Pergunta: Embora você tenha empregado frequentemente a palavra "verdade", não me lembro de que a tenha alguma vez definido. O que ela quer dizer?
Krishnamurti: Você e eu, como dois indivíduos, vamos investigar esta questão, não amanhã, mas talvez nesta tarde mesmo. Se você está perfeitamente sereno, vamos averiguar isso. Definições de nada valem. As definições não tem significação para o homem que busca a verdade. A palavra não é a coisa; a palavra "árvore" não é a árvore; mas nos satisfazemos com palavras. Tenham a bondade de seguir-me com atenção. Para nós, as definições, as explicações, são muito satisfatórias, porque podemos viver dentro dos seus limites. Podemos cultivar palavras, porque as palavras produzem em nós efeitos físicos e psicológicos. A palavra "Deus" desperta toda sorte de reações psicológicas e neurológicas, e ficamos satisfeitos.
Por isso, para nós, a definição é muito importante. Não é exato? Chamamos à definição conhecimento, e pensamos que conhecimento é a verdade. Quanto mais lemos a respeito, pensamos que tanto mais perto estamos dela. Mas a explicação da palavra não é a coisa. Cumpre-nos, pois, compreender, não nos deixando enredar por definições de palavras. Por conseguinte, temos de colocar de lado as palavras. E como isso é difícil! Não acham? — porque a palavra é o processo de pensamento. Não há pensar sem verbalizações, sem o emprego de palavras, imagens, conceitos, fórmulas. Prestem atenção a isso, meditem junto comigo, agora, a fim de o verificarem.
Quando a mente percebe que está enredada em palavras, que o próprio processo do seu pensar é palavra, é memória, como pode então essa mente — que é memória, que é tempo, que é presa a definições e conclusões — como pode ela compreender o que é a verdade, o que é o incognoscível? Se desejo conhecer o incognoscível, deve a mente estar de todo silenciosa, não acham? Isto é, tudo quanto é verbalização, imaginação, projeção, tem de acabar. Todos vocês sabem o quanto é difícil para a mente estar quieta — não compelida, não disciplinada, porém, quieta; o que significa que a mente já não está verbalizando, reconhecendo, já não é o centro de reconhecimento de qualquer experiência.
Quando a mente reconhece a experiência, essa experiência é coisa projetada. Quando experimento o Mestre, a Verdade, Deus, essa experiência é uma autoprojeção minha, porque reconheço. Há o centro do "eu", que reconhece aquela experiência; reconhecimento é processo da memória. Digo então: "Vi o Mestre, sei que ele existe, sei que existe Deus". Isto é, a mente é o centro de reconhecimento, e o reconhecimento é o processo da memória.
Quando experimento alguma coisa, tal como Deus, a Verdade, essa coisa é projeção minha, é reconhecimento, não é a Verdade, não é Deus.
A mente só está inteiramente tranquila quando é incapaz de experimentar, quando não há nenhum centro de reconhecimento. Mas isso não ocorre por meio de nenhuma espécie de ação da vontade. Não vem por meio da disciplina. Vem quando a mente observa suas próprias atividades, — o que espero que estejam fazendo neste momento. E quando observam, podem ver como a cada minuto há o processo de reconhecimento em funcionamento, e como, quando reconhecem, não há nada novo.
A verdade é algo atemporal, não é mensurável por palavras. Uma vez que a verdade é imensurável, atemporal, a mente não pode reconhecê-la. Consequentemente, para que a verdade seja, é imprescindível que a mente se ache num estado de "não experimentar". A verdade deve vir a vocês; não pode ir a ela. Se forem a ela, vocês a "experimentaram". Não podem invocar a verdade. Quando a chamam, quando a experimentam, estão em condições de reconhecê-la; se a reconhecem, então, não é a verdade; é apenas o próprio processo de memória, de pensamento de vocês, que está lhes dizendo: "É isso, eu li, eu experimentei". O conhecimento, por conseguinte, não é o caminho da verdade. O conhecimento precisa ser compreendido e colocado de lado, para que a verdade seja. Se a mente de vocês está tranquila, não adormecida, não narcotizada por palavras, mas está realmente acompanhando, observando o processo da mente, verão então como nasce a tranquilidade, no escuro, misteriosamente; e nesse estado de tranquilidade, verão aquilo que é eterno, imensurável.
Jiddu Krishnamurti — 27/01/1952 — Quando o pensamento cessa