes episódios durante os quais perde completamente o controle do seu comportamento. A pessoa pode "explodir" com raiva e em lágrimas, tremer violentamente e gritar como nunca havia feito antes. Essa liberação incomum de emoção talvez aconteça, mas antes disso, a pessoa pode ser tomada por um grande medo e se deixar envolver e resistir a esse sentimento. Depois desse tipo de "explosão", a pessoa também pode se sentir assustada e envergonhada quando se der conta da intensidade da sua atitude.
Christina Grof — A tempestuosa busca do ser
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