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terça-feira, 4 de novembro de 2014

Todo homem é neurótico, esquizofrênico

O homem é neurótico. Não apenas alguns homens são neuróticos, mas a humanidade, ela toda, é neurótica. Não se trata de cura para umas tantas pessoas, é uma questão de curar a humanidade como tal. A neurose é a condição "normal" do homem, porque cada homem passa por um treinamento, por um condicionamento. Não lhe permitem ser apenas o que é. Tem de ser moldado por um padrão particular. Esse padrão cria a neurose. 

A sociedade lhe dá um padrão, um molde. Você é cultivado dentro de certo feitio e forma. Só um fragmento de teu ser tem permissão para se expressar, enquanto a parte remanescente é represada. Isso cria uma divisão, uma esquizofrenia. E a parte que é suprimida fica lutando para se expressar. 

Assim, todo homem é esquizofrênico, dividido... dividido contra si próprio, lutando contra si próprio. O homem, como tal, é esquizofrênico. Não pode estar à vontade, não pode ser calado, nem pode ser expansivo. O inferno está sempre ali. E, a não ser que você se tornes inteiro, não pode se livrar desse inferno. 

Algo tem que ser feito para desprender essa neurose, para aproximar suas partes divididas. O que não é expresso tem de ser expresso, e essa constante repressão do inconsciente pelo consciente tem de ser eliminada.

As velhas técnicas de meditação não levam tal coisa em consideração. Por isso fracassaram. As técnicas de meditação existem há muito tempo, têm sido conhecidas através da história, mas um Buda, um Jesus, um Mahavira, todos foram fracassos. Não quero dizer que eles próprios não compreenderam. Compreenderam, alcançaram sua própria iluminação, mas não puderam auxiliar a maior parte da humanidade a alcançar a iluminação. 

Por que a religião não foi mais do que um auxílio? A razão é esta: o homem foi tomado naturalmente, e as técnicas meditativas lhes foram ensinadas tal como ele é. Essas técnicas só podem ajudar até certo ponto; podem afetar apenas a superfície. A divisão interior permanece, nada pode ser feito para dissolvê-la. 

Há por exemplo, as técnicas do Zen..., a Meditação Transcendental do iogue Mahesh... e outras técnicas mais. Elas podem ajudar até certo ponto. Podem lhe acalmar, sua superfície torna-se mais tranquila. Mas nada acontece ao seu interior. Não pode acontecer! E, de certa forma, a calma superficial é perigosa, porque, mais cedo ou mais tarde, tornará a explodir. Basicamente, nada aconteceu. Você treinou sua mente consciente para um estado mais calmo. 

Você pode facilmente acalmar sua mente através de mantras, através do constante cantarolar, através de muitas coisas. Tudo quanto criar um tédio interior lhe ajudará a obter calma. Por exemplo, se você repetir constantemente Ram-Ram-Ram, essa repetição constante cria uma sonolência, um tédio, e sua mente começa a sentir sono. Você pode sentir essa sonolência como calma, com quietude, mas não é. Na verdade, isso é uma espécie de embrutecimento. Mas, pelo menos, você pode tolerar melhor a sua vida, por causa desse embrutecimento. Pelo menos, superficialmente você estará mais satisfeito. E as forças, as forças neuróticas,continuarão fervilhando em você, por dentro. Um belo dia elas explodirão e despedaçarão a superfície. 

Tais métodos são conciliatórios. Muito poucas são as pessoas que podem ser ajudadas através deles. E as que podem ser ajudadas através deles podem ser ajudadas por quaisquer outras técnicas. Mas tais pessoas são raras exceções, são os poucos afortunados que não são neuróticos. A maioria da humanidade não tem tanta sorte.

Por isso é que minha ênfase, de início, está em dissolver sua divisão interior, fazer-lhe um — uma unidade. A não ser que você seja um, nada pode ser feito. Assim, a primeira coisa está em dissolver a sua neurose.

Minha técnica é a da Meditação Dinâmica, que aceita a sua neurose tal como ela é, e tenta liberá-la. A técnica se inicia, basicamente, com uma catarse. Tudo o que está escondido deve ser liberado. Você não deve continuar reprimindo. Antes, escolhe a expressão como caminho. Não condene a si próprio. Aceite-se tal como é, porque a condenação apenas cria divisão. Do momento em que você aceita, vai além, porque a aceitação cria uma unidade, e quando você está unido interiormente, tem energia para ir além.

Quando você está dividido interiormente, sua energia está lutando consigo mesmo. Então, ela não pode ser usada para nenhuma transformação. Assim, deixe que haja uma aceitação do que você é. Tudo que você tem estado reprimindo até agora tem que ser liberado. E se você libera sua neurose conscientemente, dia virá em você chegará ao ponto em que já não é um neurótico.

Os que reprimem as suas neuroses tornam-se cada vez mais neuróticos, enquanto os que a manifestam conscientemente, livram-se dela. Assim, a não ser que você se torne "conscientemente insano" jamais poderá tornar-se são...

Você é insano, então tem que fazer algo a esse respeito. A velha tradição diz: "Reprima a sua insanidade. Não permita que ela se manifeste ou você começará a agir de forma insana", mas eu lhe digo: "Deixe que ela venha à tona, seja consciente dela. Essa é a única via para a sanidade".

Osho em, Meditação: a arte do êxtase

A mensagem está além do simbolo fonético

Para mim, a meditação tem dois passos: primeiro, um ativo (que não é, realmente, de modo algum, meditação) e segundo, um completamente não-ativo (a consciência passiva, que é, realmente, meditação). A consciência, ou conhecimento, é sempre passiva, e, no momento em que te tornas ativo perdes teu conhecimento. É possível estar ativo e consciente apenas quando a consciência chegou a um tal ponto que agora já há, necessidade da meditação para conquistá-la, ou conhecê-la, ou senti-la. Quando a meditação se torna inútil, tu, simplesmente, pões de lado a meditação. Agora, estás consciente. Só então podes estar ao mesmo tempo consciente e ativo — de outra maneira não é possível. Enquanto a meditação ainda for necessária, não serás capaz de estar consciente durante a atividade. Mas, quando a meditação já não é necessária...

Se tu te tornaste meditação, já não precisarás dela. Então, podes ser ativo, mas mesmo nessa atividade és sempre o expectador passivo. Agora, jamais és o ator: és, sempre, uma consciência que testemunha. 

A consciência é passiva... e a meditação está fadada a ser passiva porque é apenas uma porta para a consciência — a perfeita consciência. Assim, quando as pessoas falam em meditação "ativa", estão erradas. Meditação é passividade. Podes precisar de alguma atividade, de algum "fazer" para chegar a ela — isso pode ser compreendido — mas isso não se dá porque a meditação seja, em si, ativa. Isso, antes, se dá, porque estiveste ativo em tantas e tantas vidas — a atividade tornou-se de tal forma parte e parcela de tua mente — que precisas até mesmo da atividade para alcançar a não-atividade. 

Estivestes tão envolvido em atividade que não podes abandoná-la. Assim, pessoas como Krishnamurti podem continuar a dizer: "Abandone isso", mas continuarás a perguntar como abandonar isso. Krishnamurti dirá: "Não perguntes como. Estou dizendo que abandones isso! Não há um 'como' para tanto. Não há necessidade de nenhum 'como'."

De certa forma ele está certo. Consciência passiva ou meditação passiva não têm um "como". Não podem ter, porque se houver um "como" então não pode ser passiva. Mas está certo, também, porque não leva em conta seu ouvinte. Ele está falando de si próprio. 

A meditação se faz sem "como", sem tecnologia, sem qualquer técnica. Assim, Krishnamurti está totalmente correto, mas o ouvinte não foi levado em conta. O ouvinte nada mais tem senão atividade; para ele, tudo é atividade. Assim, quando dizes "A meditação é passiva, não-ativa, sem escolha. Podes apenas estar nela. Não há necessidade de esforço, de nenhum esforço, ela é sem esforço", estás falando uma linguagem que o ouvinte é capaz de entender. Ele entende a parte linguística do que dizes — e isso é que torna tudo tão difícil. Ele diz: "Intelectualmente, compreendo tudo. Tudo o que o senhor está dizendo está sendo inteiramente compreendido", mas ele é incapaz de compreender o significado. 

Não há nada de misterioso nos ensinamentos de Krishnamurti. Ele é o menos místico dos mestres. Nada há de misterioso! Tudo é obviamente claro, exato, analisado, lógico, racional, de forma que todos podem entender. E isso tornou-se uma das grande barreiras, porque o ouvinte pensa que compreendeu. Compreendeu a parte linguística, mas não compreende a linguagem da passividade. 

Compreende o que lhe está sendo dito — as palavras. Ouve-as, compreende-as, conhece o sentido daquelas palavras. Faz correlações. Um quadro inteiramente correlato vem à sua mente. O que está sendo dito é compreendido, há uma comunicação intelectual. Mas ele não compreende a linguagem da passividade. Não pode compreender. Só pode compreender a linguagem da ação — da atividade.

Osho em, Meditação: a arte do êxtase

Usa tua mente como um meio, não faças dela um fim

Se alguma coisa é causa de alguma outra coisa, jamais é inútil, mas um velho expediente é sempre inútil. Por isso que cada novo profeta tem de lutar contra os antigos profetas. Está fazendo o mesmo trabalho que eles fizeram, mas terá que opor-se aos seus ensinamentos, porque precisa negar os velhos expedientes, já que eles se tornaram vazios e sem significação. 

Todos os grandes — Buda, Cristo, Mahavira — criaram, por compaixão, grandes mentiras, apenas para levar-te para fora da casa em chamas. Se puderes ser arrancado para fora de tua mente, através de qualquer expediente, isso é tudo quanto se faz necessário. Tua mente é o cárcere. Tua mente é fatal, é a escravidão. 

Como eu disse, esse dilema terá de acontecer. Assim é a natureza da vida. Terás que aprender a estreitar a mente. Esse estreitamento será de auxílio quando saíres para fora, mas será fatal lá dentro. Será utilitário como os outros; será suicida com a própria pessoa.

Precisas existir com os outros e contigo mesmo. Toda vida unilateral faz-se defeituosa. Precisas existir entre os outros com a mente condicionada, mas deves existir contigo mesmo com uma percepção inteiramente livre de condicionamento. A sociedade cria um estreitamento de percepção, mas a própria percepção significa expansão. É limitada. Ambas as coisas são necessárias, e ambas devem ser realizadas. 

Chamo sensata a pessoa que pode realizar ambas as necessidades. Qualquer extremo é insensato, qualquer extremo é prejudicial. Assim, vive no mundo com a mente, com o teu condicionamento, mas vive contigo mesmo sem a mente, sem treinamento. Usa tua mente como um meio, não faças dela um fim. Sai dela, no momento em que tenhas essas oportunidade. Quando estiveres sozinho, sai dela, salta fora dela. Então, festeja o momento, festeja a existência em si mesma, o Ser em si mesmo. 

O simples fato de ser é tão grande celebração, se souberes como saltar para fora do condicionamento. Esse "saltar para fora" vais aprender através da Meditação Dinâmica. Ela não será causada; virá ter contigo sem qualquer causa. A meditação criará uma situação na qual irás ter ao desconhecido. Aos poucos serás levado para fora de tua personalidade habitual, mecânica, robotizada. 

Seja corajoso. Pratica a Meditação Dinâmica vigorosamente, e tudo o mais se seguirá. Não será coisa que faças, será algo que acontece. 

Não podes trazer o divino, mas podes embaraçar a sua vinda. Não podes trazer o sol para a casa, mas podes fechar a porta. Negativamente, muita coisa a mente pode fazer: positivamente, nada. Tudo quanto é positivo é uma dádiva, é uma benção. Tudo quanto é positivo vem ter contigo, enquanto tudo quanto é negativo é trabalho teu. 

A meditação (e todos os expedientes da meditação) pode fazer uma coisa: afastar-te de todos os teus obstáculos negativos. Pode trazer-te para fora de teu cárcere, que é a mente. E, quando tiveres saído, rirás. Era tão fácil sair! Tudo estava ali mesmo! Apenas um passo se fazia necessário... mas andamos em círculos e perdemos sempre um passo, aquele passo que poderia levar-nos ao centro. 

Tu andas em círculos (pela periferia), repetindo a mesma coisa. Em algum ponto a continuidade precisa ser rompida. Isso é tudo quanto pode ser feito por qualquer método de meditação. Se a continuidade for rompida, se te tornas descontínuo com o teu trabalho, então, naquele exato momento, há explosão! Naquele exato momento estás centralizado, centralizado em teu ser. E então conhecerás tudo quanto sempre foi teu, tudo quanto estava apenas esperando por ti.

Osho em, Meditação: a arte do êxtase

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

A meditação é o processo de descondicionamento

A meditação é o "processo de descondicionamento" da mente; significa estar cônscio sem condenação, sem justificação ou resistência, de cada pensamento, cada sentimento, cada fantasia que surge, conforme as nossas idiossincrasias e tendências pessoais. A meditação, pois, significa a libertação do passado. É a memória do passado que condiciona a nossa reação, e a meditação é o processo de libertar a mente do passado. 

Mas surge-nos aqui uma dificuldade. É necessário que a mente se liberte do passado, para não deformar o que é, para ver as coisas claramente, tais como são; e como pode a mente, que é resultado do passado, libertar-se do passado? Só pode libertar-se a mente do passado, ao reconhecer que cada pensamento é produto do passado, e ao ter plena consciência de que o pensamento não pode resolver problema algum. Todo problema é um estímulo, é um desafio sempre novo; e traduzir o novo em termos de velho é negar o novo. 

Quando a mente se percebe a si mesma como o centro desfigurador, e está livre, lúcida, desvinculada do passado, e não mais se separa como "você", como "eu" — está ela então tranquila; e nessa tranquilidade existe compreensão, inteligência, realidade. Essa é uma experiência que deve ser vivida por cada um, e que não pode ser repetida.Se a repetimos, então já é coisa velha. Mas se você tem interesse em resolver os problemas humanos, é necessária essa espécie de meditação; e quando a mente se torna naturalmente tranquila, como uma lagoa depois do vendaval, surge então a realidade. 

Krishnamurti em, A ARTE DA LIBERTAÇÃO

sábado, 20 de setembro de 2014

A meditação não pode ser alcançada pelo esforço

O importante na meditação é o estado da mente e do coração. Não é o que você alcança ou diz alcançar, mas o estado da mente que é inocente e vulnerável. Pela negação encontra-se o estado positivo. O mero esforço para juntar experiência ou nela viver, nega a pureza da meditação. A meditação não é um meio que leva a um fim. Ela é meio e fim. Mediante a experiência a mente nunca se tornará inocente. A negação da experiência é que faz nascer o estado positivo da inocência, que não pode ser cultivado pelo pensamento. O pensamento nunca é inocente. A meditação é a terminação do pensamento, mas não por parte do meditador, porque o meditador é a meditação. Sem a meditação, você é como um homem cego num mundo cheio de beleza, de luz e de cores.

(...) meditação não é a repetição da palavra, nem o experimentar de uma visão, nem cultivo do silêncio. A conta do rosário e a palavra não podem de fato aquietar a mente tagarela, mas isso é uma forma de auto-hipnose. O mesmo efeito se obteria com uma pílula. 

Meditação não significa absorver-se num padrão de pensamento, no encantamento do prazer. A meditação é sem começo e, por conseguinte, sem fim. 

Se você diz: "Começarei hoje a controlar os meus pensamentos, imobilizando-me na postura meditativa, respirando ritmadamente" — nesse caso você está todo entregue aos artifícios com que o homem engana a si próprio. Meditação não é absorver-se em alguma grandiosa ideia ou imagem: isso só dá uma quietação momentânea, como a da criança absorvida num brinquedo; tão logo o brinquedo deixa de ser interessante, recomeçam a inquietação e as diabruras. Meditação não é seguir uma senda invisível, conducente a um estado imaginário de bem-aventurança. No estado de meditação, a mente está vendo — observando, escutando, sem palavra, sem comentário, sem opinião — atenta ao movimento da vida em todas as suas relações, do começo ao fim do dia. E à noite, quando o organismo descansa, a mente meditadora não tem sonhos, porque esteve desperta todo o dia. Só os indolentes tem sonhos; só os que andam semi-adormecidos precisam de cer advertidos de seus próprios estados. Mas a mente que está vigilante, escutando o movimento da vida — o externo e o interno — a essa mente vem um silêncio não fabricado pelo pensamento. 

É um silêncio que o observador não pode experimentar. Se o experimenta e reconhece, isso já não é o silêncio. O silêncio da mente que medita não se encontra entre os limites do reconhecimento, porque é um silêncio sem fronteiras. 

(...) Meditação é a revelação do novo. O novo está além e acima do passado, que incessantemente se repete; a meditação é o fim da repetição. A morte que a meditação faz vir é a imortalidade do novo. O novo não se acha na esfera do pensamento, e a meditação é o silêncio do pensamento. Meditação não é uma coisa que se alcança com esforço, não é a captação de uma visão, nem excitação dos sentidos. Qual o rio, ela é indomável, rápida, inundando as suas margens.  É música sem som; não pode ser amansada e utilizada. É o silêncio no qual o observador deixou de existir desde o começo.

(...) A meditação da mente que está em silêncio é a bem-aventurança que o homem vive buscando. Nesse silêncio estão contidas todas as variedades de silêncio.

Existe o estranho silêncio de um templo ou de uma igreja vazia, no sertão, sem barulhos de turistas e devotos; e o silêncio que pesa sobre as águas faz parte do silêncio existe fora da mente.

A mente que medita contém todas essas variedades, mutações e movimentos do silêncio. Esse silêncio da mente é a essência da verdadeira mente religiosa, e o silêncio dos deuses é o silêncio da terra. A mente que medita flutua nesse silêncio, e o amor é o modo de ser dessa mente. Nesse silêncio há bem-aventurança e alegria.

(...) Se você se prepara para meditar, o que você faz não é meditação. Se você se prepara para ser bom, a bondade jamais florescerá. Se você cultiva a humildade, não há mais humildade. A meditação é como a brisa, que entra quando deixamos a janela aberta; mas, se, deliberadamente, a conservamos aberta, deliberadamente a convidamos para entrar, ela não aparecerá.

A meditação não segue o caminho do pensamento, porque o pensamento é astuto, com infinitas possibilidades de enganar a si próprio, e, portanto, não descobrirá o caminho da meditação. Como o amor, a meditação não pode ser buscada.

(...) A meditação é um trabalho difícil. Exige disciplina em sua forma mais elevada — disciplina que não é conformismo, que não é imitação, que não é obediência: a disciplina oriunda do percebimento constante, não só das coisas que nos cercam, externamente, mas também das coisas interiores. A meditação, pois, não é uma atividade de isolamento, mas sim, ação na vida diária, que exige cooperação, sensibilidade e inteligência. Se não se lançam as bases de uma vida virtuosa, a meditação se torna uma fuga e, em consequência, completamente sem valor. Não consiste a vida virtuosa em observar a moralidade social, mas estar livre da inveja, da avidez e da busca de poder — pois tudo isso gera inimizade. A libertação dessas coisas não se verifica pela ação da vontade, mas sim, pelo percebimento delas pelo autoconhecimento. Sem o conhecimento das atividades do "eu", a meditação se torna excitação dos sentidos e, por conseguinte, muito pouco significativa.

(...) Não pense que a meditação seja prolongamento e expansão da experiência. Na experiência existe sempre a testemunha, irremediavelmente ligada ao passado. A meditação, ao contrário, é a completa inação que coloca fim em toda experiência. A ação da experiência tem suas raízes no passado e, por conseguinte, envolve o tempo: leva à ação que é inação e produz a desordem. Meditação é a total inação da mente que percebe oque é, não entrelaçado com o passado. Essa ação não é reação a nenhum desafio, mas, sim, é a ação do próprio desafio, da qual não existe dualidade. A meditação é a eliminação da experiência e funciona a todas as horas, consciente ou inconscientemente; por conseguinte, não é uma ação restrita a um certo período do dia. É uma ação contínua, da manhã à noite — observação sem observador. Por conseguinte, não há separação entre a vida cotidiana e a meditação, a vida religiosa e a vida mundana. Só há divisão quando o observador está ligado ao tempo. Nessa divisão, há desordem, aflição e confusão — tal é o estado da sociedade.

A meditação, portanto, não é individualista nem social; transcende ambas as coisas e, portanto, abrange ambas. Ela é amor: a floração do amor é meditação. 

Krishnamurti em, A OUTRA MARGEM DO CAMINHO


Meditação não é uma fuga do mundo

Meditação não é uma fuga do mundo; Não é atividade egocêntrica, isolante, porém, antes, a compreensão do mundo e seus usos. Pouco tem o mundo para oferecer, além de alimento, roupa e moradia, e do prazer e do seu conjunto de aflições.

A meditação é um movimento para fora deste mundo; pois temos de ficar fora dele. Então, o mundo tem significação e é constante a beleza do céu e da terra. Então o amor não é prazer. Daí nasce uma ação que não é resultado de tensão, de contradição, da busca de preenchimento, ou da arrogância do poder.(...)

A Verdade nunca está no passado. A verdade do passado são cinzas da memória; a memória pertence ao tempo, e nas cinzas frias de ontem não se encontra a Verdade. A Verdade é uma coisa viva, não contida na esfera do tempo.(...)

Por que você necessita de alguma teoria e por que aceita uma crença? Essa constante asserção de crença é sinal de medo — medo da vida de cada dia, medo do sofrimento, medo da morte e da total falta de significação da vida. Por conseguinte, inventa-se uma teoria, e quanto mais sutil e erudita essa teoria, mais peso tem. E após dois ou dez mil anos de propaganda, ela se torna, invariável e irracionalmente, "a verdade". 

Mas, se você não aceita nenhum dogma, se vê então frente a frente com o que realmente É. Esse "o que é" é pensamento, prazer, sofrimento, e o medo da morte. Compreendendo a estrutura do seu viver diário — com sua competição, avidez, ambição e busca de poder — você verá não só o absurdo das teorias, salvadores e gurus, mas também encontrará a terminação do sofrimento, a terminação de toda a estrutura construída pelo pensamento.

A penetração e compreensão dessa estrutura é meditação. Você verá então que o mundo não é uma ilusão, mas uma terrível realidade que o homem construiu, nas relações com seus semelhantes. Isso é o que se precisa compreender e não as teorias extraídas do vedismo, com os rituais e todo o aparato da religião organizada.

Quando o homem, sem nenhum motivo, é livre de medo, inveja ou sofrimento, só então a mente está naturalmente em paz e tranquila. Pode então não só ver verdade na vida diária, de momento a momento, mas também transcender toda a percepção; por conseguinte, termina o observador e a coisa observada, cessa a dualidade.

Mas, além de tudo isso, e sem relação com essa luta, essa vaidade e esse desespero — e isto não é uma teoria — existe uma corrente sem começo nem fim; um movimento imensurável que a mente jamais pode aprender.

Ouvindo isso, senhor, você irá certamente construir uma teoria, e se você gostar dessa nova teoria, tratará de propagá-la. Mas o que se propaga nunca é a Verdade. Só existe a Verdade quando você está livre da dor, da ansiedade, da agressividade que ora lhe enche a mente e o coração. Ao perceber tudo isso e alcançar aquela benção chamada amor, você conhecerá então a verdade do que se está dizendo.

Krishnamurti em, A OUTRA MARGEM DO CAMINHO

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Meditação não é concentração, mas relaxamento

As meditações podem estar erradas. Por exemplo, qualquer meditação que leve você a uma concentração profunda está errada. Você ficará cada vez mais fechado, em vez de se abrir. Se estreitar a sua consciência, concentrar-se em algo e excluir o todo da existência, focando em uma única coisa, isso só irá criar mais tensão. Daí a palavra “atenção”. Nesse contexto ela significa “a-tensão”. O próprio sentido da palavra concentração passa uma idéia de tensão.

A concentração tem os seus usos, mas não é o mesmo que meditação. No trabalho científico, na pesquisa científica, no laboratório, você precisa de concentração. Precisa se concentrar em uma questão e excluir todo o resto, a ponto de mal se dar conta do mundo fora do seu campo de interesse. O seu mundo é exclusivamente a questão em que você está concentrado. É por isso que os cientistas se tornam pessoas ausentes, distantes. As pessoas que se concentram muito acabam se tornando distantes porque não sabem permanecer abertas ao mundo como um todo.

Outro dia eu li uma anedota.
- Eu trouxe uma rã que acabei de coletar da lagoa - disse o cientista, professor de zoologia, sorrindo para sua turma. - Primeiro vamos estudar a aparência externa dela e depois dissecá-la.
O professor desembrulhou cuidadosamente o pacote que trazia e dentro havia um sanduíche de presunto muito bem preparado. O professor olhou para o sanduíche com surpresa.
- Estranho! - exclamou. - Eu me lembro claramente de ter comido o meu almoço.

Isso costuma acontecer com os cientistas. Eles se tornam introvertidos por terem o costume de se concentrar, de estreitar a mente. É claro que estreitar a mente tem o seu proveito: ela se torna mais penetrante, fica afiada como uma agulha; ela atinge exatamente o ponto desejado, mas perde toda a vida que a rodeia.

O Buda não é um homem de concentração, é um homem de percepção. Ele não tenta estreitar a consciência - pelo contrário, tenta eliminar todas as barreiras para ficar inteiramente disponível para a existência. Observe... A existência é simultânea. Enquanto falo, o ruído do trânsito pode ser ouvido. O trem, os pássaros, o vento que sopra entre as árvores - neste momento converge o todo da existência. Você me escuta, eu falo com você e milhões de coisas estão acontecendo - isso é imensamente enriquecedor.

A concentração torna você focado a um custo muito grande: 90% da vida é descartada. Se estiver resolvendo um problema matemático, não pode escutar os pássaros, pois será uma distração. As crianças que brincam por perto, os cachorros latindo na rua, tudo será uma distração.

Por causa da concentração, as pessoas tentam fugir da vida: sobem o Himalaia, refugiam-se em uma caverna, permanecem isoladas para poder se concentrar em Deus. Mas Deus não é um objeto, Deus é esse todo, o conjunto da existência, este momento. Deus é a totalidade. É por isso que a ciência jamais poderá conhecer Deus. O método básico da ciência é a concentração e, por causa desse método, a ciência nunca chegará a conhecer Deus.

Então, o que fazer? Repetir um mantra, ao fazer a meditação transcendental, não vai ajudar. A meditação transcendental tornou-se muito importante nos Estados Unidos por causa da visão objetiva, por causa da mente científica - é a única meditação em que o trabalho científico pode ser feito.

É exatamente concentração e não meditação, portanto é compreensível para mentes científicas. Nas universidades, nos laboratórios científicos, em trabalhos de pesquisa psicológica, muito se tem estudado a meditação transcendental, porque ela não é uma meditação. É um método de concentração. Ela pode ser classificada na mesma categoria da concentração científica: há uma ligação entre as duas. Mas não tem nada a ver com meditação.

A meditação é tão vasta, tão imensamente infinita, que não possibilita nenhum tipo de pesquisa científica. Só se um homem se tornar compaixão poderemos saber se ele conseguiu ou não. As ondas alfa não serão de muita ajuda porque elas pertencem à mente e a meditação não é da mente, é alguma coisa além.

Portanto, deixe-me dizer algumas coisas básicas. Em primeiro lugar, meditação não é concentração, mas relaxamento - basta relaxar dentro de si mesmo. Quanto mais você relaxa, mais se sente aberto, vulnerável, e menos rígido. Você fica mais flexível e, de repente, a existência começa a penetrar em você. Você não é mais como uma pedra, agora tem aberturas.

Relaxamento significa permitir-se entrar em um estado em que não se faz nada, porque, se algo estiver sendo feito, a tensão continuará. É um estado de não-fazer: simplesmente relaxar e apreciar a sensação de relaxamento. Relaxe sozinho, feche os olhos e escute tudo o que está acontecendo ao seu redor. Não procure sentir nada como uma distração. No momento em que você sentir que algo é uma distração, estará negando Deus.

Nesse momento Deus veio a você como um pássaro - não o negue. Ele bateu à sua porta como um pássaro. No momento seguinte veio como um cachorro latindo, ou como uma criança chorando e se lamentando, ou como um louco rindo. Não negue, não rejeite: aceite, porque, se você negar, ficará tenso. Todas as negações criam tensão, por isso aceite.

Se quiser relaxar, a única maneira é aceitar. Aceite tudo o que está acontecendo ao seu redor, deixe que se torne um todo orgânico. Tudo está relacionado, quer você saiba disso ou não. Esses pássaros, essas árvores, esse céu, esse sol, essa terra, você, eu - tudo está relacionado. É uma unidade orgânica.

Se o sol desaparecer, as árvores desaparecerão; se as árvores desaparecerem, os pássaros desaparecerão; se os pássaros e as árvores desaparecerem, você não poderá estar aqui. É a ecologia. Tudo está profundamente relacionado entre si.

Portanto, não negue nada, porque, no momento em que negar, estará negando alguma coisa em si mesmo. Se negar esses pássaros cantando, então alguma coisa em você também será negada.

Quando você relaxa, aceita; a aceitação da existência é a única maneira de relaxar. Se as coisas pequenas o perturbam, então é a sua atitude que o está perturbando. Sente em silêncio; escute tudo o que está acontecendo ao seu redor e relaxe. Aceite, relaxe e de repente sentirá a imensa energia que surge dentro de você.

E quando eu digo observe, não tente observar, caso contrário ficará tenso novamente e começará a se concentrar. Relaxe, permaneça relaxado, com o corpo solto, e olhe... O que mais pode fazer? Você está aí, não há nada a fazer, tudo foi aceito, não há nada a ser negado, rejeitado. Não há luta, briga ou conflito. Você simplesmente observa. Lembre-se: apenas observe.

Osho, em "Meditação: A Primeira e Última Liberdade"

sábado, 23 de agosto de 2014

Para observar é preciso meditar?

Observar é meditação, e isso não significa que para observar temos de meditar. Observar é uma das coisas mais difíceis que há. Observar, por exemplo, uma árvore, é dificílimo, porque temos ideias, imagens relativas à arvore e essas ideias — conhecimentos botânicos, etc. — nos impedem e olhar a árvore. Observar sua esposa ou marido é mais difícil ainda, porque você também tem uma imagem relativa de sua esposa e ela tem uma imagem a seu respeito, e a relação existente é entre essas duas imagens. É o que em geral se chama "relações": dois conjuntos de lembranças, de imagens, em relação entre si. Veja quanto isso é absurdo. As relações que em geral temos são uma coisa morta. Observar significa, com efeito, estar consciente da interferência do pensamento; perceber como a imagem que você tem da árvore, da pessoa, do que quer que seja, intervém no ato de olhar. Observe como você se esquece do objeto que está olhando — a árvore, a pessoa; e veja porque o pensamento interfere, porque você tem uma imagem de tal pessoa. Por que você tem uma imagem de quem quer que seja? Aqui estamos, você e eu, a nos olhar — eu, o orador, e você, o ouvinte. Você tem uma imagem relativa do orador, infelizmente; mas eu, não lhe conheço, nenhuma imagem tenho de você e, por conseguinte, posso olhá-lo. Mas não posso olhá-lo se digo para mim: Vou servir-me desse ouvinte para alcançar poder, posição, explorá-lo, tornar-me um homem famoso — você sabe o resto — de todas as futilidades que os entes humanos cultivam. Assim, observar significa: observar sem a interferência de nosso fundo. Entende? Todo o nosso ser, que está a olhar, é o nosso fundo — cristão, francês, intelectual. Pela observação, descobre-se esse fundo; e observá-lo sem nenhuma escolha, nenhuma inclinação, é uma disciplina tremenda — não a absurda disciplina de ajustamento, de imitação. Essa observação torna a mente sobremodo ativa, sobremodo sensível. Isso em seu todo é meditação. Não se entenda, pois, que "para observar é preciso meditar", porém, antes, que é quando observamos, que todas as coisas sucedem. Isso, em seu todo, é meditação, e não um certo método de controle do pensamento, assunto que trataremos noutra ocasião.

Krishnamurti em, A essência da Maturidade

terça-feira, 20 de maio de 2014

Vivenciando o silêncio em momentos de aridez - Trigueirinho


segunda-feira, 19 de maio de 2014

domingo, 18 de maio de 2014

domingo, 4 de maio de 2014

A meditação não pode ser feita pelo pensamento

Minha definição de meditação é esta: ela é, simplesmente, um esforço para saltar até o inconsciente. Você não pode saltar através de cálculo, porque todo o cálculo pertence ao consciente, e a mente consciente não permitiria tal coisa. Ela advertirá: "Você enlouquecerá. Não faça isso". 

A mente consciente está sempre temerosa do inconsciente porque, se o inconsciente emergir, tudo quanto é claro e calmo no consciente será varrido. Então, tudo se tornará escuro... como numa floresta. 

Um exemplo. Você fez um jardim, um jardim cercado. Limpou um pequeno espaço e plantou algumas flores. Tudo está em ordem, arranjado, limpo. Acontece, porém, que a floresta está ali sempre perto. É selvagem, descontrolada, e o jardim está sempre temeroso. A qualquer momento a floresta pode invadir e então o jardim desaparecerá. 

Da mesma maneira você cultivou uma parte da sua mente. Colocou tudo em ordem. Mas o inconsciente está sempre por perto, e a mente consciente tem medo dele. A mente consciente diz: "Não vá para o inconsciente. Não olhe para ele, não pense nele."

O caminho para o inconsciente é escuro e desconhecido. À razão ele parece irracional, à lógica parece ilógico. Assim, se você pensa, para chegar à meditação, jamais chegará — porque a parte que pensa não o permitirá.

Isso torna-se um dilema. Você nada pode fazer sem pensar, e com o pensamento você não pode entrar em meditação. Que fazer? Mesmo que você pense: "Não vou pensar", isso também é pensar. É a parte que pensa da sua mente que está dizendo: "Não permitirei a ação do pensamrnto". 

A meditação não pode ser feita pelo pensamento. Esse é o dilema — o maior dos dilemas. Cada investigador terá de enfrentar esse dilema. Em algum lugar, um dia qualquer, o dilema aparecerá. Aqueles que sabem, dizem: "Salte! Não pense!" Mas você nada pode fazer sem pensar. Por isso é que planos desnecessários foram criados — planos desnecessários, digo eu, porque, se você saltar sem pensar, nenhum plano será necessário. Mas você não pode saltar sem pensar, de forma que um plano é necessário. 

Você pode pensar sobre esse plano. Sua mente que pensa pode ficar à vontade quanto ao plano, mas não quanto à meditação. A meditação será um salto para o desconhecido. Você pode trabalhar com um plano e o plano irá atirá-lo, automaticamente, para o desconhecido. O plano é necessário apenas por causa do treinamento da mente, de outra maneira não seria necessário. 

Desde que você tenha saltado, dirá: "O plano não era necessário, eu não precisava dele." Mas esse é um conhecimento retrospectivo. Você saberá, depois, que o plano não era necessário (isso é o que diz Krishnamurti: "Plano algum é necessário, método algum é necessário." Os mestres dizem: "Esforço algum é necessário, isso vem sem esforço.") Mas isso parece absurdo para os que não cruzam a barreira. 

Por isso digo que um plano é artificial. É apenas um estratagema para deixar sua mente racional à vontade, de forma que você possa ser levado para o desconhecido. 

O S H O - Meditação: a arte do êxtase

Por que não experimentamos a Beatitude, o Êxtase da Vida?

Ensinamos uma criança a focalizar a mente — a concentrar-se — porque, sem concentração, ela não pode enfrentar a vida. A vida exige isso: a mente deve ter capacidade para concentrar-se. Mas, desde o momento em que a mente se torna capaz de concentrar-se, torna-se, também, menos perceptiva. A percepção significa mente consciente, mas não focalizada. A percepção é consciência de tudo quanto está acontecendo. 

Concentração é uma escolha. Exclui tudo, menos o objeto da concentração. Produz estreitamento. Se você está caminhando por uma rua, terá de estreitar sua consciência para poder caminhar. Habitualmente não lhe é possível estar consciente de tudo o que está acontecendo, porque se você estiver consciente de tudo o que está acontecendo, não estará focalizado. Assim, a concentração é uma necessidade. A concentração da mente é uma necessidade para que possamos viver — sobreviver, existir. Por isso é que toda cultura, a seu modo, tenta estreitar a mente da criança. 

Crianças, tais como são, jamais focalizam. Sua consciência está aberta para todas as sensações. Cada sensação penetra em sua consciência. E quanta coisa chega! Por isso é tão vacilante, tão instável. A mente não-condicionada de uma criança é um fluxo — um fluxo de sensações — mas não lhe seria possível sobreviver com este tipo de mente. Ela deve aprender como estreitar a mente, como se concentrar. 

Do momento em que você estreita sua mente torna-se particularmente consciente de uma coisa, e, simultaneamente, inconsciente de muitas outras coisas. Quanto mais estreita for a mente, mais sucesso haverá. Você se torna um especialista, você se torna um perito, mas a coisa toda consistirá em você saber mais e mais sobre menos e menos.

O estreitamente é uma necessidade existencial. Ninguém é responsável por isso. Assim como a vida existe, ele deve existir. Mas não é o bastante; só o ser utilitário não é o bastante. Por isso, quando você se torna utilitário e a consciência é estreitada, estará negando à sua mente muito daquilo de que ela é capaz. Você não está usando sua mente total. Está usando apenas uma pequena parte dela. E o remanescente — a porção maior — irá tornar-se inconsciente. 

Na verdade, não há fronteira entre o consciente e o inconsciente. Não há duas mentes. "Mente consciente" refere-se àquela porção da mente que tem sido usada no processo de estreitamento. "Mente inconsciente" refere-se àquela porção que tem sido negligenciada, ignorada, fechada. Isso cria uma divisão, uma brecha. A porção maior da sua mente torna-se alheia a você. Você se torna alienado de seu próprio eu, torna-se um estranho à sua própria totalidade. 

Uma pequena parte está sendo identificada como o seu eu, e o resto é perdido. Mas a parte inconsciente, remanescente, está sempre ali, como potencialidade sem uso, como possibilidade sem uso, como aventura não-vivida. Essa mente inconsciente (esse potencial, essa mente sem uso) estará sempre em luta contra a mente consciente. Por isso é que existe sempre um conflito interior. Todos estão em conflito por causa dessa fenda entre o inconsciente e o consciente. Mas só se o potencial, o inconsciente, estiver livre para florescer, é que você poderá sentir a beatitude da existência... Não há outra maneira. 

Se a porção maior de suas potencialidades permanecer irrealizada, sua vida será uma frustração. Por isso é que quanto mais utilitária é uma pessoa, menos realizada é, menos beatitude conhece. Quanto mais utilitária é a abordagem — quanto mais a pessoa está na vida dos negócios — menos estará vivendo, menos será tomada pelo êxtase. A parte da mente, que não pode ser útil no mundo utilitário, foi desprezada.

A vida utilitária é necessária, mas com grande custo. Você perdeu a festividade da vida. A vida torna-se uma festividade, uma celebração, se todas as suas potencialidades florescerem. Então, a vida é uma solenidade. Por isso é que eu sempre digo que religião significa vida transformada em celebração. A dimensão da religião é a dimensão do festivo, do não-utilitário. 

A mente utilitária não deve ser tomada como se fosse o todo. O remanescente... a maior parte... a mente inteira... não deveria ser sacrificada. A mente utilitária não deve se tornar um fim. Terá que permanecer ali, mas como um meio. A outra — a remanescente, a maior, a potencial — deve tornar-se o fim. Isso é o que eu chamo uma abordagem religiosa. 

Com uma abordagem não-religiosa, a mente dos negócios (a utilitária) torna-se o fim. Quando tal coisa acontece, não há possibilidade de a mente inconsciente realizar seu potencial. A mente inconsciente será desprezada. Se a utilitária se torna um fim, isso significa que o servo está representando o papel do senhor. 

A inteligência, o estreitamento da mente, é uma forma de sobrevivência, mas não de vida. Sobrevivência não é vida. Sobrevivência é uma necessidade — mas o fim terá de ser, sempre, um florescimento do potencial, de tudo quanto foi criado para você. Se você for completamente realizado, se nada permanecer sob a forma de semente, se tudo se faz realidade, se você florescer, então e só então você poderá sentir a beatitude, o êxtase da vida.

A parte de você que foi desprezada, a parte inconsciente, pode tornar-se ativa e criativa, só se você acrescentar uma nova dimensão à sua vida — a dimensão do festivo, a dimensão da jovialidade. Assim, a meditação não é um trabalho, é um divertimento. Rezar não é um negócio, é um divertimento. A meditação não é algo que se faz para chegar a atingir um alvo (paz, beatitude...) mas algo a ser gozado como um fim em si mesmo.

O S H O — Meditação: A Arte do Êxtase

quinta-feira, 24 de abril de 2014

A meditação destrói os muros da mediocridade, respeitabilidade e da imitação

Se me permitem, desejo considerar nesta tarde a questão da meditação, pois, no meu sentir, se não compreendermos o inteiro significado da meditação, não poderá surgir aquela mente religiosa acerca da qual lhes tenho falado. Como já acentuamos, a mente religiosa contém o espírito científico, mas a mente científica não contém o espírito religioso. A mente científica é parcial, interessada que está nas coisas superficiais; mas a mente religiosa interessa-se pela totalidade da vida. Se não se compreende e conhece o profundo significado da meditação, não há possibilidade nenhuma de se ter aquela qualidade de mente capaz de elevar-se acima e além do tempo. 

[...] A meditação, pois, não é uma busca de visões, imersão na oração... Meditação, pois, não é oração, não é o desejo de achar a Verdade. A mente vulgar que busca Deus encontrará o Deus de sua própria vulgaridade. Compreendem, senhores? Se tenho uma mente comum, limitada, estreita, superficial, cheia de ambição e avidez, de inveja e ciúme de outrem — e começo a pensar em Deus, meu Deus é igualmente vulgar, estúpido; e essa estupidez me satisfaz. 

Pois bem, estamos investigando o processo da meditação. Para investigar, vocês devem em primeiro lugar negar, devem proceder negativamente — isto é, devem estar conscientes de algo que nenhuma realidade tem, a não ser a realidade projetada do próprio desejo de vocês, da própria fantasia; devem repudiar o falso. Assim, pelo pensar negativo vamos descobrir alguma coisa positiva. Mas o pensar negativo é essencial, pois é a mais elevada forma de pensar — e não o pensar positivo. Pensar positivo é o processo de imitação, movimento de conhecido para conhecido. jamais descobriremos o desconhecido se nos movemos meramente do conhecido para o conhecido, que é o chamado processo positivo. Dessa maneira, jamais descobrirão por si mesmos o que é a meditação real. As coisas que nos têm sido oferecidas como meditação são por demais elementares, completamente desprovidas de base psicológica. Assim, se possuem suficiente interesse, se desejam realmente examinar até o fim a questão da meditação — e não apenas se entreterem com ela — devem meditar quando se dirigem ao escritório, quando constituem família, quando geram filhos. A meditação é necessária, porque destrói os muros da mediocridade, os muros da respeitabilidade e da imitação. Necessária é uma mente de todo livre exatamente no começo, e não no fim. 

[...] Meditação não é contemplação: contemplar é pensar numa ideia, concentrar-se numa coisa, geralmente um símbolo ou uma frase lida nos chamados "livros sagrados" — que em nada são sagrados, porém simples livros como outros quaisquer. Vocês selecionam uma frase e nela começam a refletir; e chamam isso de "contemplação". Não cuidam de investigar a entidade que contempla. Essa entidade é condicionada; essa entidade é medíocre, estreita, ciumenta. E essa é a entidade que investiga, que se concentra na contemplação de uma certa coisa! 

A meditação, pois, não é oração. Meditação não é contemplação. Meditação não é observância de um dado método ou sistema. O método ou sistema condiciona a mente. E, aquilo que o método ou sistema oferece, obterão; mas o que obterem será uma coisa morta. É como ter uma mente embotada e estúpida que se disciplinou por um sistema e se recusa a pensar mais; essa mente perdeu toda a flexibilidade, toda a sensibilidade; já não é nova. Assim, a meditação não é um sistema para ser praticado. Não é, por igual, um processo de disciplinar a mente. 

[...] Consequentemente, a meditação não é nenhuma dessas coisas, nem tampouco disciplina.[...] A mente que faz força para alcançar algo — com exceção de coisas mecânicas — alcançar aquilo que chama Deus, alcançar um alvo, um fim — é uma mente morta. Para a meditação necessita-se de uma mente sobremaneira flexível, altamente sensível. E ninguém pode ser sensível se está "comprometido", se está preso a um sistema inventando pelo homem sob a compulsão do medo. 

Nada disso, pois, é meditação.[...] A base correta da meditação é: não ser ambicioso, não ter inveja, não aceitar autoridade de espécie alguma. O lançamento da base é da mais alta importância, porquanto sem ela não podemos edificar. Não se pode construir uma casa sem alicerces; ela desaba. Ser sem ambição, sem autoridade, sem inveja, sem medo, sem ciúme, tem de ser uma coisa que deve ser vista imediatamente, e não cultivada como ideal; e é aí que está a dificuldade.[...] A inveja não é coisa que se possa adiar.[...] O homem que deseja meditar, que deseja investigar em profundidade a questão da meditação, não tem tempo para adiar a inveja. A inveja tem de cessar completamente, totalmente. Também a ambição tem de cessar por inteiro, porque o homem ambicioso não tem amor. Aqueles que, impelidos pela ambição, buscam posição, prestígio, poder, não têm amor, ainda que falem de paz e fraternidade. Poderão ter compaixão, piedade, capacidade organizadora para a ação social; mas, amor não têm. 

[...] Para meditarem, precisam lançar a base correta, não nos dias vindouros, porém imediatamente. Isso é dificílimo — é em verdade o ponto crucial da questão, pois nós queremos ser ambiciosos, queremos ser invejosos; e também falamos a respeito de Deus, da Verdade, etc. Nenhum valor têm os seus deuses e suas verdades, enquanto não houver a base correta. Quando já não estão presos na engrenagem da sociedade e de sua moralidade, quer dizer, quando a mente de vocês está livre da ambição, da avidez, da inveja, do poder e de todas as coisas que o homem busca porque isso a sociedade o estimulou desde a infância — então, há liberdade; não amanhã, não no fim da vida de vocês, porém exatamente no começo — agora! 

Esse é o início da meditação. Implica o conhecimento de si mesmo, e não o conhecimento do Ser Supremo. Não há Ser Supremo para a mente vulgar, a não ser aquilo que ela inventou e a que chama "Ser Supremo". Assim, quando a mente é livre — não amanhã, porém realmente, imediata e instantaneamente — da inveja, da avidez, da ambição da busca de fama e de poder, então, começa a meditação. Para essa mente cessou o buscar.[...] Assim, quando, mediante o autoconhecimento, vocês negam de todo a ambição, a avidez, a inveja, a autoridade, vocês se tornam a luz de si mesmos; a mente, estando então livre, não "comprometida", já não busca, porque nada tem que buscar; ela está tranquila. 

[...] O homem que deseja meditar deve compreender a si próprio. Se não conhecem a si mesmos, não podem ir longe. Por mais que tentem ir longe, nunca ultrapassaram suas próprias "projeções"; e a própria "projeção" de vocês está muito perto, e a parte alguma os leva. Meditação é aquele processo de lançar imediatamente a base e de fazer nascer — naturalmente, sem esforço algum — aquele estado de tranquilidade. Só então existe uma mente fora do tempo, fora da experiência e fora do conhecimento.

Jiddu Krishnamurti — A Mutação Interior  

terça-feira, 15 de abril de 2014

O que é meditação?

A verdade não é uma coisa que se possa experimentar. A verdade não pode ser buscada e achada. Está fora do tempo. E o pensamento, que é tempo, nenhuma possibilidade tem de busca-la e "pega-la". Portanto, é necessário compreender profundamente essa questão do desejo de experiência. Vejam, por favor, quanto isso é importante. Qualquer forma de esforço, de desejo, de busca da verdade, de exigência de experiência, é o observador a querer algo transcendental e a esforçar-se por alcançá-lo; a mente de vocês, por conseguinte, não é lúcida, incorrompida, não-mecânica. Quando a mente está buscando por uma experiência, por mais maravilhosa que seja, isso significa que o "eu" a esta buscando — o "eu", que é o passado, com todas as suas frustrações, aflições, esperanças. 

Observem, por si mesmos, como o cérebro funciona. Ele é o depósito da memória, do passado. Essa memória está sempre reagindo, "gostando" e "não gostando", justificando, condenando, etc.; reagindo de acordo com seu condicionamento, de acordo com a cultura, a religião, a educação, nela armazenadas. Esse depósito, de onde surge o pensamento, guia a maior parte de nossa vida. Está dirigindo e moldando nossa vida, a cada minuto do dia, consciente ou inconscientemente; está gerando pensamento, gerando o "eu", que é a essência mesma do pensamento e das palavras. Pode o cérebro, com seu conteúdo — o "velho" — tornar-se completamente quieto — só despertando quando necessário operar, funcionar, falar, agir, porém, a maior parte do tempo, completamente estéril? 

Meditação é descobrir se o cérebro, com todas as suas experiências, pode tornar-se absolutamente quieto. Não forçado a isso, porque, no momento em que o forçamos, torna a surgir a dualidade, a entidade que diz "Eu gostaria de ter experiências maravilhosas e, portanto, tenho de obrigar o meu cérebro  a quietar-se". Nunca o conseguirá! Mas, se vocês começarem a investigar, a olhar, a observar, a "escutar" todos os movimentos do pensamento, seu condicionamento, seus alvos, seus temores e prazeres; observar como o cérebro funciona — vocês verão então que ele se tornará sobremodo quieto; essa quietação não é um estado de sono, pois o cérebro se acha então sumamente ativo e, portanto, em silêncio. Um dínamo grande, em perfeito estado de funcionamento, quase não faz barulho; só quando há atrito, há barulho. 

Cumpre-nos descobrir se nosso corpo é capaz de ficar sentado ou deitado, em completa quietação, sem nenhum movimento, sem estar sendo forçado. Podem o corpo e o cérebro — pois estão psicossomaticamente relacionados — tornar-se quietos? Há vários exercícios para colocar o corpo quieto, mas tais exercícios implicam coerção; o corpo quer erguer-se e andar, mas lhe impomos que fique quieto, e começa a batalha: querer sair à rua e querer ficar sentado e quieto. 

A palavra "ioga" significa "ajuntar". O próprio termo "ajuntar" é impróprio, porque implica dualidade. Provavelmente a ioga, como uma determinada série de exercícios e movimentos respiratórios, foi inventada na Índia há milhares de anos. Sua finalidade é manter as glândulas, os nervos e todo o organismo funcionando saudavelmente, sem remédios, e sobremodo sensível. O corpo precisa ser sensível, porque de outro modo não se pode ter um cérebro claro. É fácil ver este simples fato que precisamos ter um corpo perfeitamente são, sensível, alerta, e um cérebro a funcionar muito claramente, não emocionalmente, não pessoalmente; o cérebro é então capaz de colocar-se absolutamente quieto. Mas, como conseguir isso? Como pode o cérebro, que anda sempre tão ativo — não apenas durante o dia, mas também quando dormimos — ficar em completo repouso, inteiramente quieto? Decerto, nenhum método produzirá esse efeito, já que todo método implica repetição mecânica, que entorpece e embota o cérebro; e, nesse estado de embotamento, vocês pensam ter experiências maravilhosas!

Como pode o cérebro, que anda sempre a monologar ou a palrar, sempre julgando, avaliando, "gostando" e "não gostando", constantemente variando, quietar-se de todo?[...] Pode o cérebro imobilizar-se sem a ingerência de nenhum fator externo? Não descobrindo nenhuma maneira de aquietá-lo, certas pessoas esperam pela graça de Deus, rezam, têm fé, absorvem-se em Jesus, nisto ou naquilo. É bem evidente que essa absorção numa coisa externa só pode verificar-se numa mente embotada, entorpecida. O cérebro está em contínua atividade, do despertar ao adormecer — e mesmo então a atividade cerebral prossegue. Essa atividade, na forma de sonhos, é o mesmo movimento do dia, continuando durante o sono. O cérebro nunca tem um momento de repouso, nunca diz "Acabei". Leva para as horas de sono os problemas que acumulou durante o dia, e, ao despertarem, os mesmos problemas continuam, ininterruptamente: um círculo vicioso. O cérebro, para que possa aquietar-se, não deve ter sonhos. Quando o cérebro está quieto durante o sono, introduz-se na mente uma capacidade inteiramente nova. Como pode o cérebro, sempre tão intensa e ardorosamente ativo, imobilizar-se, natural e simplesmente, sem nenhum esforço ou coerção? Eu vou lhes mostrar. 

Como dissemos, durante o dia o cérebro está incessantemente ativo. Se ao despertarem e olharem pela janela, exclamam "Oh, que chuva!" ou "Que dia maravilhoso, mas quente demais" — já colocaram o cérebro em movimento! Assim, no momento de olharem pela janela, não digam para si mesmos uma só palavra. Isso não significa reprimir as palavras, porém, apenas, compreender que no momento em que dizem "Que linda manhã!" ou "Que tempo horrível!" — o cérebro se coloca em movimento. Mas se, olhando pela janela, observam as coisas sem pronunciarem uma única palavra (e isso não é reprimir a palavra), se ficam apenas observando, sem a imediata intromissão da atividade cerebral, vocês têm então a solução, a chave do problema (de colocar o cérebro quieto). Quando o velho cérebro não reage,, começa a despontar o novo cérebro. Podem observar as montanhas, os rios, os vales, as sombras, as árvores formosas, as maravilhosas nuvens, totalmente iluminadas, além das montanhas — sem pronunciar uma palavra, sem comparar. 

Mas isso se torna bem mais difícil quando se observa outra pessoa, porque, aí, já possuem imagens estabelecidas. Observai, ainda assim! Observando assim, com claro percebimento, verão que a ação assume uma extraordinária vitalidade: é a ação completa, que nunca é levada para o próximo minuto. Compreendem?

[...] Tomemos um problema: alguém me insulta, chama-me de "idiota". Instantaneamente, o velho cérebro reage, dizendo "Idiota é você!" Se, antes de o cérebro reagir, me torno perfeitamente cônscio do que foi dito — uma coisa desagradável — abro um intervalo, de modo que o cérebro não pode logo precipitar-se para a arena. Assim, se durante o dia observarem, em seus atos, o movimento do pensamento, perceberão que ele está criando problemas, e que problemas são coisas incompletas e, por conseguinte, têm de ser levados para diante. Mas, se observarem com o cérebro realmente quieto, verão que a ação é completa, instantânea; não se leva para diante o problema, não se leva para diante o insulto, o elogio: é coisa acabada. E, depois, durante o sono, o cérebro já não levará consigo as "velhas" atividades do dia, estará em completo repouso. E, estando o cérebro quieto durante o sono, verifica-se um rejuvenescimento de toda a sua estrutura — desponta a inocência. A mente "inocente" é capaz de ver o verdadeiro — não a complicada mentalidade do filósofo ou do sacerdote. 

A mente inocente abrange aquele todo em que está contido o corpo, o coração, o cérebro, e a mente propriamente dita. A mente inocente, jamais atingida pelo pensamento, pode ver o verdadeiro, o real. Isso é meditação. Para alcançar-se aquela maravilhosa beleza da verdade e seu êxtase, é necessária lançar a base adequada. Essa base é a compreensão do pensamento, que gera medo e nutre prazer; é a compreensão da ordem e, portanto, virtude. Fica-se, assim, livre de todo conflito, de toda agressividade, brutalidade e violência. Lançada essa base da liberdade, desponta uma sensibilidade que é a culminância da inteligência, e a vida do homem se torna, em todos os seus aspectos, inteiramente diferente.

Krishnamurti — A questão do impossível

segunda-feira, 31 de março de 2014

É preciso fazer muito para atingir o não-fazer

A meditação é sempre passiva; sua própria essência é passiva. Não pode ser ativa porque a própria natureza dela é o não-fazer. Se você está fazendo algo esse fato de fazer algo perturba tudo. O fazer, em si mesmo, sua própria atividade, cria perturbação. 

Não-fazer é meditação, mas quando digo que não-fazer é meditação não quero dizer que você não precise fazer nada. Mesmo para atingir esse não-fazer precisamos fazer muito! Mas esse fazer não é meditação. É, apenas, um degrau, um trampolim. Todo o "fazer" não passa de um trampolim — não é meditação. 

Você está exatamente à porta, nos degraus... A porta é o não-fazer, mas, para atingir o estado de espírito do não-fazer é preciso fazer muito. Mas é preciso não confundir esse fazer com meditação. 

A energia vital trabalha com contradições. A vida existe como uma dialética: não é um simples movimento. Não flui como um rio: é dialética. Com cada movimento a vida cria seu próprio oposto, e através da luta com o oposto move-se para a frente. Cada movimento leva a tese a criar antítese. E isso continua sempre: tese criando antítese, incorporando-se à antítese, e tornando-se a síntese que, então, faz de novo tese. Então, vem de novo a antítese. 

Quando falo em movimento dialético não quero falar de movimento simples, direto: é um movimento dividido em si mesmo, criando o oposto, depois encontrando-se novamente com o oposto, e dividindo-se de novo no oposto. E a mesma coisa se aplica à meditação, porque ela é a coisa mais profunda da vida. 

Se eu lhe digo: "Relaxe, apenas", isso é impossível, porque você não saberia o que fazer. Assim, muitos dos pseudoprofessores de relaxamento continuam dizendo: "Relaxe, apenas, não faça nada, relaxe, apenas." Então, o que você vai fazer? Pode se deitar, mas isso não é relaxamento. Todo redemoinho interno permanece... E agora há um novo conflito: relaxar. Algo foi acrescentado sobre e acima. Toda insensatez está ali, todo redemoinho está ali, com algo acrescentado: relaxar. Uma nova tensão está, agora, acrescentada a todas as velhas tensões. 

Assim, a pessoa que está tentando viver uma vida relaxada é a pessoa mais tensa possível. Está fadada a sê-lo, porque não compreendeu o fluxo dialético da vida. Pensa que a vida é um fluxo reto, bastando que se diga a si mesmo que relaxe para estar relaxado. 

Isso não é possível! Assim, se você vier a mim, jamais direi que apenas relaxe. Primeiro fique tenso, tão fortemente tenso quanto puder. Fique totalmente tenso! Primeiro deixe que todo seu organismo fique tenso, e continue a estar tenso até o máximo, até a sua total possibilidade. E então, subitamente, você sentirá que o relaxamento se instala. Você fez o que lhe era possível: agora a energia da vida cria o oposto. 

Você levou a tensão ao auge. Agora, não há nada para além disso, você não pode continuar. Toda energia foi devotada a tensão. Mas você não pode continuar com essa tensão indefinidamente. Ela tem de se dissolver, e depressa começará a se dissolver. Agora, seja uma testemunha desse acontecimento. 

Através da tensão você chegou ao limiar, do ponto de onde se salta. Por isso você não pode continuar. Se continuasse, poderia estourar, morrer. O ponto excelente foi encontrado. Agora, a energia da vida relaxará a si mesma. 

Ela se relaxa. Agora, fique consciente, e veja esse relaxamento se instalar. Cada membro do corpo, cada músculo do corpo, cada nervo do corpo vai relaxando, inocentemente, sem que nada seja feito de sua parte. Você nada está fazendo para relaxar, ele está se relaxando. Você começará a sentir muitos pontos no organismo que se relaxa. Todo organismo será uma reunião de pontos relaxados. Fique consciente.

Essa consciência é meditação. Não é um não-fazer. Você nada está fazendo, porque estar consciente não é um ato. Não é absolutamente um ato, é sua natureza, uma qualidade intrínseca de seu ser. Você é consciência. Sua não-consciência é a sua conquista... e você a conquistou com muito esforço. 

Assim, para mim, a meditação tem dois passos: primeiro, um ativo (que não é, realmente, de modo algum, meditação) e segundo, um completamente não-ativo (a consciência passiva, que é, realmente, meditação). A consciência, ou conhecimento, é sempre passiva, e, no momento em que você se torna ativo perde seu conhecimento. É possível estar ativo e consciente apenas quando a consciência chegou a um tal ponto que agora já há, necessidade da meditação para alcançá-la, ou conhecê-la, ou senti-la. 

Quando a meditação se torna inútil, você, simplesmente, coloca de lado a meditação. Agora, você está consciente. Se então você pode estar ao mesmo tempo consciente e ativo — de outra maneira não é possível. Enquanto a meditação ainda for necessária, você não será capaz de estar consciente durante a atividade. Mas, quando a meditação já não é necessária...

Se você se tornou meditação, já não precisará dela. Então, pode ser ativo, mas mesmo nessa atividade você é sempre o espectador passivo. Agora, você jamais é o ator: é, sempre, uma consciência que testemunha

A consciência é passiva... e a meditação está fadada a ser passivo porque é apenas uma porta para a consciência — a perfeita consciência. Assim, quando as pessoas falam de meditação "ativa", estão erradas. Meditação é passividade. Você pode precisar de alguma atividade, de algum "fazer" para chegar a ela — e isso pode ser compreendido — mas isso não se dá porque a meditação seja, em si, ativa. Isso, antes, se dá, porque você esteve ativo em tantas e tantas vidas — a atividade tornou-se de tal forma parte e parcela de sua mente — que você precisa até mesmo da atividade para alcançar a não-atividade. 

Você esteve tão envolvido em atividade que não pode abandoná-la. Assim, pessoas como Krishnamurti podem continuar a dizer: "Abandone isso", mas você continuará perguntando como abandonar isso. Krishnamurti dirá: "Não pergunte como. Estou dizendo para que você abandone isso! Não há um 'como' para tanto. Não há necessidade de nenhum 'como'."

De certa forma ele está certo. Consciência passiva ou meditação passiva não têm um "como". Não pode ter, porque se houver um "como" então não pode ser passiva. Mas está certo, também, porque não leva em conta seu ouvinte. Está falando de si próprio. 

A meditação se faz sem "como", sem tecnologia, sem qualquer técnica. Assim, Krishnamurti está absolutamente correto, mas o ouvinte não foi levado em conta. O ouvinte nada mais tem senão a atividade; para ele, tudo é atividade. Assim, quando você diz "A meditação é passiva, não-ativa, sem escolha; você pode apenas estar nela; não há necessidade de esforço, de nenhum esforço, ela é sem esforço", você está falando uma linguagem que o ouvinte é capaz de entender. Ele entende a parte linguística do que você diz — e é isso que torna tudo tão difícil. Ele diz: "Intelectualmente, compreendo tudo. Tudo o que o senhor está dizendo está sendo inteiramente compreendido", mas ele é incapaz de compreender o significado. 

Não há nada de misterioso nos ensinamentos de Krishnamurti. Ele é o menos místico dos mestres. Nada há de misterioso! Tudo é obviamente claro, exato, analisado, lógico, racional, de forma que todos podem entender. E isso tornou-se uma das grandes barreiras, porque o ouvinte pensa que compreendeu. Compreende a parte linguística, mas não compreende a linguagem da passividade. 

Compreende o que lhe está sendo dito — as palavras. Ouve-as, compreende-as, conhece o sentido daquelas palavras. Faz correlações. Um quadro inteiramente correlato vem à sua mente. O que está sendo dito é compreendido, há uma comunicação intelectual. Mas ele não compreende a linguagem da passividade. Não pode compreender. Só pode compreender a linguagem da ação — da atividade.

O S H O — Meditação: a arte do êxtase - Ed. Pensamento

sábado, 22 de março de 2014

Valor da vida contemplativa

O homem moderno está condicionado a ver a atividade como uma virtude — mesmo mera atividade, indiferente às suas consequências. Tudo grita para ele:  — Vá, homem, vá... e se ele não "for", já pode considerar-se morto. Geralmente, portanto, o contemplativo é visto como algo semelhante a um peixe morto, bem como uma ameaça à ordem estabelecida das coisas. Isso se dá principalmente porque a existência leva as pessoas a se sentirem constrangidas quanto à sua incessante e (im)pensante atividade — a forma pela qual conferem tanta importância ao que quer que seja que estejam fazendo, jamais discutindo o valor intrínseco de alguma coisa. Uma pessoa pode, é natural, racionalizar suas atividades, das explicações que as justifiquem, e assim por diante — mas tudo isso tem pouco sentido quando se trata das necessidades reais da vida. Porque, se se aprofundar, acabará por descobrir as pressões que estão por trás da atividade, e ficará claro que a atividade, em si mesma, não importa muito, realmente. Aqui estamos tocando em outra característica significativa do homem moderno: ele jamais está livre da tensão e esforço. Está matando-se lentamente, através de pressão auto-imposta, sempre se fustigando, jamais relaxando. Mesmo quando ostensivamente relaxa, "afastando-se de tudo", leva consigo o hábito dos negócios, que já está gravado em seu coração. 

Poucas pessoas existem neste mundo — verdadeiros "forasteiros", como poderiam ser chamadas — que tenham experimentado a autoconfrontação e chegado a um ponto de vista diametralmente oposto ao que constitui uma forma sadia de vida.  Essas pessoas veem a descuidada atividade mecânica do homem dos dias atuais, impulsionados pela ganância, pelo medo, pelo tédio, pela ambição, como uma forma de morte; e a vida contemplativa como a forma de ocupação mais real, mais vital. Falando pessoalmente, e dizendo isso de uma forma talvez um tanto rude, não vejo obrigação nenhuma para o homem, de fazer qualquer coisa. Tudo quanto ele realmente precisa fazer é respirar, e mesmo isso é opcional, se não fosse involuntário. É óbvio que não estamos falando, aqui, de obrigações em sentido estreito, relativo — tal como os deveres para com a família, o empregador, a comunidade, as obrigações econômicas, e assim por diante — mas estamos tratando da finalidade da liberdade na mais profunda significação da palavra. E, se algum sentido há nessa palavra, a liberdade, então, deve significar o direito da autodeterminação . (Na realidade, liberdade é autodeterminação — em ambos os sentidos da expressão. primeiro ela significa a determinação que é essa entidade a que nos referimos como "eu" e com a qual temos convivido todos esses anos, e, em segundo lugar, desde que tenhamos descoberto isso, o direito de sermos nós mesmos, de deixar o "eu" sozinho num mundo onde pressões adaptadoras são exercidas para modelar o indivíduo de acordo com algum padrão "aprovado). E essa autodeterminação inclui, obviamente, a cada um o direito de ser senhor de seu próprio destino, e de se "abster" (de qualquer ação, mundana ou não) se assim o desejar. (E, sem falar na sabedoria disso, em tal direito à autodeterminação seria, logicamente, incluído também, o direito de auto-imolação física). 

O exercício do direito de se abster não significa, entretanto, na prática, que uma pessoa deva tornar-se, de súbito, cem por centro indolente — pelo contrário; mas realmente significa o fim de ser manejado, seja pelo "eu" seja pelo "não-eu". A pessoa chega finalmente a um estado em que pode dizer, de todo o coração e sem a menor reserva: "Que seja". Então, quando não mais existe a compulsão do "eu devo...", uma certa calma se estabelece, na qual a coisa mais sensata a fazer é prosseguir com a autoconfrontação até o "amargo" fim (ou como quer que seja). 

Se a pessoa prosseguir, logo se torna (literalmente) "dolorosamente óbvio" que a ela não é atribuído nenhum valor, que a importância dada as suas ações e a suas memórias é uma fantasia da imaginação, despedida de sentido, e que a verdadeira significação está no entendimento de que não há nenhum propósito na vida — uma conclusão aparentemente negativa que, paradoxalmente, contém tremendas implicações positivas. Vemos que "objetivo" foi apenas um resultado, uma projeção do nosso exagerado sentimento de auto-importância que nega o fato da brevidade do ego, dando-lhe uma permanência desprovida de qualquer apoio na realidade. 

Tendo visto tudo isso, a pessoa vive tanto o que É, que não mais haverá questão do que deveria ser; portanto, por mais complicadas que sejam as circunstâncias nas quais possa encontrar-se, não haverá mais luta para modificar as coisas — embora, também paradoxalmente, a atitude de menos resistência possa acarretar modificações muito grandes, realmente. Já não há pressões, e mais uma vez a vida é doce. Não é essa uma liberação em relação ao tempo, já que todos os "objetivos" devem, inevitavelmente, ficar no futuro, criando mais "obrigações". Assim, não se obtém logo a resposta para a indagação: Que fazer... como viver, embora não seja exatamente o que se espera? 

Então, quando a calma tornou-se Vazio, a inquieta, esforçada entidade, que está sempre planejando, sempre se afligindo a propósito do seu futuro, é, ela própria, uma parte desse Vazio. Porque a carga tremenda do "que fazer da sua vida" foi afastada, e, por assim dizer, retirada para ombros alheios, há uma sensação relaxante.* Por que a pessoa já vive cercada pela camisa-de-força de uma identidade arbitrariamente assumida — socialmente induzida pelos preguiçosos hábitos de pensamento — há, também, a experiência de uma liberdade total.
___________________
          *     Pode ser necessário enfatizar, aqui, que a passividade pressuposta na abstenção quanto à realização dos desejos de uma pessoa não é, de maneira nenhuma, a mesma coisa que a passividade do místico que "abandona" conscientemente sua própria vontade diante de um "poder maior". "Não seja feita a minha vontade e sim a Tua..." Não estamos falando aqui de renúncia (que realmente fortalece a vontade, porque renunciar alguma coisa também é um ato de vontade!), mas do abandono espontâneo do desejo de continuar com as habituais atividades auto-engrandecedoras, porque a pequenez e a falta de significação fundamental destas estão claramente percebidas. É como se a pessoa ficasse entediada com tudo aquilo (isto é, o pequeno "mim", com suas eternas exigências) e esteja agora em posição de dar completa atenção às coisas que dizem respeito ao "não-mim", ou ao Eu maior. Quando isso acontece, o "mim" ficou absorvido pelo "não-mim", ou na linguagem de Ramana Maharshi, o eu verdadeiro (também descrito como "mim-mim") é reconhecido. E essa declaração sugere que nada existe fora do eu, que nossa vida passada, com todos os seus sofrimentos, fora baseada na realidade — o mundo de Maya — portanto tinha sido vã. Essa reorientação representa um verdadeiro ponto de reversão e torna disponível uma tremenda quantidade de energia vital. 

segunda-feira, 3 de março de 2014

A realidade atemporal, imensurável, sem nenhuma ilusão

"Quando se quer descobrir a realidade, toda influência, toda imitação, observância de algum princípio ou exemplo, obediência a um guru ou outro qualquer — nada disso tem valor."
...Desde o começo dos tempos, pelos séculos a fora, o homem sempre buscou uma certa coisa que deve achar-se além da monótona rotina da vida de cada dia, uma coisa que o pensamento jamais atingiu e que não é produto do tempo. A essa coisa se tem chamado "Deus", se têm dado inúmeros e diferentes nomes, mas parece que pouquíssimos a alcançaram. Entretanto, todas as vezes que ela foi encontrada, alguns indivíduos muito sagazes trataram de organizá-la e, desse modo, a destruíram". [...] Assim, tem o homem a possibilidade de descobrir algo, de encontrar aquela realidade atemporal, imensurável, sem nenhuma ilusão — não como "experiência", ou uma fórmula, ideia ou conceito, porém como uma realidade? Porque, se não descobrirmos essa coisa, a vida será vã, sem significação. O homem pode ser competente, possuir muitos bens, viver regaladamente, tornar-se famoso, mas, se não encontrar essa coisa suprema, sua vida será SUPERFICIAL, VAZIA, INSIGNIFICANTE. E, percebendo esse estado, essa falta de significação, começa o homem a inventar deuses com o nome de pátria, de partido, e os deuses das igrejas, dos templos, etc. Assim, temos possibilidade de alcançar essa coisa suprema que não se encontra em nenhuma igreja, nenhum templo, nenhuma mesquita? Para descobri-la, para alcançá-la, necessita-se, em primeiro lugar, de ordem, de absoluta ordem interior, e essa ordem, que é virtude, é negada quando não se rejeita TOTALMENTE a moralidade social. Nessa total rejeição da moral social, há moralidade.

[...] Tendo lançado a base, não como ideia, não como conceito, não como abstração, porém na vida real de cada dia, podemos começar a investigar se existe "alguma coisa mais", uma coisa indestrutível; e, para descobri-la, ou, melhor, para encontrá-la, precisamos compreender a meditação.

[...] Meditação é o silêncio da mente; mas, nesse silêncio, nessa intensidade, nesse estado de total alertamento, a mente já não é a sede do pensamento, porque o pensamento é tempo, o pensamento é memória, o pensamento é conhecimento. E, quando se acha de todo quieta e sobremodo sensível, a mente pode começar uma viagem eterna, sem limites. Isso é meditação, e não aquela estúpida repetição de palavras que se está praticando.[...] A hipnose, quer praticada por vós mesmos, quer por outrem, só pode projetar o próprio condicionamento, as próprias ansiedades e temores; não tem absolutamente nenhum valor.

[...] Temos de descobrir por nós mesmos, independente dos teóricos, dos teólogos e dos sacerdotes, o que é a relação com a realidade. Essa realidade pode ser chamada "Deus"; o nome é, em verdade, de ínfima importância, porque a palavra, o símbolo, nunca é a coisa real, e ficar enredado em símbolos e palavras parece-me uma coisa totalmente irracional. [...] Assim, a o fazermos a pergunta sobre a verdadeira relação do homem com a realidade, devemos estar livres da palavra com todas as suas associações, com todos os seus preconceitos e condições. Se não descobrirmos essa relação, a vida terá muito pouca significação; então, inevitavelmente, nossa aflição, nossa confusão, se tornarão maiores, e a vida cada vez mais intolerável, mais superficial e insignificativa. Precisamos ser sobremodo sérios para descobrirmos se tal realidade existe ou não, e qual a relação do homem com ela. [...] Antes de tudo o mais, é possível — não misticamente, nem romântica ou emocionalmente, porém realmente — descobrir ou encontrar esse estado extraordinário?  

Krishnamurti — Onde está a bem-aventurança  

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Meditação não é concentração


Meditação não é concentração. Na concentração, há alguém se concentrando e um objeto sobre o qual se concentra. Há uma dualidade. Na meditação, não há ninguém dentro e nada fora.

Ela não é uma concentração. Não há divisão en­tre o interior e o exterior. O interior flui para fora e o exterior para dentro. A demarcação, o limite, as fronteiras não existem mais. O que está dentro, está fora; e o que está fora, está dentro. É uma consciência não-dual.

A concentração é uma consciência dual: é por isso que cansa; é por isso que, ao se concentrar, você se sente exausto. É impossível concentrar-se por vinte e quatro horas; se o fizer terá que tirar férias para descansar. A concentração não pode tornar-se sua natureza nunca.

A meditação não cansa, não o deixa exausto. Pode ser feita por vinte e quatro horas, por dias, por anos. Pode ser eterna; é um relaxamento em si mesma.

A concentração é um ato, um ato voluntário. A meditação é um estado involuntário, um estado de inação. É um relaxamento, um simples abandonar-se no próprio ser, o qual é o mesmo ser do Todo.

Na concentração, a mente funciona a partir de uma resolução: você está fazendo alguma coi­sa. A concentração vem do passado. Na medita­ção, não há nenhuma resolução por trás. Você não está fazendo nada em particular, está simples­mente sendo.

A meditação não tem passado, não está contaminada pelo passado. Não tem futuro, está limpa de qualquer futuro. É o que Lao Tzu chama de wei-wu-wei, ação através da não-ação. É o que os mestres Zen têm dito: sentando-se em silêncio, sem fazer nada, a primavera vem e a grama cresce por si mesma.

Lembre-se: ‘por si mes­ma’ — nada é feito. Você não puxa a grama para cima; a primavera vem e a grama cresce por si mesma. Esse estado — no qual você permite que a vida siga seu próprio caminho, sem querer diri­gi-la, sem querer controlá-la, sem a manipular, sem lhe impor nenhuma disciplina — esse estado de pura e indisciplinada espontaneidade é medi­tação.

A meditação está no presente, no puro presente. A meditação é imediata. Você não pode meditar, mas pode estar em meditação. Você não pode estar em concentração, mas pode se concentrar. A concentração é humana; a meditação é divina.


Osho, em "O Livro Orange

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"Quando você compreende, quando chega a saber,
então traz toda a beleza do passado de volta
e dá a esse passado o renascimento, renova-o,
de forma que todos os que o conheceram
possam estar de novo sobre a terra
e viajar por aqui, e ajudar as pessoas." (Tilopa)



"Nos momentos tranqüilos da meditação, a vontade de DEUS pode tornar-se evidente para nós. Acalmar a mente, através da meditação, traz uma paz interior que nos põe em contato com DEUS dentro de nós. Uma premissa básica da meditação, é que é difícil, senão impossível, alcançar um contato consciente, à não ser que a mente esteja sossegada. Para que haja um progresso, a comum sucessão ininterrupta de pensamentos tem de parar. Por isso, a nossa prática preliminar será sossegar a mente e deixar os pensamentos que brotam morrerem de morte natural. Deixamos nossos pensamentos para trás, à medida que a meditação do Décimo Primeiro Passo se torna uma realidade para nós. O equilíbrio emocional é um dos primeiros resultados da meditação, e a nossa experiência confirma isso." (11º Passo de NA)


"O Eu Superior pode usar algum evento, alguma pessoa ou algum livro como seu mensageiro. Pode fazer qualquer circunstância nova agir da mesma forma, mas o indivíduo deve ter a capacidade de reconhecer o que está acontecendo e ter a disposição para receber a mensagem". (Paul Brunton)



Observe Krishnamurti, em conversa com David Bohn, apontando para um "processo", um "caminho de transformação", descrevendo suas etapas até o estado de prontificação e a necessária base emocional para a manifestação da Visão Intuitiva, ou como dizemos no paradigma, a Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa...


Krishnamurti: Estávamos discutindo o que significa para o cérebro não ter movimento. Quando um ser humano ESTEVE SEGUINDO O CAMINHO DA TRANSFORMAÇÃO, e PASSOU por TUDO isso, e esse SENTIDO DE VAZIO, SILÊNCIO E ENERGIA, ele ABANDONOU QUASE TUDO e CHEGOU AO PONTO, à BASE. Como, então, essa VISÃO INTUITIVA afeta a sua vida diária? Qual é o seu relacionamento com a sociedade? Como ele age em relação à guerra, e ao mundo todo — um mundo em que está realmente vivendo e lutando na escuridão? Qual a sua ação? Eu diria, como concordamos no outro dia, que ele é o não-movimento.

David Bohn: Sim, dissemos que a base era movimento SEM DIVISÃO.

K: Sem divisão. Sim, correto. (Capítulo 8 do livro, A ELIMINAÇÃO DO TEMPO PSICOLÓGICO)


A IMPORTÂNCIA DA RENDIÇÃO DIANTE DA MENTE ADQUIRIDA
Até praticar a rendição, a dimensão espiritual de você é algo sobre o que você lê, de que fala, com que fica entusiasmado, tema para escrita de livros, motivo de pensamento, algo em que acredita... ou não, seja qual for o caso. Não faz diferença. Só quando você se render é que a dimensão espiritual se tornará uma realidade viva na sua vida. Quando o fizer, a energia que você emana e que então governa a sua vida é de uma frequência vibratória muito superior à da energia mental que ainda comanda o nosso mundo. Através da rendição, a energia espiritual entra neste mundo. Não gera sofrimento para você, para os outros seres humanos, nem para qualquer forma de vida no planeta. (Eckhart Tolle em , A Prática do Poder do Agora, pág. 118)


O IMPOPULAR DRAMA OUTSIDER — O encontro direto com a Verdade absoluta parece, então, impossível para uma consciência humana comum, não mística. Não podemos conhecer a realidade ou mesmo provar a existência do mais simples objeto, embora isto seja uma limitação que poucas pessoas compreendem realmente e que muitas até negariam. Mas há entre os seres humanos um tipo de personalidade que, esta sim, compreende essa limitação e que não consegue se contentar com as falsas realidades que nutrem o universo das pessoas comuns. Parece que essas pessoas sentem a necessidade de forjar por si mesmas uma imagem de "alguma coisa" ou do "nada" que se encontra no outro lado de suas linhas telegráficas: uma certa "concepção do ser" e uma certa teoria do "conhecimento". Elas são ATORMENTADAS pelo Incognoscível, queimam de desejo de conhecer o princípio primeiro, almejam agarrar aquilo que se esconde atrás do sombrio espetáculo das coisas. Quando alguém possui esse temperamento, é ávido de conhecer a realidade e deve satisfazer essa fome da melhor forma possível, enganando-a, sem contudo jamais poder saciá-la. — Evelyn Underhill