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sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

O que você pensa sobre se casar?

Quando voltei para casa, saindo da universidade, meus pais estavam preocupados com o meu casamento – naturalmente. Minha mãe foi a primeira a me perguntar, já que meu pai sempre foi muito cauteloso em me pedir qualquer coisa, porque certa vez eu lhe disse: seja lá o que você me peça, não haverá nenhuma maneira de eu mudar de opinião. Sendo assim, primeiro ele tentou através da minha mãe,  de que ela encontraria uma forma de falar sobre o casamento da maneira que ele pensa, porque uma vez que ele dissesse um  não para mim, teríamos que mudar de assunto completamente!
Quando eu estava indo dormir minha mãe veio, sentou na minha cama e me perguntou:
“Agora que você terminou seus estudos, o que você pensa sobre se casar?” 
Eu disse,“Eu é que gostaria de perguntar-lhe, porque eu nunca fui casado antes, então eu não tenho nenhuma experiência. Você se casou, você teve onze filhos. Você é uma pessoa experiente e então eu vou seguir seu conselho. Será que esta sua vida foi uma vida de bênçãos? Você alguma vez pensou que se não tivesse se casado, teria sido melhor? E eu não quero que você responda agora. Dou-lhe 15 dias para pensar sobre isso”
Ela disse: “Isto é muito estranho. Eu vim dar-lhe tempo para pensar sobre isso, e você está me dizendo para eu pensar nisso!”
Eu disse: “Sim, porque eu não sei e por não saber eu confio em você. Se depois de 15 dias você disser que sim, que a sua vida tem sido uma vida de enorme alegria e êxtase, é claro que eu vou me casar. Mas lembre-se, eu estou confiando tudo em você, eu estou entregando a minha vida inteira confiando em suas mãos. E lembre-se também que eu sei da sua vida, que nunca houve qualquer êxtase, qualquer bênção. Foi uma vida de  luta contínua, um sacrifício – com meu pai, com todos meus irmãos…” E na Índia, isto era comum… Minha família era composta, no mínimo, de sessenta pessoas: Meus tios, suas mulheres, seus filhos. “E você tem sido continuamente miserável, que eu sei. Talvez você tenha experimentado internamente alguma coisa que eu não esteja ciente, então… Você terá 15 longos dias para refletir. E eu deixo para você: se você disser “Case-se,” eu vou me casar.
Depois de quinze dias, ela disse: “Não. Não se case.” Disse: “Você me enganou Você confiou em mim tão profundamente que eu não posso traí-lo, eu não posso enganá-lo e também não posso mentir para você. Você está certo; muitas vezes pensei que tipo de vida eu tive, apenas dando a luz a um filho e mais outro, educando um a um. Esta tem sido a minha vida desde que acordo cedo na manhã, até tarde da noite na hora de dormir, trabalhando continuamente. Nunca conheci um único momento próprio.” Estes 15 dias “, disse ela,” têm sido de grande turbulência dentro de  mim. Eu nunca pensei em toda a minha vida do jeito que você me fez pensar. E eu te amo, e eu levo a minha pergunta embora, porque não era realmente a minha pergunta; seu pai estava tentando encontrar a resposta.”
” Eu disse: “Diga-lhe que venha me perguntar diretamente.
Ela disse ao meu pai: “Até onde entendo a situação, isto é assunto encerrado. Eu disse a ele para não se casar.” Meu pai disse: “Meu Deus! Você  o aconselhou a não se casar?” Ela disse: “Sim, porque ele confiava tanto em mim e ele me pediu para pensar sobre isso por quinze dias. Ele estava disposto, mas agora eu não posso enganá-lo e eu não posso viver com esta culpa por toda a minha vida. Você faz o que você quiser fazer “.
Agora ele estava com mais receio ainda – já não estava mais nas mãos da minha mãe. Ainda assim, de alguma forma a solução tinha que ser encontrada e algo tinha que ser feito. Ele pediu então a um de seus amigos, um supremo defensor do Tribunal, muito famoso, muito lógico e racional. Ele pensou que aquele homem poderia ser a pessoa certa para discutir comigo. E é claro que o homem disse:“Não se preocupe. Tenho feito defesas e argumentado por toda minha vida no Supremo Tribunal Federal. Você acha que eu não consigo convencer um rapaz que acaba de entrar na universidade? O que ele sabe? Qual é a experiência que ele tem? Eu irei amanhã.”
O dia seguinte era domingo, os tribunais estavam fechados. Ele veio à minha casa, e eu lhe disse:
“Antes que você comece. porque meu pai me disse que você estaria vindo para me encontrar e falar sobre meu casamento – antes de você começar eu gostaria de deixar algo bem claro, que se você me convencer, então estarei pronto para me casar, mas se você não puder me convencer, você terá que se divorciar de sua esposa. Você tem que arriscar alguma coisa. E eu confio em você, então eu não preciso pedir uma testemunha nem alguém para julgar. Eu tenho amado e respeitado você assim como amo e respeito meu pai. Vocês tem sido tão amigos que eu nunca pensei em você como se não fosse meu próprio pai também. Por isto eu não pedi a opinião de um outro juiz porque isto iria menosprezá-lo. Eu confio em suas habilidades e estou pronto para os seus argumentos, mas esta condição deve ser lembrada e respeitada.”
Ele disse: “Então me dê um pouco de tempo, porque eu nunca havia pensado sobre esta alternativa. A verdade é que eu sofri toda a minha vida por causa do meu casamento, mas eu nunca tinha pensado sobre isto. E você está propondo que me divorcie se eu não conseguir convencê-lo a favor do casamento. Deixe-me pensar sobre isso. Eu tenho filhos, tenho uma esposa, tenho toda a minha respeitabilidade na sociedade. Eu não posso me divorciar tão facilmente.”
Eu disse: “E você acha que eu não tenho nada? Tudo o que você tem é passado e tudo o que eu tenho é futuro. O passado já está morto e acabado. E eu estou arriscando a vida, o que virá, e você está arriscando apenas o o que já passou, o que acabou. Você acha que você está arriscando mais do que eu estou arriscando?”
E no segundo dia ele me informou: “Eu não quero mais discutir sobre isso.”
Eu costumava ir a casa dele todos os dias, foi então que orientou a esposa que me falasse: “Basta dizer-lhe que não estou em casa.” Finalmente, a esposa disse a ele: “Por que você está com medo daquele menino? Por que você se fecha no banheiro cada vez que ele vem aqui? No momento que você o vê chegando, por que fica com medo? “ Ele disse: “Você não sabe. O problema é que, ou ele tem que se casar ou eu tenho que me divorciar de você. É uma questão de vida ou morte. Você simplesmente continue dizendo que não estou em casa! ” 
No último dia antes de deixar a cidade e voltar à universidade como professor, passei em sua casa e disse para sua esposa: “Eu sei que ele estava aí o tempo todo e você sabe também por que ele não aparece para me encarar. Basta dizer-lhe que ele pode ser um defensor de longa experiência no Supremo Tribunal Federal, mas até onde eu sei, neste caso ele perdeu. Diga-lhe que ele deveria parar de se vangloriar de que nunca perdeu um caso. Ele perdeu um caso real, um caso existencial, mesmo sem um juiz. Ele era ambos ao mesmo tempo. Eu havia lhe dado a chance de ser o cliente e juiz. Ele poderia ter me enganado, ele poderia não ter sido sincero comigo. Mas eu sei que isto é muito difícil quando alguém confia tão profundamente em você….” Enquanto eu estava conversando com sua esposa, ele saiu de casa e disse:
“Simplesmente me perdoe. Você tem razão. Eu sempre estive aqui  mas eu estava com medo. Eu nunca tive medo de ninguém, mas eu estava com medo de você, porque eu não posso dizer uma mentira, quando eu olho para você, em seus olhos, a sua confiança, o seu amor por mim. Eu não posso dizer uma mentira, e eu não posso me divorciar de minha esposa. Há tanto envolvimento e há muito investimento – que eu não posso fazer isto. Minha sugestão é que você converse diretamente com seu pai e diga-lhe que não há outra maneira. Ele terá que falar diretamente com você.”
Meu pai nunca fez isso. Perguntei-lhe muitas vezes: “Por que você não pergunta sobre o meu casamento? Você tem tentado saber através de outras pessoas e maneiras; por que você não pergunta diretamente para mim? “
Ele disse: “Eu sei que a sua resposta vai criar problemas para mim. A sua resposta não vai se tornar um casamento para você, mas ela vai se tornar um pesadelo para mim. Você simplesmente esqueça este assunto. Tudo o que você quiser fazer, simplesmente faça. Se você quer se casar, case; se você não quiser, basta esquecer o assunto. Minha preocupação agora é parar com este assunto.”
O casamento é uma das instituições mais feias que homem inventou. Mas foi inventado com profunda preocupação, o valor no mercado, o ágio. Eu não suspeito desta boa vontade, eu só suspeito da sabedoria das pessoas. Sua intenção está certa, mas a sua inteligência é muito medíocre.
Um verdadeiro homem de entendimento nunca promete para amanhã, ele só pode dizer: “Por enquanto.” Um homem realmente sincero não pode prometer nada. Como ele pode prometer? Quem sabe sobre o amanhã? O amanhã talvez chegue, talvez não. Amanhã pode chegar: “Eu não serei o mesmo, você não será o mesmo.” Amanhã pode vir: “Você pode encontrar alguém com quem você se encaixe mais profundamente, eu posso encontrar alguém com quem terei mais harmonia.” O mundo é muito grande. Porque esgotá-lo hoje? Mantenha as portas abertas, mantenha as alternativas abertas.
Eu sou contra o casamento. É o casamento que cria problemas. É o casamento que se tornou muito feio. A mais feia instituição no mundo é o casamento, porque obriga as pessoas a serem falsas: eles mudaram, mas continuar fingindo que são os mesmos.
Eu tenho me hospedado com milhares de famílias – todos carregam uma certa miséria. E porque tenho sido amado por estas pessoas, os maridos sentiam confiança em abrir seu coração para mim; as mulheres podiam abrir seu coração para mim. Ambos são pessoas bonitas, mas juntos eles estão continuamente em guerra. Cada casa tornou-se um campo de batalha. E as crianças estão crescendo nessa atmosfera venenosa. Eles vão aprender as mesmas técnicas e estratégias e vão repeti-las. É assim que cada geração segue transferindo suas doenças para uma nova geração. Gerações mudam, doenças tornaram-se permanentes. Agora temos que erradicar as doenças, para que o futuro da humanidade possa ser livre de toda essa feiura. Não basta dar a isto um novo nome, é preciso mudar em seus alicerces.
Tenho vivido com muitas pessoas, em muitos lugares. Fiquei surpreso – por que as pessoas tem tanta ansiedade em criar problemas para outras pessoas? Se alguém é solteiro eles estão preocupados:  “Por que você não se casa?” – como se o casamento fosse uma lei universal que tem de ser seguida.
Por serem tão torturados, estas pessoas pensam então que é melhor se casarem, pelo menos as torturas terminarão. Mas você está enganado: uma vez que você está casado, elas começam a perguntar “Quando vai ter um bebê?“…
Tenho estado sentado em meu quarto, em silêncio por toda a minha vida. Eu não estou incomodando ninguém, “Porque você não se casa, porque você não tem filho?” eu nunca pergunto a ninguém porque não acho que é civilizado fazer tais questionamentos e consultas; , “Por que você não se casou, por que não produziu um filho?” Eu não acho que seja civilizado fazer tais perguntas, tais consultas; isto está interferindo na liberdade de alguém.
Osho, do livro: Autobiografia de um Místico Espiritualmente Incorreto.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Sobre Família, Casamento e Filhos

Pergunta: A família é o arcabouço do nosso amor e da nossa avidez, do nosso egoísmo e da nossa divisão. Que lugar tem ela (…)?

Krishnamurti: (…) A vida é uma coisa viva, uma coisa dinâmica, ativa, não podeis encerrá-la num arcabouço. São os intelectuais que põem a vida num molde (…) Em primeiro lugar, temos o fato de nossas relações com os outros, uma esposa, um marido ou um filho - as relações a que chamamos família. (…) (Novo Acesso à Vida, p. 40-41)

Pois bem, que é isso a que chamamos família? Trata-se, obviamente, de uma relação de intimidade, de comunhão. Ora, em vossa família, em vossas relações com vossa esposa, vosso marido, há comunhão? (…) Relação significa comunhão sem temor, liberdade de mútua compreensão, de comunhão direta. (…) (Idem, p. 41)

Estais em comunhão com vossa esposa? Talvez estejais, fisicamente, mas isso não é relação. Vós e vossa esposa viveis dos lados opostos de uma muralha de isolamento (…) Tendes os vossos alvos e ambições próprios e ela os seus. (…) (Idem, p. 41)

Ora, se existem relações reais entre duas pessoas, o que significa que existe comunhão entre elas, o que isso implica é de extraordinária significação. Porque então não há isolamento, há amor, e não responsabilidade ou dever. Um homem que ama, porém, não fala de responsabilidade - ele ama. Por isso partilha com alguém a sua alegria, a sua tristeza, o seu dinheiro. (…) (Novo Acesso à vida, p. 42)

Então, senhores, não é isso que está acontecendo? Em nossas famílias o que há é isolamento, e não comunhão; logo, não há amor. Amor e sexo são duas coisas diferentes (…) Se tivésseis interesse pelo próximo, se estivésseis em real comunhão com vossa esposa, com vosso marido, o mundo não estaria nesta desgraça. (…) (Idem, p. 42-43)

Como, então, quebrar esse isolamento? Para quebrarmos esse isolamento, precisamos estar cônscios dele (…) Tomai nota da maneira como tratais vossa esposa, vosso marido, vossos filhos; notai a insensibilidade, a brutalidade, as asserções tradicionais, a falsa educação(…) E, por não saberdes amar vossa esposa, vosso marido, não sabeis amar a Deus. (Idem, p. 43)

Pergunta: O casamento é necessidade ou luxo?

Krishnamurti: Examinemos (…) Por que nos casamos? Em primeiro lugar, (…) por força da necessidade biológica, do impulso sexual, que a sociedade legaliza (…) A sociedade deseja proteger a prole (…) Casamo-nos também por exigência psicológica. Preciso de um companheiro ou companheira, alguém que eu possua, e domine, e chame “meu” ou “minha”. (Da Insatisfação à Felicidade, p. 199-200)

Aqui (na Índia) o sistema matrimonial faz da mulher uma escrava, para ser protegida, dominada, governada, possuída. A mulher é uma coisa que se possui; assim como possuo bens, possuo minha mulher. Possuo-a sexualmente e a domino exteriormente. Psicologicamente, a posse me dá conforto, me dá segurança: minha propriedade, minha esposa, meus filhos (…) (Idem, p. 200)

Tratamos seres humanos como tratamos as coisas materiais, sem consideração (…) E vós bem conheceis as coisas da vida, os horrores, as agonias, os sofrimentos dos que são casados e não se amam. Como pode haver amor quando há instinto de posse? (…) (Idem, p. 200)

Como, na maioria, vivemos tão concentrados, tão absortos em nossas atividades comerciais, em ganhar dinheiro (…); como somos impiedosos no comércio e cruéis no mundo, como é possível ter amor por alguém no lar? No entanto, é o que quereis fazer, e por isso não tendes amor. (…) (Da Insatisfação à Felicidade, p. 200)

O casamento é também uma forma de perpetuação do “eu”. Desejo continuidade, através dos meus filhos. Por conseguinte, os filhos se tornam muito importantes, não por eles próprios, mas por causa de minha continuidade - meu nome, minha classe, minha casta. (…) (Idem, p. 200-201)

(…) Assim, para compreender todo esse processo humano, que é extremamente complexo e sutil, requer-se inteligência. Inteligência é também amor, e não apenas intelecto; e não podemos ter amor se, por um lado, procedemos cruelmente em nossos negócios, na vida cotidiana, e, por outro lado, procuramos ser ternos, meigos e bondosos. Não podeis fazer as duas coisas (…) (Idem, p. 201)

Só quando há amor, compaixão, que é inteligência - a forma mais elevada de inteligência - é que pode ser resolvido esse problema. (…) No momento em que nos considerarmos uns aos outros como seres humanos, como indivíduos, não como algo para ser possuído, teremos então a possibilidade de compreender e de transcender esse conflito existente entre dois cônjuges. (Idem, p. 201-202)

Pergunta: Não sois contrário ao matrimônio como instituição?

Krishnamurti: (…) A família é um processo de identificação particularista; e quando a sociedade está baseada nessa idéia da família como unidade exclusiva, em oposição a outras (…), tal sociedade (…) há de produzir violência. (…) (Que Estamos Buscando?, 1ª ed., p. 248)

Usamos a família como meio de segurança para nós mesmos. (…) Essa exclusão é chamada “amor”, e, nesse chamado estado de família ou de matrimônio, existe realmente amor? (…) Não estamos considerando o ideal do que ela deveria ser, mas (…) tal como a conhecemos. (Idem, p. 248)

Entendeis por “família”, vossa esposa e vossos filhos (…) É uma unidade (…), e nessa unidade sois vós quem tem importância - não a vossa esposa, nem os vossos filhos ou a sociedade - mas somente vós, que estais em busca de segurança, de nome, de posição, de poder, tanto na família como fora dela. (…) (Idem, p. 248-249)

Dominais a vossa esposa, e ela vos é subserviente; vós ganhais e gastais o dinheiro, ela é vossa cozinheira e a progenitora dos vossos filhos. Criais, assim, a família, que é uma unidade exclusiva (…) Por conseguinte, não pode haver reforma do coletivo enquanto vós, como indivíduo, fordes exclusivista e buscardes o auto-isolamento em cada uma de vossas ações, limitando o vosso interesse a vós mesmos. (Idem, p. 249)

Ora, esse processo de exclusão não é, por certo, amor. O amor não é criação da mente. O amor não é pessoal (…) O amor é algo que não pode ser compreendido enquanto existir o pensamento, que é exclusivista. O pensamento, que é reação da mente, nunca pode compreender o que é amor; o pensamento é invariavelmente exclusivista, separatista (…) (Que Estamos Buscando?, p. 249)

A família, como a conhecemos, (…) é exclusivista, é um processo de engrandecimento do “eu”, que é resultado do pensamento; (…) Dizemos que amamos a verdade, (…) a esposa, o esposo, os filhos; mas essa palavra está rodeada pelo fumo do ciúme, da inveja, da opressão, da dominação (…) (Idem, p. 249-250)

A solução reside, não na legislação, mas na vossa própria compreensão do problema; e o problema só é compreendido e, por conseguinte, desaparece quando há o verdadeiro amor. Quando as coisas da mente não enchem o coração (…) e a ambição individual (…) não predominam, só então conhecereis o amor. (Idem, p. 250)

Que tem o casamento a ver com isso? Fazeis do casamento um embaraço, em vez de um auxílio; tende-o como um cativeiro. No fim de tudo, ele é um processo de assimilação de experiência, não um cativeiro que vos force. Sei que ele vos aprisiona na maioria dos casos, porque não sabeis como utilizar, como assimilar a experiência dele. Tratai todos os que vos rodeiam como amigos, por intermédio de quem e com quem cresceis. (…) (Viver Harmonioso, em “Boletim Internacional da “Estrela”, de janeiro de 1931, p. 8)

Pergunta: Por que a mulher tem a propensão de se deixar dominar pelo homem? (…)

Krishnamurti: Ora, (…) Quando o marido domina, a mulher gosta disso e considera-o afeição; e quando a esposa governa o marido, ele também gosta disso. Por quê? Denota isso que a dominação proporciona certo sentimento de maior proximidade, nas relações. (…) Temeis a indiferença de vossa esposa ou de vosso marido (…) (A Arte da Libertação, p. 75)

E esse domínio dá um sentimento de relação, esse domínio gera o ciúme: se não me dominais, é porque estais com os olhos noutra pessoa. (…) Senhor, o homem que ama não é ciumento. O ciúme é coisa do cérebro, mas o amor não pertence ao cérebro; e onde há amor não há domínio. Quando amais alguém, não sois dominante, sois parte dessa pessoa. Não há separação, mas completa integração. É o cérebro que separa, e cria o problema da dominação. (Idem, p. 76)

Pergunta: Quais são os deveres de uma esposa?

Krishnamurti: (…) Neste país (Índia), o marido é o patrão; ele é a lei, o senhor, porque economicamente dominante, e é ele quem diz quais são os deveres de uma esposa. Podemos considerar o problema do ponto de vista do marido ou da esposa. (A Arte da Libertação, p. 42-43)

Se considerarmos o problema da esposa, vemos que, porque não é livre, economicamente, a sua educação é limitada (…); e a sociedade lhe impôs regras e modos de conduta estabelecidos por homens. (…) (Idem, p. 43)

Portanto, ela aceita o que se convencionou chamar direitos do marido; e como este é quem domina, por ser economicamente livre e ter capacidade para gastar dinheiro, quem dita a lei é ele. (…) Quando o marido exige os seus direitos e quer uma esposa “cumpridora de seus deveres” (…) a relação entre os dois não passa evidentemente de contrato mercantil. (…) (Idem, p. 43)

Enquanto as relações estiverem baseadas em contrato, em dinheiro, em posse, autoridade ou dominação, elas serão, forçosamente, questão de direitos e deveres. É evidente a extrema complexidade das relações, quando elas resultam de um contrato, em que se estipula o que é correto, o que é incorreto e o que é o dever. (A Arte da Libertação, p. 43)

Mas não haverá uma outra maneira de considerar esse problema? Isto é, quando há amor, não há nenhum dever. Quando amais vossa esposa, vós lhe dais participação em tudo - na vossa propriedade, nas vossas tribulações, vossas ansiedades e vossas alegrias. Não a dominais: não sois o homem e ela a mulher, para ser usada e posta de parte, uma espécie de máquina procriadora. (…) (Idem, p. 44)

Se o homem que não tem amor no coração, fala em direitos e deveres, e, neste país, direitos e deveres tomaram o lugar do amor. Vossa esposa não tem participação em vossa responsabilidade (…) porque considerais a mulher menos importante do que vós, como coisa para ser guardada e usada sexualmente, segundo vossa conveniência, quando o apetite o exigir. (Idem, p. 44)

Sem amor, não percebo a utilidade de se terem filhos. Sem amor criamos filhos feios, imaturos, incapazes de pensar; (…) porque nunca se lhes deu afeição, porque só serviram de brinquedo e de divertimento, e para conservar o vosso nome. (A Arte da Libertação, p. 44-45)

Para que venha a existir uma nova sociedade, uma nova civilização, não deve evidentemente haver dominação nem por parte do homem nem por parte da mulher. A dominação existe em virtude da pobreza interior. (…) (Idem, p. 45)

Certamente, só sentimento afetuoso, o calor do amor, pode implantar uma nova condição, uma nova civilização. O cultivo do coração - não é um processo da mente. A mente não pode cultivar o coração; mas, quando é compreendido o processo a mente, surge então o amor. (…) (Idem, p. 45)

Pergunta: O casamento é necessário para as mulheres?

Krishnamurti: Não sei por que será mais necessário para as mulheres do que o é para os homens. (…) Vamos tentar compreender o problema do matrimônio, o qual implica relações de sexo, amor, camaradagem e comunhão. Evidentemente, não havendo amor, torna-se o matrimônio uma ignomínia. Torna-se, puramente, um meio de satisfação. (…) (Uma Nova Maneira de Viver, p. 219-220)

E só existe amor quando o ego está ausente. Ao considerar o matrimônio, se ele é necessário ou não, é preciso primeiro compreender o amor. O amor é casto, e sem amor não podeis ser casto; um indivíduo pode (…) ser celibatário, mas isso não significa que seja casto, puro, se não houver amor. ( … ) (Idem, p. 220)

(…) E, visto como à maioria das mulheres é negado o amor, buscam elas o preenchimento nas coisas ou nos filhos. Dessarte, as coisas e os filhos assumem toda a importância para as mulheres, enquanto o homem busca o preenchimento no trabalho e nas atividades. (…) E por essa razão dou valor às coisas, às relações, às idéias. Atribuo-lhes valor superior ao que têm (…) (Idem, p. 221)

(…) Podeis ter filhos, mas não existe amor, porque vós e vossa esposa estais isolados. Estais escondidos atrás de uma parede por vós mesmos edificada (…) e para haver essa comunhão é necessário o amor. (…) Quando há amor, há castidade, pureza, incorruptibilidade. (Idem, p. 222-223)

É só para os poucos (…) que amam, que as relações matrimoniais têm significado; então, elas são inquebrantáveis, não representam mero hábito ou conveniência, nem estão baseadas na necessidade biológica, na necessidade sexual. (A Arte da Libertação, p. 232-233)

Nesse amor, que é incondicional, as identidades se fundem (…) Para que haja a fusão de duas entidades separadas, tendes de conhecer a vós mesmo, e ela, a si mesma. Isso significa amar. (Idem, p. 233)

Só há castidade quando há amor. Quando existe o amor, não existe o problema do sexo; (…) Senhor, isso significa que tereis de submeter vosso coração e vossa mente a uma intensa busca, da qual resultará uma transformação em vosso interior. O amor é casto; e quando existe amor (…) então o sexo já não é um problema e tem significação inteiramente diversa. (Idem, p. 237)

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

O chamado amor, não passa de auto-interesse

Questionador: O amor, tal como o conhecemos e vivenciamos, é uma fusão entre duas pessoas, ou entre os membros de um grupo; ele é excludente e há nele tanto a dor como alegria. Quando o senhor diz que o amor é a única solução para os problemas da vida, está dando à palavra uma conotação que dificilmente vivenciamos. Um homem comum como eu pode conhecer o amor no sentido que o senhor lhe dá?

Krishnamurti: Todos podem conhecer o amor, mas só quando são capazes de encarar os fatos com grande clareza, sem resistência, sem justificação, sem a explicação que os destrói — apenas olhe as coisas com muita atenção, observe-as com muita clareza e minuciosamente. Ora, o que é aquilo a que damos o nome de amor? A pessoa que fez a pergunta diz que ele é excludente e que, nele, conhecemos a dor e a alegria. O amor é excludente? Descobriremos quando examinarmos aquilo que denominamos amor, o que o chamado homem comum denomina amor. Não existe o homem comum. Há apenas o homem, que é você e eu. O homem comum é uma entidade fictícia inventada pelos políticos. Há apenas o homem, que é você e eu, que estamos em aflição, com dor, com ansiedade, com medo.

Ora, o que é a nossa vida? Para descobrir o que é o amor, comecemos com o que sabemos. O que é o nosso amor? Em meio à dor e ao prazer, sabemos que ele é excludente, pessoal minha mulher, meus filhos, meu país, meu Deus. Conhecemo-lo como uma chama em meio à fumaça, conhecemo-lo por meio da perda quando o outro se vai. Logo, conhecemos o amor como sensação, não é verdade? Quando dizemos que amamos, conhecemos o ciúme, conhecemos o medo, conhecemos a ansiedade. Quando vocês dizem que amam alguém, tudo isso está envolvido: a inveja, o desejo de possuir, de ter, de dominar, o medo de perder e assim por diante. Tudo isso chamamos de amor, e não conhecemos o amor sem medo, sem invejam, sem posse; simplesmente verbalizamos o estado do amor sem medo; dizendo ser ele impessoal, puro, divino ou Deus sabe mais o que, porém, o fato é que somos ciumentos, somos dominadores, somos possessivos. Só conheceremos esse estado do amor quando o ciúme, a inveja, a possessividade, o domínio, chegarem ao fim; e enquanto possuirmos, jamais amaremos.

A inveja, a posse, o ódio, o desejo de dominar a pessoa ou coisa qualificada de meu, o desejo de possuir e de ser possuído — tudo isso é um processo de pensamento, não? O amor é um processo do pensamento?  O amor é uma coisa da mente? Na realidade, para a maioria de nós, ele é. Não digam que não — é um absurdo fazê-lo. Não neguem o fato de que o seu amor é uma coisa da mente. Ele por certo é; do contrário, vocês não possuiriam, vocês não dominariam, vocês não diriam “é meu”. Como vocês dizem, o amor de vocês é uma coisa da mente; assim, o amor, para vocês, é um processo de pensamento. Vocês podem pensar na pessoa a quem amam, mas pensar na pessoa a quem ama é amor? Quando vocês pensam na pessoa a quem amam? Vocês pensam nela quando ela se foi, quando ela está longe, quando ela os deixou. Mas quando ela não os perturba mais, quando vocês podem dizer “ela é minha”, vocês não têm de pensar nela. Vocês não têm de pensar nos seus móveis; eles são partes de vocês — o que constitui um processo de identificação destinado a evitar que vocês sejam perturbados, a evitar problemas, ansiedade, tristeza. Assim, vocês só sentem falta da pessoa a quem dizem amar quando estão perturbados, quando estão sofrendo; e enquanto possuem a pessoa, vocês não têm de pensar nela, porque na posse não há distúrbio. Mas quando a posse é perturbada, vocês começam a pensar e dizem “eu amo essa pessoa”. Logo, seu amor é uma mera reação da mente, não é? O que significa que o seu amor não passa de uma sensação, e a sensação sem dúvida não é amor. Vocês pensam na pessoa quando vocês estão juntos? Quando vocês possuem, retêm, dominam, controlam, quando podem dizer “ela é minha” ou “ele é meu”, não há problema. E a sociedade, tudo quanto vocês construírem ao redor de si mesmos, os ajuda a possuir para evitar que vocês sejam perturbados, para vocês não pensarem nisso. O pensamento vem quando vocês estão perturbados — e vocês estão fadados a ser perturbados enquanto seu pensamento for aquilo que chamam de amor.

O amor com certeza não é uma coisa da mente. É porque as coisas da mente ocuparam o nosso coração que não temos amor. As coisas da mente são o ciúme, a inveja, a ambição, o desejo de ser alguém, alcançar o sucesso. Essas coisas da mente tomam conta do coração de vocês, e vocês dizem então que amam; mas como podem amar se têm no coração todos esses elementos geradores de confusão? Quando há fumaça, como pode haver uma chama pura? O amor não é uma coisa da mente e é a única solução dos nossos problemas. O amor não é da mente, e o homem que acumulou dinheiro ou conhecimento nunca pode conhecer o amor, pois vive com as coisas da mente; suas atividades são da mente e tudo aquilo que toca ele transforma num problema, numa confusão, numa tortura.

Logo, o que chamamos de nosso amor é uma coisa da mente. Olhem para si mesmos e verão que o que estou dizendo é obviamente verdadeiro; do contrário, nossa vida, nosso casamento, nossos relacionamentos seriam totalmente diferentes; teríamos uma nova sociedade. Ligamo-nos aos outros não por meio de uma fusão, mas de um contrato chamado de amor, casamento. O amor não funde nem ajusta — não é pessoa nem impessoal: é um estado de ser. O homem que deseja fundir-se com algo maior, unir-se a outra pessoa, está evitando a angústia, a confusão; mas a mente ainda se encontra em separação, que significa desintegração. O amor não conhece a fusão nem a difusão; ele não é pessoal nem impessoal; é um estado de ser que a mente não pode encontrar — ela pode descrevê-lo, designá-lo por um termo, nomeá-lo, mas a palavra, a descrição, não é o amor.

Só quando a mente se aquietar conheceremos o amor, e esse estado de quietude não é algo a ser cultivado. Cultivar ainda é ação da mente; a disciplina ainda é produto da mente, e uma mente disciplinada, controlada, subjugada, uma mente que resiste, explica, não pode conhecer o amor. Vocês podem ler, podem escutar o que está sendo dito sobre o amor, mas isso não é o amor. Só quando vocês dão fim às coisas da mente, só quando seu coração está livre das coisas da mente, há amor. E vocês vão então saber o que é amar sem separação, sem distância, sem tempo, sem medo — e isso não está reservado a uns poucos. O amor não conhece hierarquias; há somente amor. Só há os muitos e o um, a exclusão, quando não se ama. Quando se ama, não existe o “você” nem o “eu”. Nesse estado, há apenas uma chama sem fumaça.

Jiddu Krishnamurti — Bombaim, 12/03/1950

domingo, 11 de agosto de 2013

Um olhar sobre o ego, o sexo e as relações

Você provou aquele estado em que não existe "ego", ainda que por alguns segundos, por um dia, ou como seja; e onde está o "ego" está o conflito, o sofrimento, a luta. Por isso, existe o constante desejo de repetição daquele estado livre do "ego". Mas, o problema central é o conflito, em diferentes níveis, e como renunciar ao "ego". Você procura a felicidade, esse estado de isenção do "ego" com todos os seus conflitos, o qual você encontra momentaneamente no ato sexual. Ou você se disciplina, luta, controla, ou mesmo, se destrói pelo refreamento; o que significa que está procurando se libertar do conflito, orque, com a cessação do conflito, há deleite. Se podemos ficar livres do conflito, temos a felicidade em todos os diferentes níveis da existência. 

O que é que faz vir o conflito? Como surge esse conflito, no seu trabalho, nas suas relações, no ensinar, em todas as coisas? Até mesmo quando você escreve um poema, até mesmo quando canta, pinta, existe conflito. Como se origina esse conflito? Ele origina-se do desejo de "vir a ser"? Você pinta, deseja expressar-se pela cor, deseja ser o melhor pintor do mundo. Estuda e se preocupa, e espera que o mundo aplauda a sua arte. Mas, sempre que há o desejo de "vir a ser" "o mais...", tem de haver conflito. É o impulso psicológico que exige "o mais..." O desejo de ser "o mais..." é psicológico; esse desejo existe quando a psique, a mente, está empenhada em "vir a ser", em procurar, em perseguir um determinado fim, um determinado resultado. Quando você deseja ser uma Mahatma, quando deseja ser um santo, quando deseja compreender, quando pratica a virtude, quando tem consciência de classe, como entidade "superior", quando se serve das suas faculdades para o seu próprio engrandecimento — tudo isso, evidentemente, é indício de uma mente interessada no "vir a ser". E, por conseguinte, tanto mais conflito há de existir. Uma mente que está à procura do "mais...", não está consciente do "que é", porquanto vive sempre no "mais" — no que lhe agradaria ser, e nunca no "que é". Enquanto você não dissolver todo o conteúdo daquele conflito, essa libertação do "ego", por meio do sexo (ou de outro fator), continuará a ser um problema medonho. 

Senhor, o "ego" não é uma entidade objetiva que se possa estudar ao microscópio, ou aprender nos livros, ou compreender por meio de citações de palavras de outros, por mais poderosas que sejam tais citações. Ele só pode ser compreendido na vida de relação. Afinal de contas, o conflito existe nas relações, seja nas relações com a propriedade, com uma ideia, com sua esposa, ou com o seu vizinho; e sem se resolver esse conflito fundamental, o apegar-nos a esta única forma de libertação, por meio do sexo, é obviamente um indício de desequilíbrio. É isso, exatamente, o que acontece conosco. Estamos desequilibrados, porque fizemos do sexo a nossa única via de fuga; e a sociedade, a chamada civilização moderna, ajuda-nos nesse sentido. Considere os anúncios, os cinemas, os gestos sugestivos, as posturas, as aparências. 

A maioria de vocês se casaram ainda muito jovens, quando ainda muito poderoso o impulso biológico. Tomaram uma esposa ou um marido, e com essa esposa ou marido vocês têm, de qualquer maneira, de passar o resto da vida. Suas relações são unicamente físicas, e tudo o mais tem de se lhe ajustar.E que acontece, então? Você é, porventura, intelectual, e sua esposa altamente sentimental. Onde está a comunhão com ela? Ou ela é muito prática e você é sonhador, vago, um tanto indiferente. Onde está o seu contato com ela? Você é "super-sexual", ela não; mas você se serve dela, porque tem seus direitos. Como pode haver comunhão entre você e ela, quando você se serve dela? Os casamentos, hoje em dia, estão baseados nessa ideia, nesse impulso; mas começam a surgir contradições e conflitos cada vez mais numerosos, na vida conjugal, e daí o divórcio. 

Esse problema, pois, requer um manejo inteligente, o que significa que temos de alterar toda a base de nossa educação, e isso requer compreensão, não só dos fatos da vida, mas da nossa existência de cada dia; requer, não apenas que se conheça e se compreenda o impulso biológico, o impulso sexual, mas também que se veja a maneira de atender a ele inteligentemente. Mas, na atualidade, não procedemos assim, não é verdade? É um assunto proibido, uma coisa secreta, de que só se fala entre quatro paredes. Na época em que o impulso é mais poderoso, e sem consideração de mais nada, juntamo-nos um ao outro para o resto da vida. Veja o que o indivíduo faz a si próprio e ao outro. 

Como pode o indivíduo intelectual harmonizar-se, comungar, com o sentimental, o pouco inteligente ou o ignorante? Que comunhão pode haver, então, além do sexo? A dificuldade de tudo isso consiste em que o preenchimento do impulso sexual, do impulso biológico, torna necessárias certas regras sociais; por isso, existem as leis relativas ao casamento. Vocês dispõem de todos os meios de possuir aquilo que lhes proporciona prazer, segurança, conforto; mas, o que dá prazer constante embota a mente. Assim como o sofrimento constante insensibiliza a mente, assim também o prazer constante murcha a mente e o coração. 

E como você pode ter amor? Positivamente, o amor não é coisa da mente. O amor não é o mero ato sexual, ou você acha que é? O amor é algo que a mente não pode, de forma nenhuma, conceber. O amor é algo que não se pode formular. E, sem amor, vocês contraem relações, sem amor vocês se casam. E depois, na vida conjugal, "vocês se ajustam um ao outro". Bela frase! Vocês se justam um ao outro, e isso, mais uma vez, é um processo intelectual, não? Ela casou-se com você, mas você é uma repulsiva massa de carnalidade, dominado por suas paixões. Ela é obrigada a conviver com você. Detesta a casa, o ambiente, o horrível de tudo isso, a sua brutalidade, mas diz: "sou casada e tenho de conformar-me com isso". Assim, como meio de autoproteção, ela cede e, com o tempo, começa a dizer "eu te amo". Veja que, quando, pelo desejo de segurança, nós nos conformamos com algo feio, esse feio começa a parecer-nos belo, visto que isso é uma forma de autoproteção; se assim não fosse, seríamos magoados, poderíamos ser totalmente destruídos. Vemos, pois, que p que era feio, horrendo, gradualmente se tornou belo. 

Tal ajustamento é, evidentemente, um processo mental. Todos os ajustamentos o são. Mas o amor, por certo, é incapaz de ajustamento. Vocês o sabem, Senhores, (não é verdade?) que, se amam alguém, não existe "ajustamento". O que há é completa fusão. É só quando não existe amor que começamos a ajustar-nos. E esse ajustamento se chama matrimônio. Daí resulta o fracasso do casamento, porque ele é a própria fonte de conflito, uma batalha entre duas pessoas. Esse problema é extraordinariamente complexo, como todos os problemas, mas esse o é mais, porque se trata de apetites e impulsos grandemente poderosos. 

Nessas condições, uma mente que está apenas a ajustar-se nunca pode ser casta. Uma mente que busca felicidade no sexo, nunca será casta. Embora haja, por momentos, nesse ato, a abdicação do "ego", o esquecimento próprio, o desejo mesmo dessa felicidade, que é produto da mente, faz a mente impura. A castidade só existe quando há amor; sem amor, não há castidade. E o amor não é coisa susceptível de cultivar-se. Só há amor quando há o completo esquecimento de si mesmo, pelo indivíduo, e para que tenha a ventura desse amor, precisa o indivíduo ficar livre, pela compreensão da vida de relação. Então, havendo o amor, tem o ato sexual significação inteiramente diferente. Esse ato não é, então, uma fuga, um hábito. O amor não é um ideal: o amor é um estado. Não pode haver amor onde há "vir a ser". Só onde está o amor está a castidade, a pureza; mas uma mente que "vem a ser" ou tenta "vir a ser" casta, não tem amor. 

Jiddu Krishnamurti — O que te fará feliz?       

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Torne-se consciente de seu medo da liberdade

“Olhe uma rosa: ela é bela, mas não existe liberdade alguma de florescer ou não florescer. Não existe problema, não existe escolha. A flor não pode dizer, ‘Eu não quero florescer’, ou ‘Eu me recuso’. Ela nada tem a dizer, nenhuma liberdade. É por isso que a natureza é tão silenciosa (…)

Com o surgimento do homem, pela primeira vez aparece a liberdade. O homem tem a liberdade de ser ou não ser. Por outro lado, surge a angústia, o medo de que ele possa ou não ser capaz, medo do que vai acontecer. Existe um tremor profundo. Todo momento é um momento em suspense. Nada é seguro ou certo, nada é previsível com o homem: tudo é imprevisível.

Nós conversamos a respeito da liberdade, mas ninguém gosta de liberdade. Nós falamos sobre liberdade, mas criamos escravidão. Toda liberdade nossa é apenas uma troca de escravidão. Nós seguimos mudando de uma escravidão para outra, de um cativeiro para outro. Ninguém gosta de liberdade porque liberdade cria medo. Com a liberdade você tem que decidir e escolher. Nós preferimos pedir a alguém ou a alguma coisa para nos dizer o que fazer – à sociedade, ao guru, às escrituras, à tradição, aos pais. Alguém deve nos dizer o que fazer: alguém deve mostrar o caminho, para que possamos seguir – mas nós não conseguimos nos mover por nós mesmos. A liberdade existe, mas existe o medo.

É por isso que existem tantas religiões. Não é por causa de Jesus, de Buda ou de Krishna. É por causa de um enraizado medo da liberdade. Você não consegue ser simplesmente um homem. Você tem que ser um hindu, um muçulmano ou um cristão. Apenas por ser um cristão, você perde a sua liberdade; sendo um hindu, você não é mais um homem – porque agora você diz, ‘eu seguirei uma tradição. Eu não vou caminhar no inexplorado, no desconhecido. Eu seguirei num caminho bem marcado com pegadas. Eu caminharei atrás de alguém; eu não seguirei sozinho. Eu sou um hindu, assim eu seguirei com uma multidão; eu não caminharei como um indivíduo. Se eu me mover como um indivíduo, sozinho, haverá liberdade. Então, a todo momento eu terei que decidir, eu terei que gerar a mim mesmo, a todo momento estarei criando a minha alma. E ninguém mais será responsável: somente eu serei o responsável final.’

Nietzche disse ‘Deus está morto e o homem está totalmente livre.’ Se Deus está realmente morto, então o homem está totalmente livre. E o homem não tem tanto medo da morte de Deus: ele tem muito mais medo da sua liberdade. Se existe um Deus, então tudo está bem. Se não existe Deus, então você foi deixado totalmente livre – condenado a ser livre. Agora faça o que você gosta e sofra as conseqüências, e ninguém mais será responsável, só você.

Erich Fromm escreveu um livro chamado ‘O Medo da Liberdade’. Você se apaixona e começa a pensar em casamento. O amor é uma liberdade; o casamento é uma escravidão. Mas é difícil encontrar uma pessoa que se apaixona e não pense imediatamente em casamento. Existe o medo porque o amor é uma liberdade. O casamento é uma coisa segura; nele não existe medo. O casamento é uma instituição – morta; o amor é um evento – vivo. Ele se move; ele pode mudar. O casamento nunca se move, nunca muda. Por causa disso o casamento tem uma certeza, uma segurança.

O amor não tem certeza nem segurança. O amor é inseguro. A qualquer momento ele pode sumir de vista da mesma forma como apareceu do nada. A qualquer momento ele pode desaparecer! Ele é muito sobrenatural; ele não tem raízes na terra. Ele é imprevisível. Por isso, ‘é melhor casar. Assim, fincamos raízes. Agora esse casamento não vai evaporar no nada. Ele é uma instituição!’

Em toda situação – exatamente como no amor –, quando encontramos liberdade, nós a transformamos em escravidão. E quanto mais cedo melhor! Assim nós podemos relaxar. Por isso, toda história de amor termina em casamento. ‘Eles se casaram e viveram felizes para sempre.’

Ninguém está feliz, mas é bom terminar a história ali porque em seguida vai começar o inferno. Por isso toda história termina no momento mais bonito. E qual é esse momento? É quando a liberdade se torna escravidão! E isso não é apenas com o amor: isso é com tudo. Assim o casamento é uma coisa feia; é provável que venha a ser. Toda instituição tende a ser uma coisa feia porque ela é apenas um corpo morto de algo que um dia foi vivo. Mas com uma coisa viva, a incerteza provavelmente estará presente.

‘Vivo’ quer dizer que pode mover, pode mudar, pode ser diferente. Eu amo você; no próximo momento eu posso não amar. Mas se eu sou o seu marido, ou sua esposa, você pode ter a certeza de que no próximo momento eu também serei seu marido, ou sua esposa. Isso é uma instituição. Coisas mortas são muito permanentes; coisas vivas são momentâneas, mutáveis, estão num fluxo.

O homem tem medo de liberdade, mas a liberdade é a única coisa que faz de você um homem. Assim, nós somos suicidas – ao destruir nossa liberdade. E com essa destruição nós estamos destruindo toda nossa possibilidade de ser. Então você acha que ter é bom porque ter significa acumular coisas mortas. Você pode continuar acumulando; não existe um fim para isso. E quanto mais acumula, mais seguro você fica.

Eu digo que agora o homem tem que caminhar conscientemente. Com isso eu quero dizer que você tem que estar consciente de sua liberdade e também consciente de seu medo da liberdade.

Como usar essa liberdade? A religião nada mais é do que um esforço no sentido da evolução consciente, em saber como usar essa liberdade. O esforço de sua vontade agora é significativo. Qualquer coisa que você esteja fazendo não voluntariamente é apenas parte do passado na escala da evolução. O seu futuro depende de seus atos com vontade. Um ato muito simples feito com consciência, com vontade, dá a você um certo crescimento – ainda que seja um ato comum.

Por exemplo, você resolve jejuar, mas não porque você não tem comida. Você tem comida; você pode comê-la. Você tem fome; você pode comer. Você resolve jejuar: isso é um ato voluntário – um ato consciente. Nenhum animal pode fazer isso. Um animal jejua algumas vezes, quando não existe fome. Um animal terá que jejuar quando não existir alimento. Mas somente o homem pode jejuar quando existe ambos: a fome e o alimento. Isso é um ato voluntário. Você usa a sua liberdade. A fome não consegue incitar você. A fome não consegue empurrar você e o alimento não consegue puxar você.

Esse jejum é um ato de sua vontade, um ato consciente. Isso dará a você mais consciência. Você sentirá uma liberdade sutil: livre do alimento, livre da fome – na verdade, no fundo, livre do seu corpo, e ainda mais fundo, livre da natureza. A sua liberdade cresce e a sua consciência cresce.

Na medida que sua consciência cresce, a sua liberdade cresce. Elas são correlacionadas. Seja mais livre e você será mais consciente; seja mais consciente e você será mais livre.”

Osho

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Na negação do que não é amor, existe amor

O que é o amor? Não estamos discutindo teorias sobre o que o amor deveria ser. Estamos observando o que chamamos de amor: “Amo a minha mulher.” Não sei o que é que você ama; e duvido que você ame algo. Sabe o que significa amar? Será que o amor é prazer? O amor é ciúme? Um homem ambicioso é capaz de amar? – ele pode dormir com a mulher, gerar alguns filhos. E um homem que esteja lutando para se tornar importante na política, ou no mundo dos negócios, ou no mundo da religião (onde deseja se tornar um santo, deseja ser sem desejo), tudo isso faz parte da ambição, da agressão, do desejo. O homem competitivo é capaz de amar? E vocês todos são competitivos, não é verdade? – melhor emprego, melhor posição, melhor casa, ideias mais nobres, imagens mais perfeitas de si mesmos; vocês conhecem bem as situações por que passam. Isso é amor? Você é capaz de amar ao passar por toda essa tirania, quando pode dominar sua mulher ou seu marido, ou os seus filhos? Quando você está buscando o poder, há possibilidade de amar?

Portanto, na negação do que não é amor, existe amor. Entendem senhores? Precisam negar tudo que não seja amor, o que significa não ter ambição, não ser competitivo, não ser agressivo, não ser violento nem na fala, nem em ato, nem em pensamento. Quando você nega o que não é amor, então sabe o que é amor.(1)

Quando as coisas da mente não enchem seu coração, então existe amor; e só o amor pode transformar a loucura e a insanidade atuais no mundo – nunca sistemas, nunca teorias, nem da esquerda nem da direita. Você só ama realmente quando não possui, quando não é invejoso, não é ávido, quando é respeitoso, quando tem misericórdia e compaixão, quando tem consideração por sua mulher, seus filhos, seu vizinho, seus infelizes empregados.

Não se pode pensar sobre o amor, o amor não pode ser cultivado, o amor não pode ser praticado. A prática do amor, a prática da fraternidade, ainda está dentro do campo da mente, portanto, não é amor. Quando tudo isso tiver cessado, então o amor surgirá, e você saberá o que é amar.(2)

Pergunta: É possível um homem e uma mulher viverem juntos, ter sexo e filhos, sem toda a confusão, amargura e conflito inerentes a tal relação? É possível haver liberdade em ambos os lados? Não quero dizer com liberdade que o marido ou a esposa deveriam ter constantemente casos com outras pessoas. As pessoas em geral ficam juntas e casam por que se apaixonam, e nisso existe desejo, escolha, prazer, possessividade e tremendo esforço. A própria natureza deste estado apaixonado está desde o início cheia das sementes do conflito.

Krishnamurti: É isso? Precisa ser? Duvido muito disso. Você não pode se apaixonar e não ter uma relação possessiva? Amo alguém e ela me ama e nos casamos – isso tudo é perfeitamente honesto e simples, não há absolutamente conflito nisso. (Quando digo que nos casamos, quero dizer apenas que decidimos viver juntos – não se prenda em palavras.) A pessoa não pode ter isso sem a outra coisa, sem a cauda por assim dizer, necessariamente em seguida? Não podem duas pessoas estar amando e ambas serem tão inteligentes e tão sensíveis que exista liberdade e ausência de um centro que trabalha para o conflito? O conflito não está no sentimento de amar. O sentimento de estar amando é totalmente sem conflito. Não há perda de energia em estar amando. A perda de energia está na cauda, em tudo que vem em seguida – ciúme, possessividade, suspeita, dúvida, o medo de perder aquele amor, a demando constante por reafirmação e segurança. Certamente deve ser possível funcionar numa relação sexual com alguém que você ama sem o pesadelo que em geral se segue. Claro que é possível.(3)

Sabe, de fato não temos amor – essa é uma coisa terrível de se perceber. De fato não temos amor; temos sentimento; temos emocionalismo, sensualidade, sexualidade, temos lembranças de alguma coisa que pensamos que era amor. Mas de fato, brutalmente, não temos amor. Porque ter amor significa não ter violência, nem medo, nem competição, nem ambição. Se você teve amor, nunca dirá, "Esta é minha família." Você pode ter uma família e lhe dar o melhor que pode; mas ela não será "sua família" que está em oposição ao mundo. Se você ama, se existe amor, existe paz. Se você amasse, educaria seu filho não para ser nacionalista, não para ter apenas uma profissão técnica e tratar apenas de seus pequenos assuntos; você não teria nacionalidade. Não haveria divisões de religião, se você amasse. Mas como essas coisas de fato existem – não teoricamente, mas brutalmente – este mundo hediondo, mostra que você não tem amor. Mesmo o amor da mãe por seu filho não é amor. Se a mãe realmente amasse seu filho, você acha que o mundo seria assim? Ela cuidaria que ele tivesse o alimento correto, a educação correta, que fosse sensível, que apreciasse a beleza, que não fosse ambicioso, ganancioso, invejoso. Então a mãe, conquanto ela possa pensar que ama seu filho, não ama. Então não temos esse amor.(4)

A necessidade de segurança nas relações gera inevitavelmente o sofrimento e o medo. Essa busca de segurança, atrai a insegurança. Já encontrastes alguma vez segurança em alguma de vossas relações? Já? A maioria de nós quer a segurança de amar e ser amado, mas existirá amor quando cada um está a buscar a própria segurança, seu caminho próprio? Nós não somos amados porque não sabemos amar.

Que é o amor? Esta palavra está tão carregada e corrompida, que quase não tenho vontade de empregá-la. Todo o mundo fala de amor - toda a revista e jornal e todo missionário discorre interminavelmente sobre o amor. Amo a minha pátria, amo o prazer, amo a minha esposa, amo a Deus. O amor é uma idéia? Se é, pode então ser cultivado, nutrido, conservado com carinho, moldado, torcido de todas as maneiras possíveis. Quando dizeis que amais a Deus, que significa isso ? Significa que amais uma projeção de vossa própria imaginação, uma projeção de vós mesmo, revestida de certas formas de respeitabilidade, conforme o que pensais ser nobre e sagrado; o dizer "Amo a Deus" é puro contra-senso. Quando adorais a Deus, estais adorando a vós mesmo; e isso não é amor.

Incapazes, que somos, de compreender essa coisa humana chamada amor, fugimos para as abstrações. O amor pode ser a solução final de todas as dificuldades, problemas e aflições humanas. Assim, como iremos descobrir o que é o amor? Pela simples definição? A igreja o tem definido de uma maneira, a sociedade de outra, e há também desvios e perversões de toda a espécie. A adoração de uma certa pessoa, o amor carnal, a troca de emoções, o companheirismo - será isso o que se entende por amor? Essa foi sempre a norma, o padrão, que se tornou tão pessoal, sensual, limitado, que as religiões declararam que o amor é muito mais do que isso. Naquilo que denominam "amor humano", vêem elas que existe prazer, competição, ciúme, desejo de possuir, de conservar, de controlar, de influir no pensar de outrem e, sabendo da complexidade dessas coisas, dizem as religiões que deve haver outra espécie de amor - divino, belo, imaculado, incorruptível.

(...) Pode o amor ser dividido em sagrado e profano, humano e divino, ou só há amor? O amor é para um só e não para muitos? Se digo "Amo-te", isso exclui o amor do outro? O amor é pessoal ou impessoal? Moral ou imoral? Familial ou não familial? Se amais a humanidade, podeis amar o indivíduo? O amor é sentimento? Emoção ? O Amor é prazer e desejo ? Todas essas perguntas indicam - não é verdade? - que temos idéias a respeito do amor, idéias sobre o que ele deve ou não deve ser, um padrão, um código criado pela cultura em que vivemos.

Assim, para examinarmos a questão do amor - o que é o amor - devemos primeiramente libertar-nos das incrustações dos séculos, lançar fora todos os ideais e ideologias sobre o que ele deve ou não deve ser. Dividir qualquer coisa em o que deveria ser e o que é, é a maneira mais ilusória de enfrentar a vida.

Ora, como iremos saber o que é essa chama que denominamos amor - não a maneira de expressá-lo a outrem, porém o que ele próprio significa? Em primeiro lugar rejeitarei tudo o que a igreja, a sociedade, meus pais e amigos, todas as pessoas e todos os livros disseram a seu respeito, porque desejo descobrir por mim mesmo o que ele é. Eis um problema imenso, que interessa a toda humanidade; há milhares de maneiras de defini-lo e eu próprio me vejo todo enredado neste ou naquele padrão, conforme a coisa que, no momento, me dá gosto ou prazer. Por conseguinte, para compreender o amor, não devo em primeiro lugar libertar-me de minhas inclinações e preconceitos?(5)

(1) Krishnamurti. Mind in Meditation, pp 10-11
(2) Krishnamurti. The First and Last Freedom, p 234
(3) Krishnamurti Foudation Trust Bulletin 3, 1969 Krishnamurti Foudation Trust Bulletin 4, 1969
(4) Krishnamurti. The Collected Works, Vol. XV Varanasi 5th Public Talk 28th November 1964
(5) Krishnamurti - Liberte-se do passado - Editora Cultrix

O conflito não está no sentimento de amar

Pergunta: É possível um homem e uma mulher viverem juntos, ter sexo e filhos, sem toda a confusão, amargura e conflito inerentes a tal relação? É possível haver liberdade em ambos os lados? Não quero dizer com liberdade que o marido ou a esposa deveriam ter constantemente casos com outras pessoas. As pessoas em geral ficam juntas e casam por que se apaixonam, e nisso existe desejo, escolha, prazer, possessividade e tremendo esforço. A própria natureza deste estado apaixonado está desde o início cheia das sementes do conflito.

Krishnamurti: É isso? Precisa ser? Duvido muito disso. Você não pode se apaixonar e não ter uma relação possessiva? Amo alguém e ela me ama e nos casamos – isso tudo é perfeitamente honesto e simples, não há absolutamente conflito nisso. (Quando digo que nos casamos, quero dizer apenas que decidimos viver juntos – não se prenda em palavras.) A pessoa não pode ter isso sem a outra coisa, sem a cauda por assim dizer, necessariamente em seguida? Não podem duas pessoas estar amando e ambas serem tão inteligentes e tão sensíveis que exista liberdade e ausência de um centro que trabalha para o conflito? O conflito não está no sentimento de amar. O sentimento de estar amando é totalmente sem conflito. Não há perda de energia em estar amando. A perda de energia está na cauda, em tudo que vem em seguida – ciúme, possessividade, suspeita, dúvida, o medo de perder aquele amor, a demando constante por reafirmação e segurança. Certamente deve ser possível funcionar numa relação sexual com alguém que você ama sem o pesadelo que em geral se segue. Claro que é possível.

Krishnamurti Foudation Trust Bulletin 3, 1969 Krishnamurti Foudation Trust Bulletin 4, 1969

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Amar é estar em comunicação com alguém

O casamento como costume, como cultivo do prazer habitual, é um fator de deterioração, porque no hábito não há amor.

Só para os muitos, muitos poucos que amam, a relação conjugal tem significação, e então é indestrutível, então não é mero hábito ou mera conveniência nem está baseada na necessidade biológica, sexual. Nesse amor que é incondicional foram fusionadas as identidades, e numa relação assim há uma cura possível, há esperança.

Porém, para a maioria de vocês, na relação conjugal não há fusão. Para unir entre si as identidades separadas, tanto o marido como a esposa tem que conhecer a si mesmos. Isso significa amar. Porém, não há amor, o qual é um fato óbvio. O amor é sempre puro, novo, não é mera gratificação nem mero hábito. O amor é incondicional. E não é assim como vocês tratam a suas esposas ou maridos, verdade? Cada qual vive em seu próprio isolamento, e ambos tem estabelecido seus hábitos de prazer sexual assegurado. O que ocorre ao homem que tem uma renda financeira assegurada? É óbvio que se deteriora. Não o tem notado? Observem ao home que tem uma renda assegurada e de pronto notarão com quanta rapidez sua mente se deteriora. Pode ter uma grande posição, pode haver adquirido uma reputação por sua inteligência, porém, a plenitude da alegria de viver lhe tem abandonado.

De igual modo, no matrimonio de vocês há uma permanente fonte de prazer, um hábito sem compreensão, sem amor, e estão forçados a viver nessas condições. Não estou lhes dizendo o que devem fazer, senão que primeiramente considerem o problema. Pensam que isto está correto? Não quer dizer que você deva se livrar de sua mulher e buscar alguma outra. Que significado tem esta relação? Certamente, amar é estar em comunicação com alguém, porém, você está em comunicação com sua esposa, exceto fisicamente? Salvo nesse aspecto físico, a conhece? E ela, conhece a você? Por acaso não estão ambos isolados, cada qual perseguindo seus próprios interesses, suas próprias ambições e necessidades, cada qual buscando no outro suas gratificações, sua segurança econômica ou psicológica? Uma relação semelhante não é relação em absoluto; é um processo mutuo de necessidades psicológicas, biológicas e econômicas em que ambos se fecham isolando-se um do outro, e o resultado óbvio é o conflito, a infelicidade, as repressões, o temor possessivo, o ciúme e demais.

Por conseguinte, o matrimonio como costume, como cultivo do prazer habitual, é um fator de deterioração, porque no hábito não há amor. O amor não é uma questão de hábito; é algo feliz, criativo, sempre novo. Em consequência, o hábito é o contrário do amor, porém, vocês são prisioneiros do hábito e, naturalmente, a relação habitual que tem com o outro é uma relação opaca, apagada. Voltemos, pois, à questão fundamental, ou seja, que a reforma da sociedade depende de vocês, não da legislação. A legislação só pode contribuir a fomentar o hábito o amoldamento. Portanto, cada um de vocês, como indivíduo responsável que vivem em relação, tem que fazer algo, tem que atuar, e só poderá atuar quando houver um despertar de sua mente e seu coração. Vejo que alguns inclinam a cabeça em sinal de acordo comigo, porém, o fato óbvio é que não querem assumir a responsabilidade da transformação, da mudança; não desejam afrontar o transtorno de descobrir o modo de viver retamente. Portanto, o problema continua; seguem adiante com suas brigas, e finalmente morrem. E quando morrem há alguém que chora, não pelo companheiro ou companheira que morreu, senão por sua própria solidão. Vocês continuam iguais, não mudam, e pensam que são seres humanos capazes de legislar, de ocupar altas posições, de falar acerca de Deus, de encontrar uma maneira de deter as guerras, etc. Nenhuma destas coisas significa nada, porque vocês não estão resolvendo nenhum dos problemas fundamentais.

Krishnamurti – Obras Completas – Volume V – Nova Délhi, Índia, 19 de dezembro de 1948 

Quando o processo da mente é compreendido, o amor se manifesta

Neste país, um marido é o chefe; ele é a lei, o amo, porque domina economicamente, e é ele quem diz quais são os deveres de sua esposa. Uma vez que a esposa não é o fator dominante e depende economicamente, o que ela diz não conta. Podemos abordar este problema deste ponto de vista do marido ou da esposa. Se abordamos o problema da esposa vemos que, por não ser ela livre economicamente, sua educação é limitada, ou suas capacidades de pensar podem ser inferiores; e a sociedade lhe há imposto regulamentos e modos de conduta determinado pelos homens. Em consequência, ela aceita os assim chamados direitos do marido; e como ele é o fator dominante ao ser economicamente livre e ter a capacidade de ganhar dinheiro, é ele quem dita a lei. Naturalmente, onde o casamento é um assunto de contrato, suas complicações não tem limite. Então, existe o dever, uma palavra burocrática que nada significa na relação.  

Quando você estabelece regulamentações e começa a indagar nos direitos e deveres do marido e da esposa, isso não termina nunca. Por certo, uma relação semelhante é um assunto terrível, não? Quando o marido exige os seus direitos e insiste em ter uma esposa submissa, qualquer coisa que isso possa significar, a relação que tem é, obviamente, tão só um contrato comercial. É muito importante compreender esta questão, porque deve haver seguramente uma maneira distinta de abordá-la. Enquanto a relação se baseia num contrato, em dinheiro, na possessão, na autoridade e na dominação, então, é inevitável que se converta num assunto de direitos e deveres. Podemos ver a extrema complexidade da relação, quando esta é o resultado de um contrato que determina o que está bem, o que está mal, o que é dever. Se sou a esposa e meu marido insiste em certas ações, como não sou independente, é natural que tenha que sucumbir a seus desejos, que é o mantenedor da renda. Vocês impõem às suas esposas certas regras, certos direitos e deveres; portanto, a relação se torna um mero assunto de contrato, com todas as complexidades que isso implica.

Bem, agora, não há uma maneira diferente de abordar este problema? Ou seja, quando há amor não existe o dever. Quando você ama a sua esposa, compartilha tudo com ela: sua propriedade, suas preocupações, sua ansiedade, sua alegria. Não a domina. Você não é o homem e ela a mulher para ser usada e posta de lado, uma espécie de máquina de engendrar filhos a fim de prolongar o apelido de marido. Quando há amor, a palavra dever desaparece. O homem cujo coração carece de amor, é ele que fala de direitos e deveres, e neste país os deveres e direitos tem tomado o lugar do amor. As regras tem se tornado muito mais importantes que o calor do afeto. Quando há amor, o problema é simples; quando não há amor, o problema se torna complexo. Quando um homem ama a sua mulher e a seus filhos, jamais pode pensar em termos de direitos e deveres. Senhores, examinem seus próprios corações e suas mentes. Sei que o tomam por engraçado; é um dos truques das pessoas irrefletidas rirem-se de algo e assim descarta-lo. A esposa não compartilha aqui a responsabilidade do marido, não compartilha a sua propriedade, não possui a metade de tudo o que ele possui, porque se considera que a mulher é menos que o homem, é algo para ser mantido e usado sexualmente, a conveniência do marido e quando o apetite deste assim o queira. Em consequência, vocês tem inventado as palavras direitos e dever; e quando a mulher se rebela, lhe lançam estas palavras. É uma sociedade estática, uma sociedade em deterioração a que fala em de dever e direitos. Se examinam de verdade seus corações e suas mentes, encontraram que carecem de amor.

Para que surja uma sociedade nova, uma nova cultura, é óbvio que não pode haver dominação, nem da parte do homem nem da parte da mulher. A dominação existe por causa da pobreza interna. Sendo psicologicamente pobres, necessitamos de dominar, renegar contra o servente, contra a esposa e o marido. Por certo, só o sentimento de afeto, do calor do amor, podem dar origem a um novo estado, a uma nova cultura. O cultivo do coração não é um processo da mente. A mente não pode cultivar o coração, porém, quando o processo da mente é compreendido, o amor se manifesta. O amor não é uma mera palavra. A palavra não é a coisa. A palavra amor não é amor. Quando usamos essa palavra e tratamos de cultivar o amor, isso é tão só um processo da mente. O amor não pode ser cultivado, porém, quando compreendemos que a palavra não é a coisa, então, a mente com suas leis e regulamentações, com seus direitos e deveres, deixa de interferir, e só assim existe a possibilidade de criar uma nova cultura, uma nova esperança e um novo mundo.

Krishnamurti – Obras completas – Volume V – Poona –Índia, 12 de setembro de 1948

Sem a qualidade do amor, tudo carece de sentido

Pergunta: Quase todos estamos casados ou comprometidos numa relação íntima que começou por todas as razões errôneas que você tem descrito tão corretamente. Pode um casamento ou uma relação assim se, converter-se alguma vez numa força realmente positiva? (risos)

Krishnamurti: Que pessoas tão miseráveis! Então, como abordamos esta pergunta? O que significa estar em relação com outra pessoa? Você pode estar relacionado fisicamente de uma maneira muito estreita, intima, porém, alguma vez estamos relacionados psicologicamente, por inteiro? Não romanticamente, sentimentalmente; refiro-me ao sentido profundo de estar relacionados. A palavra relação significa estar em contato, ter um sentido de totalidade com o outro, não como entes separados que se juntam e se sentem totais, senão que a relação mesma produz esta qualidade, esta sensação de que não estão separados. Esta é, em verdade, uma questão sumamente importante, porque nossas vidas estão, em sua maior parte, muito isoladas, muito separadas, muito cuidadosamente estruturadas a fim de que não sejamos perturbados psicologicamente. E uma relação assim deve originar, inevitavelmente, conflito, perturbação e toda conduta neurótica que temos. Por conseguinte, juntos deixemos claro o que entendemos por relação, não só o significado dessa palavra, o significado verbal, senão o significado que há atrás da palavra, atrás das pessoas que estão relacionadas.

O que significa estar relacionados? Alguma vez estamos relacionados no sentido profundo dessa palavra? Pode haver uma relação dessa classe, inalterada, serena como as profundidades do mar? Pode haver se cada um de nós persegue seu próprio caminho particular, seu desejo particular, sua ambição particular e demais? Pode haver uma relação assim com o outro se existem estas coisas? Vocês dizem: “Como pode não existir? Acaso não é necessário que cada um de nós se realize, que floresça junto com o outro?” O que significa isso quando existe esse sentido de separação? Se cada um de nós diz que estamos nos ajudando mutuamente a florescer, a crescer, a nos realizarmos, a ser felizes juntos, então, seguimos mantendo o espírito de isolamento. Bem, agora, por que a mente, o cérebro, a entidade humana, se aferra sempre à separação?

Por favor, esta é uma pergunta muito, muito séria. Por que os seres humanos tem mantido, em todo o curso da história, este sentido de isolamento, de separação, de divisão? Você é católico, eu sou protestante. Você pertence a esse grupo e eu pertenço aquele grupo. Eu coloco uma túnica roxa ou uma túnica amarela ou me cubro com uma grinalda; e mantemos isto enquanto falamos da relação, do amor e tudo o mais. Por quê? (Por favor, estamos cooperando, investigamos juntos). Por que fazemos isto? Isso é consciente, deliberado, ou é inconsciente, é nossa tradição, nossa educação? Toda a estrutura religiosa sustenta que estamos separados, que somos almas separadas, etc. É por que o pensamento em si é separativo? Compreende? Eu penso que estou separado de você. Penso que minha conduta deve estar separada da sua, porque do contrário, existe o temos de que nos tornemos automáticos, zumbis, que nos imitemos uns aos outros. É o pensamento a causa deste sentido de separação na vida? Por favor, investiguemos isso juntos. O pensamento tem separado o mundo em nacionalidades. Você é inglês, outro é alemão, eu sou francês, você é russo e assim sucessivamente. Esta divisão é criada pelo pensamento. E o pensamento supõem que nesta separação, nesta divisão há segurança; pertencendo a uma comunidade, pertencendo ao mesmo grupo, tendo fé num mesmo guru, acreditando nas mesmas roupas que você veste conforme os mandos do guru, você se sente seguro, ao menos tem a ilusão de que está seguro.

Assim nos perguntamos: O que nos separa é o prazer, o desejo agradável que é também o movimento do pensar? Correto? Ou seja, o pensamento é alguma vez completo, total? Porque o pensamento se baseia no conhecimento, que é a imensa experiência acumulada do homem, seja no mundo científico, tecnológico ou psicológico. Temos acumulado uma grande quantidade de conhecimentos, tanto externa como internamente. E o pensamento é o resultado desses conhecimentos, o pensamento como memória, conhecimento, experiência. Portanto, o conhecimento jamais pode ser completo acerca de nada: acerca de Deus, do nirvana, do céu, da ciência..., de nada. De modo que o conhecimento deve marchar sempre junto com a sombra da ignorância. Por favor, vejamos esta fato juntos. Por isso, quando o pensamento penetra dentro do campo da relação, deve criar uma divisão, porque o pensamento mesmo é limitado. De acordo?

Se isto está claro para todos nós — não estou dando explicações, vocês o estão descobrindo por si mesmos —, então, que lugar ocupa o conhecimento na relação? Por favor, esta questão é muito séria, não é só uma proposição casual, argumentativa. Esta é uma investigação acerca de que lugar ocupam o conhecimento, a experiência, as recordações acumuladas, na relação. Tenham a bondade de responder a isto vocês mesmos, não olhem para mim. Se você diz: “Conheço a minha esposa — ou outra forma de relação intima —, já colocou esta pessoa dentro da estrutura de seu conhecimento acerca dela. Por conseguinte, esse conhecimento se torna o processo divisor. Você tem vivido com sua esposa, sua noiva ou o que for, e tem acumulado informação. Tem recordado as penosas declarações que ela tenha feito ou que você as fez; existe todo esse desenvolvimento da memória que dá forma a uma imagem, a qual interfere na relação com a outra pessoa. Correto? Por favor, observem isto em si mesmos. E ela está fazendo exatamente a mesma coisa. Nos perguntamos, pois: Que lugar ocupa o conhecimento na relação? O conhecimento é amor? Posso conhecer a minha esposa: sua aparência, o modo como se comporta, certos hábitos que possui, etc. Isso é bastante óbvio. Porém, por que devo dizer “conheço”? Quando digo que a conheço já limitei minha relação. Não sei se o compreendem. Já criei um bloqueio, uma barreira entre nós dois. Significa isso que em minha relação com ela me torno irresponsável? Compreendem minha pergunta? Se digo: “Basicamente, não conheço você”, sou irresponsável? Ou me torno extraordinariamente sensitivo — se é que posso usar essa palavra; é uma palavra errônea —, sou vulnerável, não tenho sentido algum de divisão, não tenho barreiras?

Portanto, se possuo esta qualidade de mente, de cérebro, se sinto que a relação é um florescer, um movimento — não é algo estático, é uma coisa viva, você não pode coloca-la em uma cesta e dizer “é isso” e não mover-se daí —, então, posso começar a perguntar-me: O que é o casamento? De acordo? O não casamento; você pode viver com outra pessoa, sexualmente, podem viver como companheiros, de mãos dadas, conversar e ir a um Registro Civil ou passar por uma cerimônia católica ou protestante e ser amarrados ali; ou podem viver sem estarem casados. Em um caso, você toma um voto de responsabilidade; no outro, não. Num estou legalmente casado e a separação ou o divórcio se torna bem mais difícil; no outro é bastante simples, ambos dizemos adeus e partimos em direções diferentes. E isso é o que está ocorrendo cada vez mais no mundo. Não condenamos nem a um nem ao outro. Por favor, só estamos considerando todo este problema: a responsabilidade e o sentimento de tremenda carga que representam os filhos. E aí vocês estão atados legalmente. No outro caso não, podem ter filhos, porém a porta está aberta sempre. Bem, agora, em ambos os casos, toda relação entre duas pessoas é uma mera forma de atração, de respostas biológicas por ambas as partes, curiosidade, o sentimento de querer estar com outro, o qual pode ser o resultado do inconsciente medo da solidão, um hábito estabelecido pela tradição? Em ambos os casos, se converteu num hábito e em ambos os casos há medo da perda, há a possessão, mutua exploração sexual e todas as sequelas disso. Bem, agora, o que é importante em todos os casos? Por favor, estamos considerando isto juntos; não estou lhes dizendo o que é e o que não é importante. O que é importante, indispensável em ambos os casos? A responsabilidade é essencial, não é verdade? Sou responsável pelas pessoas com quem vivo. Sou responsável, não só com respeito a minha esposa, senão que sou responsável pelo que está ocorrendo no mundo. Sou responsável de ver que não se matem as pessoas. Sou responsável. Responsável de ver que não haja violência. Estão de acordo?

Limita-se, pois, minha responsabilidade a uma pessoa, a minha família, a meus filhos, como o tem sido estabelecido pela tradição? No Ocidente, a família está desaparecendo mais e mais, enquanto que no Oriente a família segue sendo o centro. Esta é tremendamente importante; pela família farão qualquer coisa, ainda que sejam primos longínquos se manterão unidos, se ajudarão uns aos outros usando toda classe de influências. Porém, aqui, pouco a pouco isso está desaparecendo por completo.

Vejam senhores, à medida que vocês o investigam, este problema torna-se extraordinariamente complexo e vital. Se tenho filhos, se os amo realmente e me sinto responsável, o sou durante toda a vida deles, e eles devem sentir-se responsáveis por mim durante toda a sua vida. Devo ver que sejam devidamente educados, que não se lhes ensinem a causa de uma guerra.

Assim, pois, esta questão implica tudo isto. Investigando-a profundamente, você vê que, a menos que tenha esta qualidade do amor, tudo carece por completo de significação. E, se estou tentando não ser egoísta, não estar isolado, ter este sentimento de profundo afeto no qual não há apego e nem posse nem perseguição do prazer, e minha esposa sente o contrário, então, temos um problema completamente diferente. Compreendem isto? Então, o problema é: Que farei? Simplesmente abandoná-la, fugir, divorciar-me? Posso ter que faze-lo se ela insiste. Não é uma pergunta que possa ser respondida mediante umas tantas declarações, senão que requer muitíssima investigação interna nisto por ambas as partes. E, se nessa investigação, se nessa exploração não há amor, então, não há uma ação inteligente. Onde há amor, este tem sua própria inteligência, sua própria responsabilidade.

Krishnamurti – Brockwood Park, Inglaterra, 2 de setembro de 1982

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill