Pergunta: Como pode a regeneração individual trazer, sozinha e
imediatamente, o bem-estar coletivo da grande maioria, como se faz necessário
em toda a parte?
Krishnamurti: Pensamos que a
regeneração individual é oposta à regeneração coletiva. Não estamos pensando em
termos de regeneração, mas apenas em termos de regeneração individual. A
regeneração é anônima. Enquanto penso na regeneração individual, como oposta à
coletiva, não há relação entre os dois; mas se lhes interessa a regeneração,
não individual, mas a regeneração, simplesmente, notarão então a presença de uma
força, uma inteligência inteiramente diversa, em ação; porque, afinal
de contas, o que é que nos interessa? Qual é a questão que nos preocupa,
profunda e fundamentalmente? Pode uma pessoa reconhecer a necessidade de uma
ação conjunta do homem para a salvação do homem, perceber que a ação coletiva é
necessária para a produção de alimentos, de roupas e moradia. Isso requer
inteligência, e a inteligência não é individual, não é deste partido nem
daquele, desta ou daquela nação. Se o indivíduo busca a inteligência, esta há
de ser coletiva. Mas, infelizmente, não estamos em busca da inteligência, não
estamos em busca da solução do problema. Temos teorias com relação aos nossos
problemas, métodos de resolvê-los, e os métodos se tornam individuais ou
coletivos. Se você e eu estamos em busca de uma forma inteligente de nos
aplicarmos ao problema, não somos nem coletivos nem individuais; só nos
interessa, então a inteligência, que há de resolver o problema.
Que é coletivo, que é massa? São
vocês, em relação com outra pessoa. Isso não é uma simplificação exagerada;
porque nas minhas relações com vocês eu constituo uma sociedade; você e eu criamos juntamente uma sociedade, em
nossas relações. Sem essas relações não existe inteligência, não existe
cooperação, da parte de vocês ou da minha parte, que é inteiramente individual.
Se eu busco a minha regeneração e vocês buscam a sua, o que acontece? Estamos
seguindo em direções opostas.
Se estamos ambos interessados na
solução inteligente de todo o problema, porque esse problema é nossa principal
preocupação, nesse caso, o que nos interessa, não é como eu considero e como
vocês o consideram, qual seja o meu caminho ou qual seja o caminho de vocês.
Não nos interessam fronteiras e preconceitos econômicos, nem direitos
adquiridos e as coisas insensatas que nascem junto com esses direitos
adquiridos. Então, vocês e eu não somos coletivos nem individuais; realiza-se essa
integração coletiva, que é anônima.
O interrogante, porém, deseja
saber como se deve agir imediatamente, o que fazer no momento imediato, de modo
que sejam resolvidas as necessidades do homem. Quer me parecer que não existe
tal solução. Não há remédio moral de ação imediata, apesar das promessas de
políticos. A solução imediata é a regeneração do indivíduo, não em proveito próprio,
mas a regeneração que é o despertar da inteligência. Inteligência não
é coisa de vocês ou minha — é inteligência. Julgo importante que se perceba
isso a fundo. Então, a nossa ação política ou individual, coletiva ou de outra
natureza, será totalmente diferente. Perderemos a nossa identidade; não
nos identificaremos com coisa alguma — nossa pátria, nossa raça, nosso grupo,
nossas tradições coletivas, nossos preconceitos. Perderemos todas as essas coisas,
porquanto o problema exige que percamos nossa identidade, para o
resolvermos. Mas isso requer compreensão, compreensão total do problema.
Nosso problema não é o problema
do "pão de cada dia"; nosso problema não é só comer, vestir e morar;
é mais profundo do que isso. É um problema psicológico, o problema do porque o
homem se identifica com alguma coisa, pois é a identificação com um partido,
com uma religião, com o conhecimento, que está nos desunindo. E essa identidade
só pode ser dissolvida quando, psicologicamente, todo o processo de
identificação, o desejo, o motivo, é compreendido claramente.
Assim, é inexistente o problema
do coletivo ou do individual, quando estamos em busca da solução de determinado
problema. Se vocês e eu estamos interessados numa coisa qualquer, se estamos
vivamente interessados na solução do problema, não nos identificamos com outra
coisa. Mas, infelizmente, visto que não estamos vivamente interessados, nós nos
identificamos; e é essa identificação que está nos impedindo de resolver este
vasto e complexo problema.
Jiddu Krishnamurti — 20 de janeiro de 1952 – Quando o pensamento cessa