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terça-feira, 6 de agosto de 2013

É benéfico ou nocivo o controle do pensamento?

Fora educado no estrangeiro — disse ele — tendo ocupado importante cargo público; mas, havia mais de vinte anos, abandonado o emprego e as coisas do mundo, para passar os restantes dias de sua vida em meditação.

Pratiquei vários métodos de meditação” continuou, “até adquirir perfeito controle dos meus pensamentos e daí me advirem certos poderes e o domínio de mim mesmo. Entretanto, um amigo meu me levou a uma de suas conferências, em que, respondendo a uma pergunta sobre meditação, você disse que, como geralmente é praticada, a meditação é uma espécie de auto-hipnose, uma maneira de cultivar os nossos próprios desejos, ‘projetados’ e requintados. Isso me impressionou  parecendo-me tão verdadeiro que tratei de arranjar esta entrevista com você; e, considerando que à meditação dediquei a minha vida, espero que possamos apreciar este assunto com certa profundidade.

Gostaria de começar explicando um pouco como decorreu o meu desenvolvimento. De tudo o que tinha lido, compreendi que era necessário tornar-me senhor absoluto dos meus pensamentos. Isso me foi extremamente difícil. A concentração nas minhas funções oficiais era coisa muito diferente do firmar a mente e subjugar o inteiro ‘processo’ do pensamento. De acordo com os livros, era necessário segurar nas mãos todas as rédeas do pensamento controlado. Não era possível aguçar o pensamento para penetrar as nossas múltiplas ilusões, se não pudéssemos controlá-lo e dirigi-lo; foi esta, pois, a minha primeira tarefa.”

Peço permissão para perguntar, sem interromper o seu relato: O controle do pensamento é a primeira tarefa?

Ouvi o que disse em sua palestra a respeito da concentração, mas, se me permite, desejo descrever-lhe, o mais extensamente possível, a minha experiência, para depois apreciar certos pontos de vista com ela relacionados."

Como quiser, senhor.

“Logo de início me senti insatisfeito com minha ocupação, e foi-me relativamente fácil abandonar uma carreira de futuro. Li muitos e muitos livros sobre a meditação e a contemplação, inclusive os escritos por vários místicos, tanto daqui como do Ocidente, e pareceu-me óbvio que o controle do pensamento era a coisa mais importante de todas. Isso exigiu esforço considerável e perseverante, propósito firme. À medida que me adiantava na meditação, fui tendo experiências numerosas, visões de Krishna, do Cristo e de alguns santos hindus. Tornei-me clarividente e comecei a ler os pensamentos das pessoas, adquirindo ainda outros poderes. Fui prosseguindo, de experiência em experiência, de uma visão, com seu significado simbólico, para outra, do desespero à mais alta bem-aventurança. Sentia o orgulho de um conquistador, do homem que se tornou senhor de si mesmo. O asceticismo ou domínio de si mesmo, confere um sentimento de poder e gera vaidade, força e confiança em si mesmo. Tudo isso me fora dado de mão cheia. Embora ouvisse falar de você, durante muitos anos, o orgulho que eu sentia pelo que conseguira realizar, me impedia de vir ouvi-lo; mas meu amigo, outro sannyasi como eu, insistiu comigo para vir, e o que ouvi me causou perturbação! Eis em poucas palavras a minha história, no tocante à meditação.

Na sua palestra, você disse que a mente tem de transcender toda a experiência, pois, do contrário, se vê aprisionada em suas próprias ‘projeções’, em seus próprios desejos e aspirações, e causou-me profunda surpresa verificar que minha mente se achava enredada precisamente nessas coisas. Uma vez cônscia desse fato, de que maneira pode a mente demolir as paredes da prisão que ela mesma construiu ao redor de si? Estes vinte e tantos anos foram completamente perdidos? Foi tudo apenas uma mera viagem pelo reino da ilusão?”

A ação que se deveria compreender poderá ficar para considerarmos mais adiante; tratemos, por ora, se está de acordo, do controle do pensamento. É necessário esse controle? É benéfico ou nocivo? Vários instrutores religiosos têm recomendado o controle do pensamento como passo preliminar, mas eles têm razão? Quem é esse “controlador”? Ele não faz parte desse mesmo pensamento a que procura controlar? Poderá considerar-se uma entidade separada, diferente do pensamento, mas não é ele produto do pensamento? Ora, sem dúvida, o controle supõe ação coercitiva da vontade, para subjugar, reprimir, dominar, para levantar resistência contra o que não é desejado. Em todo esse processo há um vasto e doloroso conflito, não é verdade? Pode algum bem resultar do conflito?

A concentração, na meditação, é uma forma de automelhoramento egoístico, encarecendo a ação dentro dos limites do “eu”, do “ego”, de “mim”. A concentração é um processo de estreitamento do pensar. Uma criança se absorve em seu brinquedo. O brinquedo, a imagem, o símbolo, a palavra, detêm incansáveis divagações da mente, e tal absorção se chama concentração. A mente é invadida pela imagem, pelo objeto, exterior e interior. A imagem, o objeto, se torna então da mais alta importância, e não a compreensão da própria mente. A concentração numa coisa é relativamente fácil. O brinquedo, com efeito, absorve a mente, mas não a liberta, para explorar, para descobrir o que existe — se alguma coisa existe — além de suas próprias fronteiras.

“O que você diz é tão diferente daquilo que lemos ou que nos ensinaram e, todavia, é evidentemente verdadeiro, e começo a compreender a significação do controle. Mas como pode a mente tronar-se livre, sem disciplinamento?”

A repressão não constitui os passos que levam à liberdade. O primeiro passo para a libertação é a compreensão do cativeiro. A disciplina molda a conduta e ajusta o pensamento ao padrão desejado, mas, sem a compreensão do desejo, o mero controle ou disciplina perturba o pensamento; entretanto, por outro lado, quando há percebimento dos movimentos do desejo, esse percebimento traz clareza e ordem. Afinal, senhor, concentração é ação do desejo. Um homem de negócios se concentra, porque seu desejo é acumular riquezas ou poderes, e quando um outro se concentra, em meditação, esse também está desejando uma perfeição, recompensa. Ambos estão ambicionando sucesso, que lhes confere confiança em si mesmo e sentimento de segurança. Não é exato isso?

Compreendo o que está explicando, senhor”.

A compreensão apenas verbal, que é apreensão intelectual do que se ouve, tem pouco valor, não acha? O fator libertador não é, em tempo algum, mera compreensão verbal, mas o percebimento da verdade ou falsidade da coisa. Se podemos compreender o significado da concentração e perceber o falso como falso, dá-se então a libertação do desejo de realizar, de “experimentar”, “vir a ser”. Daí resulta atenção, coisa toda diferente da concentração. Concentração supõe processo dual, escolha, esforço, não é verdade? Há o “produtor de esforço” e o fim para o qual se faz o esforço. Nessas condições, a concentração fortalece o “eu”, o “ego”, que é o “produtor de esforço”, o conquistador, o virtuoso. Mas, na atenção, essa atividade dual não existe; está ausente o “experimentador”, a entidade que acumula, armazena e repete. Nesse estado de atenção, deixou de existir o conflito inerente ao esforço de realização e o medo de ser mal sucedido.

“Mas, infelizmente, nem todos somos dotados desse poder de atenção”.

Isso não é um dote, uma recompensa, coisa comprada mediante disciplina, exercícios, etc. Isso nasce com a compreensão do desejo, que é autoconhecimento. Esse estado de atenção é “o bom”, é ausência do “eu”.

Todos os meus esforços e disciplinas de muitos anos foram então inúteis e nenhum valor têm? No mesmo instante em que faço esta pergunta, estou começando a perceber a verdade relativa à questão. Vejo agora que durante mais de vinte anos estive seguindo um caminho que tinha de levar, inevitavelmente, a uma prisão por mim mesmo criada e na qual tenho vivido, “experimentado” e sofrido. Chorar o passado é favorecer o “eu”, e é necessário começar de novo, com uma intenção diferente. Mas — e todas aquelas visões e experiências? São também falsas, sem valor algum?”

A mente, senhor, não é um vasto repositório de todas as experiências, visões e pensamentos do homem? A mente é o resultado de muitos milhares de anos de tradições e experiências. É capaz de invenções fantásticas, desde as mais simples às mais complexas. É capaz de extraordinárias alucinações, e vastas percepções. As experiências e esperanças, as ânsias, as alegrias e os conhecimentos acumulados, tanto do grupo como indivíduo, tudo está lá, depositado nas camadas mais profundas da consciência, e é possível ressuscitar as experiências, visões, etc., herdadas ou adquiridas. Dizem que certas drogas podem produzir uma lucidez, uma visão de grandes profundidades e alturas, libertar a mente de suas agitações, conferindo-lhe grande energia e acuidade. Mas é necessário a mente atravessar esses ocultos e sombrios corredores, para alcançar a luz? E quando por qualquer desses meios ela encontra luz, é a luz do Eterno? Ou é a luz do “conhecido”, da coisa reconhecida, produto da busca, da luta, da esperança? É necessário passar por esse fastidioso “processo” para se achar o imensurável? Pode-se deixar de lado tudo isso e chegar àquilo que se pode chamar amor? Já que tivesse visões, poderes, etc., o que diz, senhor?

“Enquanto duravam, eu naturalmente os julgava importantes e significativos; conferiam-me um grato sentimento de poder, uma certa felicidade em agradáveis realizações. À chegada desses poderes, ganha-se uma grande confiança em si mesmo, um sentimento de autodomínio, que dão um orgulho desmedido. Agora, depois desta nossa conversa, não tenho certeza nenhuma de que essas visões, etc., sejam tão significativas para mim, como dantes. Parecem ter caído para o segundo plano, na luz de minha compreensão.”

É necessário passar por todas essas experiências? São elas necessárias, para abrir a porta do Eterno? Não podem ser deixadas de lado? O essencial, afinal de contas, é o autoconhecimento, que faz nascer a mente tranquila. A mente tranquila não é produto da vontade, da disciplina, das várias práticas destinadas a subjugar o desejo. Todas essas práticas e disciplinas só têm o efeito de fortalecer o “eu”, e a virtude se torna então um outro rochedo, sobre o qual o “eu” pode edificar a sua morada de importância e respeitabilidade. A mente precisa estar vazia do “conhecido”, para que se torne existente o incognoscível. Se não se compreendem as atividades do “eu”, a virtude começa por vestir a capa da importância. O movimento do “eu”, com sua vontade e desejo, suas buscas e acumulações, tem de cessar inteiramente. Só então se tornará existente o atemporal. O atemporal não pode ser chamado ou atraído. A mente que procura atrair o Real por meio de várias práticas e disciplinas, por meio de preces e atitudes, só pode receber suas próprias e agradáveis “projeções”, que não são o Real.

Percebo agora, depois de tantos anos de asceticismo, disciplina e automortificação, que minha mente está cativa na prisão que ela própria construiu, e que as paredes dessa prisão precisam ser demolidas. Como pôr mãos à obra?”


O próprio percebimento de que elas precisam desaparecer é suficiente. Toda ação, visando a demoli-las, põe em movimento o desejo de realização, ganho, fazendo, portanto, nascer o conflito dos opostos, o “experimentador” e a “experiência”, a entidade que busca e a coisa buscada. Perceber o falso como falso é, em si, suficiente, porquanto esse próprio percebimento liberta a mente do falso.  

Jiddu Krishnamurti — Reflexões sobre a vida
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill