Toda cultura institucionaliza determinadas formas de comportamento que comunicam e fomentam determinadas formas de pensamento e de ação, moldando assim o caráter de seus cidadãos. Na medida em que o indivíduo é objeto de constante manipulação mental, na medida em que as instituições de uma cultura tendem a enfraquecer a resistência intelectual e espiritual, na medida em que o conhecimento do espírito é empregado para amestrar e condicionar o povo e não para educar, nessa mesma medida produz a cultura homens e mulheres predispostos a aceitar um sistema autoritário de vida. O homem que não é dono de seu próprio espírito torna-se facilmente um joguete nas mãos de um possível ditador. É inquietante verificar quantas vezes homens inteligentes são incapazes de pensar corretamente por si mesmos. A padronização do espírito, orientada ou não para a conformidade e a sujeição, é condicionada desde muito cedo, na vida.
(...)Em importante experiência psico-social realizada com estudantes, descobriu-se, por meio de simples testes, que em mais de um terço das pessoas examinadas havia conformidade com uma opinião ERRÔNEA DOMINANTE e que 75% dos que se submeteram à prova concordaram, em vários graus, com a maioria. Para muitas pessoas, o peso da autoridade é mais importante que a sua qualidade.
(...) Se queremos aprender a proteger nossa integridade mental em todos os níveis, temos de examinar não apenas os aspectos da cultura contemporânea, diretamente relacionados com a luta pelo poder, mas ainda certos processos de nossa cultura que, embotando o gume de nossa vigilância mental ou aproveitando-se de nossa sugestibilidade, pode conduzir-nos à morte mental — ou ao tédio — representada pelo totalitarismo. A contínua sugestão e a lenta hipnose no sentido de despertar a COMUNICAÇÃO MECÂNICA DE MASSA favorece a uniformização do espírito e cria o ENGÔDO POPULAR da "ERA FELIZ" do ajustamento, da integração e do nivelamento, em que se ESTEREOTIPA COMPLETAMENTE a opinião individual.
(...)É extremamente difícil escapar das sugestões da vida diária, mecanicamente repetidas. Mesmo que por espírito crítico as rejeitemos, elas nos persuadem a fazer aquilo que intelectualmente consideramos estúpido.
A mecanização da vida moderna já influi sobre os homens, para torná-lo mais passivo e ajustá-lo às conformações pré-fabricadas. O homem não precisa mais pensar em valores pessoais, seguindo a sua própria consciência e suas avaliações morais; pensa cada vez mais em termos dos valores que lhe traz o ambiente das massas. Os cabeçalhos matutinos lhes fornecem uma visão política do momento, o rádio insufla-lhe sugestões pelos ouvidos, a televisão mantém-no em contínua sujeição e numa fixação passiva. Conscientemente, ele pode protestar contra essas vozes anônimas; não obstante, as sugestões destas se intrometem no seu modo de pensar.
O que talvez haja de mais impressionante nessas influências, é que muitas delas não nasceram das tendências destrutivas do homem, mas de sua esperança de melhorar o mundo em que vive e de tornar a vida mais rica e mais profunda. As mesmas instituições que o homem criou para ajudá-lo, os mesmos engenhos que ele inventou para elevar sua vida, o mesmo progresso que ele fez para dominar a si mesmo e a seu ambiente, tudo pode transforma-se em armas de destruição.
(...)Em nossa época de ruídos excessivos e de muitas frustrações, não poucos espíritos "livres" desistiram de lutar pela decência e pela individualidade. Rendem-se ao ZEITGEIST, muitas vezes sem o perceber. A opinião pública modela todos os dias o nosso senso crítico. Sem o saber, podemos nos tornar ROBÔS OPINIÁTICOS. A lenta coação da hipocrisia, de tradições de nossa cultura que têm um efeito nivelador, todas essas coisas nos transformam. Temos fome de excitação, de histórias de arrepiar cabelos, de sensação. Andamos a cata de situações que provocam um medo superficial para recobrir angústias profundas. Gostamos de escapar par o irracional, porque nos desagrada o convite ao estudo e à reflexões pessoais. Nossos lazeres são cada vez mais preenchidos por atividades automatizadas, em que não tomamos parte nenhuma: ouvir palavras trombeteadas e postar-se diante de telas de televisão. Corremos para baixo e para cima de automóvel e à noite vamos dormir com soporíferos. Esse sistema de vida, por sua vez, pode abrir o caminho para repetidos e sorrateiros ataques contra nosso espírito. Nosso tédio receberá bem qualquer sugestão sedutora.
Joost A.M. Merloo