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terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Sobre o despertar da Inteligência

Amigos, nesta breve conversa introdutória, antes de responder a algumas das perguntas que me foram colocadas, quero expressar algumas ideias sobre as quais se deveria refletir com inteligência crítica. Não quero entrar em pormenores, mas quando refletirem sobre o que eu digo e o transportarem para a ação, verão a sua importância prática neste mundo de cruel e terrível caos.

A primeira coisa que temos que compreender é que enquanto houver distinção entre o indivíduo e o grupo tem que haver conflito, tem que haver exploração, tem que haver sofrimento. O conflito no mundo é na realidade entre o indivíduo que procura realização, e o grupo. Na expressão da sua força única como indivíduo, ele tem inevitavelmente que entrar em conflito com a multidão, e este conflito só aumenta a divisão entre os dois. A mera imposição superficial de um sobre o outro ou a exterminação de um pelo outro, não pode livrar o mundo da exploração e das crueldades repressivas.

Enquanto não compreendermos a verdadeira relação entre o indivíduo e o grupo, e a verdadeira função do indivíduo entre o grupo, haverá um contínuo estado de guerra. Para mim, esta distinção entre o indivíduo e o grupo é artificial e não verdadeira, embora tenha assumido uma realidade. Enquanto não compreendermos verdadeiramente como nasceu a consciência de grupo e o que é o indivíduo e qual é a sua função, tem que existir um atrito contínuo.

Antes de responder às questões esta noite, quero tentar explicar o que quero dizer com indivíduo. A consciência de grupo não é senão a expansão da do indivíduo, portanto vamos interessar-nos com o pensamento e a ação do indivíduo. Embora o que eu digo possa parecer-lhes novo, por favor examinem-no sem preconceito.

O indivíduo é o resultado do passado, expressando-se através do meio presente; o passado sendo o herdado, o incompleto, e o presente, aquilo que é criado pela incompletude. O passado nada mais é que o pensamento, emoção e ação incompletos; isto é, pensamento, emoção e ação condicionados e limitados pela ignorância.

Expondo-o de maneira diferente, se uma pessoa desenvolveu um certo background através de tradições, através de um meio econômico, através de hereditariedade, através da formação religiosa, e está a tentar expressar-se através da limitação desse background, então naturalmente as suas ações, pensamentos e sentimentos têm que ser limitados, condicionados. Isto é, a sua mente está pervertida, distorcida pelo seu passado, e é com essa limitação que ele tenta enfrentar a vida e compreender as suas experiências. Portanto a ignorância é a acumulação dos resultados da ação através dos muitos impedimentos cujo significado o indivíduo não compreendeu integralmente. Estes impedimentos foram edificados pela mente para sua auto-proteção.

Cada um constantemente procura e cria segurança para ele próprio, e por isso toda a sua reação à vida é de contínua auto-defesa. Enquanto a mente e o coração estiverem à procura de medidas para se protegerem através de ideais e valores defensivos, tem que existir ignorância, que impede a mente de agir plenamente, completamente, e portanto ela desenvolve a sua própria particularidade a que chamamos individualidade, e que inevitavelmente entra em conflito com as muitas outras individualidades. Esta é a causa fundamental do sofrimento.

Ora, para mim, o verdadeiro significado da individualidade consiste em libertar a mente do passado, da sua ignorância para com o seu meio limitado. Neste processo de libertação, nasce a verdadeira inteligência, a única que libertará o homem do sofrimento, das crueldades e da exploração.

Assim, quando a mente está liberta do hábito e da tradição de procurar e criar valores para sua auto-proteção, através da acumulação, que é ignorância, e enfrenta a vida completamente, absolutamente despida, só então existe o duradouro discernimento daquilo que é verdadeiro.

Pergunta: É possível viver sem exploração, individual e comercial?

Krishnamurti: A maior parte de nós é levada pela mera sensação de posse. Desejamos adquirir, e por isso começamos a acumular cada vez mais, pensando que através da acumulação encontraremos felicidade, segurança. Enquanto houver desejo acumulativo e aquisitivo, tem que existir exploração; e só podemos libertar-nos dessa exploração quando começarmos a despertar a inteligência através da destruição dos valores auto-protetores. Mas se simplesmente tentarmos descobrir quais são as nossas necessidades e nos limitarmos a essas necessidades, então a nossa vida tornar-se-á pequena, tacanha e mesquinha. Ao passo que, se vivêssemos inteligentemente, sem acumulações auto-protetoras, não haveria exploração, com as suas muitas crueldades. Tentar resolver este problema unicamente controlando as condições econômicas do homem ou pela mera renúncia, parece-me uma abordagem errada a este complicado problema. É somente através da compreensão voluntária e inteligente da inutilidade e ignorância da auto-proteção, que pode chegar a ausência de exploração.

Despertar a inteligência é descobrir, através da dúvida e do questionamento, o verdadeiro significado dos valores que adquirimos, das tradições, sejam religiosas, sociais ou econômicas, que herdamos ou conscientemente edificamos. Em tal questionamento, se for real e vital, há a descoberta inteligente das necessidades. Esta inteligência é a certeza de felicidade.

Pergunta: Deveríamos transformar as nossas espadas em arados, mesmo embora o nosso país seja atacado por um inimigo? Não é o nosso dever moral defender o nosso país?

Krishnamurti: Para mim a guerra é radicalmente errada, seja defensiva ou ofensiva. O sistema de aquisitividade em que se baseia toda esta civilização tem naturalmente que criar distinções de classe, distinções raciais e nacionais, conduzindo inevitavelmente à guerra, a que podem chamar ofensiva ou defensiva de acordo com os ditames dos líderes comerciais ou políticos. Enquanto existir este sistema econômico explorador, tem que haver guerra; e o indivíduo que é confrontado com o problema de se deveria lutar ou não, decidirá de acordo com a sua aquisitividade, a que ele por vezes chama patriotismo, ideais, etc. Ou, compreendendo que todo este sistema inevitavelmente conduz à guerra, como indivíduo, começará a libertar-se inteligentemente deste sistema. E esta é para mim a única verdadeira solução.

Pela nossa aquisitividade construímos através de muitos séculos este esmagador sistema de exploração que está a destruir todas as nossas sensibilidades, o nosso amor pelo outro. E quando perguntamos, “Não deveríamos lutar pelo nosso país, não é o nosso dever moral?” há algo inerentemente errado, algo essencialmente cruel na própria questão. Para se libertar desta extrema estupidez, o homem da guerra tem que reaprender a pensar mesmo do princípio. Enquanto a humanidade estiver dividida pela religião, pelas seitas, pelos credos, pelas classes, pelas nacionalidades, tem que haver guerra, tem que haver exploração, tem que haver sofrimento. Só quando a mente se começa a libertar destas limitações, só quando a mente se derrama no coração, é que há a verdadeira inteligência, que é a única solução duradoura para as crueldades bárbaras desta civilização.

Pergunta: Como é que podemos ajudar melhor a humanidade a compreender e a viver os seus ensinamentos?

Krishnamurti: É muito simples: vivendo-os vocês mesmos. O que é que estou a ensinar? Não lhes estou a dar um novo sistema, ou um novo conjunto de crenças; mas digo, prestem atenção à causa que gerou esta exploração, a falta de amor, o medo, as guerras contínuas, o ódio, as diferenças de classes, a divisão do homem contra o homem. A causa é, fundamentalmente, o desejo da parte de cada um de nós de se proteger através da aquisitividade, através do poder. Todos desejamos ajudar o mundo, mas nunca começamos por nós próprios. Queremos reformar o mundo, mas a mudança fundamental tem que ter lugar primeiro dentro de nós próprios. Portanto, comecem a libertar a mente e o coração deste sentido de possessividade. Isto exige, não mera renúncia, mas discernimento, inteligência.

Pergunta: Qual é a sua atitude relativamente ao problema do sexo, que representa um papel tão predominante na nossa vida quotidiana?

Krishnamurti: Tornou-se um problema porque não há amor. Não é assim? Quando realmente amamos, não há problema, há ajustamento, há compreensão. Só quando perdemos o sentido da verdadeira afeição, desse profundo amor em que não há sentimento de possessividade, é que surge o problema do sexo. Só quando nos submetemos completamente à mera sensação, é que há muitos problemas relativos ao sexo. Como a maioria das pessoas perdeu a alegria do pensar criativo, naturalmente voltam-se para a mera sensação do sexo, que se torna um problema desgastando as suas mentes e corações. Enquanto não começarem a questionar e a compreender o significado do meio, dos muitos valores que edificaram em vosso redor para vossa auto-proteção e que estão a esmagar o pensar fundamental, criativo, têm naturalmente que recorrer às muitas formas de estimulação. Daqui surgem inumeráveis problemas para os quais não há solução excepto a compreensão fundamental e inteligente da própria vida.

Por favor experimentem com o que eu estou a dizer. Comecem por descobrir o verdadeiro significado da religião, do hábito, da tradição, de todo este sistema de moralidade que está constantemente a forçá-los, a instá-los numa determinada direção: comecem a questionar todo o seu significado sem ideias preconcebidas. Despertarão então esse pensamento criativo que dissolve os muitos problemas nascidos da ignorância.

Pergunta: Acredita na reencarnação? É um fato? Pode dar-nos provas da sua experiência pessoal?

Krishnamurti: A ideia da reencarnação é tão velha como as colinas; é a ideia de que o homem, através de muitos renascimentos, passando através de inúmeras experiências, chegará finalmente à perfeição, à verdade, a Deus. Ora bem, o que é que renasce, o que é que continua? Para mim, essa coisa que se supõe continuar nada mais é que uma série de camadas de memória, de determinadas qualidades, de determinadas ações incompletas que foram condicionadas, impedidas pelo medo nascido da auto-proteção. Ora essa consciência incompleta é o que nós chamamos o ego, o “eu”. Conforme expliquei no início da minha breve conversa introdutória, a individualidade é a acumulação dos resultados de várias ações que foram impedidas, entravadas por determinados valores herdados e adquiridos, pelas limitações. Espero não estar a tornar isto muito complicado e filosófico. Tentarei torná-lo simples.

Quando falam do “eu”, querem dizer com isso um nome, uma forma, determinadas ideias, certos preconceitos, determinadas distinções de classe, qualidades, preconceitos religiosos, etc., que foram desenvolvidos através do desejo de auto-proteção, de segurança, de conforto. Portanto, para mim, o “eu”, baseado numa ilusão, não tem realidade. Por isso a questão não é saber se existe a reencarnação, se há uma possibilidade de um crescimento futuro, mas se a mente e o coração se podem libertar desta limitação do “eu”, do “meu”.

Perguntam-me se eu acredito ou não na reencarnação porque esperam que através da minha certeza possam adiar a compreensão e a ação no presente, e que eventualmente chegarão a realizar o êxtase da vida ou a imortalidade. Querem saber se, sendo forçados a viver num meio condicionado com oportunidades limitadas, chegarão alguma vez através da infelicidade e do conflito a compreender esse êxtase da vida, a imortalidade. Como se está a fazer tarde tenho que expor o assunto brevemente, e espero que reflitam sobre ele.

Ora eu digo que a imortalidade existe, para mim é uma experiência pessoal; mas ela só pode ser compreendida quando a mente não estiver a contar com um futuro no qual viva com mais perfeição, mais completamente, mais ricamente. A imortalidade é o presente infinito. Para compreender o presente com o seu significado pleno, rico, a mente tem que estar livre do hábito da aquisição auto-protetora; quando estiver totalmente despida, só então há imortalidade.

Pergunta: Para podermos alcançar a verdade, devemos trabalhar sozinhos ou coletivamente?

Krishnamurti: Se é que o posso sugerir, deixem a questão da verdade de lado; vamos antes considerar se é inteligente trabalhar para a obtenção pessoal ou para o coletivo. Durante séculos cada um procurou a sua própria segurança, e foi portanto implacável, agressivo, explorador, gerando assim a confusão e o caos. Considerando tudo isto, vocês, o indivíduo, começarão a trabalhar voluntariamente para o bem-estar do todo. Neste ato voluntário, o indivíduo nunca se tornará mecânico, automático, um mero instrumento nas mãos do grupo; por conseguinte, nunca poderá haver um conflito entre o grupo e o indivíduo. A questão da expressão criativa do indivíduo em oposição e em conflito com o grupo só desaparecerá quando cada um agir integralmente na plenitude da compreensão. Só isto originará a cooperação inteligente na qual a compulsão, seja através do medo ou da ganância, não tem lugar. Não esperem a ser levados a agir coletivamente, mas comecem a despertar essa inteligência, desnudando todas as estupidezes aquisitivas, e então haverá a alegria do trabalho coletivo.

Krishnamurti, Rio de Janeiro, 2ª Palestra – 17 de Abril de 1935.

Tenham cuidado com a pessoa que lhes oferece conforto

Amigos, como houve tantos equívocos e más interpretações nos jornais e revistas com respeito a mim, penso que seria melhor se eu fizesse uma declaração para clarificar a posição. As pessoas geralmente desejam ser salvas por outra, ou por algum milagre, ou por ideias filosóficas; e eu receio que muitos venham aqui com este desejo, esperando que pelo simples fato de me ouvirem encontrarão uma solução imediata para os seus muitos problemas. Nem a solução para os seus problemas nem a sua chamada salvação pode chegar através de qualquer pessoa ou de qualquer sistema de filosofia. A compreensão da verdade ou da vida está no nosso próprio discernimento, na nossa própria perseverança e clareza de pensamento. Porque a maior parte de nós somos demasiado indolentes para pensarmos por nós próprios, aceitamos cegamente e seguimos pessoas ou apegamo-nos a ideias que se tornam o nosso meio de fuga em tempo de conflito e sofrimento.

Em primeiro lugar, quero esclarecer que não pertenço a nenhuma sociedade. Não sou teósofo nem missionário teosófico, nem vim aqui para os converter a nenhuma forma particular de crença. Não penso que seja possível seguir alguém, ou aderir a uma determinada crença, e ao mesmo tempo ter a capacidade de pensar claramente. Eis porque a maioria dos partidos, sociedades, seitas, corpos religiosos, se tornam meios de exploração.

Nem trago uma filosofia oriental, instigando-os a aceitá-la. Quando falo na Índia dizem-me que o que digo é uma filosofia ocidental, e quando venho aos países ocidentais, dizem-me que trago um misticismo oriental que é impraticável e inútil no mundo da ação. Mas se realmente chegarem a refletir sobre isso, o pensamento não tem nacionalidade, nem está limitado por nenhum país, clima ou povo. Portanto por favor não suponham que o que vou dizer é o resultado de algum preconceito racial peculiar, idiossincrasia, ou peculiaridade pessoal. O que tenho a dizer é real, real no sentido de que pode ser aplicado à vida presente do homem; não é uma teoria baseada em algumas crenças ou esperanças, mas é praticável e aplicável ao homem.

Ora bem, o pleno significado do que eu vou dizer só pode ser compreendido através da experimentação e portanto através da ação. A maior parte de nós gosta de discutir questões filosóficas em que as nossas ações diárias não tomam parte; ao passo que, isso de que falo não é uma filosofia ou um sistema de pensamento, e o seu profundo significado só pode ser compreendido através da experiência, através da ação.

O que eu digo não é uma teoria, uma crença intelectual para ser simplesmente discutida, para ser argumentada; exige muito pensamento; e só na ação, não pelo debate intelectual, podem descobrir se é verdadeiro e prático. Não é um sistema a ser memorizado, nem é um conjunto de conclusões que podem ser aprendidas e automaticamente levadas a cabo. Tem que ser compreendido criticamente. Ora a crítica é diferente da oposição. Se forem realmente críticos, não se oporão simplesmente, mas tentarão descobrir se o que digo tem em si qualquer mérito intrínseco. Isto exige clareza de pensamento da vossa parte, para que possam trespassar a ilusão das palavras, não permitindo que os vossos preconceitos, sejam religiosos ou econômicos, os impeçam de pensar profundamente. Isto é, têm que pensar a partir do próprio início, simples e diretamente. Todos nós fomos educados com muitos preconceitos e ideias preconcebidas, fomos criados em tradições supurantes e limitados pelo meio, e portanto o nosso pensamento é continuamente pervertido e deformado, impedindo assim a simplicidade de ação.

A questão da guerra, por exemplo. Vocês sabem, são tantos os discutem a retidão e o erro da guerra. Por certo que não pode haver duas maneiras de olhar para a questão. A guerra, defensiva ou ofensiva, está fundamentalmente errada. Agora, para pensar a partir do princípio no que respeita a essa questão, a mente tem de estar inteiramente livre da doença do nacionalismo. Somos impedidos de pensar profundamente, diretamente, simplesmente, devido aos preconceitos que têm sido explorados através dos tempos sob a capa do patriotismo, com os seus absurdos.

Criamos portanto através dos séculos muitos hábitos, tradições, preconceitos, que impedem o indivíduo de pensar completamente, fundamentalmente sobre as questões humanas vitais.

Ora para compreender os muitos problemas da vida, com as suas variedades de sofrimento, temos que descobrir por nós próprios os motivos e as causas fundamentais, com os seus resultados e efeitos. A menos que estejamos plenamente conscientes das nossas ações, da sua causa e efeito, exploraremos e seremos explorados, tornar-nos-emos escravos dos sistemas e as nossas ações serão unicamente mecânicas e automáticas. Até que possamos libertar conscientemente as nossas ações do seu efeito restritivo, através da compreensão do significado da sua causa, a menos que nos libertemos das velhas formas de pensamento que edificamos em nosso redor, não seremos capazes de penetrar as inumeráveis ilusões que criamos à nossa volta e nas quais estamos entravados.

Cada um tem que perguntar a si próprio o que está a procurar, ou se está simplesmente a ser conduzido pelas circunstâncias e condições, e é portanto irresponsável, irrefletido. Aqueles de vocês que estão realmente insatisfeitos, que são críticos, têm que ter perguntado a si mesmos o que é que cada indivíduo procura. Procuram conforto, segurança, ou a compreensão da vida? Muitos dirão que procuram a verdade; mas se analisassem as suas ânsias, a sua busca, ver-se-ia que na realidade estão à procura de conforto, de segurança, de uma fuga do conflito e do sofrimento.

Ora se estão à procura de conforto, de segurança, essa procura tem que se basear na aquisição e portanto na exploração e na crueldade. Se dizem que procuram a verdade, tornar-se-ão prisioneiros da ilusão, porque não se pode correr atrás da verdade, não se pode procurar e encontrar; ela tem que acontecer. Isto é, o seu êxtase só se conhece quando a mente está completamente despojada de todas as ilusões que criou na procura da sua própria segurança e conforto. Somente então há o despontar daquilo que é a verdade.

Colocando as coisas de maneira diferente, temos que perguntar a nós próprios em que é que se baseiam a nossa vida, pensamento e ação. Se pudermos responder a isto completamente, com verdade, então podemos descobrir por nós próprios quem é o criador das ilusões, destas supostas realidades das quais nos tornamos prisioneiros.

Se realmente pensarem sobre isso, verão que toda a vossa vida se baseia na procura de segurança, proteção e conforto individuais. Nesta procura de segurança nasce, naturalmente, o medo. Quando procuram conforto, quando a mente está a tentar evadir a luta, o conflito, o sofrimento, ela tem que criar várias vias de fuga, e estas vias de fuga tornam-se as nossas ilusões. Portanto o medo, que é o resultado da procura individual de segurança, é o criador das ilusões. Isto leva-os de uma seita religiosa a outra, de uma filosofia a outra, de um instrutor a outro, para procurar essa segurança, esse conforto. A isto vocês chamam a procura da verdade, da felicidade.

Ora, não há segurança, não há conforto; existe apenas a clareza de pensamento que ocasiona a compreensão da causa fundamental do sofrimento, a única que libertará o homem. Nesta libertação reside a bem-aventurança do presente. Eu digo que há uma realidade eterna que só pode ser descoberta quando a mente está livre de todas as ilusões. Portanto tenham cuidado com a pessoa que lhes oferece conforto, porque nisto tem que haver exploração; essa pessoa cria uma artimanha na qual são apanhados como peixe na rede.

Na procura de conforto, de segurança, a vida veio a ser dividida em religiosa ou espiritual, e em econômica ou material. A segurança material é procurada através das posses que dão poder e através desse poder esperam poder realizar a felicidade. Para alcançar esta segurança material, este poder, tem que haver exploração, a exploração do vosso semelhante através de um sistema estabelecido deliberadamente e que se tornou hediondo nas suas muitas crueldades. Esta procura de segurança individual, na qual está incluída também a da nossa própria família, criou a diferença de classes, os ódios raciais, o nacionalismo, e em última análise termina em guerras. E curiosamente, se prestarem atenção, a religião de deveria denunciar a guerra, ajuda à sua promoção. Os sacerdotes, que se supõe serem os educadores do povo, encorajam todas as inanidades que o nacionalismo cria e que cega as pessoas em momentos de ódio nacional. E vocês criam este sistema, baseado na segurança e no conforto individual, a que chamam religião. Criaram as organizações religiosas que são apenas formas cristalizadas de pensamento e que asseguram a imortalidade pessoal.

Entrarei em pormenores sobre esta questão da imortalidade numa das minhas palestras posteriores.

Portanto através da procura de segurança individual, através da exigência de continuação individual, vocês criaram uma religião que os explora através do clericalismo, através das cerimônias, através dos chamados ideais. O sistema a que chamam religião e que foi criado através da vossa própria exigência de segurança tornou-se tão poderoso, tão realista, que muito poucos se libertam do seu peso de tradição esmagadora e autoridade. O próprio princípio da verdadeira crítica reside no questionamento dos valores que a religião estabeleceu em nosso redor.

Ora cada um está preso nesta estrutura; e enquanto forem escravos de meios e valores inexplorados, não questionados, tanto passados como presentes, eles têm que perverter a plenitude da ação. Esta perversão é a causa do conflito entre o indivíduo que procura segurança, e as maiorias; entre o indivíduo e o movimento contínuo da experiência. Como individualmente criamos este sistema de exploração e limitação esmagadora, temos que individualmente e conscientemente demoli-lo compreendendo as bases da fundação desta estrutura e não unicamente criando novos conjuntos de valores, que serão apenas uma outra série de fugas. Assim começaremos a penetrar no verdadeiro significado de viver.

Afirmo que existe uma realidade, deem-lhe o nome que quiserem, que somente pode ser compreendida e vivida quando a mente e o coração tiverem penetrado as ilusões e estiverem livres dos seus falsos valores. Só então existe o eterno.

Krishnamurti, Rio de Janeiro, 1ª Palestra – 13 de Abril de 1935.

Sobre mediunidade, casamento, crença e família

Amigos, foram-me colocadas muitas questões em relação ao futuro pessoal de indivíduos e as suas esperanças, se seriam bem sucedidos em determinados negócios, se deveriam deixar este país e estabelecerem-se na América do Norte, quem é a pessoa certa para se casarem, etc. Não posso responder a tais perguntas já que não sou adivinho. Sei que estas são questões verdadeiras e perturbadoras, mas cada um tem que as resolver por si próprio.

Escolhi de entre as inúmeras questões que me foram colocadas, aquelas que são mais representativas; mas sinto que seria inútil e uma perda de tempo para vocês e para mim se o que vou dizer, e o que tenho dito, fosse aceite por vocês como uma qualquer teoria filosófica com a qual a mente se pode divertir. Tenho algo vital para dizer que é aplicável à vida, algo que, quando compreendido, os ajudará a resolver os muitos problemas da vossa vida quotidiana.

Não vou responder a estas perguntas a partir de um ponto de vista específico, porque sinto que todos os problemas devem ser tratados, não separadamente, mas como um todo. Se pudermos fazer isto, os nossos pensamentos e ações tornar-se-ão sãos e equilibrados.

Por favor não rejeitem algumas destas perguntas por serem burguesas ou feitas pela classe desocupada. São perguntas humanas e devem ser consideradas como tais, não como pertencendo a qualquer classe determinada.

Pergunta: Como considera a mediunidade e a comunicação com os espíritos dos mortos?

Krishnamurti: Podem rir-se disso ou levá-lo a sério. Em primeiro lugar, não vamos discutir se os espíritos existem ou não, mas vamos considerar o desejo que nos incita a comunicar com eles, porque essa é a parte mais importante da questão.

Com a maioria das pessoas que se dedicam a este gênero de coisas, na sua comunicação com os mortos há o desejo de serem guiados, de que se lhes diga o que fazer, uma vez que estão em constante incerteza relativamente às suas ações, e têm a esperança de que pela comunicação com aqueles que estão mortos, encontrarão orientação, poupando-se assim a si mesmos do trabalho de pensar. Portanto o desejo é de serem orientadas, dirigidas, para que possam não cometer erros e sofrer. É a mesma atitude que alguns têm relativamente aos mestres, aqueles seres que são considerados mais avançados, e portanto capazes de orientar o homem através dos seus mensageiros, etc.

O culto da autoridade é a negação da compreensão. O desejo de não sofrer gera exploração. Portanto esta busca de autoridade destrói a plenitude de ação, e a orientação origina irresponsabilidade, porque há um forte desejo de navegar através da vida sem conflito, sem sofrimento. É por esta razão se têm crenças, ideais, sistemas, na esperança de que a luta e o sofrimento possam ser evitados. Mas estas crenças, ideais, que se tornaram fugas, são a própria causa do conflito, gerando ilusões maiores, sofrimento maior. Enquanto a mente procurar conforto através da orientação, através da autoridade, a causa do sofrimento, da ignorância, não pode ser nunca dissolvida.

Pergunta: Para alcançar a verdade, devemos abster-nos do casamento e da procriação?

Krishnamurti: Ora bem, a verdade não é um fim, um objetivo que possa ser alcançado através de certas ações. É essa compreensão nascida do contínuo ajustamento à vida que exige grande inteligência; e porque a maior parte das pessoas não é capaz deste ajustamento sem auto-defesa ao movimento da vida, criam certas teorias e ideais que esperam possam guiá-los. O homem está assim preso na estrutura das tradições, dos preconceitos e das moralidades compulsivas, ditadas pelo medo e pelo desejo de auto-preservação. Isto aconteceu porque ele é incapaz de discernir continuamente o significado da vida em constante movimento, e portanto desenvolveu certos “ter de” e “não dever”. Uma vida completa e rica, com o que quero dizer uma vida extremamente inteligente, não uma existência auto-protetora, defensiva, exige que a mente esteja livre de tabus, de medos e superstições, sem os “dever” ou os “não dever”, e isto só pode existir quando a mente compreender integralmente o significado da causa do medo.

Para a maioria das pessoas há conflito, sofrimento e um ajustamento incessante no casamento; e para muitas o desejo de alcançar a verdade é apenas uma fuga a esta luta.

Pergunta: O senhor nega a religião, Deus e a imortalidade. Como é que a humanidade pode tornar-se mais perfeita, e portanto mais feliz, sem acreditar nestas coisas fundamentais?

Krishnamurti: Porque para vocês é apenas uma crença em Deus, na imortalidade, porque simplesmente acreditam nestas coisas, é que há tanta miséria, sofrimento e exploração. Só podem descobrir se existe a verdade, a imortalidade, na plenitude da própria ação, não através de uma qualquer crença, não através da asserção autoritária de outro. A realidade oculta-se na plenitude da própria ação.

Ora para a maioria das pessoas, a religião, Deus e a imortalidade são simples meios de fuga. A religião apenas ajudou o homem a fugir do conflito, do sofrimento da vida, e por isso da sua compreensão. Quando estão em conflito com a vida, com os seus problemas de sexo, exploração, ciúme, crueldade, etc., como fundamentalmente não desejam compreendê-los – porque compreender exige ação, ação inteligente – e como não estão dispostos a fazer um esforço, inconscientemente tentam fugir para aqueles ideais, valores, crenças que lhes foram passados. Assim a imortalidade, Deus e a religião tornaram-se simplesmente refúgios para uma mente que está em conflito.

Para mim, tanto o crente como o descrente em Deus e na imortalidade estão errados, porque a mente não pode abranger a realidade até que esteja completamente livre de ilusões. Só então podem afirmar, não acreditar ou negar, a realidade de Deus e da imortalidade. Quando a mente está totalmente livre dos impedimentos e das limitações criadas através da auto-proteção, quando está aberta, integralmente nua, vulnerável na compreensão da causa da ilusão auto-gerada, só então todas as crenças desaparecem, cedendo espaço à realidade.

Pergunta: É contra a instituição da família?

Krishnamurti: Sou, se a família for o centro de exploração, se estiver baseada na exploração. (Aplauso) Por favor, o que adianta simplesmente concordarem comigo? Têm que agir para alterar isto. Este desejo de perpetuação cria a família que se torna o centro de exploração. Portanto a pergunta é na realidade, pode-se alguma vez viver sem explorar? Não se a vida familiar está certa ou errada, não se ter filhos está certo ou errado, mas se a família, as posses, o poder, não são o resultado do desejo de segurança, de auto-perpetuação. Enquanto existir este desejo, a família torna-se o centro de exploração. Podemos alguma vez viver sem exploração? Eu digo que podemos. Tem que existir exploração enquanto houver esta luta pela auto-proteção; enquanto a mente procurar segurança, conforto, através da família, da religião, da autoridade ou da tradição, tem que existir exploração. E a exploração só cessa quando a mente discernir a falsidade da segurança e já não estiver enredada pelo seu próprio poder de criar ilusões. Se experimentarem com o que digo, compreenderão então que não estou a destruir o desejo, mas que podem viver neste mundo de uma maneira rica e sensata, uma vida sem limitações, sem sofrimento. Só podem descobrir isto experimentando, não negando, não através da resignação nem simplesmente imitando. Onde funciona a inteligência – e a inteligência cessa de funcionar quando há medo e o desejo de segurança – não pode haver exploração.

A maior parte das pessoas está à espera que ocorra uma mudança que milagrosamente alterará este sistema de exploração. Estão à espera que as revoluções realizem as suas esperanças, as suas ânsias não satisfeitas; mas nessa espera estão a morrer lentamente. Porque eu penso que as meras revoluções não mudam os desejos fundamentais do homem. Mas se o indivíduo começar a agir com inteligência, sem compulsão, independentemente das condições presentes ou do que as revoluções prometem no futuro, então há uma riqueza, uma plenitude, cujo êxtase não pode ser destruído.

Krishnamurti, São Paulo, 24 de Abril de 1935.

Nunca se teme o desconhecido; teme-se o acabar do conhecido.

O organismo tem um fim, obviamente. O homem pode viver cerca de noventa anos, e se os cientistas descobrirem algum medicamento talvez possa viver cento e cinquenta — mas sabe Deus porque é que se quer viver até aos cento e cinquenta, da maneira como vivemos! Mas mesmo assim, mesmo que se possa chegar aos cem anos, o organismo deteriora-se, porque vivemos de modo completamente errado: em conflito, com medo, em tensão, a matar animais e seres humanos. Que desordem fazemos das nossas vidas! A velhice torna-se portanto uma coisa terrível!

No entanto, há sempre morte — morte para os jovens, para os de meia-idade ou para os velhos. Que entendemos nós por morrer, à parte a morte física, que é inevitável? 

A morte tem um sentido mais profundo do que o simples acabar do organismo físico: o de psicologicamente chegar ao fim — o súbito acabar do "eu", do "você". Este "eu", este "você", que acumula conhecimentos, que sofre, que vive com lembranças agradáveis e dolorosas, com todo o esforço penoso do conhecido, com os conflitos psicológicos, com as coisas que não compreende, com as coisas que quis fazer e que não fez. A luta psicológica, as lembranças, o prazer, as dores — tudo isso acaba. É disso realmente que se tem medo e não do que está além da morte. Nunca se teme o desconhecido; teme-se o acabar do conhecido. E o conhecido é a nossa casa, a nossa família, a nossa mulher, os nossos filhos, as nossas ideias, os nossos livros, os nossos móveis, as coisas com que nos identificamos. Quando isso acaba, a pessoa sente-se completamente isolada, sozinha — é disso que se tem medo. Isso é uma forma de morte e essa é a única morte. 

Ao compreendermos isso — não de maneira teórica, mas realmente — ao compreendermos que se tem medo de perder tudo o que se possui ou se criou, ou aquilo para que se trabalha, perguntamos: ""Não será possível morrer psicologicamente todos os dias, para que a mente seja fresca, jovem e inocente em cada dia?"  Façam-o realmente e verão que coisas extraordinárias acontecem. Então, a mente torna-se inocente, o que uma mente envelhecida, embora cheia de experiências, nunca é. Só a mente que abandona os seus fardos todos os dias, que todos os dias põe fim aos seus problemas, é inocente. Então a vida ganha um sentido totalmente diferente. Então pode-se descobrir o que é o amor.

Krishnamurti em, O mundo somos nós

Olhando para o que a vida é e não o que gostaríamos que fosse

Para se compreender o que é a morte tem de se compreender, com grande profundeza e serenidade, o que é a vida; tem de se examinar livremente, sem ter de fato esperança seja no que for. O que não quer dizer que para examinar devamos estar num profundo desespero. A mente desesperada torna\-se extremamente cética; e a mente com uma carga de esperança também não é capaz de investigar corretamente, já está influenciada. Deste modo, para examinar o que chamamos vida, o ato quotidiano de viver, precisa-se de clareza, não a do pensamento, mas a da percepção: a clareza de ver realmente aquilo que é

Ver aquilo que é, esse próprio ato de ver, é paixão! Para a maior parte de nós, a paixão é sempre derivada do ódio, do sofrimento, da cólera, da tensão; ou então há a paixão que é produzida através do prazer e que se torna sensualidade. Uma tal paixão é incapaz da energia que é necessária para a compreensão de todo este processo de viver. Esse compreender realmente é paixão: sem paixão não podemos fazer nada. Não se trata de uma paixão intelectual, isso não é paixão. E para examinarmos a vida na sua totalidade precisamos não só de uma extraordinária clareza de percepção, mas também da intensidade da paixão. 

Que é que chamamos viver? Não aquilo que gostaríamos que fosse — isso é apenas uma ideia, sem realidade, é meramente o oposto do que é. O oposto do que é cria divisão, e nessa divisão há conflito. Ao olharmos para o que a vida é, deveremos afastar completamente a ideia do que "deveria ser", porque isso é refugiar-nos numa visão ideológica, totalmente irreal. 

Vamos apenas examinar o que é realmente viver; e a qualidade desse exame é mais importante do que o próprio exame. Qualquer pessoa inteligente, com uma certa agudeza mental e certa sensibilidade, é capaz de examinar. Mas se a exploração for meramente intelectual, perde então aquela sensibilidade que surge quando há uma certa qualidade de compaixão, que é afeto, que é atenção. 

Para ter essa qualidade da mente que vê com grande clareza, será necessário haver essa atenção, essa qualidade de afeto, de compaixão que o intelecto não poerá ter. E temos de estar vigilantes relativamente à influência do intelecto na investigação que vamos fazer do que realmente acontece na nossa vida diária — preciso estar de sobreaviso, se posso usar esta palavra, para saber que a descrição nunca é o que é descrito, nem a palavra é a coisa. 

Como dissemos, se não compreendermos o que é viver, nunca compreenderemos o que é morrer, e se não há compreensão do que é a morte, o amor torna-se mero prazer e portanto sofrimento. 

Que é isto a que chamamos viver? Como se pode observar na vida quotidiana, toda relação com as pessoas, com as ideias, com as coisas, com o que se possui, está cheia de conflito. Todo o relacionamento se tornou para nós um campo de batalha, uma luta constante. Desde que nascemos até que morremos, viver é um processo de acumular problemas, sem nunca os resolver, de estar carregado com toda a espécie de questões. É fundamentalmente um campo em que os homens estão uns contra os outros. Assim, viver é conflito. Ninguém o pode enganar. Quer nos agrade quer não, todos estamos em conflito.

Krishnamurti em, O mundo somos nós

O velho cérebro não pode compreender o novo cérebro

(...)Penso que é importante compreender a operação, o funcionamento, a atividade do velho cérebro programado psicologicamente. Quando o novo cérebro opera, sem nenhuma necessidade de programa psicológico, o velho cérebro não pode compreender o novo cérebro.

Apenas quando o velho cérebro programado psicologicamente, que é nosso cérebro condicionado, nosso cérebro animalesco, o cérebro cultivado através de séculos de tempo, que fica eternamente buscando sua própria segurança, seu próprio conforto – apenas quando o velho cérebro estiver quieto, sereno, cessar sua atividade, você verá que existe um tipo de movimento completamente diferente, e é este movimento que trará clareza. Este movimento é a clareza em si mesmo.
Compreender toda atividade, você deve compreender o velho cérebro, estar cônscio dele, conhecer todos os seus movimentos, todas suas atividades, suas exigências e buscas, e por isso a meditação é muito importante. Não quero dizer com isso o absurdo, sistematizado cultivo de certo hábito de pensamento e tudo o mais, isso é tudo muito infantil e imaturo.

Por meditação quero dizer compreender a cada instante pelo espelho das relações comuns do cotidiano, todas as operações do velho cérebro, olhá-lo, conhecer como ele reage, quais são suas respostas, suas tendências, sua exigência, sua busca agressiva para saber tudo isso, tanto a parte consciente bem como a inconsciente, sem qualquer esforço e nada acumulando do que aprende. Quando você se conhece, quando há consciência disso, sem nenhuma avaliação, sem controle, sem direção, sem dizer: “Isto é bom; isto é mau; manterei isto; não manterei aquilo”, quando você vê a totalidade do movimento do velho cérebro, quando você se vê totalmente nas relações, então o cérebro velho serena, fica quieto, esvazia-se psicologicamente, o cérebro novo atua na sua ausência.

J. Krishnamurti, The Book of Life

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Como implicar-nos na totalidade da vida e não apenas numa das suas partes?

(...) O que irá acontecer a todos nós, jovens e velhos — que iremos fazer das nossas vidas? Deixaremo-nos absorver por esta voragem da respeitabilidade convencional, com a sua moralidade social e econômica, tornaremo-nos parte da chamada sociedade culta, com todos os seus problemas, a sua confusão e suas contradições? Ou iremos fazer da nossa vida uma coisa inteiramente diferente? este é o problema que está perante a maior parte das pessoas.

Somos educados, não para compreender a vida como um todo, mas para desempenhar um papel particular nesta totalidade que é a existência. Estamos pesadamente condicionados desde a infância para "alcançar" alguma coisa nesta sociedade, para ter sucesso e para nos tornarmos burgueses completos. O intelectual sensível geralmente revolta-se contra um tal padrão de existência. Na sua revolta pode fazer várias coisas: ou se torna anti-social e contra a política, toma drogas e vai atrás de qualquer crença religiosa, estreita e sectária, ou se torna um ativista, um comunista (por exemplo), ou ainda, dá-se inteiramente a alguma religião exótica como o budismo ou o hinduísmo. E tornando-nos sociólogos, cientistas, artistas, escritores, ou, se estivermos capacitados para isso, filósofos, fechamo-nos num círculo e pensamos ter resolvido o problema. Imaginamos então ter compreendido a totalidade da existência e ditamos aos outros o que deveria ser a vida, de acordo com a nossa tendência particular, a nossa idiossincrasia, e segundo o ângulo do nosso conhecimento especializado. 

Quando observamos o que é a vida com a sua enorme complexidade e confusão, não apenas nas esferas econômica e social, mas também na esfera psicológica, temos de perguntar-nos — se somos realmente sérios — que papel vamos ter em tudo isto. Que vou fazer como ser humano a viver neste mundo, e não a fugir para alguma existência de fantasia ou para algum mosteiro? 

Ao vermos todo este quadro com toda a clareza, qual vai ser então o nosso comportamento, o que vamos fazer da nossa vida? esta questão tem sempre de por-se, quer estejamos dentro do sistema, quer apenas à beira de entrar nele. Por isso, parece-me, temos inevitavelmente de perguntar: Qual a finalidade da vida? E como ser humano razoavelmente saudável do ponto de vista psicológico, que não é totalmente neurótico, que está vivo e ativo: Que papel terei em tudo isto? Que papel ou que parte me atrai? E se me sinto apenas atraído para um fragmento ou uma secção determinados, tenho então de ter consciência do perigo de tal atração, porque assim regressamos de novo à mesma velha divisão, que gera esforço, contradição e guerra. 

Poderei então tomar parte na totalidade da vida e não apenas num segmento dela? Tomar parte na totalidade da vida não significa obviamente ter conhecimento completo de ciências — sociologia, matemática, etc. — da filosofia, assim por diante; isso seria impossível a não ser que se fosse um gênio. 

Poderemos portanto criar psicologicamente, interiormente, um modo de viver totalmente diferente? Isto significa, como é óbvio, que todas as coisas exteriores nos interessam, mas que a revolução fundamental, radical, se realiza no campo psicológico. 

Que podemos fazer para promover em nós próprios uma tão profunda mudança? Porque cada um e nós é a sociedade, é o mundo, é tudo o que está contido no passado. Assim, o problema é: Como podemos nós, vocês e eu, implicar-nos na totalidade da vida e não apenas numa das suas partes? 

Krishnamurti em, O mundo somos nós

Só na morte dá-se vida ao amor

(...) O que é o amor? O amor será prazer? Será desejo? O amor será produto do pensamento, como são o prazer e o medo? Poderá o amor ser cultivado, poderá vir com o tempo? E se não sei o que é o amor, serei capaz de o encontrar? 

O amor não é, obviamente, sentimentalismo ou emocionalidade, por isso podemos pô-los imediatamente de lado, porque o sentimentalismo e a emocionalidade são românticos, e o amor não é romantismo. 

O prazer e o medo fazem parte do movimento do pensamento e para a maior parte de nós o prazer é a coisa mais importante na vida — o prazer sexual e a lembrança dele, o pensamento de ter tido esse prazer, pensar nele, tornar a pensar e desejar tê-lo amanhã — a moralidade social está baseada no prazer.

Assim, se o prazer não é amor, então o que é o amor? Reparem nisto, por favor, porque vocês é que têm de dar a resposta a essas questões, não podem esperar apenas que o orador ou qualquer outra pessoa o faça. Trata-se de um problema humano fundamental que tem de ser resolvido por cada um de nós, não por um guru ou filósofo que diga "isto é amor", "aquilo não é amor". 

Amor não é ciúme, não é inveja, ou será? Vocês estão muito silenciosos! Poderemos amar e ao mesmo tempo sermos ávidos, ambiciosos, competitivos? Pode-se amar quando se matam não só os animais, mas também outros seres humanos? 

Pela negação daquilo que o amor não é — não é ciúme, inveja, ódio, não é atividade egocêntrica do "eu", e do "você", a competição tão cheia de falsidade, e desumanidade e a violência da vida quotidiana — saberemos o que é o amor. Quando pusermos de lado todas estas coisas, não intelectualmente mas de maneira real, com o nosso coração, a nossa mente, as nossas... ia a dizer entranhas — porque obviamente tudo isto não é amor — então encontraremos o amor. Quando soubermos o amor, quando tivermos amor, então estaremos livres para fazer o que está certo; e o que quer que façamos estará certo. 

Mas para chegar a este estado, para ter esse sentido da beleza e da compaixão que o amor traz, tem também de haver a morte do ontem. A morte do ontem significa morrer interiormente a todas as coisas — a toda a ambição e a tudo o que se tenha acumulado psicologicamente. Afinal, quando vier a morte, isso é o que de qualquer modo vai acontecer — deixaremos a nossa família, a nossa casa, os nossos valores, todas as coisas que possuímos. Deixaremos todos os livros, donde obtemos tantos conhecimentos, assim como os livros que queríamos escrever e não escrevemos, e os quadros que queríamos pintar. Quando se morre a tudo isso, então a mente está completamente nova, fresca e inocente. Suponho que vão dizer que é impossível. 

Quando se diz que é impossível, começa-se então a inventar teorias: deve haver uma vida depois da morte. Segundo os cristãos há a ressurreição, enquanto toda a Ásia acredita na reencarnação. Os hindus afirmam que é impossível morrer para todas as coisas enquanto ainda se tem vida, saúde e beleza; assim, temendo a morte, dão esperança inventando essa coisa maravilhosa chamada reencarnação, o que significa que a próxima vida será melhor. Contudo, o melhor tem uma condição: para ser melhor na próxima vida, tenho de ser bom nesta, portanto, devo saber comportar-me. Devo viver de maneira reta; não devo fazer mal a ninguém, não deve haver ansiedade, nem violência. Mas infelizmente esses crentes da reencarnação não vivem dessa maneira; pelo contrário, são agressivos, tão cheios de violência como qualquer outro, por isso a sua crença tem tão pouco valor como os dias de ontem já mortos. 

O que é importante é o que se é agora, e não se se acredita ou não acredita, se as experiências que se têm são psicodélicas ou apenas vulgares. O que importa é viver com retidão, com virtude — sei que não se gosta desta palavra. Abusou-se terrivelmente destas duas palavras "virtude" e "retidão", todos os sacerdotes as usam, qualquer moralista ou idealista as emprega. Mas a virtude é completamente diferente de qualquer de qualquer coisa que seja praticada como sendo virtude, e aí reside a sua beleza; se se tenta "praticá-la", deixa de ser virtude. Ela não é do tempo, por isso não pode ser "praticada", e uma conduta reta não depende do ambiente; a conduta que depende do ambiente poderá estar correta à sua maneira, mas não é virtude. Virtude é amor; é não ter medo, é viver no mais alto nível da existência, o que significa morrer interiormente para todas as coisas — morrer para o passado — para que a mente se torne clara e inocente. 

Só uma mente assim pode encontrar aquela imensidão extraordinária que não é invenção da própria pessoa, nem de algum filósofo ou guru.

Krishnamurti em, O mundo somos nós

sábado, 10 de janeiro de 2015

Compreendendo o campo de batalha chamado relacionamento

Como se pode observar na vida cotidiana, toda a relação com as pessoas, com as ideias, com as coisas, com o que se possui, está cheia de conflito. Todo relacionamento se tornou para nós um campo de batalha, uma luta constante. Desde que nascemos até que morremos, viver é um processo de acumular problemas, sem nunca os resolver, de estar carregado de toda espécie de questões. É fundamentalmente um campo em que os homens estão uns contra os outros. Assim, viver é conflito. Ninguém o pode negar. Quer nos agrade quer não, todos estamos em conflito. 

Como desejamos afastar-nos desse conflito permanente, inventamos então toda espécie de fugas — desde o futebol a uma imagem de Deus. Cada um de nós conhece, não só o fardo desse conflito, mas também o sofrimento, a solidão, o desespero, a ansiedade, a ambição e frustração, o imenso tédio, a rotina. Há ocasionais lampejos de alegria, a que a mente imediatamente se agarra, como algo muito raro, e que quer que se repita; depois, essa alegria torna-se uma lembrança, cinzas. É a isso que chamamos vier. 

Se olharmos para a nossa própria vida — não verbalmente, ou intelectualmente, mas como ela é na realidade — veremos como é vazia. Pensem no que é passar quarenta, cinquenta anos indo todos os dias para o emprego, para juntar dinheiro, para sustentar a família, etc. É a tudo isso que chamamos viver — com a doença, com a velhice e com a morte. E tentamos fugir a esse tormento por meio da religião, por meio da bebida, da erudição, do sexo, por meio de todas as formas de evasão, religiosas ou de outra espécie. A nossa vida é isso, apesar de nossas teorias, dos nossos ideais, da nossa filosofia — vivemos em conflito e sofrimento. 

A nossa vida dá origem a uma cultura, a uma sociedade que se torna a armadilha em que estamos prisioneiros. Somos nós que construímos a armadilha; cada um de nós é responsável por ela. Embora possamos revoltar-nos contra a ordem estabelecida, essa ordem é aquilo que temos feito, aquilo que temos construído. E a mera revolta contra ela tem pouquíssimo significado, porque se criará então uma outra ordem estabelecida, uma outra burocracia. 

Tudo isto, com as diferenças nacionais, raciais, religiosas, as guerras, e o derramamento de sangue e lágrimas. é o que chamamos vida; e não sabemos o que havemos de fazer. Estamos confrontados com isto. E não sabendo o que fazer, procuramos fugir ou tentamos encontrar alguém que nos diga o que devemos fazer, alguma autoridade, algum guru ou instrutor espiritual, alguém que afirme: "este é que é o caminho."

Os instrumentos espirituais, os gurus, os mahatmas, os filósofos têm-nos orientado mal, porque afinal não temos resolvido realmente os nossos problemas; as nossas vidas não são diferentes. Continuamos atormentados, infelizes, carregados de sofrimento. 

(...) Sem sabermos o que é o sofrimento e sem compreendermos a sua natureza e estrutura, não saberemos o que é o amor, porque para nós o amor é sofrimento, aflição, prazer, ciúme. Quando o marido diz à mulher que a ama e ao mesmo tempo é ambicioso, será que esse amor tem algum significado? Um homem poderá amar? E apesar disso falamos de amor, de ternura, de acabar com as guerras, quando afinal somos competitivos, ambiciosos, procurando o nosso avanço pessoal, a nossa posição, etc. Tudo isso traz sofrimento. 

O sofrimento poderá acabar? Só poderá acabar quando a pessoa compreender a si mesma — que é realmente aquilo que é. Então compreenderá por que é que sofre, quer esse sofrimento seja autopiedade, seja medo de estar só, seja o vazio de sua própria existência ou o sofrimento que surge quando se depende de outro. E isto faz parte de nossa vida. 

(...) Intelectualmente estamos limitados e emocionalmente somos inautênticos, deformados, cheios de sentimentalismo, falsidade e hipocrisia. Assim, na vida perdemos toda a liberdade, exceto no sexo. Essa é provavelmente a única coisa livre que se tem. E com ele anda o prazer, a imagem que o pensamento cria a respeito do ato, e ruminamos essa imagem, esse prazer, como uma vaca mastiga repetidamente o alimento. É a única coisa que se tem em que a pessoa se sente realmente livre como ser humano. Em tudo o mais não é livre, porque somos escravos da propaganda(...) E, faltando a liberdade por todo o lado, apenas existe essa, que também não é liberdade, porque se fica aprisionado pelo prazer e pela responsabilidade desse prazer, que é a família. Mas se realmente se amasse a família, se realmente se amassem os filhos, de todo o coração, pensam que teria um único dia de guerra? 

Encontra-se segurança no prazer e por consequência nessa "segurança" há dor, tristeza e confusão; dessa maneira, em tudo, incluindo o sexo, há sofrimento, tortura, dúvida, ciúme, dependência. A única coisa que se tem em que a pessoa se sente livre também se torna uma escravidão. 

Assim, ao vermos tudo isto — de fato, não verbalmente, sem sermos desviados pela descrição, porque a descrição nunca é o que é descrito — ao vermos com os nossos olhos, coração e amente, com completa atenção, saberemos o que é o amor. E saberemos também, o que é a morte e o que é a vida.

Krishnamurti em, O Mundo Somos ´Nós

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

No amor não há espaço para autoridade e conformidade

(...) Como é fácil destruir o que amamos! Com que rapidez surge uma barreira entre nós, uma palavra, um gesto, um sorriso! A saúde, o humor e o desejo nos entristecem e o que era maravilhoso torna-se insípido e opressivo. Pelo uso nós nos desgastamos, e aquilo que era vivo e claro torna-se cansativo e confuso. Por meio de constantes atritos, esperanças e frustrações, aquilo que era belo e simples torna-se terrível e cheio de expectativas. Relacionamentos são complexos e difíceis, e poucos conseguem sair deles ilesos. Embora quiséssemos que fosse estático, duradouro e contínuo, o relacionamento é um movimento, um processo que deve ser profunda e completamente entendido, e não forçado a se conformar a um padrão interno ou externo. A conformidade, que é a estrutura social perde seu peso e autoridade somente quando há amor. O amor no relacionamento é um processo purificador, pois revela os mecanismos do eu. Sem essa revelação, o relacionamento tem pouca importância.

Mas como lutamos contra essa revelação! A luta assume muitas formas: controle ou submissão, medo ou esperança, ciúme ou aceitação e assim por diante. A dificuldade é que nós não amamos; e se nós de fato amamos, queremos que isso funcione de uma forma particular, não lhe damos liberdade. Nós amamos com nossas mentes e não com nossos corações. A mente pode se modificar, mas o amor, não. A mente pode se tornar invulnerável, mas o amor, não; a mente pode sempre se retrair, ser exclusivista, tornar-se pessoal ou impessoal. O amor não é para ser comparado e tolhido. Nossa dificuldade está naquilo que chamamos amor, que é realmente da mente. Enchemos nossos corações com coisas da mente e mantemos nossos corações sempre vazios e cheios de expectativas. É a mente que se apega, que é ciumenta, que controla e destrói. Nossa vida é dominada pelos centros físicos da mente. Nós não amamos e não deixamos em paz, mas ansiamos por ser amados; nós damos a fim de receber, que é a generosidade da mente, não do coração. A mente está sempre buscando garantia, segurança; e pode o amor ser garantido pela mente? Pode a mente, cuja própria essência é temporal, perceber o amor, que é sua própria eternidade?

(...) Nossa maior dificuldade é estar ampla e profundamente atentos ao fato de que não existem meios para o amor como um objetivo desejável da mente. Quando entendemos isso real e profundamente, há uma possibilidade de receber algo que não é desse mundo. Sem o toque desse algo, façamos o que quisermos, não poderá haver felicidade duradoura no relacionamento. Se você receber essa graça e eu não, naturalmente estaremos em conflito. Você pode não estar em conflito, mas eu estarei; e em minha dor e tristeza eu me desligarei. A dor é tão exclusiva quanto o prazer, e até que exista aquele amor que não seja uma construção minha o relacionamento será dor. Se houver a benção daquele amor, você nada poderá fazer a não ser me amar pelo que sou, pois então não moldará o amor segundo o seu comportamento. Quaisquer que sejam os truques da mente, somos independentes; embora possamos estar em contato um com o outro em alguns pontos, a integração não é com você, mas dentro de mim. Essa integração não é resultado da mente em nenhum momento; ela toma forma somente quando a mente está inteiramente silenciosa, tendo alcançado o limite de suas forças. Somente assim não existe dor no relacionamento.

Krishnamurti em, Comentários sobre o Viver

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Deixando de ser um bobo alegre

Sobre as influências da inconsciência coletiva

Sobre a mediocridade de seguir a autoridade psíquica

Sobre o ficar no ócio

De fato não temos amor

Sabe, de fato não temos amor – essa é uma coisa terrível de se perceber. De fato não temos amor; temos sentimento; temos emocionalismo, sensualidade, sexualidade, temos lembranças de alguma coisa que pensamos que era amor. Mas de fato, brutalmente, não temos amor. Porque ter amor significa não ter violência, nem medo, nem competição, nem ambição. Se você teve amor, nunca dirá, "Esta é minha família." Você pode ter uma família e lhe dar o melhor que pode; mas ela não será "sua família" que está em oposição ao mundo. Se você ama, se existe amor, existe paz. Se você amasse, educaria seu filho não para ser nacionalista, não para ter apenas uma profissão técnica e tratar apenas de seus pequenos assuntos; você não teria nacionalidade. Não haveria divisões de religião, se você amasse. Mas como essas coisas de fato existem – não teoricamente, mas brutalmente – este mundo hediondo, mostra que você não tem amor. Mesmo o amor da mãe por seu filho não é amor. Se a mãe realmente amasse seu filho, você acha que o mundo seria assim? Ela cuidaria que ele tivesse o alimento correto, a educação correta, que fosse sensível, que apreciasse a beleza, que não fosse ambicioso, ganancioso, invejoso. Então a mãe, conquanto ela possa pensar que ama seu filho, não ama. Então não temos esse amor.

Krishnamurti em, The Collected Works, Vol. XV Varanasi 5th Public Talk 28th November 1964

Todos dizem "eu te amo" sem saber o que é amor

Todo o mundo fala de amor - toda a revista e jornal e todo missionário discorre interminavelmente sobre o amor.(...) Quando você diz que ama a Deus, que isso significa? Significa que ama uma projeção de sua própria imaginação, uma projeção de si mesmo, revestida de certas formas de respeitabilidade, conforme o que você pensa ser nobre e sagrado; o dizer "Amo a Deus" é puro contrassenso. Quando você adora a Deus, está adorando a si mesmo; e isso não é amor.

(...) A adoração de uma certa pessoa, o amor carnal, a troca de emoções, o companheirismo - será isso o que se entende por amor? Essa foi sempre a norma, o padrão, que se tornou tão pessoal, sensual, limitado, que as religiões declararam que o amor é muito mais do que isso. Naquilo que denominam "amor humano", elas veem que existe prazer, competição, ciúme, desejo de possuir, de conservar, de controlar, de influir no pensar de outrem e, sabendo da complexidade dessas coisas, dizem as religiões que deve haver outra espécie de amor - divino, belo, imaculado, incorruptível.

(...) Pode o amor ser dividido em sagrado e profano, humano e divino, ou só há amor? O amor é para um só e não para muitos? Se digo "Eu te amo", isso exclui o amor do outro? O amor é pessoal ou impessoal? Moral ou imoral? Familial ou não familial? Se você ama a humanidade, pode amar o indivíduo? O amor é sentimento? Emoção? O Amor é prazer e desejo? Todas essas perguntas indicam - não é verdade? - que temos ideias a respeito do amor, ideias sobre o que ele deve ou não deve ser, um padrão, um código criado pela cultura em que vivemos.

(...) Para compreender o amor, não devo em primeiro lugar libertar-me de minhas inclinações e preconceitos? Vejo-me confuso, dilacerado pelos meus próprios desejos e, assim, digo entre mim: "Primeiro, dissipa a sua confusão. Talvez você tenha possibilidade de descobrir o que é amor através do que ele não é".

(...) O governo ordena: "Vai e mate, por amor à pátria!" Isso é amor? A religião preceitua: "Abandone o sexo, pelo amor de Deus". Isso é amor? O amor é desejo? Não diga que não. Para a maioria de nós, é; desejo acompanhado de prazer, prazer derivado dos sentidos, pelo apego e o preenchimento sexual.
(...) Você diz que ama sua esposa. Nesse amor está implicado o prazer sexual, o prazer de ter uma pessoa em casa para cuidar dos filhos e cozinhar. Você depende dela; ela lhe deu o seu corpo, suas emoções, seus incentivos, um certo sentimento de segurança e bem-estar. Um dia, ela o abandona; se aborrece ou foge com outro homem, e eis destruído todo o seu equilíbrio emocional; essa perturbação, de que você não gosta, chama-se ciúme. Nele existe sofrimento, ansiedade, ódio e violência. Por conseguinte, o que realmente você está dizendo é: "Enquanto me pertence, eu te amo; mas, tão logo deixe de me pertencer, começo a lhe odiar. Enquanto posso contar com você para a satisfação de minhas necessidades sociais e outras, eu te amo, mas, tão logo deixe de atender a minhas necessidades, não gosto mais de você".

(...) A mente que se acha nas garras do sofrimento jamais conhecerá o amor; o sentimentalismo e a emotividade nada, absolutamente nada, têm que ver com o amor. Por conseguinte, o amor nada tem em comum com o prazer e o desejo.

O amor não é produto de pensamento, que é o passado. O pensamento não pode de modo nenhum cultivar o amor. O amor não se deixa cercar e enredar pelo ciúme; porque o ciúme vem do passado. O amor é sempre o presente ativo. Não é "amarei" ou "amei". Se você conhece o amor, não seguirá ninguém. O amor não obedece. Quando se ama, não há respeito nem desrespeito.

Você não sabe o que significa amar realmente alguém - amar sem ódio, sem ciúme, sem raiva, sem procurar interferir no que o outro faz ou pensa, sem condenar, sem comparar - não sabe o que isto significa? Quando há amor, há comparação? Quando você ama alguém de todo o coração, com toda a sua mente, todo o seu corpo, todo o seu ser, existe comparação? Quando você se abandona completamente a esse amor, não existe "o outro".

O amor tem responsabilidades e deveres, e emprega tais palavras? Quando você faz alguma coisa por dever, há nisso amor? No dever não há amor. A estrutura do dever, na qual o ente humano se vê aprisionado, o está destruindo. Enquanto você é obrigado a fazer uma coisa, porque é seu dever fazê-la, não ama a coisa que está fazendo. Quando há amor, não há dever nem responsabilidade.

A maioria dos pais, infelizmente, pensa que são responsáveis por seus filhos, e seu senso de responsabilidade toma a forma de lhes preceituar o que devem fazer e o que não devem fazer, o que devem ser e o que não devem ser. Querem que os filhos conquistem uma posição segura na sociedade. Aquilo a que chamam de responsabilidade faz parte daquela respeitabilidade que eles cultivam; e a mim me parece que, onde há respeitabilidade, não existe ordem; só lhes interessa o tornar-se um perfeito burguês. Preparando os filhos para se adaptarem à sociedade, estão perpetuando a guerra, o conflito e a brutalidade. Pode-se chamar a isso zelo e amor? (...) quando preparam os seus filhos para se adaptarem à sociedade, os estão preparando para serem mortos. Se amassem seus filhos, não haveria guerras.

(...) Assim, ao perguntar o que é o amor, você pode ter muito medo de ver a resposta. Ela pode significar uma completa reviravolta; poderá dissolver a família; você pode descobrir que não ama sua esposa ou marido ou filhos (você os ama?); pode ter de demolir a casa que construiu; pode nunca mais voltar ao templo.

(...) Mas, se você deseja continuar a descobrir, verá que o medo não é amor, a dependência não é amor, o ciúme não é amor, a posse e o domínio não são amor, responsabilidade e dever não são amor, autocompaixão não é amor, a agonia de não ser amado não é amor, que o amor não é o oposto do ódio, como a humildade não é o oposto da vaidade. Desse modo, se você for capaz de eliminar tudo isso, não à força, porém lavando-o assim como a chuva fina lava a poeira de muitos dias depositada numa folha, então, talvez, encontrará aquela flor peregrina que o homem sempre buscou sequiosamente.

Se você não tem amor - não em pequenas gotas, mas em abundância; se não está transbordando de amor, o mundo irá ao desastre. Intelectualmente, você sabe que a unidade humana é a coisa essencial e que o amor constitui o único caminho para ela, mas quem pode lhe ensinar a amar? Poderá uma autoridade, um método, um sistema lhe ensinar a amar? Se alguém o ensina, isso não é amor. Você pode dizer: "Eu me exercitarei para o amor. Todos os dias me sentarei para refletir sobre ele. Exercitar-me-ei para ser bondoso, delicado e me forçarei a ser atencioso com os outros"? – Você acha que pode se disciplinar para amar, que pode exercer a vontade para amar? Quando exerce a vontade e a disciplina para amar, o amor lhe foge pela janela. Pela prática de um certo método ou sistema de amar, você pode se tornar muito hábil, ou mais bondoso, ou entrar num estado de não-violência, mas nada disso tem algo em comum com o amor.

(...) Uma coisa me parece absolutamente necessária; a paixão sem motivo, a paixão não resultante de compromisso ou ajustamento, a paixão que não é lascívia. O homem que não sabe o que é paixão, jamais conhecerá o amor, porque o amor só pode existir quando a pessoa se desprende totalmente de si própria.

A mente que busca não é uma mente apaixonada, e não buscar o amor é a única maneira de encontrá-lo; encontrá-lo inesperadamente e não como resultado de qualquer esforço ou experiência. Esse amor, como vereis, não é do tempo; ele é tanto pessoal, como impessoal, tanto um só como multidão.

(...) O amor é uma coisa nova, fresca, viva. Não tem ontem nem amanhã. Está além da confusão do pensamento. Só a mente inocente sabe o que é o amor, e a mente inocente pode viver no mundo não inocente. Só é possível encontrá-la, essa coisa maravilhosa que o homem sempre buscou sequiosamente por meio de sacrifícios, de adoração, das relações, do sexo, de toda espécie de prazer e de dor, só é possível encontrá-la quando o pensamento, alcançando a compreensão de si próprio, termina naturalmente. O amor não conhece o oposto, não conhece conflito.

(...) Mas, você não sabe como chegar a essa fonte maravilhosa - e, assim, o que faz? Quando não sabe o que fazer, nada faz, não é verdade? Nada, absolutamente. Então, interiormente, você está completamente em silêncio. Compreende o que isso significa? Significa que você não estás buscando, nem desejando, nem perseguindo; não existe nenhum centro. Há, então, o amor.

Krishnamurti - Do Livro: "LIBERTE-SE DO PASSADO"


terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Não adianta gastar vela com defunto ruim

A vocação de Cuidar do Ser que somos

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

A questão dos paradigmas

Seguir uma profissão libertará o homem do conflito e da confusão?

A educação moderna resultou em completo fracasso, por ter exagerado a importância da técnica. Encarecendo-a em demasia, destruímos o homem. Desenvolvendo capacidades e eficiência, sem compreensão da vida, sem uma percepção total dos movimentos da mente e do desejo, nos tornaremos cada vez mais cruéis, o que significa fomentar guerras e colocar em perigo nosso segurança física. O exclusivo cultivo da técnica tem produzido cientistas, matemáticos, construtores de pontes e conquistadores do espaço. Compreenderão esses homens o processo total da vida? Pode um especialista experimentar a vida como um todo? Só se deixar de ser um especialista. 

O progresso técnico resolve certos problemas para certas pessoas, num dado nível, mas, ao mesmo tempo, gera problemas mais vastos e profundos. Viver num só nível, desprezando o processo total da vida, é atrair desgraça e destruição. A maior necessidade e o problema mais urgente de todo indivíduo é adquirir uma compreensão integral da vida, que o habilite a enfrentar suas sempre crescentes complexidades. 

O saber técnico, embora necessário, de modo algum resolverá as nossas premências interiores e conflitos psicológicos; e porque adquirimos saber técnico sem compreensão do processo total da vida, a técnica se tornou meio de destruição. O homem que sabe dividir o átomo mas não tem amor no coração, transforma-se num monstro. 

Escolhemos uma profissão de acordo com nossas capacidades; mas, seguir uma profissão libertará o homem do conflito e da confusão? Uma dada espécie de preparo técnico parece necessária; mas, depois que nos tornamos engenheiros, médicos, contadores, o que acontece? A prática de uma profissão representa o preenchimento da vida? Parece que sim, para a maioria de nós. Nossas várias profissões mantêm-nos ocupados durante a maior parte da existência; mas as próprias coisas que criamos e das quais tanto nos maravilhamos, causam destruições e desgraças. Nossas atitudes e nossos valores estão fazendo das coisas e das profissões instrumentos da inveja, do ressentimento e do ódio. 

Sem a compreensão de nós mesmos, a mera operosidade conduz à frustração, com as suas inevitáveis fugas através de atividades maléficas de todo gênero. Técnica sem compreensão leva à inimizade e à crueldade, o que costumamos disfarçar com frases bem-soantes. De que serve encarecermos a importância e nos tornarmos entidades eficientes, se o resultado é a mútua destruição? Nosso progresso técnico é fantástico, mas só teve como resultado aumentar as possibilidades de nos destruirmos mutuamente; e em todos os países reinam a fome e a miséria. Não somos entes pacíficos e felizes. 

Quando se atribui à função toda a importância, a vida se torna insípida e monótona, uma rotina mecânica e estéril, da qual fugimos nos entregando a toda espécie de distrações. O acúmulo de fatos e o desenvolvimento de capacidades, a que chamamos educação, privou-nos da plenitude da vida de integração e ação. Porque não compreendemos o processo total da vida, nos apegamos à capacidade e à eficiência, que por essa razão assumem uma importância tremenda. O todo, porém, não pode ser compreendido pela parte; só pode ser compreendido por meio da ação e da experiência. 

Outro fator determinante no cultivo da técnica é que esta nos proporciona um sentimento de segurança, não só econômica mas também psicológica. É confortante verificar que somos capazes e eficientes. Saber que temos capacidade para tocar piano ou para construir uma casa nos dá um sentimento de vitalidade, de arrogante independência; mas realçar a importância da capacidade, por causa de um desejo de segurança psicológica, é negar a plenitude da vida. O conteúdo total da vida nunca pode ser previsto e tem de ser experimentado sempre como coisa nova, momento por momento. Tememos o desconhecido, por isso estabelecemos para nós mesmos zonas psicológicas de segurança, sob a forma de sistemas, técnicas e crenças. Enquanto andarmos em busca de segurança interior não compreenderemos o processo total da vida.

(...) Quem tem realmente alguma coisa para dizer, com o mesmo ato de externá-la cria seu estilo próprio; mas aprender um estilo sem ter a capacidade de experimentar interiormente, só pode redundar em superficialidade.

Krishnamurti em, A educação e o significado da vida

domingo, 4 de janeiro de 2015

O silêncio: a verdade atemporal

Todos nós temos os nossos brinquedos que nos absorvem, e, por isso, pensamos que estamos muito quietos; mas, se um homem se dedica a uma certa forma de atividade, científica, literária ou qualquer outra, o brinquedo apenas o absorve e ele não está, em absoluto, totalmente quieto.

O único silêncio que conhecemos é o silêncio que vem quando cessa o barulho, o silêncio que vem quando o pensamento cessa; mas isso não é silêncio. O silêncio é coisa toda diferente, como a beleza, como o amor. Esse silêncio não é o produto de uma mente quieta, não é o produto de células cerebrais que, tendo compreendido toda a estrutura, dizem: "Pelo amor de Deus, fica quieto!"; são, então, as próprias células cerebrais que produzem o silêncio, e isso não é silêncio. Tampouco é o silêncio produto da atenção em que o observador é o objeto observado; não há então atrito, mas isso não é silêncio.

Estais esperando que eu vos descreva o que é esse silêncio, a fim de poderdes compará-lo, interpretá-lo, levá-lo e enterrá-lo. Ele é indescritível. O que pode ser descrito é o conhecido, e o estado livre do conhecido só pode tornar-se existente quando há um morrer todos os dias para o conhecido, para os insultos, as lisonjas, para todas as imagens que tendes formado, para todas as vossas experiências: morrer todos os dias, para que as células cerebrais se tornem novas, juvenis, inocentes. Mas, essa inocência, esse frescor, essa "qualidade" de ternura e delicadeza não produz o amor; não é a "qualidade" da beleza ou do silêncio.

Aquele silêncio, que não é o silêncio do fim do barulho, é só um modesto começo. É como passar por um túnel estreito para se chegar a um oceano imenso, vasto, extenso — a um estado imensurável, atemporal. Mas isso não se pode compreender verbalmente, a menos que se tenha compreendido toda a estrutura da consciência e o significado do prazer, do sofrimento e do desespero, e as próprias células cerebrais se tenham tornado quietas. Então, talvez alcanceis aquele mistério que ninguém pode revelar-vos e nada pode destruir. Uma mente viva é uma mente quieta, uma mente viva é uma mente que não tem centro algum e, por conseguinte, não tem espaço nem tempo. Essa mente é ilimitada, e esta é a única verdade, a única realidade.

Krishnamurti em, Liberte-se do passado

Filme: Homens, Mulheres e Filhos

“Homens, Mulheres & Filhos” conta a história de um grupo de adolescentes do ensino médio e de seus pais enquanto tentam lidar com as diversas maneiras nas quais a Internet mudou seus relacionamentos, suas comunicações, suas auto-imagens e suas vidas amorosas. O filme trata de questões sociais como a cultura dos videogames, anorexia, infidelidade, busca da fama e a proliferação de material ilícito na Internet. Na medida em que cada personagem e cada relacionamento é testado, podemos ver a variedade de caminhos que as pessoas escolhem – alguns trágicos, outros cheios de esperança – e fica claro que ninguém está imune a esta enorme mudança social que vem através de nossos telefones, nossos tablets e nossos computadores. Do diretor Jason Reitman, o mesmo de “Juno” e “Amor sem Escalas”. Com Ansel Elgort, Jennifer Garner, Adam Sandler, Kaitlyn Dever e Dean Norris.

Não deixem de assistir... Uma das melhores expressões da realidade da irrealidade das relações, onde, o amor, de fato, nunca pode estar... Uma claríssima demostração de Adultos Adulterados Adulterantes. 

Título Original: Men, Women & Children
Direção: Jason Reitman
Ano de Lançamento no Brasil: 2014
Duração: 1 hora e 59 minutos
Gênero: Comédia | Drama
Imdb: http://www.imdb.com/title/tt3179568/

sábado, 3 de janeiro de 2015

A verdadeira rebelião

A rebelião da qual eu tenho falado não tem que ser feita contra ninguém. Ela não é na verdade uma rebelião, mas somente uma compreensão. Não, você não tem que lutar contra os padres, as freiras e os pais externos. E você não tem também que lutar contra os padres, freiras e pais internos. Porque, internos ou externos, eles estão separados de você. O externo está separado, e o interno também está separado. O interno é apenas o reflexo do externo.

Você está perfeitamente certo ao dizer: 'parece que não vale a pena rebelar-me contra aquelas pessoas velhas e desamparadas'. Eu não estou dizendo a você para se rebelar contra aquelas pessoas velhas e desamparadas.

E eu também não estou dizendo a você para se rebelar contra tudo o que eles incutiram em você. Se você se rebelar contra sua própria mente, isso será uma reação, não uma rebelião. Note a diferença. A reação surge a partir da raiva; a reação é violenta. Numa reação você se torna cego de raiva. Numa reação você passa para o outro extremo.

Por exemplo, se os seus pais ensinaram você a ficar limpo e tomar um banho todo dia, e mais isso e mais aquilo, e se foi ensinado a você desde pequenino que a limpeza está próxima de Deus; o que você fará, se um dia você começar a se rebelar? Você vai parar de tomar banho. Você vai começar a viver imundo.

Isso é o que os Hippies seguiram fazendo ao redor do mundo. Eles pensavam que isso era rebelião. Eles passaram para o outro extremo. A eles foi ensinado que a limpeza era divina; agora eles estão pensando que a imundície é divina, que a sujeira é divina. De um extremo, eles passaram para o outro. Isso não é rebelião. Isso é raiva, isso é ira, isso é desforra.

Enquanto você estiver reagindo aos seus pais e às suas idéias de limpeza, você ainda está apegado àquelas mesmas idéias. Elas ainda estão dentro de você, elas ainda têm um poder sobre você, elas ainda são dominante, elas ainda são decisivas. Elas ainda decidem a sua vida, embora você tenha se tornado o oposto delas; mas elas decidem. Você não pode tomar um banho tranqüilo, pois você se lembrará de seus pais que o forçavam a tomar banho todos os dias. Agora você não quer tomar mais banho, de jeito algum.

Quem está dominando você? Ainda os seus pais. O que eles fizeram com você, você ainda não foi capaz de desfazer. Isso é uma reação, isso não é rebelião.

Então o que é rebelião? Rebelião é pura compreensão. Você simplesmente compreende qual é o caso. Então você não fica mais obcecado por limpeza, e isso é tudo. Isso não quer dizer que você vá se tornar sujo. A limpeza tem sua própria beleza. Mas a pessoa não deve ficar obcecada por ela, porque obsessão é doença.

Mas, se você não prestar muita atenção nos pequenos detalhes, não verá muita diferença entre obsessão e inteligência. Por exemplo, se você cruzar com uma cobra no caminho e você der um salto, naturalmente você deu um salto devido ao medo. Mas esse medo é inteligência. Se você não for inteligente, for estúpido, você não vai pular para fora do caminho e, desnecessariamente, estará colocando a sua vida em perigo. A pessoa inteligente irá pular imediatamente — a cobra está ali. Isso é devido ao medo, mas esse medo é inteligente, positivo, está a serviço da vida.

Mas esse medo pode se tornar obsessivo. Por exemplo, você pode não querer sentar dentro de uma casa. Quem sabe? Ela pode desmoronar. E sabe-se que casas se desmoronam, isso é verdade. Algumas vezes, elas têm desmoronado; você não está absolutamente errado. Você pode argumentar: 'se outras casas desmoronaram, por que não esta?' Agora você está com medo de viver sob qualquer teto — ele pode desabar. Isso é uma obsessão. Isso agora se tornou não-inteligente. Quando você reage, o traço permanece lá. Mas, na rebelião não fica nenhum traço; é liberdade completa.

Você tem simplesmente que ser um observador. E o observar é a sua face original; aquele que observa é a sua consciência verdadeira. Aquilo que é observado é o condicionamento. Aquele que observa é a fonte divina de seu ser.

Osho

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

A arte de Cuidar do Ser

Só surge a vocação quando não há o medo de não sobreviver

Descobrir aquilo que gostam de fazer exige muita inteligência, porque, se temerem não ser capazes de ganhar o sustento ou não se ajustar a essa sociedade infectada, nunca descobrirão. Mas se não tiverem medo, ao se recusarem a ser empurrados para a vala da tradição pelos pais, professores, pelas exigências superficiais da sociedade, então haverá a possibilidade de descobrirem o que realmente gostam. Para isso, NÃO PODE HAVER O MEDO DE NÃO SOBREVIVER.

Porém, muitos de nós temos esse medo. Dizemos: "O que acontecerá comigo se eu não fizer o que meus pais me dizem, se eu não me ajustar a sociedade?" Assustados, agimos como nos é dito, e nisso não há amor, somente contradição, que consiste num dos fatores que origina a ambição destrutiva.

Logo, é função básica da educação auxiliá-los na descoberta do que realmente gostam de fazer, para que possam dedicar a mente e o coração inteiros, porque é isso que cria a dignidade humana, que elimina a mediocridade, a pequena mentalidade burguesa. Por isso é muito importante ter os professores certos, a atmosfera correta para que vocês possam crescer com o amor que se expressa naquilo que fazem. Sem amor, os exames, o conhecimento, as capacidades, a posição e as posses são somente cinzas, sem significado; sem amor, seus atos trarão mais guerras, mais ódio, mais danos, mais destruição.

(...)Vocês acham que a verdade é uma coisa e sua vida diária é outra, e em sua vida diária vocês desejam realizar o que chamam verdade. Mas um está separado do outro? Quando crescerem terão de ganhar o próprio sustento, não é? Afinal, é para isso que precisam ser aprovados nos exames: para se preocupar com o próprio sustento. Porém várias pessoas não se importam com a área em que atuarão ou o trabalho que farão, desde que ganhem algum dinheiro. Enquanto tiverem emprego, não importa que sejam soldado, policial, advogado ou algum tipo de comerciante desonesto.

Bem, descobrir a verdade do que constitui um meio correto de ganhar a vida é importante, não é? Porque a verdade está em suas vidas, não fora dela.(...) Portanto, antes de se tornarem soldado, policial, advogado ou um comerciante astuto, não deveriam perceber a verdade dessas profissões? Certamente, a menos que vejam a verdade daquilo que fazem e sejam guiados por ela, sua vida se tornará uma confusão hedionda.

(...) Poderemos — eu e vocês, que somos pessoas simples, comuns — viver criativamente neste mundo sem o impulso da ambição que se revela de várias formas como o desejo de poder, de posição? Vocês encontrarão a resposta correta quando amarem aquilo que estão fazendo. Se são engenheiros somente porque precisam de uma forma de sustento, ou porque seus pais ou a sociedade esperam isso de vocês, têm-se uma outra maneira de compulsão; e compulsão, sob qualquer forma, gera contradição, conflito. Porém, se realmente gostam de ser engenheiros ou cientistas, ou se podem plantar uma árvore, pintar um quadro, escrever um poema, não para obter o reconhecimento, mas somente porque gostam, verão então que nunca competirão com o outro. Acho que esta é a verdadeira chave: amar aquilo que fazem. 

Krishnamurti em, PENSE NISSO

Liberte-se da rede do tempo

Sem meditação, não existe autoconhecimento; sem autoconhecimento, não existe meditação. Então você tem que começar a saber o que você é. Você não pode ir longe sem começar perto, sem compreender o processo diário do pensamento, sentir, e ação. Em outras palavras, o pensamento tem que compreender seu próprio trabalho, e quando você vê a si mesmo funcionando, observará que o pensamento vai do conhecido para o conhecido. Você não pode pensar no desconhecido. Aquilo que você conhece não é real porque o que você conhece existe só no tempo. Para se libertar da rede do tempo é preciso interesse, não pensar a respeito do desconhecido, pois, você não pode pensar no desconhecido. As respostas para suas preces são do conhecido. Para receber o desconhecido, a própria mente deve se tornar o desconhecido. A mente é o resultado do processo de pensamento, o resultado do tempo, e este processo de pensamento deve chegar ao fim. A mente não pode pensar naquilo que é eterno, infinito; portanto, a mente deve estar livre do tempo, o processo de tempo da mente deve ser dissolvido. Só quando a mente está completamente livre do ontem, e não está usando o presente como meio para o futuro, ela é capaz de receber o eterno. Portanto, nosso interesse em meditação é conhecer a si mesmo, não só superficialmente, mas todo o conteúdo da consciência interior, oculta. Sem conhecer tudo isso e estar livre desse condicionamento você não pode ir além dos limites da mente. Por isso o processo da mente deve cessar, e para essa cessação deve haver o conhecimento de si mesmo. Portanto, meditação é o início da sabedoria, que é compreensão de sua própria mente e coração.

J. Krishnamurti, The Book of Life

Filme: Apocalypto

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Filme: O Doador de Memórias

Filme: O Último Sacramento [The Sacrament]

Sinopse: Patrick (Kentucker Audley) é um fotógrafo que viaja com seus amigos e colegas de trabalho Sam (AJ Bowen) e Jake (Joe Swanberg) até Eden Parish, uma comunidade onde sua irmã mora desde que começou um tratamento contra as drogas. Apesar de alguma dúvidas sobre o isolamento do local, ele vai até lá para visitá-la, enquanto seus amigos vão em busca de alguma história interessante para um documentário. Quando chegam, eles encontram pessoas extremamente felizes e satisfeitas com a comunidade e seus métodos de tratamento. Mas eles logo descobrem algo sinistro por trás do cenário aparentemente tranquilo.
País de Origem: EUA | Ano de Produção: 2013
Lançamento no Brasil: 2014
Direção e Roteiro: Ti West
Distribuição no Brasil: TELE FIMES

É realmente importante saber quem é um mestre ou guru?

É realmente importante saber quem é um mestre ou guru? O que importa é a vida — não o guru, um mestre, um líder ou professor que a interpreta para vocês. São VOCÊS que precisam compreender a vida. São VOCÊS que estão sofrendo, que estão angustiados; são VOCÊS que desejam saber o significado da morte, do nascimento, da meditação, da tristeza, e ninguém pode lhes dizer. Os outros podem explicar, porém suas noções podem ser totalmente falsas, e até erradas. 

Por esse motivo é bom ser cético, porque lhes dá a chance de descobrir, POR VOCÊS MESMOS, se precisam realmente de um guru. O importante é ser uma luz para si mesmo, ser o próprio mestre e discípulo, ser tanto o professor quanto aluno. Enquanto estão aprendendo, não existe professor. Será somente quando pararem de explorar, de descobrir e compreender todo o PROCESSO da vida que surgirá o professor — E ELE NÃO TERÁ VALOR. Então estarão mortos; seu professor também estará morto.

Krishnamurti em, PENSE NISSO
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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill