Embora levando exteriormente vidas de grande propósito e "negócios", a maioria das pessoas, hoje, teria de admitir, se forem totalmente honestas consigo mesmas, que estão vivendo uma existência em que a carência de sentido existe em diversos graus. Isso acontece porque a maior parte de seus esforços, embora tenham finalidade dentro de um estreito contexto, são essencialmente fragmentários e contraditórios, portanto não podem contribuir para um estilo de vida completo e saudável, como não podem levar a uma visão do mundo baseada na realidade.
Longa sucessão de religiões orientais e de escritos filosóficos, vindos das mais antigas escrituras da Índia — os Vedas e os Upanishads — até o Zen, ensinam que há uma outra forma de funcionamento dos seres humanos, uma vida inteiramente livre de fragmentação, vida que também possui profundo sentido e grande beleza. E, nesses ensinamentos, o que é notável, existem, através da imensa variedade de expressão religiosa que representam, um discernimento e uma experiência elevadíssimos, que sempre permanecem os mesmos: a visão direta da natureza, do eu, e do mundo, visão que transforma e libera aquele que a obtém. Assim, com o advento dos Upanishaes, que foram chamados, com muita justiça, os ensinamentos mais revolucionários que vieram a ser oferecidos à humanidade, uma fagulha brilhou na consciência do homem, e a chama que dela nasceu tem sido conservada viva por um pequeno número de indivíduos, durante todos estes séculos.
As intuições centrais desses ensinamentos, os únicos que dão verdadeira significação à vida, são a experiência e a compreensão integrais do que, em sânscrito, é designado pela palavra "Sunyata". Tal palavra é, quase sempre, embora inadequadamente, traduzida como "Vazio" — inadequadamente porque a palavra inglesa tem uma conotação pesadamente negativa, associado-se a futilidade, frustração e mesmo niilismo, quando Sunyata é, na verdade, uma experiência das mais positivas, soberanamente libertadora, que dá nova e melhorada amplitude de vida ao ser humano. Só ela é capaz de apagar o passado, com suas lembranças dolorosas, e só ela tem explicação para o problema do sofrimento. Esse Vazio infunde, pela primeira vez, sentido real a cada uma das atividades da pessoa, e assim, paradoxalmente, é a própria chave da plenitude da vida.
Não sendo Sunyata um simples conceito, ou doutrina intelectual, já que se torna viva realidade depois que alcançada determinada profundidade de entendimento, não é possível, realmente, descrever a experiência com "qualquer" palavra (por isso é bom conservar a expressão equivalente de "Vazio"). Só é possível fazer sugestões sobre alguns dos aspectos das intuições revolucionárias, dos quais um dos mais importantes, no Vazio, é o de não haver, de forma alguma, autoridade, fórmula, princípio, que possam guiar uma pessoa na sua vida cotidiana, nem crença à qual se agarrar quando enfrenta uma frustração, conflito, ou sofrimento; não há filosofia ou doutrina na qual se possa encontrar refúgio sólido — pois tudo isso é visto como simples invenções da mente; a liberação, em relação ao sofrimento, só pode vir do interior da própria pessoa. Outro aspecto importante do Vazio está no fato de a pessoa acordar para o verdadeiro significado dos seus objetivos e motivações convencionais, e descobrir que eles têm muito pouco valor e significância. Em terceiro lugar, mas não o menos importante, a pessoa compreende que o "eu" é visto muito superficialmente, que seus atributos são baseados em aparências pouco profundas, em impressões, mas que, realmente, quando o desejamos destacar, definindo sua natureza ou identidade, ele se revela uma identidade das mais ilusórias. E quando chegamos a compreender o assunto ainda mais profundamente, vemos que não se trata, absolutamente, de uma "entidade"! Essa é, de fato, a apoteose da experiência em Vazio.
Assim, o retorno à significação, que é sentido como aguda necessidade por muitas pessoas dadas à meditação, só é possível através da compreensão da "plenitude do Vazio", que é a nossa natureza autêntica. E tal compreensão só pode ter lugar depois que o ser humano abandonou, com facilidade, sem sofrimento, e com finalidade completa, as amarras que o prendem a uma sociedade condicionada e condicionante.
Robert Powell (1918-2013)